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Capítulo 9 Colonizações espanhola e inglesa na América 2 Capítulo 10 Colonização portuguesa na América 18 Capítulo 11 Comércio atlântico de escravizados 34 Capítulo 12 Brasil Colonial: a sociedade açucareira 48 Volume 3 ca pí tu lo Colonizações espanhola e inglesa na América 9 O artista mexicano Diego Rivera representou um pou- co da história de seu país em sua obra. A imagem dessa página faz parte de um mural produzido por Rivera. Nele, constam elementos da colonização espanhola na América. Observe a imagem e responda: Como os espanhóis e os indígenas foram retratados pelo artista? Considerando a imagem, como você descreveria o processo de colonização espanhola? Colonização espanhola na América Administração espanhola na América Colonização inglesa na América o que você vai conhecer RIVERA, Diego. Chegada de Hernan Cortés a Veracruz. 1951. 1 afresco. Palácio Nacional, Cidade do México. Detalhe. ©World Pictures/Alamy Stock Photo/Fotoarena 2 História Caracterizar o modelo de administração espanhola na América. Analisar os diferentes impactos da con- quista europeia na América espanhola para as populações ameríndias. Descrever os elementos da sociedade estabelecida na América espanhola. Localizar geograficamente as Treze Colônias inglesas, destacando as suas principais características econômicas e sociais. Identificar os principais aspectos da colonização inglesa na América. Analisar o impacto do estabelecimento dos colonos ingleses na América do Norte sobre as populações nativas. objetivos do capítulo Colonização espanhola na América Ao chegar às terras americanas em 1492, Cristóvão Colombo pensou ter alcançado as Índias. Por esse motivo, chamou os habitantes de índios, denominação que permaneceu para designar os povos mais antigos que habitavam o continente americano, mesmo após a ela- boração do termo “pré-colombianos”. Os exploradores europeus impuseram a sua cultura a esses povos, muitas vezes por meio da violência e da escravização. Mas houve reação por parte dos nativos, pois eles desejavam preservar seus costumes. Os conquistadores portugueses, espanhóis e franceses falavam línguas procedentes do la- tim. Assim, as regiões por eles conquistadas – e, depois, colonizadas – receberam a denominação de América Latina. Em 1494, Portugal e Espanha assinaram o Tratado de Tordesilhas, documento que esta- beleceu uma linha imaginária de 370 léguas (no final do século XV, essa distância equivalia a cer- ca de 2500 km) a oeste da ilha de Santo Antão, no arquipélago de Cabo Verde. O tratado previa que o território a oeste da linha ficaria com a Es- panha, e a leste, com Portugal. Foi a partir desse acordo que os espanhóis planejaram a conquista e a dominação da região. O território colonial espanhol foi dividido em áreas administrativas distintas, independentes entre si e que respondiam diretamente a Madri. Fonte: ATLAS histórico escolar. 7. ed. Rio de Janeiro: Fename, 1977. p. 50. Adaptação. Colonização espanhola na América T a li ta K a th y B o ra 3 Observe o mapa da página 3. Em seguida, pesquise os nomes atuais dos países que foram colônias espanholas até meados do século XIX. América do Sul: América Central: América do Norte: organizando a história Conquistas dos astecas e dos incas Os espanhóis iniciaram o processo de conquista pela região do Caribe. Entre 1508 e 1511, as ilhas de Porto Rico, Jamaica e Cuba foram dominadas. A partir desses pontos, os navegadores espanhóis conseguiram contornar o continente e chegaram ao Oceano Pacífico em 1513. Exploraram a região do Rio da Prata em 1516. Em 1519, atraído pelas notícias sobre riquezas do Império As- teca, o militar Hernán Cortez investiu na conquista desse Império, que corresponde a uma parte do atual território do México. Esse processo foi concluído em 1521. As riquezas atribuídas ao Império Asteca estavam relacionadas às consideráveis reservas de ouro presentes no território. Quando Hernán Cortez chegou pelo mar, foi confundido com o deus Quetzalcóatl (divindade que tinha a forma de uma serpente de plumas e asas) e recebido pelo immperador Montezuma de forma amistosa. ENTRADA de Cortez no México. 1 ilustração. Biblioteca do Congresso, Washington, D.C. ©Biblioteca do Congresso, Washington, D.C. 4 História Numericamente menor, o exército de Cortez soube aproveitar as vantagens de que dis- punha. Com uma frota de 11 navios, 600 canhões, 16 cavalos, dois intérpretes e 600 solda- dos, os espanhóis conseguiram subjugar uma população de mais de 200 mil habitantes. Além das armas de fogo, das armaduras, dos cavalos e dos cães ferozes, o explorador fez uso das intrigas existentes entre tribos descontentes com a dominação asteca para instigar uma luta interna. Os tlaxcaltecas faziam parte de um reino que não havia sido conquistado pelos astecas. Eles formaram uma aliança com os espanhóis, invadiram a capital asteca Tenochtitlán e forneceram guerreiros para os confrontos. A luta entre reinos nativos, influenciados pelos espanhóis, gerou uma diminuição da população guerreira, acarretando a redução da resistência contra os conquistadores. Os tlaxcaltecas, por lutarem ao lado dos espanhóis, desfrutaram de privilégios que os distinguiam de outros povos nativos americanos, como o porte de armas de fogo e a autonomia de governo em seus povoados. CONQUISTA de Tototlan. 1 ilustração, color. Tlaxcala Canvas Edition, 1982. Universidade Nacional Autônoma do México. Outro fator importante na vitória espanhola foi a dissemina- ção de doenças desconhecidas na América. A catapora, a varíola ou mesmo variações do vírus da gripe inexistentes no continente se espalharam rapidamente entre os povos ameríndios. Essas doen- ças provocaram a morte de milhares de pessoas e enfraqueceram rapidamente o contingente guerreiro dos nativos. Finalmente, a destruição do modo de produção coletiva desses povos também enfraqueceu a resistência e possibilitou a conquista. Na América do Sul, Francisco Pizarro e Diego de Al- magro iniciaram a conquista do Império Inca, atual Peru, entre 1531 e 1533. A exploração desse território, junto ao dos astecas e dos maias, deu à Espanha grande quan- tidade de ouro e prata. Ameríndios é um dos nomes dados aos povos que viviam no continente americano antes da chegada dos europeus, assim como indígena ou nativo americano. COUTAN, Amable-Paul. Retrato de Francisco Pizarro. 1835. 1 óleo sobre tela, 72 cm × 54 cm. Palácio de Versalhes, França. Utilizando técnicas militares inovadoras, Pizarro derrotou os incas e conquistou o Peru © W ik im e d ia C o m m o n s/ M a n u e l d e Y a ñ e z © F in e A rt I m a g e s/ A lb u m /A lb u m /F o to a re n a 5 Francisco Pizarro chegou a Cuzco, capital do Império Inca, em 1532. Sua chegada se deu logo após uma disputa pelo poder entre os irmãos Huáscar e Atahualpa. O Império Inca es- tava dividido e era governado por Atahualpa. Com 180 homens e 27 cavalos, Pizarro se apro- veitou das disputas internas pelo poder e do uso de armas de fogo pelo exército espanhol para domi- nar e conquistar as principais cida- des incas. Pizarro fundou a cidade de Lima em 1535 e continuou sua campanha de conquista. As forças incas tenta- ram retomar Cuzco, mas foram der- rotadas por Almagro. Leia a citação a seguir sobre as conquistas espanholas na América. interpretando documentos Trinta anos depois de pisarem os espanhóis o continente americano, ninguém que visitas- se as paragens do México ou do Peru seria capaz de desconfiar, sequer, que ali existiram dois impérios adiantados, fortes, populosos, encerrando mundo de tradições. Tudo desaparecera. [...] ninguém cumprira jamais façanha igual: eliminar duas civilizações de tal forma que até as tradições se perderam [...]. BOMFIM, Manoel. A América Latina: malesde origem. Rio de Janeiro: Topbooks, 1993. p. 87. De acordo com a citação e com seus estudos, marque V para as alternativas verdadeiras e F para as falsas. Depois, no caderno, reescreva as falsas para que se tornem verdadeiras. a) ( ) De acordo com Manuel Bomfim, apesar da conquista espanhola, as tradições incas e aste- cas permaneceram inalteradas. b) ( ) As armas utilizadas pelos espanhóis nas batalhas já eram conhecidas dos nativos americanos. c) ( ) As doenças contagiosas mataram em larga escala os povos pré-colombianos porque estes não tinham imunidade contra elas. d) ( ) Na conquista do Império Asteca, os espanhóis contaram com o apoio de tribos de nativos americanos que estavam descontentes com a dominação asteca. e) ( ) Entre as principais motivações para a conquista espanhola na América estava a busca pelo ouro. LEPIANI, Juan. A captura de Atahualpa. [ca. 1920-1927]. 1 óleo sobre tela, 60 cm × 85 cm. Museu de Arte de Lima, Lima. © M u se u d e A rt e d e L im a , P e ru 6 História Administração espanhola na América As colônias espanholas na América eram consideradas propriedades pessoais do rei da Espanha. A monarquia espanhola impôs um rígido controle administrativo e fiscal sobre a região. O território americano que coube à Espanha foi dividido em capitanias-gerais e vice- -reinos. Os capitães-gerais e vice-reis eram escolhidos pelo governo espanhol para comandar esses territórios, devendo obediência e lealdade aos reis espanhóis. Nesse período, a Espanha praticava uma política mercantilista, assim, suas colônias na América foram inseridas nesse contexto. O processo de colonização das terras americanas teve como base o Pacto Colonial, um conjunto de leis estabelecido pelas metrópoles que deveria ser cumprido pelos colonos. O Pacto Colonial prezava pela exclusividade: a colônia enviava matéria-prima (produtos tropicais e metais preciosos) para a metrópole, e a metró- pole enviava produtos manufaturados e escravizados para a colônia. Inicialmente, a exploração dos metais preciosos na América foi deixada a cargo de par- ticulares, os adelantados. Eles deveriam pagar impostos referente a um quinto de todo o metal explorado para a Coroa espanhola, e dela recebiam o direito de fundar cidades, cate- quizar os nativos, construir fortalezas, comandar exércitos e impor leis. Conforme a exploração se intensificava, a administração colonial deixou de ficar apenas a cargo dos adelantados. Foram enviados para a América os chapetones, funcionários da Coroa que se encarregaram da administração dos territórios. Eram eles que fiscalizavam as atividades dos espanhóis na América. Os chapetones eram subordinados aos vice-reis. Estima-se que 30 mil toneladas de prata foram extraídas apenas das minas de Potosí. O trabalho nas minas profundas dos Andes, onde o ar é rarefeito, provocava doenças pulmo- nares graves. Em Potosí a prata levantou templos e palácios, mosteiros e cassinos, foi motivo de tragédia e de festa, derramou sangue e vinho, incendiou a cobiça e gerou desperdício e aventura. GALEANO, Eduardo. As veias abertas da América Latina. Porto Alegre: L&PM, 2010. p. 18. Busque informações sobre o que foi feito com a prata retirada das minas das colônias espanholas. Depois, anote o que você encontrou. pesquisa 7 Ainda na primeira metade do século XVI, foram criados os órgãos administrativos nas colônias. O mais importante deles era o Conselho das Índias, de 1524, responsável por ela- borar leis, aplicar a justiça e designar os funcionários públicos que seriam enviados para a América. A esse conselho se submetiam todos os outros órgãos. Para fiscalizar o trabalho dos vice-reis e dos capitães-gerais, o Conselho das Índias auto- rizava a formação de audiências e enviava, aleatoriamente, visitadores para inspecionar a colônia. Compostas de ouvidores, as audiências eram abertas como um Tribunal Superior, às quais os colonos poderiam recorrer de penas ou acusações consideradas injustas. As maiores autoridades governamentais das colônias eram os vice-reis e os capitães- -gerais. Nas cidades, os órgãos responsáveis pelas funções judiciais e administrativas eram os cabildos, que funcionavam como câmaras municipais controladas pelas elites locais. Os criollos (filhos de espanhóis nascidos na América) poderiam participar dos cabildos. Os de- mais cargos eram ocupados exclusivamente por pessoas nascidas na Espanha. O controle econômico era realizado pela Casa de Contratação. Nela, era estabelecida a fre- quência com que os navios partiriam da América e a qual porto se dirigiriam. Esse órgão definiu o regime de porto único, ou seja, as embarcações que transportavam riquezas das colônias ameri- canas deveriam se encaminhar ao porto de Sevilla e, posteriormente, ao de Cádiz; elas não podiam se dirigir a outros portos europeus. O objetivo era combater a pirataria e o contrabando de metais preciosos. O mercantilismo regia a política econômica da maior parte dos países europeus no século XVI. Dian- te disso, pode-se afirmar que as colônias da América tinham a função de a) servir de moradia aos refugiados políticos desses reinos. b) aumentar a riqueza de suas metrópoles, provendo metais preciosos que gerariam uma balança comercial favorável. c) fornecer produtos industrializados que seriam revendidos por suas colônias para toda a Europa. d) promover a formação de uma população detentora dos conhecimentos europeus em conjunto com os saberes dos povos nativos da América. e) prover mão de obra que seria exportada para a Europa. organizando a história Prédio do Cabildo de Salta, na Argentina. Atualmente, essa construção abriga o Museu Histórico do Norte, com exposições sobre o passado colonial do país. ©Shutterstock/Diego Grandi 8 História O trabalho nas colônias espanholas Até a chegada dos espanhóis, os habitantes da América mantinham a propriedade das terras nas mãos do Estado, o qual concedia o direito de uso delas mediante o pagamento de impostos. Afora os tributos, o excedente era de uso coletivo. Os espanhóis implantaram a lógica mercantilista na produção agrícola, concentrando as terras nas mãos de alguns proprietários, fato que disseminou a fome entre muitos indígenas. As formas de trabalho impostas aos ameríndios eram variadas. As mais conhecidas foram a encomienda e a mita. Mita: também chamada pelos espanhóis de repartimiento de trabajo, era uma forma de trabalho semelhante à praticada pelos incas e astecas antes da conquista espanhola. Consistia na demanda de mão de obra indígena para o trabalho nas minas e em grandes obras públicas. Embora fosse uma atividade remunerada, era obrigatória, e as condições se assemelhavam às da escravidão. Foi bastante usada nas minas para a extração de ouro e prata. Os maus-tratos sofridos pelos ameríndios em decorrência das condições de trabalho causa- ram a morte de muitos deles, contribuindo para a diminuição da população nativa da América. A escravidão africana também foi praticada nas colônias espanholas, sobretudo no Cari- be. Porém, o recurso à mão de obra africana ocorreu principalmente em regiões nas quais os espanhóis não podiam explorar o trabalho indígena. Encomienda: nesse sistema, os indí- genas da América deveriam cultivar ali- mentos e, em troca, os espanhóis se com- prometiam a catequizá-los e protegê-los. Tratava-se de uma condição muito pareci- da com a da escravidão. No entanto, juri- dicamente, esses indígenas eram homens livres, e o trabalho era visto como uma for- ma de tributo. Essa condição não era per- manente nem hereditária. PAUCKE, Florián. Encomienda de indígenas em Tucumán. [séc. XVIII]. Indígenas trabalhando em uma propriedade rural em Tucumán BRY, Théodore. Mineração em Potosí. 1596. 1 gravura. História Americae sive Novi Orbis. © H is to ri a A m e ri ca e s iv e N o v i O rb is A gravura representa Potosí, uma grande montanharepleta de minas de prata. A mineração era a principal atividade lucrativa da colonização espanhola na América. ©Wikimedia Commons/Florián Paucke 9 A imposição da religião cristã também foi um recurso de dominação usado pelos espa- nhóis. A proibição da prática das religiões tradicionais fez com que parte da cultura indígena se perdesse, forçando esses povos a se aproximar cada vez mais dos padrões culturais europeus. Para tanto, foram construídas as chamadas missões ou reduções, comunidades nas quais os indígenas viviam de acordo com o ritmo de trabalho europeu, constituíam famílias aos moldes cristãos, praticavam o catolicismo e aprendiam técnicas agrícolas e arquitetônicas, tudo sob a supervisão dos padres. O frei Bartolomeu de Las Casas viveu na América entre os anos de 1502 e 1547. Em razão da convivência com a realidade dos indígenas americanos, ele se envolveu na defesa dessa população. Em 1552, publicou uma obra na qual denunciava a violência dos conquistadores e dos colonos espanhóis contra as populações nativas da América. O fragmento a seguir traz uma reflexão sobre a violência praticada pelos europeus. Leia-o com atenção. interpretando documentos Com que direito haveis desencadeado uma guerra atroz contra essas gentes que viviam pa- cificamente em seu próprio país? Por que os deixais em semelhante estado de extenuação? Os matais a exigir que tragam diariamente seu ouro. Acaso não são eles homens? Acaso não pos- suem razão e alma? Não é vossa obrigação amá-los como a vós próprios? LAS CASAS, Bartolomé de. O paraíso destruído: a sangrenta história da conquista da América Espanhola. 2. ed. Porto Alegre: L&PM, 2007. p. 13. Com base na citação, responda às questões propostas. 1 Quais foram as críticas feitas por Bartolomeu de Las Casas ao comportamento dos espanhóis? 2 Segundo Las Casas, como a postura dos espanhóis em relação aos indígenas americanos prejudica- va os projetos da Igreja na América? Sociedade colonial espanhola A estrutura administrativa criada pelos espanhóis gerou uma sociedade colonial rigida- mente ordenada. Os chapetones, indivíduos nascidos na Espanha que vinham para a América assumir cargos administrativos, estavam no nível mais elevado. Somente eles podiam assumir tais cargos, pois 10 História eram escolhidos entre as pessoas mais próximas e de confiança do rei ou dos conselheiros que o assistiam. Abaixo dos chapetones estavam os criollos, filhos de espanhóis nas- cidos na América. Eles faziam parte da elite colonial, eram proprietários de terras, oficiais militares, altos clé- rigos, advogados, comerciantes, mas não podiam assumir os principais cargos administrativos pelo fato de terem nascido na América. Essa foi a raiz do conflito entre os colonos e os espanhóis, que mais tarde deu ori- gem aos primeiros movimentos pela independência da América espanhola. Os mestiços, os indígenas e os escravizados trazidos da África compunham o grupo que arcava com a maior parte do trabalho. Nas colônias espanholas, havia uma hierarquia racial. Quanto mais próxima da “pureza racial” espanhola, mais privilégios uma pessoa poderia ter na sociedade colonial. Assim, os mestiços, filhos de espanhóis e indígenas, eram hierarquicamente inferiores aos criollos, mas ainda tinham alguma projeção social. Constituíam um grupo médio, como pequenos comerciantes, artesãos ou prestadores de serviços às famílias criollas e aos chapetones. Nessa sociedade, os indígenas eram excluídos e não tinham os mesmos direitos dos des- cendentes de espanhóis. A maioria estava submetida ao trabalho compulsório em regime de semiescravidão. Embora estivessem nessa condição, eram juridicamente superiores aos escravizados. Seu trabalho era, por vezes, remu- nerado, não podiam ser comprados ou vendidos e seus filhos não estavam, necessariamente, re- duzidos às obrigações do trabalho compulsório. Na base da pirâmide social estavam os es- cravizados, geralmente de origem africana. Em- bora não tenham sido a principal força de tra- balho nas colônias espanholas, a mão de obra escravizada africana foi fundamental no Caribe. Sua situação jurídica era inferior à dos indígenas, embora, na prática, fossem tratados da mesma forma. CABRERA, Miguel. Pintura de castas. 1763. 1 óleo sobre tela. Galeria de Castas Mexicanas, Cidade do México. Família mestiça da América espanhola © G a le ri a d e C a st a s M e x ic a n a s, C id a d e d o M é x ic o FAMÍLIA Fagoaga Arozqueta. 1730. 1 óleo sobre tela. Cidade do México. A família Fagoaga Arozqueta era de origem criolla da classe alta da Cidade do México © W ik im e d ia C o m m o n s 11 A Igreja Católica teve um papel fundamental no processo de coloni- zação dos territórios da Espanha na América. A Igreja foi o braço direito da Co- roa espanhola, pois se dedicou à euro- peização dos povos indígenas, conver- tendo-os ao catolicismo, ensinando a língua espanhola às crianças, impon- do a moral cristã, etc. 1 Com base em seus conhecimentos sobre a colonização espanhola na América, analise as afirmativas a seguir. I. Na sociedade colonial espanhola, os chapetones eram o grupo que arcava com a maior parte do trabalho, como a produção de alimento. II. Os mestiços eram hierarquicamente inferiores aos criollos, contudo tinham alguma projeção social. III. A Igreja Católica trabalhou ao lado da Coroa espanhola no processo de colonização na América. De acordo com a análise, assinale a alternativa correta. a) Todas as afirmativas são verdadeiras. b) Todas as afirmativas são falsas. c) Apenas as afirmativas I e II são verdadeiras. d) Apenas as afirmativas I e III são verdadeiras. e) Apenas as afirmativas II e III são verdadeiras. 2 Escreva o nome e as atribuições dos grupos que faziam parte da sociedade colonial espanhola na América. organizando a história CATEDRAL Metropolitana da Cidade do México. 2005. 1 fotografia. Cidade do México. Hernán Cortez ordenou a construção de uma igreja sobre as ruínas do antigo Templo Maior Asteca. Posteriormente, essa igreja foi demolida e teve início a construção da Catedral do México. © S h u tt e rs to ck /H e ik o n e u m a n n P h o to g ra p h y 12 História Colonização inglesa na América A expansão marítima e a colonização inglesa, em comparação com a ibérica, acontece- ram de maneira tardia. Dois elementos explicam essa situação: um externo, a Guerra dos Cem Anos (1337-1453), que mobilizou Inglaterra e França, e outro interno, a Guerra das Duas Rosas (1455-1485) – disputa pelo trono inglês entre as famílias Lancaster e York. A Inglaterra foi derrotada no conflito externo e, no interno, passou por uma guerra civil que abalou as finanças do reino. A Guerra das Duas Rosas terminou quando Henrique Tudor derrotou Ricardo III na Batalha de Bosworth. O novo rei assumiu o poder como Henrique VII e unificou as duas alas da nobreza, dando início à dinastia Tudor, consolidadora do Absolutismo na Inglaterra. No século XVII, com a organização da economia, o Es- tado inglês, em aliança com a burguesia, teve condições de investir recursos nas grandes navegações. HOLBEIN, Hans. Retrato de Henrique VIII da Inglaterra. 1537. 1 óleo sobre tela, 28 cm × 20 cm. Museu Thyssen-Bornemisza, Madri. Rei Henrique VIII, segundo monarca inglês pertencente à dinastia Tudor Os corsários recebiam um documento chamado Carta de Corso, indicando que estavam autorizados pela Coroa inglesa a saquear navios estrangeiros. Os piratas faziam o mesmo, contudo trabalhavam por conta própria e dividiam os lucros entre a população. GHEERAERTS, Marcus. Sir Francis Drake. 1590. 1 óleo sobre tela, 86 cm × 76 cm. Abadia de Buckland, Devon. © A b a d ia d e B u ck la n d , D e v o n , I n g la te rr a © M u se u T h y ss e n -B o rn e m is za , M a d ri As regiões tropicais do continente americano, compotencial agrícola e onde se concen- travam minas de ouro e prata, já haviam sido conquistadas por outros países. Para não ficar de fora da exploração do continente americano, os ingleses recorreram à pirataria corsária. O Oceano Atlântico se tornou um lago de corsários, que promoviam saques a mando dos seus governantes. Seus alvos principais eram as naus espanholas e portuguesas que se dirigiam à Península Ibérica carregadas de riquezas. Francis Drake foi um dos principais corsários ligados à Inglaterra. Por suas conquistas, recebeu títulos de nobreza da rainha Elizabeth I. 13 As Treze Colônias M a ri lu d e S o u za Além dessas atividades, os ingleses conquistaram territórios na América do Norte, no Caribe, na América Central e do Sul, os quais correspondem, atualmente, a parte dos Estados Unidos e do Canadá, das ilhas de Bahamas, Jamaica, Bermudas e Trinidad e Tobago, e aos territórios de Belize e da Guiana Inglesa. A ocupação do território americano pelos ingleses só começou efetivamente no século XVII e com objetivos e preocupações diferentes dos que tinham os ibéricos. As terras ameri- canas foram vistas como a possibilidade de um território para onde enviar cidadãos ingleses que causavam problemas à Coroa. Dessa forma, algumas pessoas foram incentivadas a se deslocar para a América. A reli- gião oficial da Inglaterra era o anglicanismo. Os fiéis de outras igrejas cristãs eram persegui- dos e impedidos de praticar sua fé. Famílias inteiras que se viam nessa situação optaram por se mudar para a América e iniciar a colonização das Treze Colônias. Como poucas pessoas tinham condições financeiras de pagar a viagem até a América, desenvolveu-se uma nova forma de trabalho: a servidão por contrato. Uma pessoa financiava a viagem em troca de trabalho gratuito até que a dívida fosse paga. Os colonos pobres leva- vam cerca de sete anos para garantir sua liberdade. Fonte: ATLAS histórico escolar. Rio de Janeiro: MEC/Fename, 1973. p. 48. Adaptação. Quando chegaram à Améri- ca, os ingleses estabeleceram- -se na região litorânea da Amé- rica do Norte. A ocupação inglesa da América deu origem às Treze Colônias. Essas colônias apre- sentavam características so- ciais, econômicas e políticas distintas. 14 História Como a intenção dos ingleses era viver na América, diferentemente de portugueses e espanhóis, que almejavam apenas levar as riquezas para a Europa, desde o início, a coloni- zação inglesa buscou desenvolver uma infraestrutura, que envolvia a construção de casas, enfermarias, oficinas e demais edificações necessárias para a vida em comunidade. Na administração, em vez de enviarem funcionários para administrar suas posses na América (como haviam feito os ibéricos), os ingleses organizaram governos locais, escolhen- do representantes para as assembleias. Observe, no material de apoio, a imagem que representa o Dia de Ação de Graças dos colonos norte-americanos. De acordo com seus estudos sobre a colonização inglesa na Amé- rica, assinale a alternativa correta. a) Os colonos procuravam manter a cultura europeia e não integravam seus hábitos aos dos indí- genas. b) De acordo com a imagem, percebemos que os colonos rapidamente incorporaram à sua cultura hábitos dos indígenas da América do Norte. c) Os colonos ingleses transformaram a colonização em uma missão religiosa, buscando ensinar aos indígenas os fundamentos da fé católica. d) Os ingleses estimularam acordos comerciais e casamentos com os indígenas. e) A ação colonizadora inglesa na América respeitou a posse da terra dos povos nativos, buscando regiões que ainda não tinham ocupação humana. interpretando documentos Diferenças entre as Treze Colônias De acordo com as condições climáticas de cada colônia, foram estruturadas suas bases econômicas, políticas e sociais. As colônias do Norte, compostas de Massachusetts, Rhode Island, New Hampshire, Connecticut, Nova Iorque, Nova Jérsei, Delaware e Pensilvânia, não puderam se dedicar à agricultura em virtude do clima temperado. Nelas, então, prevalece- ram as cidades, a atividade comercial, a instalação de manufaturas, os minifúndios com pro- dução variada, o desenvolvimento do mercado interno e a mão de obra livre, pois não havia recursos suficientes para a importação de escravizados em grande escala. A pouca relevância econômica dessas colônias para a Inglaterra fez com que o Pacto Co- lonial, que deveria limitar as liberdades comerciais da colônia, não fosse respeitado. Diante disso, esses territórios desenvolveram maior autonomia. As colônias do Sul, formadas por Maryland, Virgínia, Carolina do Norte, Carolina do Sul e Geórgia, de clima ameno, dedicaram-se à agricultura e seu modo de organização era diferen- te daquele estabelecido nas vizinhas do Norte. Nas colônias do Sul, a mão de obra escrava era utilizada em grande escala. 15 Nas colônias do Sul, prevaleceu o modelo de plantation, também adotado no Brasil. A produção se concentrava em grandes propriedades, os latifúndios. Nesses locais, predomi- nava a produção de apenas um gênero agrícola, o algodão. Esse produto ganhou importân- cia ao longo do tempo, já que era a matéria-prima essencial para o processo da Revolução Industrial na Inglaterra, cuja base era o setor têxtil. O cultivo de apenas um produto é cha- mado de monocultura. As colônias do Sul eram, portanto, rurais e, em razão da sua importância para a indústria inglesa, todas as atividades eram rigidamente controladas pela Inglaterra. O comércio era mo- nopolizado pelas companhias de comércio, empresas mistas, privadas e estatais, que estabele- ciam regras e preços, além de realizarem o transporte de mercadorias para a Inglaterra. O Destino Manifesto Depois de colonizar o litoral, os ingleses iniciaram a expansão para o interior do conti- nente. Pelos locais onde se estabeleciam, os colonos levavam o seu modo de vida. Essa ex- pansão, porém, encontrou uma barreira nos povos indígenas que habitavam o interior, como os apaches, os sioux e os cheyennes. Os ingleses, no entanto, dispostos a estimular o cres- cimento e o desenvolvimento das suas colônias, promoveram ataques aos povos indígenas. Na busca por justificar a expansão territorial e a dizimação de indígenas, em 1845, o jornalista John O’Sullivan teria publicado a seguinte frase na Revista Democrática: “Nosso destino manifesto atribuído pela Providência Divina para cobrir o continente para o livre de- senvolvimento de nossa raça que se multiplica aos milhões anualmente.”. Depois dessa pu- blicação, propagou-se a ideia de que os colonos eram o povo escolhido por Deus para levar a cultura e o seu modo de vida a todos os cantos da América. Tal ideia passou a ser chamada de Destino Manifesto. A ideia de superioridade, manifestada nesse período, foi retomada em vários momentos da história dos Estados Unidos como forma de legitimar a dominação de outros povos e territórios. A imagem ao lado é uma das repre- sentações do Destino Manifesto que os colonos ingleses usavam para justi- ficar a apropriação de terras indígenas. Reúna-se com um colega e jun- tos analisem a imagem. Em seguida, identifiquem os elementos que ex- pressam a ideia do Destino Manifesto apresentados na pintura. troca de ideias GAST, John. Progresso americano. 1872. 1 óleo sobre tela, color., 45,08 cm × 54,61 cm. Autry Nacional Museu do Oeste Americano, Los Angeles. © A u tr y N a ci o n a l M u se u d o O e st e A m e ri ca n o , L o s A n g e le s 16 História Embora tenha gerado benefícios à Inglaterra, a colonização inglesa na América foi trági- ca para as populações nativas. Os indígenas norte-americanos tiveram suas terras tomadas, e muitas de suas práticas culturais foram desestruturadas à medida que os colonos europeus avançavam. Estima-se que a população indígena que vivia na região, que atualmente forma os Estados Unidos, era de 25 milhões no século XVI.No início do século XIX, era de 2 milhões. Leia com atenção o trecho a seguir. interpretando documentos Para conseguir 20 000 quilos de ouro, remetidos à Espanha entre 1503-1530 (antes disso não há registro), os espanhóis saquearam, mataram e roubaram. Os historiadores discutem o número de mortos, mas ninguém nega a tragédia. Se a ilha de São Domingos tinha 8 milhões de habitantes em 1492, em 1514 restavam 32 mil homens. Se o vale do México comportava 25 mi- lhões de pessoas, no final do século não passavam de 70 000 pessoas. Sessenta e oito por cento dos Maias pereceram nas mãos dos espanhóis. A população do Peru, que em 1530 era calculada em 10 milhões, em 1560 caiu para dois milhões e meio. Um desastre demográfico. PEREGALLI, Enrique. A América que os europeus encontraram. São Paulo: Atual, 1987. p. 4-5. Com base no texto e nos seus estudos, escreva duas semelhanças e duas diferenças entre as colo- nizações espanhola e inglesa na América. Leia as afirmativas a seguir e marque V para as verdadeiras e F para as falsas. Depois, reescreva no caderno as afirmativas falsas de modo que se tornem verdadeiras. a) ( ) Os vice-reis poderiam ser escolhidos entre a nobreza espanhola ou entre as famílias criollas. b) ( ) A Igreja Católica era uma das principais instituições na América espanhola. c) ( ) Os indígenas estavam abaixo de todas as outras castas sociais na América espanhola. d) ( ) Os colonos ingleses que vieram para a América buscavam um novo mundo para viver; os ibéricos buscavam riquezas para levar para a Europa. e) ( ) O Conselho das Índias era o principal órgão administrativo da América espanhola. f) ( ) Entre as colônias inglesas na América, as do norte se dedicavam à agricultura em grandes áreas, a chamada plantation. g) ( ) Os cabildos eram proprietários de terras que recebiam grandes quantidades de indígenas para trabalhar na forma de encomienda. o que já conquistei 17 ca pí tu lo Colonização portuguesa na América 10 A imagem desta página representa, de forma alegórica, como foi a primeira missa celebrada em território brasileiro. O evento ocorreu provavelmente na atual região de Porto Se- guro, quatro dias depois da chegada dos portugueses. O cele- brante foi o frei Henrique de Coimbra. Observe a imagem e converse com seus colegas sobre as seguintes questões: Qual é a postura dos dois grupos que aparecem na imagem? É possível dizer que o contato entre portugueses e nativos foi pacífico? Crise do comércio com as Índias Contatos, escambos e feitorias Organização da política colonial o que você vai conhecer MEIRELLES, Victor. A primeira missa no Brasil. 1860. 1 óleo sobre tela, 268 cm × 356 cm. Museu Nacional de Belas-Artes, Rio de Janeiro. ©Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro 18 Explicar as razões que levaram os portugueses a iniciar a colonização do Brasil. Analisar as relações estabelecidas entre portugueses e indígenas nas primeiras décadas da colonização. Descrever o processo de formação das Capitanias Hereditárias. Compreender os elementos das estruturas políticas e econômicas no processo de colonização portuguesa. Conhecer as características estrutu- rais do Governo-Geral e sua relação com as Capitanias Hereditárias. objetivos do capítulo Crise do comércio com as Índias Em março de 1500, sob o comando de Pedro Álvares Cabral, uma esquadra formada por 13 navios partiu de Lisboa com uma tripulação de mil e quinhentos homens, entre nobres, funcionários da corte, padres, marujos, soldados e degredados. Foi a maior frota reunida para cruzar o Atlântico até aquele momento. O objetivo oficial era fundar um entreposto comercial em Calicute, na Índia. Afastando-se, teoricamente, da rota original, na tarde de 22 de abril, a frota portuguesa aportou no litoral do atual estado da Bahia, onde foi fixado o brasão real. Assim, os portugueses tomavam posse das terras que lhes fo- ram asseguradas pelo Tratado de Tordesilhas, assinado entre Por- tugal e Espanha em 1494. Na carta que enviou ao rei português, o cronista da viagem, Pero Vaz de Caminha, descreveu suas primeiras impressões sobre as terras encontradas. Vendo do mar, o sertão nos pareceu muito grande, porque, ao estender os olhos, não podíamos ver senão terra com arvoredos a perder de vista. Até agora, não pudemos saber que haja aqui ouro, prata, ou alguma coisa de metal ou ferro; nem o vimos. Po- rém a terra em si tem um ótimo clima, frio e temperado [...]. As águas são muitas, infindas. E esta terra é tão graciosa que, que- rendo aproveitá-la, tudo dará, em razão das águas que tem. [...] CARTA de Pero Vaz de Caminha. In: MARQUES, Adhemar; BERUTTI, Flávio; FARIA, Ricardo. História moderna através de textos. São Paulo: Contexto, 2008. p. 70. O marco coonfnfirirrmamavavav aa posse das ss teterrrrr asass ppelela a Coroa poortrtugugueuesasaa.. Marco de posse português colocado em Porto Seguro, sul da Bahia ©Shutterstock/casadaphoto 19 A expedição portuguesa permaneceu no litoral brasileiro até os primeiros dias do mês de maio. Depois, sob o comando de Gaspar Lemos, uma embarcação retornou a Portugal a fim de levar a notícia da posse da terra, enquanto Cabral seguiu para as Índias com o restante da expedição. Analisando a descrição feita por Pero Vaz de Caminha e tendo em mente o destino principal da ex- pedição de Cabral, assinale a alternativa correta. a) Em razão das riquezas encontradas de imediato pelos portugueses, a frota de Cabral retornou a Portugal para solicitar ao rei o início da colonização. b) O objetivo da frota de Cabral era chegar às Índias. A América, embora tivesse clima e solos bons, aparentemente não possuía metais preciosos, por essa razão ficou em segundo plano. c) Os portugueses não sabiam da existência de terras na região onde atualmente fica o Brasil, por essa razão o Tratado de Tordesilhas foi apenas um golpe de sorte que garantiu a posse desse território. d) Quando os portugueses chegaram ao Brasil, os espanhóis já haviam passado por aqui e estabelecido os primeiros contatos com os indígenas brasileiros, dificultando a tomada de posse do território. e) Em virtude da inexistência de riquezas na região, da falta de água e de solos férteis, os portugue- ses abandonaram o Brasil, retornando apenas 50 anos depois. organizando a história A primeira iniciativa da Coroa portuguesa em relação ao novo território foi determinar a vinda de expedições destinadas a reconhecer o litoral. Assim, em 1501, Gaspar Lemos liderou uma expedição e, em 1503, Gonçalo Coelho comandou a segunda. Entre 1516 e 1526, duas outras expedições, sob o comando de Cristóvão Jacques, foram enviadas com o objetivo de proteger a costa brasileira de possíveis ataques estrangeiros, as expedições guarda-costas. Foi durante essas viagens que os portugueses descobriram uma madeira nobre. Inicialmente, a terra conquistada pelos portugueses foi denominada Terra de Vera Cruz, por conta da Cruz da Ordem de Cristo, desenhada nas caravelas. Posteriormente, o rei de Portugal Dom Manuel denominou-a Terra de Santa Cruz. Com o início da extra- ção da madeira do pau-brasil, o nome Brasil foi adotado. CARAVELA. 1 pintura em azulejo. A cruz era o símbolo da Ordem e Cavalaria de Cristo, fundada pelo papa João XXII a pedido de D. Dinis em 1319. Com o objetivo de proteger os viajantes, a cruz estava presente nas velas das caravelas que exploravam mares desconhecidos. ©Shutterstock/Marafona 20 História Além dos nomes portugueses dados ao nosso país, algumas tribos indígenas usavam outro termo para identificar a terra onde viviam. Faça uma pesquisa, descubra qual era esse nome e o que significava. pesquisa Apesar da vastidão do novo território, o Brasil não parecia ter ouro, prata ou pedras pre- ciosas, algo de valor substancial a ser explorado. O pau-brasil, embora fosse lucrativo para os comerciantes, ainda não gerava o lucro que o comércio com as Índias oferecia. O desinteresseportuguês pelo Brasil explica a razão de a colonização do território ter começado apenas 30 anos depois da chegada dos lusos a terras brasileiras. A crise do co- mércio com as Índias influenciou profundamente o início da colonização. Todos os anos, os navios portugueses se dirigiam às Índias contornando a África; essa viagem era chamada de “carreira das Índias” – trajeto entre Lisboa e os portos de Cochim e Goa. Até meados de 1530, os negócios de Portugal na Índia foram bastante lucrativos, e os portugueses ultrapassaram os venezianos no controle do comércio de especiarias. Na primeira metade do século XVI, por várias razões, esse comércio começou a declinar. O motivo mais importante para isso foi a entrada de outras nações na corrida colonial e na expansão marítima, como Inglaterra, França e Holanda. Esses países não respeitavam a di- visão do mundo estabelecida por Espanha e Portugal no Tratado de Tordesilhas e passaram a concorrer com os portugueses, tomando algumas colônias, assediando outras, assumindo parte do comércio de especiarias e atacando navios portugueses por meio dos corsários. Os franceses começaram a traficar pau-brasil clandestinamente, depois invadiram as atuais regiões do Rio de Janeiro e do Maranhão. Portugal não tinha recursos militares sufi- cientes para fazer frente a essa disputa, e o domínio sobre tais regiões passou a ser inviável. A distância entre Portugal e as Índias acabou contribuindo para a crise. Os navios aguen- tavam apenas uma viagem de ida e volta, a manutenção da frota tinha alto custo, os naufrá- gios eram comuns e a defesa das diversas feitorias espalhadas pelo Oriente ficou cada vez mais difícil após a disputa comercial com outras potências. Assim, o volume de gastos com as viagens não compensava o lucro obtido com o comércio de especiarias na Europa. BRAUN, Georg; HOGENBERG, Franz. Cidade de Goa. 1509. In: Civitates orbis terrarum. 1617. N i i t d d é l XVI A cicic dadadede de GoGoa,, nno o atuaual ll tet rrrrritititóróróriooi da a Índidia,aa fficcouo sob o controle portuguêês por r mais de 400 anos. Tornou-se a capital do i d 400 T it l d Império português na Índia, região de imensa importância econômica. © A tl a s d e B ra u n e t H o g e n b e rg 21 A descoberta de ouro e prata pelos espanhóis, em suas colônias na América, estimulou a monar- quia portuguesa a intensificar a procura por me- tais em sua colônia americana. Os portugueses precisavam fazer uma esco- lha: ou concentravam recursos na manutenção das suas posições nas Índias, o que se mostrava cada vez mais complicado, ou iniciavam a coloniza- ção na América, a fim de buscar riquezas minerais e preservar os territórios da ameaça estrangeira. A segunda opção foi escolhida, assim, o processo efetivo de conquista e colonização da América foi iniciado na década de 1530. 1 O navegador Cristóvão Jacques foi o responsável por liderar expedições para proteger a costa bra- sileira de invasores estrangeiros. Essas expedições ficaram conhecidas como: a) Expedições punitivas. b) Expedições de guerra. c) Expedições de reconciliação. d) Expedições guarda-costas. e) Expedições de garantia. 2 Por volta de 1530, a posse portuguesa do Brasil se efetivou. Assinale os fatores que contribuíram para que essa decisão fosse tomada pela monarquia portuguesa. ( ) O rei D. João III não queria colonizar nenhum território, então apostou em utilizar novas técni- cas de navegação e intensificar o comércio de especiarias. ( ) Foram descobertas riquezas minerais nas colônias espanholas. ( ) As viagens até as Índias tinham um alto valor. ( ) Os territórios portugueses na América sofriam ameaça estrangeira. ( ) Foi feita uma aliança com franceses na colonização do Brasil. organizando a história LOPES, Cristóvão. Retrato de d. João III. 1522. 1 óleo sobre tela. Museu de São Roque, Lisboa. D. João III, Rei de Portugal entre 1521 e 1557, é conhecido como “o colonizador”, por ter iniciado a colonização de vários territórios, entre eles o do Brasil, em 1532. Contatos, escambos e feitorias Como vimos, os portugueses não encontraram minas de ouro e prata nas primeiras via- gens que fizeram para a colônia americana, por isso não deram grande atenção ao território. Ainda assim, alguns negociantes viram na extração do pau-brasil um negócio lucrativo e con- seguiram do rei autorização para explorá-lo. © M u se u d e S ã o R o q u e , L is b o a 22 História A árvore do pau-brasil era encontrada facilmente em várias áreas da Mata Atlântica, desde a atual região de Pernambuco até o Rio de Janeiro. O interesse comercial por essa árvore se devia a dois motivos: da madeira triturada obtinha-se uma tinta vermelha, que era utilizada para tingir tecidos; e a madeira era bastante resistente. O primeiro negociante português a ob- ter o direito sobre o monopólio da extração e da comercialização do pau-brasil foi Fer- nando de Noronha. Ele assumiu o compro- misso de mandar anualmente seis navios carregados de madeira para o reino; para isso, construiu uma feitoria na Colônia. Conhecido pelos indígenas como ibirapitanga, o pau-brasil era uma árvore comum em vasta ex- tensão da costa litorânea brasileira. Sua madeira, de tom avermelhado, era empregada na Europa com a finalidade de produzir um corante deno- minado brasileína. A madeira era procurada para fabricação de mobiliários finos e ornamentados e, por ser muito resistente, era usada também na construção naval. Sua exploração, constante e predatória por vários anos, quase o levou à ex- tinção. Os primeiros comerciantes que atuavam na exploração do pau-brasil ficaram conhecidos como brasileiros. © B ri ti sh L ib ra ry , L o n d re s TINGIMENTO de tecido. [ca. 1500]. 1 gravura, color. Biblioteca Britânica, Londres. Feitoria era um núcleo fortificado de ocupação portuguesa, cercado por paliçadas de madeira ou de pedra. Era administrada por um feitor escolhido pela Coroa portuguesa. Além dele, poderia haver ali um escrivão. A maior parte das pessoas que viviam em seus limites eram militares. Era utilizada como depósito para madeira, animais, peles e outros produtos que se destinavam a ser embarcados. © F o to a re n a /R it a B a rr e to © Sh ut te rst ock /Visicou 23 Para explorar o território brasileiro, foram organizadas feitorias em vários pontos do li- toral. Nelas, os portugueses armazenavam os produtos extraídos das matas brasileiras, prin- cipalmente o pau-brasil. Depois, esses produtos eram embarcados nas caravelas e enviados a Portugal, a fim de serem vendidos em todo o continente europeu. Quando as reservas de madeira de uma região terminavam, os portugueses deslocavam-se para novas áreas do ter- ritório, o que provocou sérios danos ambientais em parte da Mata Atlântica. Era o início da exploração predatória das riquezas naturais do Brasil por Portugal. Eram os indígenas os responsáveis por derrubar as árvores, cortá-la em pequenos tron- cos, transportá-los até o litoral e acondicioná-los nas caravelas. Em troca, eles recebiam ob- jetos considerados de pouco valor na Europa, como pentes, anzóis, espelhos, colares, facas e machados de metal. Por esse motivo, muitos historiadores afirmaram que a troca de pau- -brasil era realizada por “bugigangas”. A amistosidade dos primeiros contatos logo acabaria. Os indígenas não entendiam o trabalho como uma atividade contínua, visando à acumulação de mercadorias. Também não tinham a ideia de lucrar com a comercialização. Por isso, muitos resistiam ao trabalho força- do fugindo para locais ainda desconhecidos dos colonos ou atacando as fortificações em que estes viviam. © B ib li o te ca N a ci o n a l d e P a ri s, F ra n ça No Atlas Miller, elaborado por Lopo Homem em conjunto com outros cartógrafos, por volta do ano 1519, há um mapa com a representação de indígenas cortando e transportando pau-brasil.Também podem ser observadas caravelas no litoral. HOMEM, Lopo. Terra Brasilis. [entre 1515 e 1519]. 1 manuscrito iluminado sobre pergaminho, 41,5 cm × 59 cm. Département de Cartes de la Bibliothèque Nationale, Paris. (Detalhe). 24 História No mapa ao lado, observe a extensão da região de onde se extraía o pau-brasil. Para extrair essa madeira, os indígenas se deslocavam para o interior – observe no mapa as áreas mais afastadas do litoral. Depois, andavam vários quilôme- tros para transportar o produto até o litoral. Extração do pau-brasil A presença francesa no litoral do Brasil foi intensa. Uma das evidências disso foi o episódio da Festa de Rouen, em 1550. Sobre esse evento, leia o trecho a seguir. interpretando documentos Uma “festa brasileira” foi realizada diante do monarca francês Henrique II e da regente Ca- tarina de Médicis. Para receber o casal reinante, a cidade de Rouen resolveu fazer uma grande cerimônia. Construíram-se vistosos monumentos – obeliscos, templos e arcos do triunfo –, e nesses locais aconteceu uma festa do Novo Mundo. Meio século depois da chegada dos portu- gueses ao continente, a voga parecia ser encenar os “homens do Brasil”: os “bravos Tupinambá”, aliados dos franceses. E assim se fez: cinquenta Tupinambá foram simular um combate perto do rio Sena e na presença da nobreza local. Para dar maior amplitude à festa, os indígenas fo- ram misturados com mais de 250 figurantes vestidos à moda, e representavam cenas de caça, de guerra e de amor, além de aparecerem carregados de bananas e papagaios. SCHWARCZ, Lilia; STARLING, Heloísa. Brasil: uma biografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2015. p. 36. Com base no texto e em seus conhecimentos, marque V para as afirmações verdadeiras e F para as falsas. ( ) Os europeus tinham curiosidade sobre a vida e os costumes dos nativos da América. ( ) Os portugueses tinham total controle da costa brasileira e impediam qualquer aproximação de outras nações. ( ) Os indígenas não suportavam a presença dos europeus, salvo em situações de trocas comerciais. ( ) Os franceses fizeram grandes esforços para conquistar partes do território brasileiro, inclusive alianças com povos indígenas locais. ( ) Os povos indígenas brasileiros fizeram diferentes alianças com os europeus. ( ) A Festa de Rouen foi uma forma de aproximação entre os franceses e os Tupinambá, além de uma maneira de apresentar os nativos aos reis. T a li ta K a th y B o ra Fonte: ALBUQUERQUE, Manuel M. de. Atlas histórico escolar. Rio de Janeiro: FAE, 1988. p. 28. Adaptação. 25 Organização da política colonial Diante das ameaças de invasões estrangeiras e da diminuição dos lucros com as expe- dições às Índias, o rei de Portugal determinou o início da conquista e a ocupação das terras portuguesas na América. O período entre 1500 e 1530, quando a ação portuguesa foi ca- racterizada por expedições de reconhecimento, policiamento do litoral e extração do pau-brasil, ficou conhecido na História tradicional como Período Pré-Colonial. Essa denomina- ção vem do fato de não ter havido povoamento pelos portugueses nesses anos. Em 1532, Martim Afonso de Sousa aportou no lito- ral que atualmente faz parte do estado de São Paulo e fundou a primeira vila do Brasil, chamando-a de São Vicente. No ano seguinte, foi criada a Vila de Santo André da Borda do Campo, no Planalto de Piratininga. © M u se u P au lis ta , S ão P au lo RODRIGUES, J. Wasth. Martim Afonso. [18--]. 1 óleo sobre tela, color. Museu Paulista, São Paulo. Martim Afonso de Sousa, nascido no ano de 1500, homem culto, versado em Letras e Matemática, era amigo de infância do rei D. João III. Composta de cinco embarcações, a expedição de Martim Afonso trouxe 400 pessoas, animais domésticos destinados ao consumo, transporte e tração – vacas e cavalos –, além das primeiras mudas de cana-de-açúcar. Essa planta de origem asiática tinha como subpro- duto o açúcar, que era muito procurado no comércio europeu. CALIXTO, Benedito. Fundação de São Vicente. 1900. 1 óleo sobre tela, color., 65 cm × 100 cm. Museu Paulista, São Paulo. No ano de 1900, o pintor Benedito Calixto representou, de modo idealizado, a fundação da Vila de São Vicente. ©Museu Paulista, São Paulo 26 História Após a morte do donatário, a capitania era pas- sada para seu filho mais velho, por isso o nome “he- reditárias”. Essas terras não poderiam ser vendidas nem divididas. Receber uma capitania no Brasil era uma hon- raria e também um negócio arriscado. Os donatá- rios, além de investir o próprio dinheiro em terras distantes de Portugal, estavam expostos a diversos perigos, como a hostilidade de alguns povos nati- vos, as doenças tropicais e a possibilidade de não encontrar riqueza alguma. Também havia a pirata- ria corsária à espreita e a completa falta de infraes- trutura – portos, pontes, estradas. Do projeto inicial, apenas duas capitanias foram consideradas lucrativas: São Vicente, que havia re- cebido incentivo real quando foi fundada a Vila de São Vicente, em 1532; e Pernambuco, em virtude Capitanias Hereditárias As terras brasileiras eram extensas. Para cuidar de todo o território e povoá-lo, Portugal precisaria dispensar grandes investimentos, e o rei não tinha essa intenção. Ao contrário, ele buscava um modo de tomar conta da nova terra e explorá-la sem precisar investir muito. A expedição colonizadora de Martim Afonso de Sousa, embora tenha proporcionado um me- lhor reconhecimento do litoral brasileiro e a fundação de algumas vilas, mostrou-se de alto custo. Assim, essa forma de expedição não voltou a ocorrer. D. João III, que governou Portugal de 1521 a 1557, fez uso de um sistema que já havia experimentado nas ilhas da Madeira e dos Açores. Ele determinou que as terras fossem re- partidas e doadas a pessoas interessadas em colonizar a América. Esse sistema ficou conhe- cido como Capitanias Hereditárias e consistia na divisão do território em faixas de terras que variavam de 20 a 100 léguas de largura. Todas começavam no litoral e prosseguiam com a mesma largura até a linha imaginária do Tratado de Tordesilhas. Em 1534, o território brasileiro foi dividido em 15 faixas; elas foram entregues a 12 pes- soas de confiança do rei e pertencentes à aristocracia portuguesa. Os beneficiários de terras eram chamados de donatários. Eles tinham o direito de explorar as riquezas encontradas em sua capitania, contudo, deveriam arcar com as despesas empregadas para a exploração e a colonização do território. Os donatários também se responsabilizavam por arrecadar impos- tos e aplicar a justiça. TEIXEIRA, Luís. Capitanias Hereditárias. 1574. 1 mapa. Biblioteca da Ajuda, Lisboa. Representação cartográfica das Capitanias Hereditárias A Carta de doação e o Foral eram os documen- tos que oficializavam o recebimento da terra pelo donatário e o início de suas obrigações com o rei de Portugal. © B ib li o te ca d a A ju d a , L is b o a 27 do estabelecimento de famílias responsáveis por grandes propriedades de terras produto- ras de açúcar e da proximidade com Portugal, se comparada com a localização das demais capitanias. Os objetivos iniciais da Coroa não foram atingidos. Vários donatários não vieram para a Colônia, outros não dispunham de recursos suficientes para trabalhar a terra recebida. Mes- mo entre os que resolveram investir, nem todos foram bem-sucedidos. Desse modo, muitas capitanias foram abandonadas à própria sorte. As capitanias de Per- nambuco e São Vicente se dedicaram à produção de cana-de-açúcar, o que possibilitou o desenvolvimento do povoamento. 1 Que motivos levaram D. João III a escolher o sistema de Capitanias Hereditárias para a administra- ção da colônia portuguesa na América? 2 Quais eram os deveres e os direitos dos donatários? organizando a história Os portugueses que vieram para a Colônia tiveram muitas dificuldades, umavez que o território, as pessoas, a comida e o clima eram diferentes daqueles que conheciam na Euro- pa. Os indígenas tiveram um grande papel nesse processo de adaptação. Os donatários que permaneceram na América escreveram ao rei solicitando ajuda, pois as dificuldades amea- çavam o domínio português. Diante dessa situação, a Coroa portuguesa resolveu enviar um representante do rei para a Colônia. Assim, em 1548, foi criado o Governo-Geral. Leia o texto a seguir sobre os primeiros anos dos portugueses na América. interpretando documentos Os índios, também chamados de brasís, ensinaram os por- tugueses a utilizar a flora variada na vida prática: folhas de ca- pim selvagem serviam de lâminas de barbear; o fruto da bignoniácea era usado como pente; o capim-flecha se transformava em delicadas pinças para arrancar pelos. As castanhas de caju, como afir- ma um viajante de passagem na Pernambuco seiscentista, serviam de calendários: “Quanto aos algarismos, não passam de cinco. Devido a isso, utilizavam-se de castanhas de caju – cujo fruto bignoniácea: espécie de planta cujos frutos são, geralmente, longos e com hastes que lembram pontas. 28 História torna-se maduro apenas uma vez por ano – em vez de um calendário, para marcar o ano [...] Por isso, quando se desejava saber deles há quanto tempo aconteceu isso ou aquilo ou a idade desta pessoa, tem que se perguntar pelo número de castanhas.” [...] Dependentes da cultura e saberes indígenas, os colonos deles se apropriaram. Ocorreu entre brancos e índios um jogo de trocas e reciprocidades. Os nativos acabaram se inserindo na eco- nomia colonial como produtores de excedentes para trocas. Seus grupos passaram a depender de produtos manufaturados: anzóis, machados, armas. Em resposta, ofereciam suas mulheres, alimentos e produtos tropicais como formas de inserção numa sociedade nascente. Mas ai des- tes se resistissem ao projeto de colonização. Eram massacrados. DEL PRIORE, Mary. Histórias da gente brasileira: volume 1 – colônia. São Paulo: LeYa, 2016. p. 24. 1 Com base no texto, assinale as alternativas corretas. a) Os indígenas continuaram em grupos isolados sem se integrar à economia colonial. b) Os nativos passaram a utilizar produtos manufaturados. c) De acordo com o texto, é possível afirmar que a interação entre indígenas e portugueses era completamente pacífica. d) Os indígenas não se esforçaram em ensinar aos europeus sobre a flora nativa. e) Os europeus se apropriaram dos ensinamentos indígenas. f) Os nativos continuaram com suas técnicas para plantar e caçar sem nada utilizar do que era tra- zido pelos europeus. 2 A forma como os indígenas calculavam o tempo causou estranheza a um viajante europeu. Explique como era feito esse cálculo. 3 Quais saberes indígenas podem ser identificados no texto? 4 Em que situação a reciprocidade pacífica entre indígenas e europeus terminava? 29 Governo-Geral A criação do Governo-Geral em 1548 não significou o fim das Capitanias Hereditárias, as quais existiram até a segunda metade do século XVIII. O objetivo do Governo-Geral era centralizar a administração colonial. Para tanto, foi nomeado um governador-geral e es- colhida a Capitania da Bahia de Todos os Santos para servir de sede do novo instrumento administrativo. Com a instalação do Governo-Geral, novos órgãos foram organizados e um número maior de funcionários foi nomeado para apoiar os governadores. Entre os principais órgãos estavam a Ouvidoria-Mor, responsável pela justiça, e a Provedoria-Mor, responsável pelos assuntos fiscais, ou seja, pelo recolhimento de impostos. Havia ainda órgãos que cuidavam da defesa, chefiados pelo capitão-mor. O primeiro governador-geral do Brasil nomeado pelo rei de Portugal foi Tomé de Sousa. Como primeiro governador-geral da Colô- nia, Tomé de Sousa era responsável por tra- zer famílias para povoar o território, combater o contrabando de pau-brasil, fundar vilas e auxiliar donatários na ocupação das terras. AZEVEDO, Manoel Victor de. Retrato de Tomé de Sousa. [séc. XVII]. 1 óleo sobre tela, color., 35 cm × 45,5 cm. Biblioteca Municipal de São Paulo. Na Capitania da Bahia, em 1549, Tomé de Sousa fundou a cidade de Salvador. Essa cida- de passou a ser a primeira capital do Brasil e sede do governo na Colônia. Foi também em Salvador que ficou sediado o primeiro bispado, residência da principal autoridade religiosa da Colônia. Salvador preservou a condição de capital da Colônia até 1763, quando foi trans- ferida para o Rio de Janeiro. © B ib lio te ca M un icip al de São Paulo ©S hu tte rst oc k/ laz yll am a itania da © B ib lio te ca Mu nic ipal de São Paulo Pelourinho, Centro Histórico de Salvador 30 História Na atualidade, o Centro Histórico de Salvador é um bairro formado por ruas e construções feitas durante o Período Colonial no Brasil. Busque informações sobre uma obra arquitetônica que compõe esse bairro e cole, no espaço a seguir, uma imagem da construção escolhida. Depois, preencha a ficha com as informações que você encontrou. pesquisa Se, por um lado, a presença do Governador-Geral e o apoio de um corpo de funcionários auxiliavam os donatários, por outro, eles se incomodavam com uma autoridade que limitava sua autonomia. No sentido de facilitar a administração e resolver tais tensões, foram esta- belecidas câmaras municipais. Nome da construção: Endereço do monumento: Função original: Função atual: Provável data da construção: 31 Membros da elite das vilas eram selecionados para serem vereado- res e juízes. Eles eram denominados homens bons. Em algumas vilas e ci- dades, havia ainda um terceiro juiz, nomeado pela Coroa e denominado Juiz de Fora. Antiga casa da Câmara de Vereadores do Centro Histórico de Porto Seguro Além de Tomé de Sousa, dois governadores-gerais tiveram destaque na administração da Colônia no século XVI: Duarte da Costa e Mem de Sá. No período de 1572 a 1578, por conta da extensão territorial da Colônia, o rei de Portu- gal dividiu o Governo-Geral em duas sedes: Rio de Janeiro e Salvador. O intuito era facilitar a administração das capitanias. O duplo Governo-Geral funcionou até a chegada da Família Real portuguesa ao Brasil, em 1808. Chegada dos jesuítas Foi durante a administração de Tomé de Sousa, entre os anos 1549 e 1553, que os pri- meiros jesuítas chegaram ao território colonial português. Eles eram liderados pelo padre Manuel da Nóbrega e tinham a tarefa de catequizar os indígenas. Ao lado de outros 12 jesuítas, entre eles José de Anchieta, Manuel da Nóbrega fundou o primeiro colégio do Brasil, na região da atual cidade de São Paulo. O objetivo dessa fundação era alfabetizar colonos e indígenas, ensinando-lhes orações e hinos. A escola e o povoamen- to ao redor dela deram origem à cidade de São Paulo em 1554. Atualmente, o local denominado de Pateo do Collegio é uma reconstituição, visto que o edifício original foi praticamente demolido em 1896 para dar lugar a novas construções. Do prédio original, resta apenas parte de uma parede, que foi preservada quando o conjunto foi todo reconstruído para as celebrações do IV Centenário, em 1954. O Pateo dodo CColllell gio ooo foi seeededeee do govevernrno o pap ululisi ta entre os anos de 1765 e 1912. ©Shutterstock/Diego Grandi ©Pulsar Imagens/Chico Ferreira 32 História 1 A colonização na América teve início logo após a chegada dos portugueses? Justifique sua resposta. 2 Por que Portugal resolveu iniciar a colonização da América? 3 De acordo com o contexto histórico estudado, qual o significado da expressão “homens bons”? 4 A primeira riqueza natural da América explorada pelos portugueses foi o pau-brasil. Para quais fina- lidades era comercializado? 5 Associe corretamente. 1. Expedições guarda-costas 2. Donatários 3. Martim Afonso 4. Foral 5. Pernambuco 6. Governo-Geral o que já conquistei ( ) Fundador da Vila de São Vicente. ( ) Tinhao objetivo de auxiliar na administração das colônias portuguesas na América. ( ) Uma das únicas capitanias que prosperaram. ( ) Titulares da capitania com vários direitos e deveres sobre o seu território. ( ) Expedições que tinham como objetivo proteger a costa bra- sileira de possíveis ataques estrangeiros. ( ) Um dos documentos que oficializava a doação da capitania ao seu titular. 33 ca pí tu lo Comércio atlântico de escravizados 11 A mão de obra escrava de africanos foi um recurso utili- zado em todo o continente americano. Entre os séculos XVI e XIX, mais de cinco milhões de africanos foram retirados de sua terra natal à força e submetidos ao trabalho escravo na América. Observe a pintura de Johann Moritz Rugendas, que representa o interior de um navio negreiro, e respon- da: Em quais condições os africanos eram transportados? Qual é a idade e o sexo das pessoas retratadas? Exploração portuguesa na África Atlântica Escravidão na África Atlântica Viagem na Calunga Grande Chegada aos portos americanos o que você vai conhecer ©Museu Itaú Cultural, São Paulo RUGENDAS, Johann Moritz. Navio negreiro. 1830. 1 gravura, 35,5 cm x 51,3 cm. Museu Itaú Cultural, São Paulo. Os escravizados africanos eram transportados para a América nos navios negreiros, também chamados de “tumbeiros” em razão da alta mortalidade durante a viagem 34 História Compreender a presença portuguesa na costa africana como fator que impulsionou o tráfico de escravizados. Diferenciar as formas de escravidão praticadas em alguns reinos africanos e as praticadas pelos europeus. Caracterizar a ação dos europeus e suas lógicas mercantis. Analisar os mecanismos e as dinâmi- cas do comércio de escravizados em suas diferentes fases, identificando os agentes responsáveis pelo tráfico e as regiões e zonas africanas de proce- dência dos escravizados. Compreender como era a rotina dos escravizados no Brasil Colônia. objetivos do capítulo Exploração portuguesa na África Atlântica O contato entre portugueses e africanos teve início no contexto da expansão marítima do século XV. Na busca por um caminho alternativo para o Oriente, os portugueses exploraram o Oceano Atlântico contornando a costa da África. Nesse período, a costa africana era habitada por vários povos e grande parte deles vivia da pequena agricultura. Ao contrário das regiões cen- trais do continente africano, for- madas por vastos e poderosos rei- nos, na costa, a população estava reunida em povoados menores, o que facilitou a conquista daquelas regiões por parte dos portugueses. Durante os séculos XV e XVI, os portugueses estabeleceram uma série de feitorias em fortifi- cações na costa africana, as quais serviam de bases militares e entre- postos comerciais. Em 1420, Dom Henrique de Portugal iniciou a colonização das ilhas do arquipélago da Madeira, introduzindo na região o cultivo de cana-de-açúcar e a plantação de uva malvasia para a fabricação de vinho. A partir de 1430, a ocupação sistemática dos Açores se deu com a introdução da criação de gado naquelas terras, seguida das ilhas do arquipélago de Cabo Verde, importante porto de escala de navios portugueses. Entre os produtos africanos explorados, estavam o marfim, o ouro e a pimenta-malagueta. Os portugueses exploraram de forma sistemática o comércio de escravizados, que se tornou um produto altamente rentável para os exploradores. © W ik im e d ia C o m m o n s/ D a m ie n H a ll e u x R a d e rm e ck e r Castelo de São Jorge da Mina, Elmina O Castelo de São Jorge da Mina foi construuído por portuggueu ses em 1482 e se trransformou u em uum dos prp inincicipapaiss eentntrerepopoststosos ccomomererciciaia s s nana ÁÁfrfricicaa SuSubsbsaaaaririananaa (s(sulul ddo o SaSaarara)a).. DeDessssa a fefeititororiaia oou u fofortrtifificicaçaçãoão,, sasaíríramam mmuiuitotos s esescrcravavizizadadosos qqueue cchehegagararamm aoao BBrarasil. 35 Os lucros obtidos do contato com os povos africanos foram tão significativos que os por- tugueses trataram de estender suas relações comerciais a diversas regiões da costa africana. Estudamos sobre as navegações portuguesas iniciadas no século XV. A respeito desse tema, analise as afirmativas a seguir. I. Os portugueses tiveram dificuldades na conquista do litoral africano, principalmente por conta dos grandes reinos instalados naquelas regiões. II. Mesmo navegando pelo litoral do continente africano, os portugueses não demonstraram inte- resse em conhecer ou estabelecer possessões na região. III. Os portugueses estabeleceram contato com povos de diversas culturas e etnias em variados pontos do litoral africano. De acordo com a análise, assinale a alternativa correta. a) Todas as afirmativas são verdadeiras. b) Apenas as afirmativas I e III são verdadeiras c) Apenas as afirmativas I e II são verdadeiras. d) Todas as afirmativas são falsas. e) Apenas a afirmativa III é verdadeira. organizando a história Escravidão na África Atlântica Desde a Antiguidade, a escravidão é praticada como forma de exploração do trabalho. No continente africano, ela fez parte das tradições de vários povos. Entretanto, com o início do comércio atlântico, a escravização de pessoas aumentou. Antes da chegada dos europeus, as tribos e os reinos africanos já praticavam a escravidão no continente. Porém, em um modelo diferente daquele adotado pelos europeus. A escravidão praticada pelos europeus era do tipo mercantilista, ou seja, visava ao acúmu- lo de capitais por meio da exploração nas colônias. No caso do modelo africano, a escravidão ocorria após uma derrota militar, quando os escravizados trabalhavam para pagar a sua liber- dade. Não se tratava, portanto, de uma exploração puramente econômica, pois as guerras não ocorriam com a finalidade de escravizar, mas sim conquistar terras ou por vingança con- tra algum tipo de ofensa. Os escravizados eram utilizados para o trabalho ou para promover o poder dos reis – em algumas culturas, por exemplo, as de origem banta, a quantidade de pessoas de um reino realçava o poder do rei. A escravidão na África passou a apresentar características diferentes quando alguns che- fes tribais e reis perceberam o interesse que a venda de pessoas escravizadas despertava nos comerciantes europeus. © S h u tt e rs to ck / E V -D A 36 História O comércio entre africanos e portugueses era feito por meio de escambo, ou seja, a troca de produtos: os chefes tribais ou seus representantes entregavam as pessoas escravi- zadas e, em troca, recebiam produtos, como tecidos, aguardente, açúcar, fumo, vinho, armas de fogo, pólvora, espadas, facas, arcos e flechas. Os africanos eram capturados no interior da África e levados para a costa, onde aguar- davam os navios negreiros para serem levados a outros continentes. Entre a captura e a dispersão para outras áreas, muitos africanos morreram. O valor pelo qual os escravizados eram comercializados variaram ao longo do tempo. Há relatos de que, na região do Senegal, por exemplo, por volta de 1446, 25 a 30 escravizados podiam ser adquiridos em troca de um cavalo já idoso; em 1460, no Congo, um cão podia valer até 22 escravizados. Portugal recebeu os primeiros escravizados de origem africana em 1443. Eles desem- penhavam diversas funções tanto nos centros urbanos como na área rural. Com o tempo, os escravizados passaram a representar uma necessidade fundamental no reino português. O estabelecimento de colônias europeias na América impulsionou a busca por mão de obra. Como o comércio de escravizados proporcionava lucros altos, a opção de várias colô- nias americanas, entre elas o Brasil, foi empregar o trabalho de povos africanos. Em 1559, os portugueses trouxeram os primeiros africanos para o Brasil. Com o aumen- to da produção açucareira e a descoberta de ouro no centro-sul brasileiro, a entrada de afri- canos na colônia aumentou.Os comerciantes portugueses faziam negociações na região da Guiné, na altura do ar- quipélago de Cabo Verde, nas regiões de Ajudá (no Golfo do Benin), Lagos (atual Nigéria) e da costa do atual território de Angola. O comércio de pessoas escravizadas ficou conhecido como tráfico negreiro. © U n iv e rs id a d e d a V ir g ín ia , V ir g ín ia COOK, J. W. Canoas no rio Níger. 1841. Universidade da Virgínia, Virgínia. Na chamada Costa da Mina,NaNa cchahamamadada CC ue seriam oso aafrfricicananosos qq aguardavam emese crravavizizadadosos aa serem colocados bab rraca õeões s ataté é depois, nos naviosemem cannoaoas e, dd m para a Europa ouquue e os levarariaia a.pap ra a Américaca 37 Leia o texto a seguir sobre a captura de africanos para o comércio com os europeus. interpretando documentos A operação [de captura] começava com o apresamento em guerra ou emboscada dos fu- turos escravos pelos traficantes, seguido de uma extensa viagem pelo interior africano. Os ca- tivos eram obrigados a percorrer longas distâncias até alcançarem os portos de embarque, e muitos não resistiam ao esforço físico ou às doenças que apanhavam durante o deslocamen- to. Realizavam a operação os reinos africanos aliados dos portugueses; estes últimos nunca se envolveram em tais atividades internas. Com o tráfico, elites africanas tinham acesso a armas e bens de consumo que caíram no gosto local, como aguardente e tabaco. SCHWARCZ, Lilia; STARLING, Heloísa. Brasil: uma biografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2015. p. 82. Com base no texto, assinale a alternativa correta. a) Os portugueses entraram em guerra com todas as nações africanas e, em virtude de sua superio- ridade militar, venceram-nas e escravizaram os sobreviventes. b) Os portugueses faziam alianças com várias nações africanas e estas abriam seus territórios para que os traficantes entrassem e perseguissem seus habitantes. c) Os reinos africanos aliados de Portugal, em troca de produtos como tabaco e aguardente, caça- vam e capturavam membros de tribos inimigas, depois os vendiam aos traficantes portugueses nas feitorias. d) Embora o tráfico de escravizados africanos fosse importante, no Brasil, ele não foi fundamental, pois a maior parte da mão de obra escravizada era indígena. e) Os reinos africanos que apresavam escravizados para Portugal não tinham interesses econômi- cos, queriam apenas se livrar de inimigos de guerra. Com a chegada dos europeus e o estímulo econômico que eles trouxeram, as guerras tribais se intensificaram, várias nações foram exterminadas e os campos deixaram de ser cultivados. Além dos portugueses, ainda no século XV, outros europeus passaram a comer- cializar pessoas nos portos africanos. Reúna-se com um colega e conversem sobre as questões a seguir. No caderno, anotem as con- clusões a que chegaram. 1 A escravidão de pessoas é uma atividade que só existiu no passado? 2 Caso a resposta da questão 1 seja negativa, existem organizações que combatem a escravidão de pessoas atualmente? 3 Podemos dizer que a escravidão na atualidade é um problema menos grave do que era no século XV? troca de ideias 38 História Viagem na Calunga Grande O trajeto entre a África e o Brasil durava cerca de três meses, dependendo do local de destino e das condições de navegação. Em razão das precárias condições no transporte dos africanos, esses navios foram chamados de tumbeiros. O tráfico negreiro durou do século XVI até o século XIX. Foi uma das atividades econô- micas mais rentáveis, cruéis e desumanas da história da formação do Brasil. No início, foi realizado pelos portugueses e, a partir do século XVIII, ficou por conta dos comerciantes que habitavam a Colônia. Observe a planta de um navio negreiro europeu do século XVIII: O cotidiano nos navios negreiros era angustiante. A alimentação para os escravizados era escassa, não havia banheiros. O abafamento provocado pelo aglomerado de pessoas em ambientes sem janelas em conjunto com o sacolejo do mar gerava um mal-estar contínuo. As pessoas que não resistiam a essas condições eram jogadas ao mar. Os navios utilizados para o transporte de escravizados africa- nos eram de grandes proporções. Haviam sido projetados para trans- portar mercadorias, mas passaram por uma adaptação para que pu- dessem ser usados no tráfico de pessoas. Os porões tinham três níveis: o porão propriamente, onde ficava o armazenamento de água e comida; a falsa coberta, onde fi- cavam os escravizados; e a cober- ta, para a tripulação. Nos porões, não havia janelas nem ventilação, pois não se poderia correr o risco de que as pessoas se jogassem em alto-mar. As condições de trans- porte eram desumanas. Centenas de pessoas eram amontoadas, de forma que não podiam se mexer, nem para esticar suas pernas ou se levantar. DESENHO da planta de um navio negreiro europeu, do século XVIII, utilizado para o transporte de africanos que teriam como destino a escravidão na América. In: MOURA, Carlos E. M. de. A travessia da Calunga Grande: três séculos de imagens sobre o negro no Brasil. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2000. p. 313. © B ib li o te ca d o C o n g re ss o N a ci o n a l, E U A 39 Durante fortes tempestades, era comum que os traficantes escolhessem mulheres e crianças e as lançassem ao mar, na tentativa de diminuir o peso da embarcação. A insalubridade do ambiente, a alimentação deficiente e a aglomeração geravam um am- biente propício a doenças, que se propagavam rapidamente devido ao acúmulo de pessoas. Leia o trecho a seguir sobre a viagem nos navios negreiros. interpretando documentos A viagem era longa; maior ainda o fastígio. Calunga grande é o mar, a enormidade de seu destino e de seu horizonte. Calunga pequeno é a terra que recebe esses corpos e os transforma em semente. Mas no caso da escravidão, reinventada no Novo Mundo, a terra tragou os corpos desses milhares de cativos, que foram antes transformados em prisioneiros, brutalizados pela violência desse sistema que supôs a posse de um homem por outro. SCHWARCZ, Lilia. Carlos Eugênio Marcondes de Moura. A travessia da Calunga Grande. Três séculos de imagens sobre o Negro no Brasil. (1637-1899). Revista de Antropologia, São Paulo, v. 44, n. 2, 2001. De acordo com o texto e seus estudos sobre o transporte de africanos que seriam escravizados na América, faça o que se pede. 1 Indique quais sentimentos os escravizados africanos associavam para cada um dos termos a seguir. a) Calunga grande b) Calunga pequena 2 Sublinhe no texto o termo que representa a América. 3 É correto afirmar que a autora do texto considera que a terra, no processo de escravidão reinven- tado no Novo Mundo, manteve o mesmo significado que tinha para os africanos? Transcreva a frase do texto que justifica sua resposta. fastígio: auge, ponto mais alto, plenitude. cativos: pessoas sem liberdade, presos, encarcerados. 40 História Mesmo com as condições desfavoráveis, os africanos aprisionados nos navios negreiros tentavam se rebelar. A maior parte das tentativas fracassava, e os revoltosos eram castiga- dos na presença dos demais prisioneiros, para que ninguém mais tentasse o mesmo. A mais conhecida rebelião acontecida no período do tráfico negreiro foi no veleiro espanhol chamado La Amistad. No ano de 1839, os africanos haviam sido capturados na região onde atualmente está situada Serra Leoa. A intenção dos traficantes era levá-los para Cuba, onde seriam comercializados. Um homem chamado Sengbe Pieh liderou outros 52 africanos e tomou o controle do navio. Eles mataram a tripula- ção poupando apenas dois navegadores, que foram orientados a conduzir o navio de volta à África. JOCELYN, Nathaniel. Retrato de Sengbe Pieh (Joseph Cinqué). 1840. 1 óleo sobre tela. Sociedade Histórica da Colônia de New Haven, New Haven. OC h l d S b h ( h Sengbe Pieh, mais tarde conhecido como Cinqué, nasceu
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