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2012 História do Pensamento Político e econômico Prof. André Marcos Vieira Soltau Prof. Edison Lucas Fabrício Copyright © UNIASSELVI 2012 Elaboração: Prof. André Marcos Vieira Soltau Prof. Edison Lucas Fabrício Revisão, Diagramação e Produção: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. Impresso por: 909.829 S691h Soltau, André Marcos Vieira História do pensamento político e econômico / André Marcos Vieira Soltau e Edison Lucas Fabrício. Indaial : Uniasselvi, 2012. 192 p. : il ISBN 978-85-7830- 586-4 1. Políticas mundiais – Economia; 2. História. I. Centro Universitário Leonardo da Vinci. III aPresentação Olá, acadêmico/a! Iniciamos os estudos da disciplina História do Pensamento Político e Econômico. No intuito de alcançar os objetivos estabelecidos no plano de estudo da disciplina, utilizamos uma linguagem que ousou quebrar a sisudez do tema. Pesquisamos filmes apropriados para cada temática estudada, bem como, utilizamos muitas citações retiradas dos originais, permitindo que você, acadêmico/a, amplie seus horizontes de estudo e pesquisa. Organizamos seu livro em três unidades, assim distribuídas: Unidade 1 – Recorte Histórico: origens do Pensamento Político e Econômico. Unidade 2 – O Liberalismo Político. Unidade 3 – Teorias Políticas e Econômicas Contemporâneas. Quer uma dica para sua formação profissional? Procure assistir aos filmes indicados, ler os livros citados e faça perguntas aos nossos professores- tutores, durante sua leitura. Um bom historiador é curioso e procura novos caminhos para perceber melhor os contextos históricos em estudo. Então, vamos aos estudos e que esse caderno contribua para sua formação. Prof. André Marcos Vieira Soltau Prof. Edison Lucas Fabrício IV Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novidades em nosso material. Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo. Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto em questão. Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade. Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos! NOTA V VI VII UNIDADE 1 – RECORTE HISTÓRICO: ORIGENS DO PENSAMENTO POLÍTICO E ECONÔMICO ............................................................................................................... 1 TÓPICO 1 – DEBATES NA GRÉCIA ANTIGA E EM ROMA ........................................................ 3 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 3 2 SURGIMENTO DO TERMO POLÍTICA ......................................................................................... 4 3 INSTITUIÇÕES POLÍTICAS GRECO-ROMANAS ...................................................................... 5 3.1 ATENAS ............................................................................................................................................ 5 3.2 ESPARTA ........................................................................................................................................... 8 3.3 ROMA ................................................................................................................................................ 9 RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 10 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 11 TÓPICO 2 – PLATÃO, ARISTÓTELES E OS SOFISTAS ................................................................ 13 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 13 2 PLATÃO .................................................................................................................................................. 13 3 ARISTÓTELES ...................................................................................................................................... 15 4 SOFISTAS ............................................................................................................................................... 17 5 A EMERGÊNCIA DA NOÇÃO DE “ECONOMIA” ...................................................................... 19 6 MODO DE PRODUÇÃO ESCRAVISTA ......................................................................................... 20 6.1 INSTAURAÇÃO .............................................................................................................................. 20 6.2 CARACTERIZANDO O MODO DE PRODUÇÃO ESCRAVISTA ........................................... 21 LEITURA COMPLEMENTAR 1 ............................................................................................................ 23 LEITURA COMPLEMENTAR 2 ............................................................................................................ 25 RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 28 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 29 TÓPICO 3 – PENSAMENTO POLÍTICO E ECONÔMICO NA IDADE MÉDIA....................... 31 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 31 2 SANTO AGOSTINHO ........................................................................................................................ 33 3 MODO DE PRODUÇÃO FEUDAL ................................................................................................... 35 3.1 DINÂMICA DO MODO DE PRODUÇÃO FEUDAL ................................................................. 35 4 AS TRÊS ORDENS SOCIAIS NO IMAGINÁRIO FEUDAL ....................................................... 37 5 A DESINTEGRAÇÃO DO FEUDALISMO ..................................................................................... 39 6 A TRANSIÇÃO DO FEUDALISMO PARA O CAPITALISMO .................................................. 41 RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 43 AUTOATIVIDADE .................................................................................................................................44 TÓPICO 4 – FILOSOFIA, ECONOMIA E POLÍTICA NA MODERNIDADE ............................ 45 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 45 2 NICOLAU MAQUIAVEL .................................................................................................................... 46 2.1 MAQUIAVEL: INTERPRETAÇÕES ............................................................................................. 49 3 THOMAS HOBBES .............................................................................................................................. 52 3.1 THOMAS HOBBES: INTERPRETAÇÕES .................................................................................... 54 sumário VIII 4 MERCANTILISMO .............................................................................................................................. 57 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 59 RESUMO DO TÓPICO 4........................................................................................................................ 62 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 63 UNIDADE 2 – O LIBERALISMO POLÍTICO .................................................................................... 65 TÓPICO 1 – CONTEXTO HISTÓRICO DO SEU SURGIMENTO ............................................... 67 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 67 RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 70 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 71 TÓPICO 2 – O LIBERALISMO POLÍTICO ........................................................................................ 73 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 73 2 JOHN LOCKE ........................................................................................................................................ 73 2.1 JOHN LOCKE: INTERPRETAÇÕES ............................................................................................. 74 3 VOLTAIRE.............................................................................................................................................. 77 4 MONTESQUIEU ................................................................................................................................... 79 5 JEAN-JACQUES ROUSSEAU ............................................................................................................ 81 5.1 ROUSSEAU: INTERPRETAÇÕES ................................................................................................. 82 6 A DEMOCRACIA MODERNA .......................................................................................................... 84 RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 86 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 87 TÓPICO 3 – OS PENSADORES DA POLÍTICA: DOS MODERNOS AOS CONTEMPORÂNEOS .................................................................................................... 89 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 89 2 EDMUND BURKE ................................................................................................................................ 90 3 IMMANUEL KANT ............................................................................................................................. 93 4 GEORG WILHELM FRIEDRICH HEGEL ....................................................................................... 97 5 ALEXIS DE TOCQUEVILLE ............................................................................................................... 100 RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 105 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 106 TÓPICO 4 – REVOLUÇÃO INDUSTRIAL E TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS ......................... 109 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 109 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 114 RESUMO DO TÓPICO 4........................................................................................................................ 116 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 117 UNIDADE 3 – TEORIAS POLÍTICAS E ECONÔMICAS CONTEMPORÂNEAS .................... 119 TÓPICO 1 – O LIBERALISMO ECONÔMICO ................................................................................. 121 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 121 2 OS FISIOCRATAS E O LAISSEZ-FAIRE .......................................................................................... 121 3 ADAM SMITH ...................................................................................................................................... 123 4 MODO DE PRODUÇÃO CAPITALISTA ........................................................................................ 125 RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 129 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 130 IX TÓPICO 2 – OS PENSADORES DA ECONOMIA: DOS CLÁSSICOS AOS CONTEMPORÂNEOS .................................................................................................... 131 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 131 2 THOMAS MALTHUS E O PROBLEMA DA POPULAÇÃO ....................................................... 131 3 DAVID RICARDO E O VALOR DO TRABALHO NA ECONOMIA LIBERAL ..................... 134 4 JOHN STUART MILL E A LIBERDADE MERCANTIL ............................................................... 136 5 KARL MARX E O PRINCÍPIO AUTODESTRUTIVO DO CAPITALISMO ............................ 138 6 JOHN MAYNARD KEYNES E A VIABILIDADE DO CAPITALISMO .................................... 140 LEITURA COMPLEMENTAR 1 ............................................................................................................ 145 LEITURA COMPLEMENTAR 2 ............................................................................................................ 147 RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 149 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 150 TÓPICO 3 – O SOCIALISMO ...............................................................................................................151 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 151 2 O SOCIALISMO CIENTÍFICO .......................................................................................................... 152 3 O SOCIALISMO REAL ....................................................................................................................... 155 4 LENINISMO .......................................................................................................................................... 157 5 A ERA STALIN ...................................................................................................................................... 159 6 ANARQUISTAS .................................................................................................................................... 161 RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 165 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 166 TÓPICO 4 – REGIMES TOTALITÁRIOS ........................................................................................... 167 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 167 2 FASCISMO ............................................................................................................................................. 168 3 NAZISMO .............................................................................................................................................. 171 RESUMO DO TÓPICO 4........................................................................................................................ 174 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 175 TÓPICO 5 – POLÍTICA E ECONOMIA NA HISTÓRIA RECENTE ............................................. 177 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 177 2 NEOLIBERALISMO ............................................................................................................................. 178 3 GLOBALIZAÇÃO ................................................................................................................................. 180 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 183 RESUMO DO TÓPICO 5........................................................................................................................ 186 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 187 REFERÊNCIAS ......................................................................................................................................... 189 X 1 UNIDADE 1 RECORTE HISTÓRICO: ORIGENS DO PENSAMENTO POLÍTICO E ECONÔMICO OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir do estudo desta unidade, você será capaz de: • compreender o processo histórico de surgimento das discussões e refle- xões políticas na Antiguidade Clássica; • entender as primeiras ideias fundadoras do pensamento ocidental acerca da política; • analisar e refletir a respeito da formação política da humanidade ocidental e o surgimento dos estados e governos; • compreender os modos de produção escravista e feudal, bem como suas relações com o pensamento político de sua época. • compreender o surgimento das primeiras instituições políticas na Grécia e em Roma; • analisar a desintegração do feudalismo e a transição para o capitalismo; • entender as filosofias de Maquiavel e Hobbes como fundadoras do pensa- mento político moderno. Esta unidade está organizada em três tópicos. Em cada um deles você encontrará diversas atividades que o(a) ajudarão na compreensão das informações apresentadas. TÓPICO 1 – DEBATES NA GRÉCIA ANTIGA E EM ROMA TÓPICO 2 – PLATÃO, ARISTÓTELES E OS SOFISTAS TÓPICO 3 – PENSAMENTO POLÍTICO E ECONÔMICO NA IDADE MÉDIA TÓPICO 4 – FILOSOFIA, ECONOMIA E POLÍTICA NA MODERNIDADE 2 3 TÓPICO 1 UNIDADE 1 DEBATES NA GRÉCIA ANTIGA E EM ROMA 1 INTRODUÇÃO O que hoje compreendemos por política é resultado de um processo histórico, que define nossas concepções contemporâneas, nossos significados, dando consistência às atividades políticas, como algo fundamental na vida social dos seres humanos. Ao compreendermos o surgimento das ideias políticas e percebermos as mudanças que essas tiveram, podemos refletir acerca de uma atividade que está sempre em movimento e, consecutivamente, é construída em diversos momentos históricos do ocidente. As formas pelas quais a política se apresenta em alguns momentos – debates, organizações de Estado ou partidos políticos – foram, pouco a pouco, constituindo elementos de sua existência e dando contornos a manifestações políticas importantes na história. Mesmo que atualmente percebamos uma descrença diante da política, é fundamental que historiadores em formação analisem o processo histórico que tornaram as manifestações políticas um dos caminhos para a solução de diversos problemas em muitos agrupamentos humanos. A política, diante dessa descrença generalizada, começa a se concentrar em ações que estão fora das instituições aceitas como representantes dessa ação organizacional. São em organizações não governamentais, organizações trabalhistas e patronais, clubes e em diversas instâncias do cotidiano que as ações políticas têm concentrado seu trabalho e atuação. Isto é o que podemos afirmar ser um caminho de constituição de um futuro transformador, diante da trajetória histórica das organizações políticas do ocidente. O estudo que você, caro(a) acadêmico(a), fará, nessa unidade, será sobre o processo histórico que aponta o pensamento político em sua trajetória no mundo ocidental, bem como, perceberá que as instituições e organizações sociais surgem vinculadas às ideias políticas ricas em argumentos e capazes de constituir movimentos sociais e agentes de atuação tão necessários quanto os governos ou partidos políticos. Estudemos as teorias políticas, percebendo que a compreensão de sua história é fundamental para que entendamos a multiplicidade de políticas existentes. UNIDADE 1 | RECORTE HISTÓRICO: ORIGENS DO PENSAMENTO POLÍTICO E ECONÔMICO 4 2 SURGIMENTO DO TERMO POLÍTICA Para começarmos nossa conversa sobre o tema, é conveniente estudarmos a origem do termo política. Sua origem está vinculada às atividades desenvolvidas na polis grega. A polis, ou seja, a cidade-estado, foi o espaço social onde se utilizou, pela primeira vez, o termo política. Filósofos e escritores da Grécia Antiga utilizavam o termo para designar as regras de organização da vida em comum, ou melhor, tratava dos cuidados e decisões sobre problemas e interesses da cidade. Política seria a arte e a ciência de governar, decidir sobre os destinos da cidade. É na polis que os gregos começavam as discussões em torno dos problemas da cidade. Essas discussões iniciavam a delinear os fundamentos do conceito política. A cidade era considerada a unidade da vida social sendo, portanto, o espaço privilegiado, pelos gregos, para o exercício do pensamento e de questionamentos diante de problemas comuns. Anterior às organizações em cidades-estado (século VI a.C.), a Grécia era organizada, social e politicamente, em realezas com características tradicionais e feudais. Grandes famílias definiam os princípiospolíticos, religiosos, jurídicos e econômicos diante de pequenos agricultores. Nessa organização, um pequeno grupo dominava absoluto, com apoio de militares, sacerdotes e funcionários administrativos. Os conflitos eram inevitáveis, diante de tamanha tensão entre essas famílias, os agricultores e os moradores das cidades que começavam a crescer. Essas relações eram marcadas pela crença em mitos e, segundo essa concepção de mundo, os deuses interferiam diretamente na vida humana, por meio de leis que determinavam o comportamento humano. As leis e determinações sobre a vida tinham origem divina sendo, assim, inquestionáveis. Os conflitos constantes geraram a necessidade de legisladores que definiram textos tornados públicos e chamados de leis – expressão do bem comum. Aristóteles, filósofo grego, definia o homem como um animal que possui capacidade de refletir sobre seus atos. As primeiras leis apontavam as cidades como uma organização fundada sobre interesses coletivos e o espaço onde os homens podem enfrentar a força e tutela de clãs familiares, as quais os cidadãos gregos estavam submetidos. As mudanças na organização social vêm acompanhadas de outras, como: o surgimento da escrita, circulação de moedas e de leis escritas, além, da filosofia que contribuiu diretamente para uma nova perspectiva de mundo, desvinculado da mitologia e das definições consideradas divinas para uma ordem social mais próxima da racionalidade. Essa dinâmica social define os primeiros espaços de discussão política e tem reflexo direto na vida pessoal do cidadão grego e na organização coletiva TÓPICO 1 | DEBATES NA GRÉCIA ANTIGA E EM ROMA 5 2 SURGIMENTO DO TERMO POLÍTICA da polis grega. O desenvolvimento da discussão, diante de problemas comuns, discursos e retóricas de convencimento delineiam o termo política e seus desdobramentos. NOTA politikós Termo grego que indicava os procedimentos relativos às cidades-estado. Termo que dá origem à palavra política – palavra que, etimologicamente origina de polis (cidade). Poderíamos afirmar, portanto, que política é a arte de gerir os destinos da cidade. Concepções de cidadania e democracia começam a ocupar as conversas, ao mesmo tempo, gregos começam a discutir a participação e o direito de todos, no exercício de decisões coletivas, independente da origem familiar. Aqueles que antes recebiam esse direito, por serem aristocratas ou guerreiros, agora o recebe por serem cidadãos. 3 INSTITUIÇÕES POLÍTICAS GRECO-ROMANAS 3.1 ATENAS Como vimos anteriormente, o termo “política” tem uma relação íntima com a cultura grega. Era a arte de administrar, gerenciar e discutir os rumos e destinos da polis (cidade). Como a Grécia chegou a esse ideal, quais foram os caminhos e instituições que levaram os gregos a criar o sistema político democrático? Primeiramente, devemos analisar aquilo que os gregos entendiam ser a cidade (polis). A cidade para os gregos não era somente o espaço urbano, compreendia também os campos ao redor e até alguns povoados urbanos menores. A cidade era caracterizada e formada pela população que a compõe, o povo (demos). Segundo Funari (2002, p. 25), demos são grupos de indivíduos que estão: submetidos aos mesmos costumes fundamentais e unidos por um culto comum às mesmas divindades protetoras. Em geral, uma cidade, ao formar-se, compreende várias tribos. A tribo está dividida em diversas fratrias e estas em clãs; estes, por sua vez, compostos de muitas famílias, no sentido estrito do termo (pai, mãe e filhos). A cada nível, os membros desses agrupamentos acreditam descender de um ancestral comum, e se encontram ligados por estreitos laços de solidariedade. As pessoas que não fazem parte destes grupos são estrangeiras na cidade e não lhes cabem nem direitos, nem proteção. UNIDADE 1 | RECORTE HISTÓRICO: ORIGENS DO PENSAMENTO POLÍTICO E ECONÔMICO 6 UNI Você deve ter notado a palavra demos. É justamente desta palavra que deriva a palavra “democracia” (poder do povo). Portanto, a democracia é uma invenção grega. Mas nem sempre a Grécia foi democrática. A seguir, veremos como se chegou a essa concepção de governo. Por muito tempo a cidade grega de Atenas viveu um regime político aristocrático (aristoi = nobre, “melhor”). A aristocracia grega era definida pela linhagem de sangue, ou seja, nascia-se nobre. Mas com o passar do tempo, as classes populares, chamadas de “demos”, principalmente os comerciantes enriquecidos através do comércio mediterrânico, começaram a lutar por mais direitos políticos. Por volta do século VIII a. C., muitos cidadãos de classe média e pobres começaram a integrar as forças militares que faziam a defesa das cidades. Desta forma, começaram a questionar a restrição de direitos e buscaram ampliar sua participação política. Conforme Funari, isso levou a muitas guerras civis, e como medida emergencial para conter os conflitos, muitas cidades deixaram a cargo de certos homens, chamados “tiranos” (senhores, em grego), a redação de leis para amenizar a situação. Várias cidades, por volta de 650 a 500, foram governadas por homens autoritários que se colocavam contra a “nobreza”, dizendo- se defensores dos direitos do povo — os tiranos —, que ampliaram os direitos políticos dos cidadãos e permitiram que os indivíduos se desligassem do poderio dos grupos familiares. Entretanto, tais transformações que tendiam para a democracia (governo do povo) ocorreram principalmente nas cidades marítimas e mais voltadas para o comércio. Em outros lugares, nessa mesma época, prevalecia o regime aristocrático (“governo dos melhores”, os nobres). (FUNARI, 2002, p. 27). A aristocracia ateniense governou por muitos séculos. Neste período, a propriedade das terras estava nas mãos dos nobres, também chamados de eupátridas (bem-nascidos). Eles se reuniam numa colina chamada Areópago e legislavam segundo aquilo que achavam justo e de acordo com seus interesses. Ficavam de fora das decisões políticas os agricultores pobres, os pequenos comerciantes e os artesãos. Neste período, entre os séculos IX e VI, os mais pobres ainda poderiam ser escravizados por dívidas. TÓPICO 1 | DEBATES NA GRÉCIA ANTIGA E EM ROMA 7 De acordo com Funari, “foi Sólon, arconte ateniense, em 594 a.C., que aboliu o sistema de escravidão por endividamento”. (FUNARI, 2002, p. 33). Sólon foi uma figura muito importante na política ateniense. Em seu tempo a democracia vai ganhando centralidade na política ateniense, e a Eclésia ganha mais poder de decisão nas questões da cidade. Eclésia? Sim. Parece familiar essa palavra? Ela quer dizer assembleia, uma instituição que congregava todos os cidadãos para discutir e propor soluções para os problemas da cidade. Sólon buscou desvincular os privilégios políticos da linhagem de sangue dos nobres e das riquezas, ou seja, os cidadãos pobres que não eram de linhagem nobre também tiveram acesso às decisões políticas. Sólon instituiu também um novo conselho, a Boulé, também conhecida como “Conselho dos Quinhentos”. A Boulé era uma espécie de senado, que reunia 500 homens sorteados anualmente de uma lista prévia de candidatos de cidadãos. Este conselho era formado por homens com idade mínima de 30 anos. A eles cabia analisar os projetos de lei vindos da assembleia dos cidadãos, fazer alterações, emendar quando necessário e remetê-los novamente à apreciação da assembleia. Mas quem eram os cidadãos atenienses? Na época, no século V a. C., Atenas tinha cerca de 42 mil cidadãos, filhos homens, de pais e mães atenienses maiores de 18 anos. Portanto, ficavam de fora as mulheres, aproximadamente 28 mil estrangeiros e cerca de 110 mil escravos. Você deve estar se perguntando como é que duas instituições aparentemente tão díspares, como a democracia e a escravidão, podiam conviver num mesmo ambiente.Perry Anderson nos responde essa questão. Segundo este autor, foi justamente a formação de uma população escrava que liberou os cidadãos para a vida pública, “que elevou a cidadania grega a alturas até então desconhecidas de liberdade jurídica consciente. A escravidão e a liberdade helênicas eram indivisíveis: uma era condição estrutural da outra [...]”. (ANDERSON, 1989, p. 23). Embora a democracia ateniense fosse limitada em muitos aspectos, ela nos faz refletir sobre temas relevantes para nossa atualidade. Primeiro, a democracia ateniense era “direta”, e não meramente representativa. Qualquer cidadão poderia pronunciar-se publicamente na assembleia, propor leis e discussões importantes para a polis. O cidadão gozava de liberdade individual e do direito de igualdade perante a lei e seus concidadãos. Ainda segundo Funari (2002), com o decorrer do tempo passou-se a pagar para os cidadãos participar das assembleias. Porque estava havendo uma disparidade na participação dos cidadãos ricos, que poderiam deixar seus afazeres para discutir livremente as questões políticas, em prejuízo dos cidadãos mais pobres, que ficavam impossibilitados de assim proceder. UNIDADE 1 | RECORTE HISTÓRICO: ORIGENS DO PENSAMENTO POLÍTICO E ECONÔMICO 8 A ideia era que cidadãos de menos posses, que trabalhavam para garantir seu sustento, pudessem assistir às reuniões e usufruir dos direitos políticos do mesmo modo que os mais abastados. O que era, sem dúvida, mais democrático. Uma democracia direta que ainda paga para os cidadãos exercerem o poder político só é possível em estados pequenos e com recursos econômicos suficientes para proporcionar aos seus cidadãos disponibilidade e tempo livre. (FUNARI, 2002, p. 38). A democracia ateniense inspira nosso pensamento político há mais de dois milênios e meio. Mas ao lado de Atenas havia a cidade grega de Esparta, sua rival e uma das mais importantes do mundo antigo. A seguir veremos como eram as suas instituições políticas. 3.2 ESPARTA Segundo a tradição, Esparta foi fundada no século IX a.C. Ao conquistarem os territórios, os espartanos também dominavam seus habitantes e os transformavam em hilotas, que quer dizer “aprisionados”. Desta forma, cada espartano tinha uma fração de terra e também hilotas que a cultivavam, embora estes não fossem escravos. Por diversas vezes os hilotas se revoltaram por causa da sua condição de submissão. Os espartanos eram proibidos de cultivar a terra, pois eram essencialmente guerreiros e pertenciam ao chamado grupo dos “iguais” que se dedicavam às questões e problemas da cidade. Esparta, como todas as cidades-estado, tinha seu próprio regime de governo. A instituição política mais importante de Esparta era a Gerusia, uma espécie de senado ou conselho de anciãos. A Gerusia era formada por dois reis de famílias rivais e mais 28 membros com mais de 60 anos, escolhidos entre os mais nobres de nascimento. Havia também uma assembleia de homens adultos, que embora não tendo tanto poder político, escolhia por aclamação cinco éforos, espécie de cargo executivo, próximo ao que conhecemos como prefeito, que permaneciam no cargo por um ano. Há uma dificuldade em conhecermos as particularidades do sistema político espartano, por causa da escassez de fontes históricas. O que podemos afirmar é que se trata de uma cidade cujas características mais importantes eram a aristocracia e o militarismo. Por causa de suas conquistas militares, conseguiam subjugar povos e fazer com que produzissem para o sustento dos cidadãos espartanos, que assim podiam livremente se dedicar à guerra e à política. TÓPICO 1 | DEBATES NA GRÉCIA ANTIGA E EM ROMA 9 3.2 ESPARTA 3.3 ROMA Os romanos também contribuíram com importantes instituições e conceitos para a história do pensamento político. Uma das mais caras é a noção de “república”, em latim res publica, que quer dizer “coisa pública, coisa do povo”, ou seja, aquilo que é do interesse coletivo. Em Roma havia dois cônsules ou magistrados, eleitos anualmente por um conselho de anciãos chamado de senado. Estamos notando muitas palavras familiares. Isso faz parte do legado greco-romano para a civilização ocidental. Foi a herança sobre a qual construímos nosso pensamento político. A história política em Roma foi muito parecida com a da Grécia, pois por muito tempo o poder político esteve nas mãos de uma pequena aristocracia. Mas com o passar dos anos, a plebe, aqueles que não tinham uma nobreza de sangue, passou a fazer valer seu poder econômico na pressão por direitos políticos. Nesta luta, conseguiram criar um cargo de magistratura chamado de “tribuno da plebe”, que defendia os interesses e tinha poder de veto ante as decisões do senado e dos cônsules, se porventura viessem a prejudicar os interesses da plebe. Segundo Funari, a democracia romana foi bem mais ampla que a ateniense. Tornavam-se romanos, por exemplo, os ex-escravos alforriados, chamados libertos, ainda que os plenos direitos políticos só fossem adquiridos pelos filhos de libertos, já nascidos livres. Os romanos concediam, também, a cidadania a indivíduos aliados e, até mesmo, a comunidades inteiras. (FUNARI, 2002, p. 84). Assim como os gregos tinham suas poleis, os romanos cunharam expressões muito caras até os nossos dias para designar suas cidades. É de Roma que ganhamos a noção de cidade como espaço urbano, de urbs e também como civitas (cidade). Palavra da qual derivaram tantas outras expressões, como civil, civilidade, civilização etc. Por essas e outras razões, a cultura greco-romana tem uma importância capital para a história do pensamento político. ESTUDOS FU TUROS No segundo tópico, da primeira unidade, deste caderno, iremos analisar mais profundamente as principais ideias de pensadores gregos, como: Platão, Aristóteles e os sofistas. Filósofos que despontam nos debates políticos da antiguidade. 10 Neste tópico você estudou que: • A polis grega é considerada o princípio da organização política. • Política é a arte e a ciência de governar. • Leis são textos que definem a expressão do bem comum. • As instituições políticas greco-romanas foram um legado importante para a história política ocidental. • As noções de democracia, cidadania, república são heranças importantes da cultura política greco-romana. RESUMO DO TÓPICO 1 11 1 Afirma-se que é na polis que nasce e se desenvolve o princípio do pensamento político. Explique essa afirmação, com base no que acabamos de estudar. 2 Escreva um texto relacionando os dois significados do termo política, ou seja, sua origem grega e o seu uso nos dias atuais. 3 Assinale a alternativa que melhor caracteriza a democracia ateniense. a) ( ) A democracia ateniense era um regime político em que havia uma participação maciça de toda a população nas decisões políticas. b) ( ) A democracia ateniense foi gestada lentamente. Ela significou a conquista de direitos políticos pelos cidadãos que formavam os demos e que não possuíam uma nobreza de sangue. c) ( ) A democracia desenvolvida em Atenas era bem ampla. Dela participavam os escravos que conseguiam a alforria e também as mulheres das classes mais abastadas. d) ( ) A escravidão e a democracia eram instituições díspares e contraditórias. Por isso, a noção de democracia buscou questionar a escravidão e logo os escravos passaram a ter direitos políticos. 4 Complete as lacunas da sentença a seguir: a) Apesar de a democracia ateniense ser extremamente excludente, ela tinha uma característica muito importante, ela oportunizava a participação política “direta” e não apenas ______________. b) A ___________ foi uma das instituições mais importantes da política romana, ela significava que a política não pode servir a interesses particulares, privados, pelo contrário, deve ser o espelhodos interesses coletivos e públicos. c) Em Esparta, assim como em Grécia e Roma, durante muito tempo a discussão das questões políticas era tarefa de uma pequena ___________. Atualmente, o modelo democrático iniciado com os atenienses prevalece, mas por muito tempo uma pequena minoria decidia os destinos da maioria da população. Agora, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) eletiva – democracia - burguesia. b) ( ) representativa – república - aristocracia. c) ( ) participativa – monarquia - assembleia. AUTOATIVIDADE 12 13 TÓPICO 2 PLATÃO, ARISTÓTELES E OS SOFISTAS UNIDADE 1 1 INTRODUÇÃO Duas das mais importantes cidades-estado gregas – Esparta e Atenas – tiveram um longo envolvimento na Guerra do Peloponeso. O resultado desse processo foi a derrota de Atenas (século IV a.C.), cidade que acolhia, em sua população, Platão e Aristóteles, filósofos que levantavam polêmicas diante de temas políticos, sempre em busca de uma verdade e, muitas vezes, criticando os poderosos na política Grega. Ambos, diferentes dos sofistas, donos de uma retórica e defensores de muitos argumentos. Vejamos as principais ideias desses filósofos a respeito do pensamento político. 2 PLATÃO FONTE: Disponível em: <www.educ.fc.ul.pt>. Acesso em: 10 set. 2008. FIGURA 1 – A ACADEMIA DE PLATÃO UNIDADE 1 | RECORTE HISTÓRICO: ORIGENS DO PENSAMENTO POLÍTICO E ECONÔMICO 14 Oriundo de famílias aristocráticas e considerado um tipo conservador, o jovem Platão presencia as discussões políticas entre aristocratas e democratas, bem como os excessos cometidos por ambos. Crítico da democracia – como seu mestre Sócrates, que foi, inclusive, condenado por suas ideias –, dizia que a corrupção da classe política em Atenas era incorrigível. Platão foi pensador de uma época conturbada e presenciou as primeiras discussões sobre democracia, queda das aristocracias, tiranias após guerras. O filósofo Platão, na sua trajetória, defendeu que as decisões políticas deveriam ser de responsabilidade de pessoas preparadas para ocupar cargos. Não era, portanto, qualquer pessoa que poderia assumir o compromisso de decidir os destinos da cidade. Argumentava, também, que uma sociedade deveria possuir apenas três grupos: os filósofos, os guerreiros e os artesãos. Para administrar uma cidade ideal, deveriam escolher, entre os filósofos, aqueles que poderiam ser representantes, com alto grau de formação. O restante da população deveria se ocupar de problemas concretos do cotidiano da cidade, tais como: agricultura, comércio e defesa do território da cidade-estado. Para Platão, os filósofos são pessoas capazes de dar uma ordem possível na sociedade, por sua procura constante pela verdade, pela pesquisa e pelo bem discernir. Suas ideias políticas estão, sobretudo, na obra A República. Ele mostra, nessa obra, uma possibilidade de constituição perfeita, definida por uma política defensora de um elevado sentimento de justiça, onde predominasse a Ideia do Bem. Por meio de diálogos entre seus personagens, ele escreve um texto profundo que define ideias sobre o relacionamento entre os cidadãos e o governo. Utiliza frases do seu mestre Sócrates, para fazer proposições sobre modelos ideais de cidade, estado, nação, justiça e cidadania. Seu texto aborda questões sobre a organização do estado e a elevação espiritual do homem e é, sem dúvida, uma obra completa sobre o pensamento platônico. Seu livro aspira a um Estado ideal, completamente baseado na justiça. Escreveu Platão (1996, p. 39) “Um Estado nasce das necessidades dos homens, ninguém basta a si mesmo, mas todos nós precisamos de muitas coisas.” E continua sua reflexão com uma pergunta: “se procurássemos uma base comum de acordo [...] qual deve ser o principal objetivo do legislador ao ditar suas leis com vistas na organização de cidade – qual o maior bem e qual é o maior mal?”. (PLATÃO, 1996, p. 113). Platão, respondendo por meio de diálogos, diz que é a unidade o maior bem da cidade, sendo a discórdia o maior mal, e conclui dizendo que os males humanos só terão fim quando os filósofos – aqueles que buscam a verdade – receberem o poder soberano das cidades ou, em outra hipótese, que os poderosos das cidades – mediante algumas providências – se tornem filósofos. TÓPICO 2 | PLATÃO, ARISTÓTELES E OS SOFISTAS 15 Platão fundou a Academia, uma escola filosófica (Figura 1). Este era um espaço onde dialogava com seus discípulos, procurando a verdade sobre temas diversos. Esse espaço de diálogos manteve suas atividades do ano IV a.C. até o ano de 529 d.C., quando foi fechada por ordem de Justiniano, imperador. 3 ARISTÓTELES FONTE: Disponível em: <http://www.educ.fc.ul.pt>. Acesso em: 15 set. 2008. FIGURA 2 – PÁGINA DA OBRA POLÍTICA DE ARISTÓTELES UNIDADE 1 | RECORTE HISTÓRICO: ORIGENS DO PENSAMENTO POLÍTICO E ECONÔMICO 16 Discípulo de Platão e crítico das ideias do mestre, Aristóteles desenvolve a divisão do governo nas seguintes formas: monarquia, aristocracia e democracia. Podemos, assim, resumir suas ideias, no seguinte conceito: • A forma de governar tornou-se outra questão de debate entre os cidadãos gregos que se distinguiam, segundo Aristóteles, em três regimes de governo: monarquia, aristocracia e democracia. Era o número de pessoas que exerciam o poder que diferenciavam um de outro. Observem as características principais: Forma de governo Etimologia Caracterização Monarquia Mono + arquia (poder de um só) Poder exercido apenas por um soberano. Aristocracia Aristoi + arquia (poder dos melhores) Poder exercido pelos que têm arete, a capacidade dos heróis. Democracia Demo + kratos (Autoridade do povo) Poder exercido por todos. Regime onde todos são iguais. FONTE: O autor Aristóteles defende que o governo deve promover a justiça e uma “vida boa”, para que os cidadãos possam viver numa cidade feliz. Porém, para que a cidade tenha possibilidades de oferecer isso aos seus cidadãos, é necessário que as formas de governo não sejam corrompidas. Por exemplo, quando uma monarquia se torna tirania ou quando aristocratas se transformam em oligarcas e, também, quando a democracia torna-se demagogia. QUADRO 1 – OS TRÊS REGIMES DE GOVERNO SEGUNDO ARISTÓTELES IMPORTANT E Aristóteles, mesmo apontando diferentes formas de governo, é um defensor de que existem homens capazes de governar. Ele exclui, dessa capacidade, os artesãos e comerciantes. Como pensador, defendeu que a educação é o caminho para a formação da juventude, na qual estaríamos preparando o bom cidadão e o bom governante. TÓPICO 2 | PLATÃO, ARISTÓTELES E OS SOFISTAS 17 Sendo aluno da Academia de Platão, ele se destacou como estudioso profundo. Após sair dos estudos, tornou-se tutor de Alexandre da Macedônia. Quando esse assumiu o trono (336 a.C.), Aristóteles voltou para Atenas e fundou o Liceu. Defendeu, nesse espaço, ideias distintas de seu mestre Platão, considerado, por ele, como um idealista. Aristóteles (1991, p. 51) diz que “aquele que não precisa dos outros homens, ou não pode resolver-se a ficar com eles, ou é um deus, ou um bruto [...] assim como homem civilizado é o melhor de todos, os animais, aquele que não conhece nem justiça, nem leis é o pior de todos.” Aristóteles deixou sua obra mais conhecida na área, A Política. Um texto escrito durante muitos anos, abordando seus estudos e observações sobre a polis. O filósofo fortalece essa estrutura, dando fundamento teórico para a organização política, tornando-se um texto clássico para o estudo das bases de organização das Cidades-Estado. Sua obra é considerada um marco de passagem do idealismo platônico ao mundo real, quando se trata de ciência política. Afirma Aristóteles (1991, p. 1) que: Todo Estado é uma sociedade, a esperança de um bem, seu princípio, assim comode toda associação, pois todas as ações dos homens têm por fim aquilo que consideram um bem. Todas as sociedades, portanto, têm como meta alguma vantagem e aquela que é a principal e contém em si todas as outras se propõe a maior vantagem possível. Chamamo- la Estado ou sociedade política. O trabalho de Aristóteles tem um caráter de observação, feito por um pesquisador da realidade socioeconômica e das ações políticas. 4 SOFISTAS FONTE: Disponível em: <http://www.educ.fc.ul.pt>. Acesso em: 20 set. 2008. FIGURA 3 – OS SOFISTAS UNIDADE 1 | RECORTE HISTÓRICO: ORIGENS DO PENSAMENTO POLÍTICO E ECONÔMICO 18 Os sofistas eram considerados retóricos muito respeitados na Grécia Antiga, por trabalharem com jovens ambiciosos que almejavam sucesso na vida pública da cidade. Seu objetivo não era a formação educativa da mente, mas dar a esses jovens meios para que atinjam grupos maiores, com o uso da palavra. Suas técnicas eram chamadas de sofística. Afirmavam que a influência e o poder eram conquistados pela retórica. Eram chamados de mestres itinerantes, pois viajavam pelas cidades vendendo seus conhecimentos. Suas ideias defendiam que os valores morais não eram universais e sim relativos a cada sociedade de onde eles se originavam. Os conhecimentos são individuais e, portanto, não são originários de critérios objetivos e universais. Sendo assim, os sofistas defendiam suas ideias, afirmando ser necessário usar a arte de bem falar para persuadir os outros, por meio da palavra. Afinal, como não existem verdades universais, é impossível comprovar o que está sendo dito. Podem existir duas ideias aceitas sobre um mesmo assunto, mas se uma delas for persuasiva o bastante para convencer um grupo, esta será a verdadeiramente aceita e aplaudida. NOTA O termo sofista é utilizado para designar alguém que não fala completamente a verdade, mas utiliza de retórica para seduzir um grupo sobre suas ideias, utilizando-se de um argumento enganador. No entanto, os sofistas podem ser considerados os primeiros a utilizar técnicas para falar em público, muito conhecido por meio das palavras de políticos. A utilização do diálogo, como método, é um dos recursos da retórica para o convencimento, prática em voga no mundo da política. DICAS O rei Leônidas e seus 300 guerreiros lutam até a morte contra o exército persa. Dirigido por Zack Snyder Com Gerard Butler, Rodrigo Santoro e Dominic West no elenco. Gênero: Aventura Tempo de Duração: 117 minutos Ano de Lançamento (EUA): 2007 TÓPICO 2 | PLATÃO, ARISTÓTELES E OS SOFISTAS 19 5 A EMERGÊNCIA DA NOÇÃO DE “ECONOMIA” A palavra economia é de origem grega e tem um significado bem diferente daquele que atribuímos ao termo hoje. Um dos primeiros registros da palavra economia é encontrado nos escritos do ateniense Xenofonte. Este autor viveu na Grécia clássica, no século IV antes da era cristã. Foi contemporâneo de Sócrates e Platão e produziu uma vasta obra literária. Na enorme obra de Xenofonte, o livro chamado “Econômico” é destaque. Ele se encontra na categoria dos escritos socráticos, ou seja, foi concebido como um diálogo com Sócrates. Mesmo Xenofonte não tendo sido um dos discípulos de Sócrates, ele registrou várias lembranças e diálogos com Sócrates em seus escritos. São exemplos “A apologia de Sócrates” e o próprio “Econômico”. Mas vamos ao texto de Xenofonte. Por que sua forma de conceber a economia difere tanto da nossa? Quando falamos em economia hoje, logo pensamos nas flutuações das bolsas de valores, nos efeitos globais das crises econômicas etc. Mas a obra “Econômico”, de Xenofonte, era um tratado prático daquilo que hoje chamaríamos de “economia doméstica”. Pois, para os gregos a palavra economia é a junção do termo oikos = casa, moradia, espaço familiar, doméstico; e nomos = lei, regulamento e norma. Desta forma, a economia na Grécia clássica era a arte de bem gerenciar ou administrar a casa. Mas não era somente isso, a palavra oikos tem um significado bem mais amplo. Ele é entendido em oposição ao termo polis (cidade). Enquanto a polis é o espaço público, da cidadania, da política, da comunidade de cidadãos, o oikos é o espaço familiar, dos membros da família, dos interesses privados, particulares. Nesta perspectiva: Como membro de uma família, o indivíduo insere-se em seu oikos como o cidadão em sua polis e, assim, pode-se dizer que o indivíduo está para o seu oikos, assim como o cidadão está para sua polis. O oikos, portanto, é muito mais que a oikía, a casa onde reside uma família. É tudo o que a família possui, a oikía em si com seu mobiliário e adorno. Os bens, quer em dinheiro, quer em terras e, mais que tudo, os seus valores éticos e tradições. (XENOFONTE, 1999, p. X) Dessa forma, o escrito de Xenofonte é uma espécie de manual para bons administradores do patrimônio familiar. Tal como a polis necessita de bons políticos, a casa necessita de bons administradores. No âmbito da casa, os papéis são bem divididos. Esposa é a dona de casa, que cuida e administra o lar, já o homem governa a propriedade como chefe de família. Sigamos o trecho do diálogo socrático em que ele define o que entende por economia: UNIDADE 1 | RECORTE HISTÓRICO: ORIGENS DO PENSAMENTO POLÍTICO E ECONÔMICO 20 Bem, então!, disse Sócrates. Pensamos que economia, administração do patrimônio familiar, é o nome de um saber, e esse saber parece ser aquele pelo qual os homens são capazes de fazer crescer seus patrimônios. E patrimônio parece-nos ser o mesmo que o total de uma propriedade, e, para nós, propriedade é o que para cada um é proveitoso para a vida e dá-se como proveitoso tudo quanto se saiba usar. (XENOFONTE, 1999, p. 30-31). 6 MODO DE PRODUÇÃO ESCRAVISTA A Grécia Antiga e, sobretudo Roma, tinha cerca de 80% de sua população composta de escravos. Todos os trabalhos manuais e burocráticos eram executados por escravos que recebiam moradia, alimentação e roupas permitindo sua sobrevivência. Esse modo de produção surgiu na Grécia Antiga, mas sua expansão foi com os romanos, após a conquista desses sobre os gregos. Esse Modo de Produção foi justificado no pensamento grego e ampliado e praticado em todo o Império Romano. A economia desses povos era predominantemente agrícola. Nessas propriedades, os senhores viviam com muito conforto e luxo. O controle e vigilância dos escravos eram rígidos, incluindo escritos filosóficos brilhantes para justificar a escravidão. Platão e Aristóteles consideravam a escravidão um fenômeno natural que seria eterno por sua perfeição. Acreditavam, esses filósofos, que alguns seres humanos nasciam para serem escravos, sendo considerados inferiores. As ideias que justificassem a escravidão estavam em voga na antiguidade. A escravidão, na antiguidade, construiu a ideia de que alguns trabalhos são indignos e reservado aos considerados inferiores, segundo algumas sociedades. Como funcionou o modo de produção escravista? Vejamos a seguir. 6.1 INSTAURAÇÃO O modo de produção escravista resultou em guerras constantes, nas quais um povo conquistava o outro. Diante desse contexto de conflitos e pilhagens, o escravismo permitiu que o trabalho de um grupo fosse apropriado por outro. Grécia Antiga e Roma foram edificadas economicamente tendo, como base, guerras de conquistas e pilhagens sobre povos conquistados. Os donos de escravos, grupo dominante que acumulava grandes lucros e privilégios, podem ser considerados o motor do desenvolvimento das forças produtivas, vinculado ao aumento do número de escravos resultantes de novas conquistas. A economia escravista romana é fundada sobre a pilhagem e a exploração dos povos conquistados, fornecendo aos romanos os seus meios de subsistência TÓPICO 2 | PLATÃO, ARISTÓTELES E OS SOFISTAS 21 6.1 INSTAURAÇÃO (comida, tributos e escravos).O poder político é confundido com o poder que os militares adquirem a cada triunfo. O mesmo podemos dizer da prosperidade econômica, que está intimamente vinculada com as capacidades militares da civilização romana. 6.2 CARACTERIZANDO O MODO DE PRODUÇÃO ESCRAVISTA A sociedade escravista é demarcada pela propriedade dos meios de produção (Terra e instrumentos de produção) e tudo isto era propriedade do senhor. Assim sendo, o escravo era um instrumento de produção, como os animais e as ferramentas utilizadas. O escravo não era diferente de uma enxada ou de um boi. As relações de produção são demarcadas pelo controle e sujeição dos escravos por seus senhores. As pilhagens e conquistas aumentavam consideravelmente a quantidade de terras para produção, pois as terras dos povos conquistados eram divididas entre os nobres. Os povos conquistados eram escravizados e considerados propriedade do Estado, sendo cedidos aos nobres para a produção em suas terras. Por meio do escravismo, o mundo antigo conheceu um período de grande desenvolvimento, tendo as obras de irrigação em lavouras, portos e estradas feitas com mão de obra escrava. O trabalho de produção era feito exclusivamente pelos escravos. Sua mão de obra era fundamental para a economia de gregos e romanos. Em números, podemos dar uma ideia dessa importância utilizando a cidade-estado de Atenas. Havia uma média de 20 escravos para cada cidadão. As revoltas escravas eram constantes contra a exploração (veja dica de filme ao final dessa unidade, que trata de uma das mais conhecidas que ocorreram no mundo antigo) e o desinteresse dos povos escravizados em aumentar a produção, bem como as guerras constantes que o império romano impunha, foram arruinando a economia e, consecutivamente, os domínios imperiais. Veja o texto que segue sobre como tratar o escravo, sua importância na economia e modo de perceber sua condição, o material data dos século II e III escrito por Gaio: Os escravos devem ser submetidos ao poder de seus amos. Esta espécie de domínio já é consagrada no direito dos povos pois podemos observar que, de um modo geral, em todos os povos, o amo tem sobre os escravos poder de vida e morte, e tudo aquilo que se adquire por intermédio do escravo pertence ao amo. Mas hoje em dia não é permitido nem aos cidadãos romanos, nem a nenhum dos que se acham sob o império do povo romano, castigar excessivamente e sem motivos os escravos [...] não devemos fazer mau uso de nossos direitos; é em virtude do mesmo princípio, que se proibiu ao dissipador a administração dos próprios bens. (PINSKI, 1980). UNIDADE 1 | RECORTE HISTÓRICO: ORIGENS DO PENSAMENTO POLÍTICO E ECONÔMICO 22 DICAS O diretor Stanley Kubrick traz às telas a história de Spartacus, gladiador que se revolta contra a opressão dos nobres romanos e organiza uma rebelião de escravos. Com Kirk Douglas, Laurence Olivier e Peter Ustinov. Vencedor de 4 Oscars. Direção: Stanley Kubrick TÓPICO 2 | PLATÃO, ARISTÓTELES E OS SOFISTAS 23 LEITURA COMPLEMENTAR 1 OS PROBLEMAS DE DEFINIÇÃO DA ESCRAVIDÃO ANTIGA Moses I Finley Num trabalho sobre a escravidão no mundo greco-romano, Lauffer escreveu: “A palavra Sklave, esclave, schiavo, originada na Idade Média, e que a princípio designava os cativos da guerra eslava da Europa oriental, só pode ser transferida para a Antiguidade de um modo anacrônico, o que suscita equívocos. Além do mais, essa palavra lembra a escravidão negra da América do Norte e das regiões coloniais nos séculos mais recentes, o que dificulta ainda mais sua aplicação nas relações da Antiguidade. “O ‘escravo’ antigo é um tipo social completamente diferente”. Poucos (ou nenhum) dos historiadores da Antiguidade que participaram da discussão do trabalho de Lauffer viram com bons olhos essa sugestão radical de abandonar a palavra “escravo”, o que, na verdade, representa uma omissão diante das dificuldades, não uma solução. Se um rótulo induz a sérios erros, ele talvez possa ser substituído por um outro, neutro. A opção óbvia para o historiador da Grécia é a palavra grega doulos, que não dá margem a associações não gregas. Mas isso é pretensão. Todas as palavras ensejam associações, e estas não podem ser eliminadas por decreto. [...] Doulos, como palavra isolada, pode não ter sentido para um historiador moderno, mas assim que lê e pensa sobre os douloi em Atenas, ele, sendo humano, inevitavelmente a associará à servidão, e daí a escravos. [...]. “O ‘escravo’ da Antiguidade é um tipo social completamente diferente”, pressupõe que o escravo da Antiguidade é um tipo social. Mas os gregos usavam regularmente a palavra doulos (e o substantivo abstrato douleia) para abranger uma ampla gama de condições sociais. Mesmo se ignorarmos os usos mais metafóricos — “os aliados tornaram-se douloi dos atenienses” —, ainda nos resta o famoso problema dos hilotas espartanos. Os gregos contemporâneos não tinham escrúpulos em chamá-los de douloi. A maioria dos historiadores, hoje, opõe-se à tradução de “escravos” por hilotas. Embora a empreguem para os douloi de Atenas e, curiosa e incoerentemente, para o escravo por dívida da Ática pré-solônica ou da Roma primitiva. São inegáveis as diferenças significativas existentes entre essas categorias sociais antigas. Portanto, devemos questionar a linha de raciocínio de Lauffer e concluir que o escravo da Antiguidade não é absolutamente um tipo social único, e sim apenas um escravo no sentido geral. Devemos insistir na eliminação desse conceito, usando palavras diferentes para hilota, escravo por dívida, e assim por diante. UNIDADE 1 | RECORTE HISTÓRICO: ORIGENS DO PENSAMENTO POLÍTICO E ECONÔMICO 24 Esse processo, levado a extremos, tornaria impossível todo discurso histórico: mesmo o analista mais parcimonioso encontraria problemas, pois ele seguramente não poderia mais dizer que o indivíduo X executou a ação Y em determinado lugar e em certo dia. Tal procedimento pelo menos seria coerente. O que ocorre com frequência na prática corrente não tem nem essa virtude nem outra qualquer. Em vez de enfrentarem as dificuldades que Lauffer observou — e elas são sérias —, os estudiosos da Antiguidade esquivam-se frequentemente delas, abrigando-se na segurança ilusória do termo “servo”, que em geral aplicam aos hilotas espartanos, chegando mesmo a empregá-lo para os escravos por dívida da Ática pré-solônica e a outros grupos que não eram de escravos propriamente ditos. Deveria ser óbvio que esse procedimento simplesmente transfere o problema de um termo para outro, de “escravo” para “servo”. Não soluciona nada. Em conclusão, podemos demonstrar que, atualmente, com relação a este tópico em particular, o uso de rótulos e conceitos classificatórios encontra-se num estágio insatisfatório, no qual a terminologia incongruente reflete uma confusão mais profunda quanto à interpretação das próprias instituições. FONTE: FINLEY, Moses I. Generalizações em história antiga. In: Uso e abuso da história. São Paulo: Martins Fontes, 1989, p. 60-62. TÓPICO 2 | PLATÃO, ARISTÓTELES E OS SOFISTAS 25 LEITURA COMPLEMENTAR 2 NA SOCIEDADE GREGA, OS ESCRAVOS CONSTITUÍAM UMA CLASSE? Pierre Vidal-Naquet Na sociedade grega, os escravos constituíam uma classe? A ques tão é menos trivial do que talvez pareça, e colocá-la sob esta forma exige alguns esclarecimentos da parte do historiador da Grécia. A meu ver, nossa concepção moderna de classe social está ligada a três ordens de fenômenos bem distintos que enumerarei aqui bem empiricamente e sem escolher: 1. Uma classe é um grupo de homens que ocupa um lugar bem definido na escala social. É o que exprimimos em linguagem comum quando falamos da “grande burguesia” ou da “pequena burguesia”, da pretensa “classe média” ou das “classes inferiores”. [...] 2. Uma classe socialocupa um lugar definido nas relações de produção; esta é a principal contribuição do marxismo, e é inútil insistir nesse ponto. 3. Finalmente, uma classe social supõe a tomada de cons ciência de interesses comuns, o emprego de uma linguagem co mum, uma ação comum no jogo político e social. [...]. Seria evidentemente fácil pegar essas três noções de nível, relações de produção e de consciência e tentar aplicá-las à Anti guidade clássica e aos escravos, mas antes de nos dedicarmos a es se joguinho, talvez para torná-lo inútil, convém fazer um desvio. Meu primeiro ponto pode ser resumido desta forma: estamos acos tumados a imaginar a sociedade antiga como composta de senhores e escravos - e é o que o próprio Marx diz na abertura do Manifesto Comunista -, mas é preciso observar o seguinte: 1) nem sempre foi assim; 2) mesmo na época clássica, confrontam-se dois tipos de so ciedade, dentre as quais apenas uma pode ser considerada como “escravista” no sentido preciso que se deve dar ao termo. Em grego, o escravo é o doulos, e essa palavra aparece já nas tabuinhas micênicas sob a forma doero, mas a presença do termo não significa que de fato a sociedade micênica assumia uma oposição clara e decisiva entre homens livres e escravos. [...] UNIDADE 1 | RECORTE HISTÓRICO: ORIGENS DO PENSAMENTO POLÍTICO E ECONÔMICO 26 Na sociedade homérica ou mais exatamente naquilo que chamamos tão impropriamente por esse nome, na sociedade evoca da e imaginada pelos poemas homéricos, há certamente escravos, mulheres raptadas, prisioneiros de guerra, escravos adquiridos por um embrião de comércio, mas o escravo não é o único embaixo da escala social e nem está tão mal situado. Muitos disseram e M. I. Finley mostrou melhor do que ninguém que o miserável por ex celência não é o escravo: é o trabalhador agrícola que só dispõe de seus braços, não tendo qualquer ligação permanente com o domí nio, o oikos, é o tete. Em suma, tanto na sociedade homérica quanto na micênica, existe toda uma gama de estatutos entre o ho mem livre e o escravo. Saltemos agora alguns séculos e consideremos a época clássica. Nela temos dois modelos antagônicos que se enfrentam pública e também socialmente – digamos: o modelo ateniense e o modelo espartano. Aproximação decerto grosseira, pois há em Es parta características totalmente excepcionais que não permitem transformá-la num Estado oligárquico, mas, assim mesmo, o que é verdadeiro para Esparta é, muitas vezes, verdade, grosso modo, para a Tessália ou para Creta. Em Atenas reinava uma grande simplicidade que nos é familiar desde a primeira série ginasial. Existe o cidadão, o meteco, o escravo, com, é claro, distinções de acordo com o nível de fortu na, distinções entre a cidade e o campo, distinções também, acres centarei, de acordo com as idades, pois a “Constituição” ateniense opõe os “jovens” aos “velhos”. É evidente que, no interior do mundo dos escravos, exis tem enormes diferenças. Não é a mesma coisa ser gendarme, fun cionário ou mineiro, ter uma barraca ou ser operário agrícola. Mas juridicamente, do ponto de vista do estatuto pessoal, essas distin ções não representam muita coisa, pelo menos no século V. [...] Em suma, é claro, simples e radical, e isso mostra ao mesmo tempo que as três cate gorias da sociedade ateniense, cidadão, estrangeiro residente e escravo – esse estrangeiro absoluto, esse outsider, como diz Finley – são efetivamente vividas como tal em Atenas. [...] Nossos manuais de história também falam de uma divisão em três partes da sociedade em Esparta: os pares (os homoioi), os periecos e os hilotas, mas essa divisão em nada corresponde à de Atenas. O hilota e o homoioi são dois extremos, sem que possamos dizer que a categoria da liberdade se aplique perfeitamente aos pares, nem a do escravo aos hilotas. [...] Apesar de seu nome, os homoioi não formam absolutamente, mesmo no século V, um grupo social homogêneo. [...] Além disso, todo jovem espartano que sofreu o agôgê, a educação espartana, pode tornar-se homoioi, mas nem todos tornam-se e constata-se, no século V, uma multiplicação de intermediários, uma profusão de categorias, dentre as quais algumas remontam a uma época muito antiga. [...] TÓPICO 2 | PLATÃO, ARISTÓTELES E OS SOFISTAS 27 Do lado dos hilotas, a simplicida de também não reina mais. Um hilota pode ser um mothax, e as fontes antigas explicam esse termo ora como designando o escravo nascido em casa, ora como o hilota, criado com os espartanos e tendo passado pelo agôgê dos futuros pares. Libertado, o hilota irá tornar-se neodamodo, novo membro do damos, sem por isso tornar-se homoioi. Em suma, a sociedade espartana caracteriza-se por uma gama de estatutos sem que se possa definir muito claramente onde começa a liberdade e onde acaba a escravidão, pois mesmo os “iguais”, no fundo, não são homens livres no sentido ateniense do termo. FONTE: VIDAL-NAQUET, Pierre. Os escravos gregos constituíam uma classe? In: VERNANT, Jean Pierre; VIDAL-NAQUET, Pierre. Trabalho e Escravidão na Grécia Antiga. Campinas: Papirus, 1989, p. 86-91. 28 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico você estudou que: l Platão, Aristóteles e os sofistas foram considerados os estudiosos que deixaram contribuições sobre política desde a Grécia Antiga aos dias atuais. l Platão deixou suas ideias políticas na obra A República, escrevendo sobre modelos ideais de cidade, estado, nação, justiça e cidadania. l Aristóteles deixou, como legado, a obra A Política. Considerado fundamental para o estudo das organizações políticas, bases das Cidades-Estado. l Os sofistas defendiam suas ideias, afirmando ser necessário usar a arte de bem falar para persuadir os outros por meio da palavra. l O Modo de Produção Escravista era a base de sustentação econômica da Grécia Antiga e, sobretudo, do Império Romano. l A noção de economia na Grécia Clássica era bastante diferente do que veio a ser entendido posteriormente. Inicialmente, designava a administração do patrimônio familiar. 29 1 A concepção de política grega pressupõe que existem modelos ideais de governantes. Homens que devem ser educados para o exercício de funções públicas. Escreva um texto, evidenciando sua opinião e comentários sobre esse tema. AUTOATIVIDADE 30 31 TÓPICO 3 PENSAMENTO POLÍTICO E ECONÔMICO NA IDADE MÉDIA UNIDADE 1 1 INTRODUÇÃO FONTE: Disponível em: <http://www.brasilescola.com/historia/universidades-na-idade-media. htm>. Acesso em: 15 out. 2008. FIGURA 4 – UNIVERSIDADE NA IDADE MÉDIA Sabemos o quanto a Idade Média é ainda considerada como um período obscuro, na qual a civilização ocidental teria adormecido diante do jugo da Igreja Católica. No campo do pensamento científico e filosófico, teríamos vivido um momento de ausência total de pensadores que fugiram aos domínios do Cristianismo. Esse contexto foi chamado, por séculos, de Idade das Trevas e associado à tirania da Igreja, intolerância, fome, pestes, guerras, domínio das ideias sobrenaturais, irracionalidade. Esse processo seria rompido apenas com o Renascimento, no qual a humanidade retoma o pensamento da antiguidade clássica e prepara os fundamentos para o Iluminismo. Como surge esse estigma? Os pensadores humanistas do Século XVI, querendo exaltar as mudanças profundas apresentadas no Renascimento, chamaram o período anterior de Idade Média ou das Trevas. Essa denominação 32 UNIDADE 1 | RECORTE HISTÓRICO: ORIGENS DO PENSAMENTO POLÍTICO E ECONÔMICO carregou a conotação de período estagnado em matéria de pensamentos e mudanças significativas. As instituições do período medieval e suas organizações, bem como os pensadores do período, serviram para afirmar o poder renovador da burguesia e suas instituições e pensadores alinhados com o novo tempo. Filmes hollywoodianoscontribuíram muito para reforçar a ideia de que do período medieval restaram trevas no pensamento, aventuras de heróis e romances cavalheirescos, nos quais o cavaleiro e seu cavalo buscam a justiça em nome da fé, honrando seu reino e defendendo sua amada. Rei Arthur e seus cavaleiros da Távola Redonda foram recontados nas telas e transformados em personagens épicos de uma época bucólica, mas vazia de produção intelectual. Na Idade Média, o livro referencial foi a Bíblia, sem dúvida. O que se produziu em termos de pensamento e reflexões relacionavam-se com os preceitos cristãos interpretados de diferentes maneiras. As universidades e escolas monásticas eram controladas pela Igreja que mantém sob seu controle, inclusive, a escrita até o século XII. Senhores feudais eram, na maioria, analfabetos que mantinham um controle social e político sobre os homens. A Igreja ficava com o controle administrativo dos reinos ao fornecer funcionários que trabalhavam diretamente com os reis. Como detentora da cultura, a Igreja praticava ensinamentos nos sermões e controlava moralmente as comunidades com sistemas de ensino, reuniões dominicais, confissões e definindo a organização do tempo de trabalho por meio dos toques do sino: tempo de repouso, tempo de trabalho, tempo de orações, de festas. Tempo de vida controlado rigorosamente pelo sino. Controle que perdurou até o surgimento dos relógios mecânicos, que substituíram os sinos. Seu poder era absoluto em várias formas de saber. NOTA O surgimento do relógio mecânico foi na Europa, final do século XIII, por volta do ano de 1271. Os relógios eram considerados como símbolo do equilíbrio, virtude e sabedoria. TÓPICO 3 | PENSAMENTO POLÍTICO E ECONÔMICO NA IDADE MÉDIA 33 2 SANTO AGOSTINHO FONTE: Disponível em: <http://br.geocities.com>. Acesso em: 18 out. 2008. FIGURA 5 – SANTO AGOSTINHO O texto que segue para você, caro(a) acadêmico(a), é uma tentativa de mostrar a originalidade e a riqueza de um pensador medieval ocupado em construir uma concepção universal, relacionando Deus, o mundo terreno e as bases racionais. Seus pensamentos sobre Estado e governo são dignos de estudo considerando-se que Santo Agostinho é o filósofo mais marcante deste período. Antes chamado Aurelius Augustinus, Santo Agostinho defendeu uma concepção de que o Estado tem a função de controlar e vigiar o povo, evitando, assim, que este ceda às paixões, pecados e erros. Não há, em seus escritos, uma preocupação em separar a fé e a razão visto que acreditava que a razão auxilia os homens a atingirem a fé. E a fé, por sua vez ilumina a razão que esclarece os conteúdos mais profundos da fé. Ao deixar as fronteiras da fé e razão, assegura que as revelações divinas e o pensamento racional se complementam. Para Agostinho, o Estado ideal é o que procura imitar a perfeição divina. Em sua obra A cidade de Deus, descreve uma cidade ideal, organizada segundo a perfeição divina e tomando como base o amor divino, abolindo todas as formas de pecado. Seus pensamentos são dignos de análise e estudo, considerando-se que influenciaram todo o pensamento político medieval assentado na superioridade do poder espiritual sobre os homens. 34 UNIDADE 1 | RECORTE HISTÓRICO: ORIGENS DO PENSAMENTO POLÍTICO E ECONÔMICO Em sua obra Cidade de Deus, o pensador diz existirem muitos povos com religiões e costumes diversos em línguas e maneiras de vestir, mas afirma que existem apenas duas espécies de sociedade humana, ou como diz, cidades: uma comandada por homens que querem viver sob o jugo da carne e do pecado; outra que é orientada pelo espírito. Nessa obra, o pensador diz ser impossível o Estado chegar à justiça se não optar pela orientação em torno dos princípios morais cristãos. Ao dizer, deixa claro que no seu ponto de vista, a Igreja é superior ao Estado. Deixa transparecer que para compreendermos a história da humanidade, deveríamos levar em consideração a luta constante entre duas sociedades: uma fundada pelos impulsos humanos e terrenos considerados inferiores – a cidade terrena; e outra fundada nos princípios da paz celestial e espiritual – a cidade de Deus. Claro que para Santo Agostinho, o domínio deveria ser da Cidade de Deus, pois só nela é possível a paz permanente típica de reinos espirituais. A cidade terrena está vinculada ao reino do Diabo e de todos os males. Percebemos, em seu legado, que não há discussão sobre a condição de existência do Estado. Esse deveria ser cristão e comandar uma comunidade reunida nos princípios da fé cristã, tendo os interesses espirituais acima de todos os outros, mantendo a fé pura, garantindo, assim, a salvação humana. Sua obra foi decisiva para a história do pensamento cristão. Por viver em um contexto no qual duas épocas se interpõem, Santo Agostinho trouxe, em seus escritos, o registro do seu tempo, com bases fixadas no pensamento antigo, mas preocupado em transformar o que já estava em decadência e apontar para o que ainda estava por vir. Seu pensamento dominou a cultura medieval ao descrever o encontro entre a fé e a razão, Estado e Igreja tendo como objetivo a pureza da fé. Diríamos que seu pensamento ainda persistiu por parte da Idade Moderna e ainda é fonte de debate em grupos cristãos pelo mundo. Podemos apontar então três legados da obra de Agostinho: ● um ideal de cultura vinculado à fé, promovendo e apresentando as bases de organização de um possível Estado; ● uma síntese da doutrina cristã muito importante para o período em que viveu; ● é uma orientação filosófica para seus contemporâneos. FONTE: Disponível em: <http://br.geocities.com>. Acesso em: 18 out. 2008. TÓPICO 3 | PENSAMENTO POLÍTICO E ECONÔMICO NA IDADE MÉDIA 35 DICAS O Nome da Rosa Um monge franciscano é encarregado de investigar uma série de estranhas mortes que passam a ocorrer em um mosteiro, em plena Idade Média. Dirigido por Jean-Jacques Annaud e com Sean Connery e Christian Slater no elenco. Título Original: Der Name Der Rose Gênero: Suspense Tempo de Duração: 130 minutos 3 MODO DE PRODUÇÃO FEUDAL Com as revoltas internas e os ataques de povos estrangeiros (os chamados povos bárbaros), o Império Romano começa a conhecer sua ruína por volta do século V d.C. E, com ele, o Modo de Produção Escravista também começa a deteriorar tendo pequenos agricultores uma força maior na economia. Diante desse quadro, um novo Modo de Produção começa a desenhar sua base econômica: o Modo de Produção Feudal. Foi a partir do século V d.C. que começa o que denominamos Idade Média. Contudo, o sistema feudal começa a vigorar em parte da Europa somente após o século IX d.C. O Modo de Produção Feudal tinha, como base, a economia agrária com escassa circulação monetária. A propriedade das terras era de um grupo privilegiado: os senhores feudais, o clero e alguns descendentes de chefes tribais. Na Idade Média, as forças produtivas continuavam seu desenvolvimento com o surgimento de novas tecnologias, tais como: a tipografia e a tecelagem, que contribuíram no desenvolvimento de algumas profissões muito importantes, para o desenvolvimento das pequenas cidades, em torno do artesanato e do comércio. Locais que, em época posterior, viriam a se tornar centros comerciais importantes na Europa. 3.1 DINÂMICA DO MODO DE PRODUÇÃO FEUDAL As relações de produção, no Modo de Produção Feudal, estavam baseadas na propriedade dos senhores feudais sobre a terra e no grande controle sobre os servos. O servo era quem cultivava um pedaço de terra cedido pelo proprietário e, para tanto, pagava impostos e cultivava parte desta, em que o resultado da produção pertencia ao senhor. 36 UNIDADE 1 | RECORTE HISTÓRICO: ORIGENS DO PENSAMENTO POLÍTICO E ECONÔMICO O senhor, por sua vez, não poderia castigar o servo, mas poderia, por exemplo, vender as terras com
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