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TCC FÁBIA SÉRGIO GENEROSO

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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA 
FÁBIA SÉRGIO GENEROSO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
DA (IM)POSSIBILIDADE DA ESTERILIZAÇÃO DO DOENTE MENTAL 
À LUZ DO ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Araranguá 
2017 
 
FÁBIA SÉRGIO GENEROSO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
DA (IM)POSSIBILIDADE DA ESTERILIZAÇÃO DO DOENTE MENTAL 
À LUZ DO ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA 
 
 
 
 
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado 
ao Curso de Graduação em Direito da 
Universidade do Sul de Santa Catarina, como 
requisito parcial à obtenção do título de 
Bacharel em Direito. 
 
 
 
Orientadora: Profª. Nádila da Silva Hassan, Esp. 
 
 
 
Araranguá 
2017 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Dedico esse trabalho às pessoas que passam 
pelo Escritório Modelo da Unisul Araranguá. 
Em especial a Antônia e Valéria. Nunca as 
conheci pessoalmente, mas foi por intermédio 
delas que me deparei com esse tema incrível e 
que me fez despertar. Conhecer histórias é 
sempre despertador! 
 
 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
Sei que, sem Deus, nenhum sonho meu se tornaria realidade. Agradeço pela vida e 
pela graça que Ele me deu durante toda a minha caminhada. 
Minha eterna gratidão aos meus pais, Pedro e Leonir e ao meu padrinho João 
Carlos. Meus sonhos sempre foram sonhados por vocês três também, a paciência, a renúncia 
de vocês e o carinho para comigo ajudaram-me a seguir em frente, quando eu mais pensei em 
desistir. 
Ao meu amor, Rangel. Por todas as vezes que me incentivou e aliviou o fardo que 
caia sobre meus ombros, pela paciência nesses anos de graduação e por ser meu porto seguro. 
A minha querida professora orientadora Nádila Hassan, obrigada por sua amizade, 
sua alegria e, por cada ajuste, cada conversa e dedicação com esse trabalho, fomos escolhidas 
para relatar esse tema tão complexo e apaixonante. Sem seus ensinamentos, esse trabalho não 
iria a lugar algum. 
A minha amada amiga de faculdade e de vida, Fernanda Evaldt, por caminhar 
comigo nesses 5 anos, sendo meu suporte e minha auxiliadora nas dificuldades e por toda a 
força e incentivo, todos os dias, a minha eterna gratidão por sua existência. 
Por fim, a todas as pessoas que passaram pelo meu caminho e que, de uma forma 
ou de outra, me mostraram que quanto maior a renúncia, maior a conquista, Deus abençoe 
cada um de vocês! 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
“Cada doença pertence a um doente. Cada doente tem uma mente. Cada mente é 
um universo infinito” (Augusto Cury). 
 
 
RESUMO 
O presente trabalho foi conduzido através de pesquisa bibliográfica e documental, com foco 
nas mudanças causadas pelo Estatuto da Pessoa com deficiência. O questionamento base para 
desenvolver essa pesquisa foi: existe a possibilidade da esterilização compulsória do doente 
mental com o advento da nova Lei nº 13.146/2015? O objetivo geral foi buscar enquadrar o 
doente mental nas garantias e nos direitos dispostos no Estatuto, explanando as mudanças que 
este trouxe ao regime de capacidades e de que forma essa mudança refletiu na esterilização 
compulsória, enquanto os objetivos específicos foram compreender de que forma a 
esterilização forçosa foi utilizada, qual seu contexto social e se enquanto durou foi benéfica ao 
doente. O presente trabalho deixou claro que as deficiências sempre existiram no mundo e que 
nem sempre os doentes foram tratados como humanos, então, a busca por seus direitos 
acompanham a história. No ordenamento jurídico, ficou claro que a esterilização compulsória 
foi mais utilizada como uma forma de proteção para as famílias do que para os próprios 
doentes. E que, em decorrência disso, o Estatuto garantiu autonomias aos que antes eram 
considerados incapazes. Nessa toada, o presente trabalho permitiu compreender todas as 
mudanças que foram causadas na legislação que acabaram por reverter a atenção para o 
doente e não mais para a doença. Garantindo ao doente a autonomia sobre seus direitos 
sexuais, reprodutivos e de conservar sua fertilidade, vedando, legalmente, a esterilização 
compulsória destes. 
 
Palavras-chave: Estatuto da Pessoa com Deficiência. Esterilização compulsória. Doente 
mental. Tomada de decisão apoiada. 
 
 
ABSTRACT 
The present this essay was conducted through bibliographical and documentary research, 
focusing on the changes caused by the Statute of the Person with Disabilities. The basic 
question to develop this research was: is there a possibility of compulsory sterilization of the 
mental patient with the advent of the new Law no. 13,146 / 2015? The general objective was 
to seek to frame the mentally ill in the rights and guarantees provided in the Statute, 
explaining the changes that this brought to the capacity regime and how this change reflected 
in compulsory sterilization, while the specific objectives were to understand how forced 
sterilization was used, what its social context and if while it lasted it was beneficial to the 
patient. The present paper has made it clear that deficiencies have always existed in the world 
and that patients have not always been treated as human, and the search for their rights 
accompanies history. In the legal system, it became clear that compulsory sterilization was 
used more as a form of protection against families than for the patients themselves. And, as a 
result, the Statute guaranteed autonomy to those who were previously considered incapable. 
In this study, the present work allowed to understand the changes caused in the legislation that 
reverted its attention to the patient and no longer to the disease. Guaranteeing the patient 
autonomy over their sexual and reproductive rights and preserving their fertility, legally 
prohibiting their compulsory sterilization. 
 
Keywords: Status of the Person with Disabilities. Compulsory sterilization. Brain sick. 
Decision-making supported. 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................... 9 
2 DOENÇA MENTAL ........................................................................................................ 11 
2.1 ASPECTOS HISTÓRICOS DA DOENÇA ..................................................................... 11 
2.2 O QUE É DOENÇA MENTAL? ..................................................................................... 14 
2.3 CONCEITOS OPERACIONAIS DE DEFICIÊNCIA E DOENÇA MENTAL .............. 15 
2.4 A INTERFERÊNCIA DA DOENÇA NA VIDA DO INDIVÍDUO ............................... 20 
2.5 AUTONOMIA DE EXERCER DIREITOS SEXUAIS E REPRODUTIVOS ............... 21 
3 ASPECTOS GERAIS DO INSTITUTO DA CURATELA .......................................... 27 
3.1 PERSONALIDADE E CAPACIDADE NO DIREITO BRASILEIRO .......................... 27 
3.2 LEI 13.146/2015 .............................................................................................................. 30 
3.3 CARACTERÍSTICAS DA CURATELA ........................................................................ 34 
3.4 A TOMADA DE DECISÃO APOIADA ........................................................................ 36 
4 DA (IM)POSSIBILIDADE DA ESTERILIZAÇÃO COMPULSÓRIA DO DOENTE 
MENTAL ................................................................................................................................. 39 
4.1 ESTERILIZAÇÃO COMPULSÓRIA ............................................................................. 39 
4.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA ESTERILIZAÇÃO COMPULSÓRIA DOS DOENTES 
MENTAIS ................................................................................................................................40 
4.2.1 Lei do planejamento familiar e as pessoas com doença mental .............................. 41 
4.2.2 Vedação à esterilização compulsória no Brasil......................................................... 43 
4.3 ANÁLISE JURISPRUDENCIAL ................................................................................... 46 
5 CONCLUSÃO ................................................................................................................... 54 
REFERÊNCIA ........................................................................................................................ 56 
 
 
 9 
1 INTRODUÇÃO 
A legislação brasileira, desde o Código Civil de 1916, buscava um meio de 
proteger os direitos fundamentais dos indivíduos que possuíssem alguma deficiência. 
Com o decorrer dos anos, esses direitos foram aprimorados e as deficiências 
conceituadas e compreendidas, deixando de possuir um caráter de imperfeição devido a uma 
maldição divina e passando a ser aceita na sociedade. 
A trajetória das pessoas que possuem deficiências nunca foi fácil, mas o legislador 
sempre se preocupou em garantir os direitos e igualdades dessas pessoas. Tanto é, que em 
2015 foi publicada a Lei nº 13.146, o Estatuto da Pessoa com Deficiência, a qual, além de 
alterar alguns institutos do ordenamento jurídico, tem como principal objetivo garantir uma 
maior proteção para aquelas pessoas que possuem algum tipo de deficiência sensorial, mental, 
física ou intelectual, enquadrando todas as deficiências nesses parâmetros. Todavia, a Lei 
acaba não diferenciando doença mental de deficiência mental. 
Uma das principais alterações do Estatuto da Pessoa com Deficiência foi no 
regime das incapacidades, deixando de vigorar a incapacidade absoluta, de igual forma ao 
instituto da interdição. Passou-se a garantir autonomia e direitos que, até então, nunca foram 
exercidos por doentes mentais, como a liberdade dos direitos sexuais e reprodutivos, 
refletindo na vedação da esterilização compulsória no ordenamento jurídico brasileiro. 
À vista disso, o presente trabalho foi desenvolvido apresentando como tema 
central a (im) possibilidade da esterilização compulsória do doente mental à luz do Estatuto 
da Pessoa com Deficiência. Possuindo como questão orientadora para os estudos: quais as 
mudanças no instituto da interdição ocasionadas pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência e 
como essas alterações refletiram na esterilização compulsória do doente mental no 
ordenamento jurídico brasileiro? 
Ao mesmo tempo em que o objetivo geral desse trabalho foi buscar enquadrar o 
doente mental nos direitos e garantias dispostos no Estatuto da Pessoa com Deficiência, 
explanando as mudanças que o Estatuto trouxe “aos loucos de todos os gêneros”, conforme 
determinava o Código Civil de 1916, buscou-se, também, verificar a repercussão nas decisões 
dos tribunais brasileiros com o advento do art. 6º, IV da Lei nº 13.146/15. 
Como objetivos específicos, determinaram-se: compreender a interdição no 
Brasil, até que ponto o curador pode decidir pelo interditado e quais os efeitos jurídicos da 
interdição após as alterações trazidas pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência; diferenciar 
deficiência de doença mental, buscando uma análise histórica e atual da doença, bem como, a 
 10 
sua interferência no mundo jurídico; compreender de que forma a esterilização foi utilizada, 
qual seu contexto social e os seus benefícios para o doente e para sua família; analisar as 
decisões dos tribunais anteriores e posteriores da nova legislação. 
O estudo realizou-se por meio de pesquisa documental e bibliográfica, embasado 
em escritos de diferentes autores que atuam no ramo de direito civil, aprofundando a análise 
dos conhecimentos sobre a matéria, a fim de garantir uma base teórica confiável. 
A pesquisa foi realizada por intermédio de capítulos, sendo que a princípio, 
buscou-se fazer uma análise introdutória do presente trabalho, demostrando uma visão geral 
do tema. 
O segundo capítulo teve como principal objetivo compreender as diferenças entre 
deficiência e doença mental, bem como, a evolução histórica da doença e a forma como esta 
interfere no mundo jurídico. 
No terceiro capítulo, foi feito um apanhado geral do instituto das capacidades no 
ordenamento jurídico brasileiro, procurando compreender o que foi a interdição e o que se 
tornou, com o advento da Lei nº 13.146/2015, além de suas principais características. 
O quarto capítulo trata do método contraceptivo, objeto de estudo, esterilização 
compulsória, foi feita uma análise desse procedimento nos doentes mentais, contando também 
com uma evolução histórica desse método, as fundamentações legais utilizadas para que fosse 
possível a esterilização compulsória em doentes mentais e o posicionamento jurisprudencial 
para a concessão, bem como para a vedação. 
Ao final, expõem-se as conclusões que foram atingidas no decorrer do trabalho e, 
por fim, as referências que foram utilizadas para a construção da base teórica. 
 
 
 11 
 
2 DOENÇA MENTAL 
As incapacidades sempre estiveram no mundo, desde os tempos mais remotos. O 
indivíduo possui limitações que foram, e ainda são, objetos de estudo. Pesquisadores não 
medem esforços para que uma doença seja categorizada e juntamente com a doença, a solução 
para ela, descobrindo vacinas, medicamentos em geral, capazes de conter o problema para que 
o cidadão possua uma vida normal. 
2.1 ASPECTOS HISTÓRICOS DA DOENÇA 
A deficiência já foi considerada um problema religioso, um castigo de Deus, tida 
como a manifestação de um pecado. Trazendo a ideia de que tudo que for mal, feio ou doente 
nunca poderia ser almejado por Deus. (PAN, 2003, p. 26). Gracia (s.d apud PAN, 2003, p. 26) 
afirma que “a deformidade sempre foi vista como um afastamento de Deus, portanto como 
uma desgraça ou como uma dívida para com Deus [...] a expressão e consequência de 
desordem”. 
Nas palavras de Silva (1987 apud GARCIA, 2011a): “anomalias físicas ou 
mentais, deformações congênitas, amputações traumáticas, doenças graves e de 
consequências [sic] incapacitantes, sejam elas de natureza transitória ou permanente, são tão 
antigas quanto a própria humanidade”. 
Parafraseando Pan (2003, p. 27), existiam duas vertentes que poderiam 
fundamentar o acometimento de uma deficiência nas pessoas. A primeira delas, a teoria da 
genética, as pessoas acreditavam que havia uma transmissão de características dos pais aos 
filhos, considerado um problema de herança, o que explicaria o nascimento de um ser humano 
com deformidades. Outra teoria seria a teologia da natureza, nessa teoria, acreditava-se na sua 
própria ordem, como se fosse um acaso, decorrente da vontade da natureza. 
O primeiro caso de transtorno mental visto como um fenômeno natural, veio da 
Grécia, com o início da medicina. Contudo, essa ideia não foi muito aceita na época, 
preponderava a doença como uma maldição divina e aqueles acometidos por tal barbárie 
deveriam ser isolados da sociedade. Ainda para o autor, o infanticídio era muito aceito na 
época, da mesma forma que a compra e venda daqueles que portavam algum tipo de 
deficiência. 
Citando a cidade de Roma Antiga, Silva (1987 apud GARCIA, 2011a) relata que 
“cegos, surdos, deficientes mentais, deficientes físicos e outros tipos de pessoas nascidos com 
 12 
má formação eram, também, ligados a casas comerciais, tavernas e bordéis; bem como a 
atividades dos circos romanos, para serviços simples e às vezes humilhantes”. 
Essas transgressões eram mais sentidas pelas crianças, Ferrari (2017) expõe o 
seguinte: 
Em Esparta as crianças com deficiência física e mental eram consideradas sub-
humanas, sendo eliminadas ou abandonadas. Já na Idade Média, as concepções, 
dominadas pela visão cristã, atribuíam às pessoas com deficiência o caráter de 
possuído pelo demônio, ou de divino, inspirado por Deus, para explicar as diferenças 
de comportamento.Silva (1987 apud GARCIA, 2011a) diz que: 
A Escola de Anatomia da cidade de Alexandria, que existiu no período de 300 a.C. 
Dela ficaram registros da medicina egípcia utilizada para o tratamento de males que 
afetavam os ossos e os olhos das pessoas adultas. Existem até passagens históricas 
que fazem referência aos cegos do Egito e ao seu trabalho em atividades artesanais. 
Cada país visualizava a pessoa com deficiência de uma forma, mesmo sendo na 
mesma época, cada um possuía uma característica no país em que se encontrava. Garcia 
(2011a), diz o seguinte: 
Durante o século XX, por exemplo, pessoas com deficiência foram submetidas a 
“experiências científicas” na Alemanha nazista de Hitler. Ao mesmo tempo, 
mutilados de guerra eram considerados heróis em países como os EUA, recebendo 
honrarias e tratamento em instituições do governo. 
Ao observar a história antiga e medieval, as pessoas com deficiência, receberam 
tratamentos distintos, pode-se destacar dois pesos: a ideia de rejeição e eliminação, bem como 
a ideia de proteção. 
Na Roma Antiga, tanto os nobres como os plebeus tinham permissão para sacrificar 
os filhos que nasciam com algum tipo de deficiência. Da mesma forma, em Esparta, 
os bebês e as pessoas que adquiriam alguma deficiência eram lançados ao mar ou 
em precipícios. Já em Atenas, influenciados por Aristóteles – que definiu a premissa 
jurídica até hoje aceita de que “tratar os desiguais de maneira igual constitui-se em 
injustiça” – os deficientes eram amparados e protegidos pela sociedade (GARCIA, 
2011a) 
Foi por intermédio da Igreja Cristã que as pessoas portadoras de alguma 
deficiência mental acabaram por ser conhecidas como portadoras de alma, sendo assim, 
dignas da misericórdia divina. “Assim, as práticas de abandono e assassinatos foram sendo 
substituídas pelo acolhimento e institucionalização, numa espécie de mistura entre caridade e 
castigos, uma vez que ainda havia punições com intenção de “curar” ou “livrar do mal” 
(FERRARI, 2017). 
Considerando a caridade, o amor ao próximo, o perdão e a humildade, deram 
ênfase à valorização à vida. “Estes princípios encontraram respaldo na vida de uma população 
 13 
marginalizada e desfavorecida, dentro da qual estavam aqueles que eram vítimas de doenças 
crônicas, de defeitos físicos ou de problemas mentais” (GARCIA, 2011a). 
Os estudos sobre as deficiências no geral surgiram com o século XVI, tudo porque 
iniciou-se uma preocupação da medicina em ajustar e classificar os indivíduos que não se 
enquadravam no padrão normal e aceito na época. “Só no século XIX que entram em cena 
também os pedagogos, interessados no estudo da deficiência mental” (CARNEIRO, 2008, 
p.13). 
Já na história do Brasil, desde o tempo indígena é possível verificar a prática da 
exclusão e rejeição das pessoas que possuíam alguma anormalidade. Acompanhados, na 
maioria das vezes de violência e maus tratos, dando início a uma associação entre doença e 
deficiência (GARCIA, 2011b). 
Para o autor, as crenças e superstições fundiam a deficiência a uma forma de 
castigo ou punição. E não somente as deficiências de nascença, mas também aquelas 
adquiridas, sendo vistas como determinação de força divina e espiritual. 
Muitos negros escravos adquiriam as deficiências físicas e sensoriais através dos 
castigos a que eram submetidos. “A forma como se dava o tráfico negreiro, em embarcações 
superlotadas e em condições desumanas, já representava um meio de disseminação de 
doenças incapacitantes, que deixavam sequelas” (GARCIA, 2011b). 
Com o passar dos anos, com a aparição cada vez maior de pessoas diferentes do 
senso comum, muitos médicos começaram a buscar adequar esses cidadãos excluídos da 
sociedade. Eles o fizeram de uma forma em que deveriam ser criados escolas e centros, 
capazes de suportar as necessidades de cada um, destinados ao cuidado e reabilitação dessa 
gente, como a Sociedade Pestallozzi de São Paulo (1952) e, em 1954, a Associação de Pais e 
Amigos dos Excepcionais – APAE do Rio de Janeiro (GARCIA, 2011b). 
O ano de 1981 foi declarado pela ONU como Ano Internacional da Pessoa 
Deficiente (AIPD). Considera-se um momento de conscientização, “tendo sido organizadas 
várias manifestações para alertar sobre a própria existência e os direitos das pessoas com 
deficiência contra a invisibilidade. [...] Cumpriu o seu papel de chamar a atenção da sociedade 
para a questão da deficiência” (GARCIA, 2011b). 
E dessa forma, ano após ano, a sociedade tem se adequado para acolher as pessoas 
portadoras de deficiência em seu meio. 
Em meados de 1980, surge uma nova perspectiva, caracterizando-se, não mais 
com a ideia de exclusão e, sim, possibilitando que a pessoa com deficiência tenha o direito à 
 14 
convivência não segregada e acesso a todos os recursos que os outros cidadãos acessavam 
(GARGHETTI; MEDEIROS; NUERNBERG, 2017, p.103). 
Existem infinidades de definições para as pessoas com deficiência, que foram 
construídas e modificadas através do tempo. A Constituição Federativa do Brasil, de 1988 
(doravante CRFB), utilizou a expressão “portador de deficiência”. No entanto, a expressão 
portador de deficiência remete a ideia de que a pessoa porta algo, sendo optativo, por 
exemplo, sair de casa e deixar ou levar consigo a sua deficiência. Sendo esse o entendimento 
de Andrade e Bublitz (2016, p. 712), complementando-se com o seguinte: “[...] traduz a 
deficiência como algo que a pessoa carrega consigo, valorizando mais esta posse, a 
deficiência, do que o possuidor, a pessoa”. 
Ainda nas palavras dos autores, o surgimento e reconhecimento dessa expressão: 
A expressão “pessoa com deficiência” foi adotada oficialmente a partir da 
Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência12 13 (Resolução n. 
61/106), assinada, pela ONU, em 30 de março de 2007, a qual entrou em vigor em 
03 de maio de 2008, eis que subscrita e ratificada pelo Brasil. Referida Convenção 
foi aprovada pelo Congresso Nacional brasileiro no dia 09 de julho de 2008 (Decreto 
Legislativo n. 186/2008) e, posteriormente, foi promulgada pela Presidência da 
República em 25 de agosto de 2009 (2016, p. 711). 
Existem diferentes características e aspectos referentes à doença mental, há 
peculiaridades que serão mais bem tratadas a seguir. 
2.2 O QUE É DOENÇA MENTAL? 
Ao tratar de uma área tão complexa como o cérebro humano e com as infinitas 
possibilidades, existem algumas doenças que não possuem cura, mas apenas um antídoto que 
controla os sintomas, possibilitando a vida com a doença. 
Contudo, existem casos tão complicados, que o indivíduo é condenado pela 
própria doença a viver com uma série de limitações. 
O Estatuto da Pessoa com Deficiência (doravante EPD) vem definindo pessoa 
com deficiência como aquela que possui limitações a um longo prazo, enquadrando as 
deficiências de natureza sensorial, intelectual, mental e física, sendo que estas acabam 
afetando a participação efetiva na sociedade diante das barreiras que a própria doença causa. 
No entanto, essa convivência na sociedade é uma busca do Estatuto, devendo ser da forma 
mais humana, sem discriminações e em pé de igualdade (AGUIAR; SILVA, 2017). 
 15 
“Os termos perturbação, distúrbio e doença combinam-se aos termos mental, 
psíquico e psiquiátrico para descrever qualquer anormalidade, sofrimento ou 
comprometimento de ordem psicológica e/ou mental” (O QUE..., 2017). 
No decorrer de anos, as pessoas não conseguiam entender as doenças, 
empregando muitas vezes os termos “idiota”, “imbecil”, “demente”, dentre vários outros, que 
mais excluíam do que incluíam esses indivíduos. 
Dentre tantas formas de definir, Luiz Alberto David Araújo (1994 apud 
BEVERVANÇO, 2017a) buscou definir a pessoa que possui uma deficiência de acordo com a 
integração social: 
O que define a pessoa portadora de deficiência não é a falta de um membro nem a 
visão ou audição reduzidas. O que caracteriza pessoa portadorade deficiência é a 
dificuldade de se relacionar, de se integrar na sociedade. O grau de dificuldade de se 
relacionar, de se integrar na sociedade. O grau de dificuldade para a integração 
social é que definirá quem é ou não portador de deficiência [...] A deficiência, 
portanto, há que ser entendida levando-se em conta o grau de dificuldade para a 
integração de uma falha sensorial ou motora, por exemplo. 
Doença mental e deficiência mental não possuem o mesmo significado. 
Erroneamente, são enquadrados em um mesmo patamar, seja pelo uso do senso comum, ou 
pela semelhança existente entre esses dois institutos, entretanto, são casos totalmente distintos 
(NICOLAU et al., 2017). 
De um lado, a deficiência com reduções nas funções do ser humano, e do outro, a 
doença mental afetando o funcionamento primário do indivíduo, bem como outras áreas do 
funcionamento, não só ligadas a inteligência, podendo prejudicar a capacidade de 
concentração, o humor, bom senso e o pensamento (NICOLAU et al., 2017). 
Diante disso, faz-se necessário conhecer ambas as disfunções. Embora, estejam 
relacionadas a problemas referentes ao cérebro humano, os reflexos na vida social do 
indivíduo são totalmente diferentes. 
2.3 CONCEITOS OPERACIONAIS DE DEFICIÊNCIA E DOENÇA MENTAL 
Para encontrar o sinônimo de uma palavra, basta utilizar os recursos da internet e, 
em segundos, milhares de sites respondem a uma simples pergunta. 
Ao pesquisar o significado de deficiência, basicamente se extrai o seguinte: “trata-
se de um retrocesso no desenvolvimento da pessoa que gera dificuldades no aprendizado e na 
realização de tarefas simples do dia a dia. Nestes casos existe um problema cognitivo que 
aparece antes da fase adulta” (DEFICIÊNCIA..., 2013). 
 16 
“A deficiência é a limitação física, sensorial ou intelectual que tem uma pessoa. 
Do ponto de vista geral, todos os indivíduos sofrem de alguma deficiência em seu organismo, 
mas utiliza-se o conceito deficiência para mencionar um alto grau de disfunção” 
(DEFICIÊNCIA, 2017). 
Cabe esclarecer que a nomenclatura aplicada para definir deficiência mental está 
em constante debate entre profissionais da Medicina, Psicologia e Pedagogia. Se o melhor a 
ser utilizado seria deficiência mental ou deficiência intelectual. 
“Esta proposta de mudança de nomenclatura parece ter a intenção de tornar o 
termo menos pejorativo, além de considerar a influência do contexto social e cultural imediato 
na definição da condição da deficiência intelectual” (VELTRONE; MENDES, 2012, p. 364). 
De toda forma, ambas as expressões versam sobre deficiência que será mais bem 
estudada a partir de agora. 
É incorreto definir deficiência utilizando a expressão incapacidade. “A palavra 
"incapacidade" denota um estado negativo de funcionamento da pessoa em função do 
ambiente humano e físico inadequado ou inacessível, e não um tipo de condição” (SASSAKI, 
2004). 
O mesmo autor exemplifica da seguinte forma: a incapacidade para o deficiente 
visual só existe quando a ele é disponibilizado algum texto que não esteja escrito em braile, da 
mesma forma que um cidadão que, se locomove através de cadeiras de rodas, se torna incapaz 
somente ao ser submetido para subir escadarias. “Configura-se, assim, a situação de 
“desvantagem” imposta às pessoas COM deficiência através daqueles fatores ambientais que 
não constituem barreiras para as pessoas SEM deficiência”. 
O Decreto nº 3.298, de 20 de dezembro de 1999, em seu art. 3º, inciso I, conceitua 
deficiência como “toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, 
fisiológica ou anatômica que gere incapacidade para o desempenho de atividade, dentro do 
padrão considerado normal para o ser humano” (BRASIL, Decreto nº 3.298, 1999). 
E preocupou-se em definir o que seria incapacidade, no mesmo art.: 
III - incapacidade – uma redução efetiva e acentuada da capacidade de integração 
social, com necessidade de equipamentos, adaptações, meios ou recursos especiais 
para que a pessoa portadora de deficiência possa receber ou transmitir informações 
necessárias ao seu bem-estar pessoal e ao desempenho de função ou atividade a ser 
exercida. 
Nicolau et al. (2017) buscou conceituar deficiência mental da seguinte maneira: 
Segundo a AAMD e DSM-IV (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos 
Mentais), por deficiência mental entende-se o estado de redução notável do 
funcionamento intelectual significativamente inferior à média, que dá lugar a 
 17 
deficiências no comportamento adaptativo e que tem origem no período de 
desenvolvimento. 
O autor acrescenta que essas limitações devem ocorrer em pelo menos dois 
aspectos do funcionamento adaptativo, cita como exemplo as funções de: cuidado pessoal, 
habilidade social, comunicação, competências domésticas, autonomia, aptidão escolar, bem 
como para lazer, trabalho, saúde e segurança, em que o indivíduo é rebaixado 
intelectualmente. 
Essa degradação intelectual deve ser entendida pelo funcionamento intelectual 
abaixo da média, de uma forma significativa, ou seja, estar abaixo do relativo, do padrão 
definido para a população em geral. 
A deficiência mental pode ser caracterizada por um quociente de inteligência (QI) 
inferior a 70, média apresentada pela população, conforme padronizado em testes 
psicométricos ou por uma defasagem cognitiva em relação às respostas esperadas 
para a idade e realidade sociocultural, segundo provas, roteiros e escalas (NICOLAU 
et al., 2017). 
O posicionamento do autor abrange ainda que: 
Por deficiências no comportamento adaptativo são entendidos os déficits 
apresentados nos componentes básicos da personalidade, quais sejam: maturação, 
aprendizagem e ajustamento social. É importante considerar que cada um destes 
fatores adquire maior ou menor relevância, dependendo da fase do desenvolvimento 
humano com a qual mais se identificam: o primeiro (maturação), com a idade pré-
escolar; o segundo (aprendizagem), com a idade escolar e o terceiro (ajustamento 
social), com a idade adulta. Por período do desenvolvimento compreendem-se os 
primeiros anos de vida da criança. 
O Decreto nº 3.298/1999 conceitua a deficiência mental e esclarece em que área a 
limitação ocorre: 
IV - deficiência mental – funcionamento intelectual significativamente inferior à 
média, com manifestação antes dos dezoito anos e limitações associadas a duas ou 
mais áreas de habilidades adaptativas, tais como: 
a) comunicação; 
b) cuidado pessoal; 
c) habilidades sociais; 
d) utilização dos recursos da comunidade; 
e) saúde e segurança; 
f) habilidades acadêmicas; 
g) lazer; e 
h) trabalho; (BRASIL, Decreto nº 3.298,1999). 
Ou seja, o surgimento da deficiência ocorre antes dos 18 anos de idade. E além de 
representar um QI abaixo da média, acaba, em suma, englobando dificuldades para a 
realização das atividades do dia a dia e afeta a interação com o meio em que a pessoa vive 
(BEVERVANÇO, 2017a). 
 18 
O autor complementa ainda que, uma pessoa acometida com essa deficiência, 
embora possuindo intelecto inferior à média, como principal tratamento, precisa ser 
estimulada naquelas áreas em que possui dificuldade. “Os principais profissionais envolvidos 
são educadores especiais, psicólogos, fonoaudiólogos e terapeutas ocupacionais” 
(BEVERVANÇO, 2017a). Medicamentos também podem ser associados ao tratamento. 
“Em 2010, 8,3% da população brasileira apresentava pelo menos um tipo de 
deficiência severa, sendo: [...] 1,4% com deficiência mental ou intelectual” (BRASIL, SDH, 
2012). 
O IBGE definiu deficiência mental como o retardo no desenvolvimento intelectual, 
sendo caracterizada pela dificuldade permanente que a pessoa tem em se comunicar 
com outras pessoas, em cuidar de si mesma, em realizar atividades domésticas, 
aprender, trabalhar, brincar, etc (BRASIL, SDH, 2012). 
Diferentemente de tudo isso, a doença ou também chamado transtorno mental, 
afeta a vida do serhumano de forma mais significativa, mais agressiva. 
“A doença mental pode ser entendida como uma variação mórbida do normal, 
variação esta capaz de produzir prejuízo na performance global da pessoa (social, 
ocupacional, familiar e pessoal) e/ou das pessoas com quem convive” (BEVERVANÇO, 
2017a). 
Viu-se que na deficiência mental, o sujeito se desenvolve intelectualmente, 
mesmo que de forma reduzida e até mesmo incompleta, porém, existe o entendimento da vida 
e de todas as coisas a sua volta. 
Já as pessoas acometidas pela doença mental não possuem essa mesma visão do 
mundo. Mesmo possuindo todas as funções intelectuais necessárias para viver, elas 
apresentam um funcionamento comprometido. 
“As causas dessas doenças são complexas. Geralmente resultam de problemas no 
funcionamento do cérebro, vulnerabilidade genética, traumas, padrões de pensamentos 
persistentes ou outras experiências emocionalmente difíceis” (DOENÇA..., 2017). 
Parafraseando Bevervanço (2017a), a doença engloba desde o seu comportamento 
perante a sociedade, como também, uma alteração da realidade, ficando com a percepção 
alterada, visto afetar o bom senso, a concentração e principalmente os casos de alterações de 
humor. 
No texto estresse (2017), um artigo relacionado a transtornos mentais expõe que 
são inúmeros os fatores que podem levar uma pessoa a desenvolver a doença mental: “Nosso 
mapa genético, química cerebral, aspectos do nosso estilo de vida. Acontecimentos que nos 
acometeram no passado e nossas relações com as outras pessoas – participam de alguma 
 19 
forma”. Ainda, acrescenta que na maioria das vezes a pessoa acometida por essa doença, está 
constantemente em sofrimento e se torna incapaz de viver a vida plenamente. 
Desiquilíbrio emocional, memória enfraquecida e distúrbio de conduta, podem ser 
alguns dos sintomas da doença mental (RENNÓ, 2016). Acrescenta o autor Bevervanço 
(2017a): “Alguns exemplos de doenças mentais são depressão, TOC (transtorno obsessivo-
compulsivo), transtorno bipolar e esquizofrenia”. 
Para APAE (2015 apud VIEIRA K., 2015, p. 41), “o indivíduo acometido por 
doença (ou transtorno) mental apresenta alterações comportamentais que criam uma 
percepção alterada da realidade e isso compromete o seu convívio social”. 
O mesmo autor acrescenta ainda que “trata-se de uma doença psiquiátrica, que 
precisa de tratamento e prescrição de medicamentos” (2015, p. 41). 
No entanto, não existe uma única causa que seja capaz de tornar a pessoa um 
doente mental. 
Hoje em dia sabe-se que há alterações biológicas no cérebro (central de comando do 
nosso ser) das pessoas com doença, mas que também há factores [sic] genéticos que 
podem interferir, bem como determinantes psicológicos, tóxicos, físicos e sociais. 
Por exemplo, uma pessoa pode desenvolver uma demência por exposição a químicos 
industriais, outra pode ter alterações dramáticas de comportamento após um acidente 
que provocou traumatismo craniano, outra pode vir a sofrer de depressão profunda 
depois de uma perda duma pessoa significativa, ainda outra pode ter ansiedade 
persistente na sequência de sucessivos martírios no local de trabalho. Muitas pessoas 
têm vidas plenas e sem traumas e adoecem simplesmente por que o organismo 
deixou de funcionar bem (DOENÇAS..., 2017). 
O autor Bevervanço (2017a) subdividiu as doenças mentais em dois grupos: as 
neuroses e as psicoses. “As neuroses são características encontradas em qualquer pessoa, 
como ansiedade e medo, porém exageradas. As psicoses são fenômenos psíquicos anormais, 
como delírios, perseguição e confusão mental”. 
Para distinguir deficiência mental de doença mental, Bevervanço (2017a) diz que 
“na deficiência mental, há uma limitação no desenvolvimento das funções necessárias para 
compreender e interagir com o meio, enquanto na doença mental, essas funções existem mas 
ficam comprometidas pelos fenômenos psíquicos aumentados ou anormais”. 
De acordo com o IBGE, “são mais de 45 milhões de brasileiros que possuem 
algum tipo de dificuldade para ver, ouvir, se movimentar ou algum tipo de incapacidade 
mental” (BRASIL, IBGE, 2017). 
Os índices de doentes mentais espalhados pelo Brasil chegam a 3% (cerca de 5,4 
milhões de pessoas) (RENNÓ, 2016). 
 20 
É muito comum, ouvir o termo deficiência intelectual para referir-se ao doente 
mental. Para Vieira K. (2015, p. 41), “buscou-se, além de humanizar o termo, separar cada 
qual a suas peculiaridades”. 
Acrescenta, ainda, que: 
Não se pode confundir um deficiente intelectual com um doente mental, visto que o 
doente mental precisa e deve ser acompanhado por psiquiatra e ser submetido a 
tratamento com medicações para que assim os sintomas da patologia sejam 
diminuídos. O doente mental, por ter sua realidade pessoal alterada, não consegue se 
inserir na sociedade e desempenhar tarefas interativas, ao passo que o deficiente 
intelectual, mediante atividades de desenvolvimento intelectual que o ensinem e 
estimulem, pode levar uma vida próxima da normalidade (VIEIRA K., 2015, p. 41). 
Embora o Estatuto da Pessoa com Deficiência não conceitue nem diferencie 
doença mental de deficiência mental ou intelectual, ambas não são sinônimas. As 
interferências das doenças na vida do indivíduo são diferentes, uma possibilita viver 
normalmente mesmo que, acometido pela deficiência, enquanto a outra torna o indivíduo 
muitas vezes incapaz de cuidar de si mesmo. 
As interferências causadas pela doença mental serão melhores tratadas na próxima 
seção. 
2.4 A INTERFERÊNCIA DA DOENÇA NA VIDA DO INDIVÍDUO 
 Nem todos os doentes mentais são considerados incapazes. Toda a incapacidade é 
relativa ao grau que a doença atinge a pessoa. 
Tratar-se-á dos institutos da curatela e interdição no próximo capítulo, por ora, 
faz-se indispensável uma análise da forma com que a doença pode incapacitar o sujeito, os 
transtornos que a doença mental causa à vida, não só do doente, mas também, de todos a sua 
volta. 
Algumas deficiências não impossibilitam o indivíduo de interagir com a sociedade 
sem obstáculos, ele se adequa a sociedade e a sociedade a ele. Suas condições são plenas e o 
tornam igual perante os outros, possuem o discernimento sobre sua vida, sobre seus bens e 
clareza em suas escolhas. 
Os doentes mentais, nos casos irreversíveis, são integralmente dependentes de 
apoio, em todos os sentidos. O indivíduo, por exemplo, não consegue cuidar de si mesmo, 
administrar bens, ir ao supermercado e efetuar as compras da semana, pegar um ônibus e 
viajar desacompanhado. 
 21 
A doença acaba interferindo de forma negativa no que tange à vida do indivíduo. 
Há uma série de limitações em virtude da doença. 
Algumas doenças, como por exemplo, a psicose, que gera a paranoia, apresenta- 
se como um pensamento delirante, lúcido, que condiz a uma lógica interna, podendo ser 
discreta como a crise de ciúmes, por exemplo, ou severa, gerando uma esquizofrenia 
paranoide, acometendo a pessoa a delírios e alucinações, que em caráter permanente vão 
deteriorando a vida da pessoa, levando-a a ser interditada (MELDAU, 2017). 
A esquizofrenia, por exemplo, é uma doença mental crônica e grave, sua principal 
característica é a perda que ocorre do sujeito com a realidade, acarretando também, em uma 
diminuição das funções. São sintomas da doença, a alucinação, alteração das emoções, 
pensamento desorganizado, podendo apresentar períodos de exaltação, bem como depressão e 
sensação de estar sempre sendo perseguido. 
Com o tratamento específico, em alguns casos, o doente pode se relacionar com o 
mundo ao seu redor de uma forma, praticamente, normal no ambiente social e familiar. O 
indivíduo não deixa de ter a doença, mas seus sintomas podem ser controlados (SAMPAIO et 
al., 2010). 
Todavia, não é por conta do tratamento que condiciona o indivíduo a uma vida 
normal, que a doença deixa de ser considerada grave. “São as mais sérias ameaças à saúde nomundo moderno: estão em crescimento, muitas mortes decorrem de doença mental não tratada 
- suicídios, acidentes de trânsito, descuidos com os autocuidados [sic] de saúde, abuso de 
tóxicos” (DOENÇAS..., 2017). 
2.5 AUTONOMIA DE EXERCER DIREITOS SEXUAIS E REPRODUTIVOS 
Na busca da inclusão de todos os deficientes na sociedade, sem discriminações, a 
fim de promover a igualdade e o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais, o 
Estatuto da Pessoa com Deficiência vem trazendo fartas inovações ao direito brasileiro. 
A legislação prevê direitos e obrigações, garantindo os direitos fundamentais 
pessoais e, a partir do Estatuto, a inclusão e a igualdade, bem como, o direito de exercerem 
direitos sexuais e reprodutivos. 
Essa autonomia no direito de exercer direitos sexuais e reprodutivos surge quando 
o art. 6º do Estatuto diz que a deficiência não afeta a capacidade plena do indivíduo e, em um 
rol, traz elencadas algumas situações em que a deficiência não prejudica o discernimento, 
tem-se no artigo 6º: 
 22 
A deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa, inclusive para: 
I - casar-se e constituir união estável; 
II - exercer direitos sexuais e reprodutivos; 
III - exercer o direito de decidir sobre o número de filhos e de ter acesso a 
informações adequadas sobre reprodução e planejamento familiar; 
IV - conservar sua fertilidade, sendo vedada a esterilização compulsória; 
V - exercer o direito à família e à convivência familiar e comunitária; 
VI - exercer o direito à guarda, à tutela, à curatela e à adoção, como adotante ou 
adotando, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas (BRASIL, Lei n. 
13.146, 2017, grifo nosso). 
Todavia, não se podem igualar todas as deficiências existentes a um único 
patamar de autonomia, como por exemplo, os casos de doenças mentais, deixando uma 
dúvida: até que ponto os deficientes serão categorizados da mesma maneira? 
Embora a sexualidade seja normal na vida humana e considerada como uma fonte 
de energia para muitas pessoas, é tratada por muitos como um tabu. 
Diehl A. (2017) classifica a sexualidade da seguinte maneira: 
É uma forma de energia que motiva os seres humanos a procurar a satisfação de um 
desejo ou de um impulso sexual através do contato, do toque, de carícias, de beijos, 
de prazer, da automanipulação, do bem-estar, do orgasmo, da expressão do afeto, da 
intimidade, do ser e estar sexual, influenciando tanto os pensamentos quanto a saúde 
física e mental dos indivíduos. A prática da sexualidade é tão vital para a saúde 
quanto comer, dormir e fazer exercícios, sendo neste sentido um importante 
indicador de qualidade de vida. 
Ainda para a autora, “a sexualidade deve ser compreendida a partir de um enfoque 
extremamente abrangente, manifestando-se em todas as fases da vida do ser humano, e que, 
ao contrário do imaginário popular, tem na genitalidade apenas um de seus aspectos, talvez 
nem mesmo o mais importante”. 
Ballone (2006 apud BRITO; OLIVEIRA, 2009, p. 249) diz que “a definição de 
sexualidade não é um instrumento ligado unicamente ao ato sexual, e que deve ser entendida 
como: expressão da afetividade, capacidade de estar em contato consigo e com o outro; como 
construção da autoestima e do bem-estar”. 
“A sexualidade é vivenciada e expressa em pensamentos, opiniões, desejos, 
fantasias, atitudes, valores, comportamentos, práticas, papéis e relacionamentos” 
(BARBOSA, 2011, p. 41). 
Para o mesmo autor, “a compreensão da sexualidade é algo complexo, uma vez 
que é influenciada por fatores biológicos, psicológicos, sociais, econômicos, políticos, 
culturais, éticos, legais, históricos e religiosos” (2011, p. 41). 
Falar sobre sexualidade sempre foi um tabu. “Falar de sexualidade de pessoas 
portadoras de deficiência, mais ainda” (GLAT; FREITAS, 2007, p. 11). 
 23 
Para as autoras, cada vez mais se começa a perceber que antes de qualquer 
deficiência, tratam-se de pessoas, com necessidades, aptidões e interesses como qualquer 
outro ser humano (2007, p. 12). 
Ocorre que, nem sempre é dada a devida acuidade ao funcionamento sexual e ao 
comportamento reprodutivo das pessoas acometidas pela doença mental, “como parte 
igualmente importante dos cuidados em saúde destas pessoas” (DIEHL A., 2017). 
Para a autora, o tema deveria ser tratado diretamente com os doentes. Sendo uma 
forma de prepará-los e incentivá-los para a prática da sexualidade. 
É fato que as equipes de saúde mental em geral são relutantes em conversar sobre 
sexo/sexualidade com seus pacientes, sendo este aspecto da vida de doentes mentais 
crônicos ainda muito negligenciados na maioria dos centros de tratamento. Este 
desconforto estaria a princípio relacionado à crença dos profissionais da saúde 
mental de que portadores de esquizofrenia não seriam psicologicamente capazes de 
manejar tal discussão e o medo de que a abordagem de tal assunto poderia 
desencadear comportamentos inapropriados. 
Conforme Gejer (2006 apud BRITO; OLIVEIRA, 2009, p. 249), “o deficiente 
mental, como qualquer outro sujeito, tem necessidade de expressar seus sentimentos de 
maneira particular e intransferível”. 
Segundo Brito e Oliveira (2009, p. 250), através de estudos realizados com 
profissionais da saúde que cuidavam de doentes mentais, houve a associação ao aumento da 
libido no momento de delírio. “Segundo tais profissionais, a verbalização do desejo sexual, 
bem como as práticas sexuais, é evidenciada de forma excessiva quando o indivíduo está em 
surto, o que se pode perceber, nas entrevistas, que este excesso está intimamente ligado à 
patologia deste indivíduo”. 
Nessa toada, o problema tende a piorar, uma vez que grande é a falta de 
informação e, também, pelo acometimento da doença, o cidadão não tem os mesmos cuidados 
que uma pessoa em gozo da sua razão tomaria. 
Para Vieira K. (2015, p. 48), “a ausência de um trabalho adaptativo ao longo do 
desenvolvimento físico e psicológico do deficiente eclode na dificuldade do mesmo em 
compreender os limites dos seus impulsos sexuais”. 
Guimarães e Campos (2008 apud SIMPÓSIO INTERNACIONAL DE 
EDUCAÇÃO SEXUAL, 2013, p. 10) relatam que: 
Um estudo de corte transversal multicêntrico em nível nacional, em hospitais e 
Centros de Atenção Psicossocial Substitutivo (CAPS), com 2.238 adultos com 
transtornos mentais atendidos nos serviços de saúde mental, mostrou que somente 
6% utilizavam regularmente preservativos desde a iniciação sexual. 
 24 
Ou seja, embora haja uma necessidade de preparar o indivíduo para a vida sexual, 
existe também a vulnerabilidade dessas pessoas para que possam compreender a 
grandiosidade do ato e as consequências que ele pode causar, bem como, saber lidar com 
situações alheias a vontade do doente, como nos casos de abusos sexuais. 
Nas palavras de Kaufman, Silverberg e Odette (2003 apud MAIA; RIBEIRO, 
2011): 
As pessoas com deficiências são mais facilmente vítimas de violência sexual do que 
aqueles que não vivem com deficiências. O poder abusivo de cuidadores, a falta de 
punição para os agressores e o silêncio nas instituições, são situações que podem 
agravar e aumentar a ocorrência de estupro ou de outras formas de violência nas 
instituições. 
A violência sexual afeta diretamente a vida da vítima, comprometendo a saúde 
física, ocasionando traumas físicos, gravidez indesejada, doenças sexualmente transmissíveis 
e todas as consequências possíveis para a saúde mental da vítima (VIDAL, 2015). 
As necessidades fisiológicas acompanham os seres humanos desde o início da 
vida adulta e a deficiência bem como os transtornos mentais não acarretam nenhuma 
diminuição nessa esfera. 
Maia e Ribeiro (2011) afirmam que, mesmo nos casos de deficiências relacionada 
à mente, deveriam ocorrer incentivos à autonomia: 
Em casos de pessoas com deficiência intelectual, a decisão de ter ou não filhos(as) 
pode ser mais difícil e envolve os pais e ou responsáveis. Mas até mesmonesses 
casos, poderiam ser incentivadas a ter autonomia e responsabilidade podendo 
exercer uma vida sexual prevenindo-se de gravidez não programada e ou do 
contágio de doenças. 
“O direito à maternidade/paternidade esbarra com o nível de independência e a 
vontade da família para assumir a supervisão das atividades do casal, provavelmente durante 
toda a vida, desde a concepção até a morte” (DI GIROLAMO, 2011). 
O mesmo autor expõe ainda que a gravidez deve ser estendida ao fato de que, 
junto com a criança, nasce um pai e uma mãe, tornando-se uma família, que requererá funções 
cognitivas e emocionais e acrescenta, ainda: “a maioria dos portadores de deficiência mental 
não consegue atingir estas capacidades, mesmo assim, podem desejar ter filhos, sendo, porém, 
mais uma fantasia do que uma vontade consciente e responsável”. 
Para Parreira (1986 apud BEVERVANÇO, 2017b), a decisão para ter ou não 
filhos compete à pessoa maior e capaz sobre si mesma, sendo fundada nos direitos da 
personalidade. Devendo a pessoa interessada ter acesso a todos os meios e métodos 
anticoncepcionais, ciente das vantagens e desvantagens. Acrescenta, ainda, que “no caos [sic] 
 25 
de esterilização voluntária, ter conhecimento da irreversibilidade e riscos da intervenção 
cirúrgica". 
Para Bevervanço (2017b), que não concorda com o posicionamento exposto 
acima, esclarecendo que definir a possibilidade de decisão à pessoa capaz no âmbito da 
deficiência ou doença mental acaba limitando demasiadamente o ser humano. “São vários os 
males mentais e ultra diversificados os seus graus. Isso significa que inúmeras pessoas que 
padecem de deficiência ou doença mental conservam a possibilidade de decisão sobre 
constituir família, procriar, exercitar, como lhe aprouver, a afetividade”. 
É certo que, de acordo com o grau que a doença afeta o indivíduo, este tem 
suporte para enfrentar todas as dificuldades e situações normais a todo e qualquer ser humano, 
como por exemplo, a vida sexual. 
Ocorre que, de acordo com o desenvolvimento da vida individual juntamente com 
a doença, essas barreiras, dificuldades e situações não são homogêneas para todas as pessoas. 
Nesses casos, parafraseando Vieira K. (2015 p. 48), essas pessoas necessitam 
receber a devida tutela familiar e estatal, sendo uma forma de proteção. 
Em uma pesquisa realizada por Barbosa (2011), com ênfase na vida sexual de 
pessoas com transtornos mentais, visou-se compreender a sexualidade para essas pessoas. 
Sendo realizada a pesquisa com 22 entrevistados do sexo masculino e 17 do sexo feminino, 
sendo que, a identidade desses pacientes foi preservada. 
Foram 13 entrevistados com diagnóstico de esquizofrenia, oito com transtornos 
esquizoafetivos, delirantes, afetivos orgânicos não especificados de personalidade, 
sete com transtorno afetivo bipolar com sintomas psicóticos, sete com transtornos 
psicóticos e um com mania sem sintoma psicótico. Onze tinham transtorno por uso 
drogas ou álcool. Dois pacientes tinham diagnóstico de psicose orgânica não 
especificada e três tinham retardo mental e demência precoce, com episódios 
depressivos. O número de diagnósticos ultrapassou o de participantes pelo fato de 
vários deles terem mais de um diagnóstico conforme a Classificação Internacional 
de Doenças (CID 10) (BARBOSA, 2011, p. 65). 
Extrai-se inicialmente que a sexualidade é um tabu na sociedade em geral. Para as 
pessoas portadoras de uma doença mental, a situação é mais constrangedora ainda. Muitos 
relataram não falar sobre sexo com ninguém (BARBOSA, 2011, p. 71). 
E, em decorrência disso, os relatos de gravidez no início da vida sexual foram 
muitos. Para a autora, “o que dá indícios de a iniciação ter se dado de forma inesperada e sem 
informações claras, e evidencia o não uso de preservativo nestas circunstâncias”. 
A autora acrescenta, ainda, que (2011, p. 74): 
Em muitos relatos verificou-se que, quando da iniciação, as mulheres não sabiam 
nada sobre sexo, sendo que muitas demonstraram desconhecimento sobre o próprio 
 26 
corpo, como sintetizado na afirmação a seguir: “Eu pensava que ia continuar virgem, 
não sabia que moça era uma coisa e virgem era outra não” (E31, 29 anos). 
Muitos foram os relatos narrados pelas participantes, como por exemplo, o abuso 
sexual sofrido pelo próprio pai, sendo que, ao denunciar para a família, não houve o crédito de 
ninguém, visto ser taxada de louca. “Os relatos feitos por cinco entrevistadas sobre as 
primeiras aproximações com as práticas sexuais mostram situações de violência sofrida, que 
as marcou profundamente” (BARBOSA, 2011, p. 75). 
Casos também de abusos sexuais de pessoas de fora da família e que resultaram 
em uma gravidez, em decorrência dos mesmos, sendo a criança encaminhada para a adoção 
logo após o parto. Conforme o relato extraído da pesquisa (2011, p. 76): 
“Eu fui na casa do homem, o homem pegou e ficou comigo. Aí sucedeu a 
gravidez. [...] Eu fui na casa dele passear... Eu fui sem pensar em... [ter relação sexual]. Se eu 
saísse correndo, ele ia abusar de mim (E18, 42 anos)”. 
É certo que a vida sexual acompanha todos os seres vivos, sendo um modo da raça 
humana se reproduzir. Todavia, são inúmeras, as consequências que a vida sexual ativa 
ocasiona a uma pessoa, inclusive apresenta uma grande interferência no mundo de uma 
pessoa acometida por uma doença mental. 
O Estatuto da Pessoa com Deficiência defende que a deficiência mental não 
impossibilita que o indivíduo possa ter autonomia para decidir sobre seus direitos sexuais e 
reprodutivos. Essa é uma das muitas alterações que o EPD trouxe à legislação brasileira. No 
próximo capítulo, essas alterações serão mais bem trabalhadas. 
 
 27 
 
3 ASPECTOS GERAIS DO INSTITUTO DA CURATELA 
Desde o Código Civil de 1916 (BRASIL, CC, 1916), o legislador teve um cuidado 
especial ao tratar dos temas que poderiam incapacitar um indivíduo. Explanando o momento 
em que esse indivíduo adquiriria capacidade de fato e, também, de direito, e em quais 
hipóteses a pessoa perderia essa segunda capacidade, a de direito. 
Em 2002, o raciocínio praticamente continuou e isso refletiu na vida da sociedade 
brasileira de uma forma muito significativa. 
Atualmente, a legislação alavancou esse conceito de (in)capacidades, concedendo 
liberdade e autonomia àqueles que, em 1916 e em 2002, foram considerados cidadãos sem 
capacidade de se reger perante a sociedade e que necessitavam de curador para reger suas 
vidas. 
3.1 PERSONALIDADE E CAPACIDADE NO DIREITO BRASILEIRO 
Preliminarmente, cabe ressaltar que toda pessoa, por ser um ser humano, possui 
personalidade e essa personalidade pode ser conceituada da seguinte maneira: 
O conceito de personalidade está umbilicalmente ligado a pessoa. Todo aquele que 
nasce com vida torna-se uma pessoa, ou seja, adquire personalidade. Esta é, 
portanto, qualidade ou atributo do ser humano. Pode ser definida como aptidão 
genérica para adquirir direitos e contrair obrigações ou deveres na ordem civil (BIA 
SG, 2015). 
O Código Civil Brasileiro (doravante CC), no seu art. 2º, é que traz essa garantia, 
como o fragmento a seguir mostra: 
“A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a 
salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro” (BRASIL, CC, 2017). 
A capacidade está interligada com a personalidade. Todo indivíduo, ao nascer, 
adquire a personalidade e a capacidade de direito, mas não adquire a capacidade plena nesse 
mesmo momento. 
Nas palavras de Cristiano Sobral (2016): 
Capacidade é a medida da personalidade. Pode ser de direito ou de fato. A de direito 
é própria de todo ser humano, que a adquire assim que nasce (ao começar a respirar) 
e só a perde quando morre. A de fato é a aptidão para exercer, pessoalmente, os atos 
da vida civil, sua aquisição está condicionada à plenitude da consciência e da 
vontade. Ocorre capacidade plena quando a pessoa é dotada das duasespécies de 
capacidade: a capacidade de direito e a capacidade de fato. 
 28 
A (in)capacidade do ser humano foi e é um fator fundamental para o 
desenvolvimento da civilização. A precaução do legislador em estabelecer os critérios de 
avaliação vem desde os tempos mais remotos. 
O Código Civil dos Estados Unidos do Brasil (BRASIL, CC, 1916) fazia menção, 
em seus primeiros artigos, às pessoas, as quais seriam consideradas absolutamente incapazes 
se estivessem dentro dos parâmetros estabelecidos pela lei. 
Nesse sentido, extrai-se o art. 5º da referida lei: 
“São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil: I. Os 
menores de dezesseis anos. II. Os loucos de todo o gênero III. Os surdos-mudos, que não 
puderem exprimir a sua vontade. IV. Os ausentes, declarados tais por ato do juiz” (BRASIL, 
CC, 1916). 
Da análise do referido código, (BRAZZALE; PINHEIRO, 2016): 
Acompanhando o típico caráter generalizador que as codificações do século XIX, o 
Código Civil Brasileiro de 1916 obedeceu fielmente este critério ao preceituar dentre 
o rol dos absolutamente incapazes qualquer um que pudesse se enquadrar na 
expressão “loucos de todo o gênero”. Ora, como estabelecer um parâmetro 
suficientemente preciso para identificar determinado indivíduo como absolutamente 
incapaz dentro de tamanha amplitude que referida terminologia pudesse alcançar? 
Na época, a ideia apresentada de incapacidade estava interligada ao patrimônio do 
sujeito incapaz e não com a ideia de proteção do indivíduo. 
Somente com a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 e o “novo 
humanismo” que ela inaugura, sob a influência do Segundo Pós-Guerra, faz-se uma 
releitura destes códigos a partir de princípios constitucionais que delineiam um 
conceito axiológico de pessoa. O reconhecimento a partir de então, passa a ser do 
homem de carne e osso e não mais do sujeito de direito abstrato, permitindo-se ater 
sobre as diferenças entre as pessoas e, por consequência sobre as incapacidades. 
Surge assim a necessidade de se chegar à resposta sobre quem é o sujeito incapaz 
(BRAZZALE; PINHEIRO, 2016). 
Nas palavras de França (2016), o Código Civil de 1916 dividiu a incapacidade em 
dois níveis: os relativamente incapazes, que teriam o respeito à sua vontade, a qual 
necessitaria ser ratificada por seu assistente e os absolutamente incapazes, que receberiam 
proteção maior. 
Seguindo essa análise, na atualização do Código Civil, no ano de 2002, as 
alterações trazidas pela reforma foram muito significativas, exemplificando e ajustando os 
casos a quem se daria a maior ou menor proteção. Foi estabelecido que a proteção se daria de 
acordo com o grau de necessidade ou discernimento do indivíduo de analisar o que seria 
melhor para si. 
 29 
O objetivo para se limitar o exercício dos direitos civis tem por cerne a proteção do 
indivíduo dos riscos em assumir obrigações que podem lhe comprometer o bom 
andar de suas vidas diante da falta de compreensão da realidade que teriam estas 
pessoas, buscando manter sua dignidade. Por isto, estabelecer o grau de 
comprometimento do discernimento para adequar a lei às suas necessidades e 
individualidade (FRANÇA, 2016). 
O legislador, em toda a história, mencionou os portadores de causas transitórias 
ou permanentes, que poderiam interferir na decisão do indivíduo perante sua vida em relação 
à sociedade, e percebeu que a incapacidade sempre foi uma realidade e, por esse fato, 
precisaria de amparo legal, ficando estabelecida uma forma de resguardar os interesses 
individuais, bem como, os coletivos dos portadores das necessidades. 
Não obstante, os deficientes ou enfermos mentais e os Excepcionais permaneciam 
como incapazes, dependendo do seu grau de discernimento se lhe atribuiria a 
incapacidade absoluta ou relativa. Aliás uma adequação técnica ao que antes se tinha 
para a expressão “loucos de todos os gêneros” do Código Civil de 1916 (FRANÇA, 
2016). 
Com o advento do Código Civil de 2002, a incapacidade adquiriu duas 
classificações definitivas advindas do Código de 1916, que serviram de base durante anos 
para o ordenamento jurídico do país. 
Seriam considerados os relativamente incapazes aqueles que dependessem de 
assistência para exercer os atos da vida civil. Nessa esfera, levar-se-ia em conta a vontade do 
assistido, que seria autenticada pela vontade do seu assistente. 
Os atos praticados somente pelo relativamente incapaz, sem assessoramento, 
seriam considerados atos anuláveis, ou seja, que continham um defeito, um vício 
(INTRODUÇÃO..., 2017). 
O Código Civil (BRASIL, CC, 2017) classificou-os da seguinte maneira 
(ressaltando que a Lei 13.146/2015, alterou o respectivo artigo): 
Art. 4º São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os exercer: 
I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos; 
II - os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, 
tenham o discernimento reduzido; 
III - os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo; 
II - os ébrios habituais e os viciados em tóxico; 
III - aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua 
vontade; 
IV - os pródigos (grifo nosso referente aos incisos revogados pela Lei 13.146/15). 
Seriam considerados totalmente incapazes, aqueles que não pudessem exercer 
nenhum ato da vida civil por conta própria. Nesse grau de incapacidade, o indivíduo deveria 
estar devidamente representado. Todos os atos praticados pessoalmente pelo incapaz sem a 
 30 
devida representação seriam considerados atos nulos, como se nunca tivessem existido 
(INTRODUÇÃO..., 2017). 
O Código Civil (BRASIL, CC, 2017) deixou expressamente quais pessoas 
entrariam nessa classe. 
(Ressaltando que a Lei 13.146/2015, alterou o respectivo artigo): 
Art. 3º São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil: 
I - os menores de dezesseis anos; 
II - os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário 
discernimento para a prática desses atos; 
III - os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade 
(grifo nosso referente aos incisos revogados pela Lei 13.146/15). 
Martins (2016) acrescenta: 
Em todos os casos abrangidos pelos incs. I, II e II, do art. 3.º, do CC/2002 
(LGL\2002\400), a vontade autônoma do sujeito não era considerada válida para a 
prática dos atos da vida civil, seja em virtude da idade reduzida, do acometimento de 
enfermidade ou deficiência mental que comprometesse o discernimento ou ainda 
pela impossibilidade biológica de manifestação da vontade. 
Nota-se que em todas as fases do direito brasileiro, o legislador preocupou-se com 
a situação das pessoas portadoras de deficiência mental. A proteção dos direitos humanos e 
cíveis foi estabelecida pelos assistentes e através da curadoria. Ou seja, seria nomeado alguém 
para que ficasse responsável por cuidar da pessoa, dos seus bens, dos seus interesses e que 
também responderia pelos atos daquele que fosse incapaz de fazê-lo. 
3.2 LEI 13.146/2015 
Na legislação clássica, o Código Civil de 2002, aqueles que por causa transitória 
ou permanente que fossem impossibilitados de exprimir sua vontade, sejam elas por uma 
questão física ou mental, seriam classificados como incapazes e, com isso, ficariam limitados 
para o exercício da capacidade de fato. 
Para esses casos, a legislação amparava as pessoas nessas condições, através do 
artigo 1.767 e seguintes do CC/2002, vale ressaltar que esse artigo foi revogado com o 
Estatuto da Pessoa com Deficiência (doravante EPD): 
Art. 1.767. Estão sujeitos a curatela: 
I - aqueles que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário 
discernimento para os atos da vida civil; 
II - aqueles que, por outra causa duradoura, não puderem exprimir a sua vontade; 
III - os deficientes mentais, os ébrios habituais e os viciados em tóxicos; 
IV - os excepcionaissem completo desenvolvimento mental (BRASIL, CC, 2017). 
 31 
A curatela, até a promulgação do EPD, foi “um instituto protetivo (caráter 
protetivo e assistencial) dos maiores de idade, mas incapazes, ou seja, sem condições de zelar 
por seus próprios interesses, reger sua vida e administrar seu patrimônio” (ANDRADE, 
2016). 
Para o autor, o Juiz, através do processo de interdição, com documentação 
robusta, incluindo exames periciais para que o grau de incapacidade ficasse estabelecido, 
nomearia uma pessoa para ficar responsável civilmente por todos os bens, negócios e atos 
jurídicos do interditado, como uma forma de proteção ao indivíduo, embora, essa proteção 
devesse ser exatamente na medida de ausência do discernimento do curatelado, mas de fato, o 
curatelado acabava perdendo a capacidade de agir. 
Era, em muitos casos, tirar de uma pessoa com uma leve deficiência intelectual, a 
capacidade de ser e viver conforme a sua vontade. 
A pessoas, quando completam 18 (dezoito) anos, podem praticar sozinhas todos os 
atos da vida civil, tais como comprar e vender imóveis, casar, trabalhar, etc. Se, por 
algum motivo, alguém não tiver o discernimento necessário para esses atos, 
precisará ser interditado. Interdição é o nome que se dá a um tipo de processo 
judicial no qual um juiz analisa o nível de compreensão de uma pessoa adulta e 
decide se ela pode ou não praticar sozinha atos da vida civil, ou se precisará de ajuda 
para tanto (INTERDIÇÃO..., 2017). 
A responsabilidade seria dada ao curador e ao Estado-Juiz, que visariam sempre o 
bem estar do incapaz. E esse bem estar, poderia ser relacionado à saúde física, emocional, 
intelectual, à integridade física, enfim, todas as ações que envolvessem o interditado, o 
curador assumiria também as consequências de toda e qualquer ação que gerasse uma 
consequência ao doente. 
Vários motivos poderiam levar uma pessoa à interdição, até 2015, poderiam ser 
discutidas em juízo, a limitação de capacidade de uma pessoa ou até mesmo a sua 
incapacidade total. Tudo isso, através do processo judicial de interdição, devendo ficar 
estabelecidas as razões para justificar o pedido de interdição, sendo indispensável laudo 
médico para provar as alegações, sempre que possível (FUJIKI, 2015). 
Posterior à produção de provas que atestavam a capacidade do indivíduo e todos 
os requisitos judiciais feitos, o juiz proferiria a sentença, decretando ou não a interdição. “Na 
sentença que decretar a interdição, o juiz nomeará curador levando em conta o estado e o 
desenvolvimento mental do interdito para assim estabelecer os limites da curatela” (FUJIKI, 
2015). 
A curatela foi conceituada da seguinte maneira: 
 32 
A palavra curatela, intrinsecamente relacionada à questão da interdição, traz em seu 
radical o sentido original do vocábulo, cura, que significa cuidado, diligência, 
aplicação, administração, direção, traduzindo o sentido da proteção presente neste 
instituto (MEDEIROS, 2006, p. 2). 
Extrai-se das palavras de Medeiros (2006, p. 2) que o elemento constitutivo da 
interdição é a proibição, um impedimento que é imposto a alguém, que legalmente se torna 
privado da administração de seus bens e da regência da sua pessoa, bem como, do gozo e 
exercício de alguns direitos relacionados à pessoa. Em suma, a interdição poderia ser vista 
como um ato de responsabilidade pública, em defesa de interesses sociais, que é exercido a 
partir do momento que o juiz dá seu veredito na sentença. 
Até a promulgação do Estatuto, o instituto, os requisitos e toda a forma como se 
visualizava o deficiente davam a ele certo limite de discricionariedade. Atualmente, com o 
EPD, o instituto da curadoria tem um novo prisma, isso porque a nova lei trouxe mais 
liberdade e autonomia para o incapaz. 
“Com base na Convenção dos Direitos da Pessoa com Deficiência, a Lei 
13.146/2015 operou uma ruptura na teoria das incapacidades do Código Civil, tornando a 
pessoa com deficiência plenamente capaz para prática de atos da vida civil” (BRAZZALE; 
PINHEIRO, 2016). 
Ainda nas palavras dos autores, essa reviravolta no direito brasileiro abrange atos 
essenciais. “Trata-se da funcionalização da curatela ao livre desenvolvimento da 
personalidade do curatelado”. 
Para Vieira S. (2016), antes do Estatuto da Pessoa com Deficiência: 
A curatela mostrava-se, nessa medida, um mecanismo que promovia a restrição de 
direitos fundamentais dos curatelados, apesar de ter sido pensada para protegê-los. 
Essa situação, da maneira como era conduzida, violava frontalmente os princípios 
que orientam a teoria dos direitos das pessoas com deficiência, expressa na 
Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e no Estatuto da Pessoa 
com Deficiência. Os princípios constitucionais que devem orientar o Direito Privado 
também não eram respeitados. A curatela tradicional feria os princípios da 
autonomia, da não discriminação, da privacidade e, em última análise, o da 
dignidade desses seres humanos. 
O Estatuto trouxe a ideia de igualar os indivíduos que portam alguma necessidade 
especial, seja ela física, psíquica, sensorial ou mental. Um ser humano “normal” tem a total 
autonomia de escolher o que é melhor para si, tem sua independência e liberdade. A ideia que 
o Estatuto traz é esse mesmo entendimento para todas as pessoas. 
A deficiência deixa de ser reconhecida por um olhar preliminarmente limitado às 
restrições que decorrem de uma doença, mas sim, pela forma como o indivíduo responde a 
esse confronto ao seu redor. “A limitação pessoal, de tal modo a responder se aquela limitação 
 33 
pessoal é impeditiva de ultrapassar as barreiras externas existentes na sociedade onde 
convive” (BRAZZALE; PINHEIRO, 2016). 
Para as autoras, consideram-se barreiras externas, os impedimentos que venham 
acarretar deterioramento na forma como esse deficiente se porta perante algumas situações, 
elencadas por Menezes (2015 apud BRAZZALE; PINHEIRO, 2016), podem ser definidas 
como “sua participação social, bem como o gozo, a fruição e o exercício de seus direitos à 
acessibilidade, à liberdade de movimento e de expressão, à comunicação, ao acesso à 
informação, à compreensão, à circulação com segurança, entre outros”. 
E essa alteração que acompanha o EPD desconstitui a ideia remota de que a 
doença só tinha haver com o próprio doente e seu aspecto intrínseco. 
Para os autores Araujo e Costa Filho (2015), “a ideia de um "Estatuto da Pessoa 
com Deficiência" dá à lei uma dimensão de unidade, de sistematização”. 
E o que se entendia por curatela, deixa de ter relevância e aplicação no mundo 
jurídico, “perde o fôlego enquanto medida de substituição de vontade e passa-se a atribuir 
maior relevo às circunstâncias pessoais do próprio curatelado, notadamente às suas 
preferências, aos seus vínculos de afetividade e aos seus interesses fundamentais” 
(MENEZES, 2015, p. 18). 
Para Brazzale e Pinheiro (2016), “a curatela, por sua vez, é relegada a um caráter 
excepcional, [...] trata-se de uma nova curatela, que se restringe aos atos patrimoniais, não 
podendo afetar os atos existenciais da pessoa com deficiência”. 
Tem-se, como principal ator na curatela, a pessoa incapacitada. Por muito tempo, 
a doença foi exaltada e a pessoa rebaixada, ficando em evidência a deficiência que a pessoa 
possuía, e com o instituto da curatela acessível, muitos foram os casos em que, prevaleceram-
se desta ideia. 
Para Lilia Pinto Martins (2008 apud BRAZZALE; PINHEIRO, 2016), “a pessoa, 
antes de sua deficiência, é o principal foco a ser observado e valorizado, assim como sua real 
capacidade de ser o agente ativo de suas escolhas, decisões e determinações sobre sua própria 
vida”. 
A mudança mais significativa encontra-se no fato de a legislação ter afastado a 
deficiência da categoria da incapacidade, seja ela absoluta ou relativa, o que repercutiu 
diretamente no instituto da interdição. 
Os reflexos da nova legislaçãono mundo jurídico serão mostrados nas próximas 
seções. 
 34 
3.3 CARACTERÍSTICAS DA CURATELA 
Muito se falou do instituto da curatela, da forma como ela foi regida durante anos 
no ordenamento jurídico brasileiro. Sabe-se que nos últimos anos, inovações surgiram, 
parâmetros foram estabelecidos para que a curatela permanecesse com todas essas mudanças. 
Como todo mecanismo de capacidades no Código Civil, a curatela sofreu 
alterações e, isso reflete diretamente na sua forma de aplicação, nos seus requisitos e 
características. 
No novo sistema jurídico, a curatela deixa de ter aquele fim de total autonomia 
com relação ao interditado. Passando a vigorar o fim assistencial, ou seja, passa a 
complementar, com caráter auxiliar na vida do incapaz e, não mais como responsável 
totalmente por cada ato do indivíduo. “O instituto da curatela completa no Código Civil, o 
sistema assistencial dos que não podem, por si mesmos, reger sua pessoa e administrar seus 
bens” (ROMANO, 2017). 
Anteriormente, interditado uma vez, raramente essa interdição cessaria. Não 
ficava um período estabelecido. Diferentemente de atualmente, em que o principal caráter da 
curatela é a sua temporariedade, ou seja, ela só irá durar enquanto a causa que a mantem 
existir. Diz-se que a interdição é levantada quando se faz cessado o que lhe deu a causa. 
Sendo que, para que seja inicialmente decretada a curatela, deve haver uma 
absoluta certeza de incapacidade. 
Existe a possibilidade de interdição no novo modelo do ordenamento jurídico. “O 
Estatuto da Pessoa com Deficiência admite em caráter excepcional o modelo jurídico da 
curatela, porém, sem associá-la à incapacidade absoluta” (ROSENVALD, 2015). 
Para o autor, o Estatuto remete a duas vertentes de deficiência, “a deficiência sem 
curatela e deficiência qualificada pela curatela”. 
Em suma, a deficiência em geral acaba por englobar todos os indivíduos que 
possuem um não funcionamento das capacidades físicas, sensoriais e mentais, e, assim, o 
deficiente consegue normalmente desfrutar dos seus direitos existenciais, civis e patrimoniais, 
podendo ser chamado de deficiente capaz. 
Todavia, se por intermédio da deficiência a pessoa não possuir meios de se 
autodeterminar, o ordenamento jurídico tem condições de conferir maior proteção para esse 
deficiente do que para aquele deficiente que é capaz, por intermédio, é claro, de um processo 
legal (ROSENVALD, 2015). 
 35 
Erroneamente se pensa que, através do novo entendimento sobre capacidades, a 
curatela foi extinta do ordenamento jurídico brasileiro. Em contra partida, esse instituto foi 
aprimorado e, como já dito, não se visa mais o doente e sim o meio através do qual ele se 
porta diante da sociedade. 
A incapacidade será aceita no mundo jurídico uma vez que seja muito bem 
justificada. Para o autor Requião (2015), nada impede que a curatela seja utilizada, uma vez 
que “verificada a necessidade fática de um portador de transtorno mental de auxílio para o 
exercício da sua capacidade, sejam adotadas medidas protetivas”. 
Tem-se: “art. 6º a deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa” 
(BRASIL, Lei n 13.146/15, 2017). 
Para Rosenvald (2015), “a deficiência é um impedimento duradouro físico, mental 
ou sensorial que não induz, em princípio, a qualquer forma de incapacidade, apenas a uma 
vulnerabilidade, pois a garantia de igualdade reconhece uma presunção geral de plena 
capacidade a favor das pessoas com deficiência”. 
Para aquelas pessoas que possuem dificuldades de reger suas vidas, o Código 
Civil, já com as atualizações de 2015, expõe que: 
“Art. 4º São incapazes, relativamente a certos atos ou à maneira de os exercer: [...] 
 III - aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua 
vontade” (BRASIL, CC, 2017). 
Com esta redação, todas as pessoas que não puderem exprimir sua vontade 
poderão ser consideradas relativamente incapazes, o que, anteriormente, para essas pessoas 
estaria no rol dos absolutamente incapazes. 
Para Rosenvald (2015): 
O legislador optou por localizar a incapacidade no conjunto de circunstâncias que 
evidenciem a impossibilidade real e duradoura da pessoa querer e entender – e que 
portanto justifiquem a curatela-, sem que o ser humano, em toda a sua 
complexidade, seja reduzido ao âmbito clínico de um impedimento psíquico ou 
intelectual. 
Em harmonia com o referido artigo, encontra-se o disposto no Estatuto da Pessoa 
com Deficiência que garantiu a possibilidade da curatela, conforme estabelece o seguinte: 
Art. 84. A pessoa com deficiência tem assegurado o direito ao exercício de sua 
capacidade legal em igualdade de condições com as demais pessoas. 
§ 1o Quando necessário, a pessoa com deficiência será submetida à curatela, 
conforme a lei. 
[...] 
§ 3o A definição de curatela de pessoa com deficiência constitui medida protetiva 
extraordinária, proporcional às necessidades e às circunstâncias de cada caso, e 
durará o menor tempo possível (BRASIL, Lei n 13.146/15, 2017, grifo nosso). 
 36 
Resumindo, a pessoa portadora de qualquer deficiência encontra, atualmente, 
autonomia para os atos de sua vida, mesmo estando nos parâmetros da curatela. “A curatela 
somente se dará de forma excepcional e fundamentada e deverá ser proporcional às 
necessidades e circunstâncias de cada caso” (OLIVEIRA, 2016). 
Essa proporcionalidade é o juiz quem determina, ao analisar cada caso concreto, 
“o juiz concederá a curatela e indicará os atos para os quais a mesma será necessária, não 
havendo mais que se falar em curatela parcial ou total [...] e fixará expressamente os limites 
da curatela, não podendo mais declarar genericamente” (OLIVEIRA, 2016). 
O art. 85, do Estatuto da Pessoa com Deficiência, esclarece da seguinte maneira: 
Art. 85. A curatela afetará tão somente os atos relacionados aos direitos de 
natureza patrimonial e negocial. 
§ 1o A definição da curatela não alcança o direito ao próprio corpo, à 
sexualidade, ao matrimônio, à privacidade, à educação, à saúde, ao trabalho e 
ao voto. 
§ 2o A curatela constitui medida extraordinária, devendo constar da sentença as 
razões e motivações de sua definição, preservados os interesses do curatelado 
(BRASIL, Lei n 13.146/15, 2017, grifo nosso). 
Todas essas mudanças tem o objetivo maior de incluir a pessoa com deficiência na 
sociedade. “Propiciando a ela a prática dos atos da vida, como casamento, sexo, filhos, e 
de trabalho” (OLIVEIRA, 2016). 
A curatela não entrou em desuso, esse instituto continua sendo juridicamente 
possível, mediante novas regras e funções. A curatela que existiu até 2015 foi alcançada 
pelas mudanças do Estatuto, bem como, foi modificada e substituída. 
Um novo instituto de proteção surgiu no ordenamento jurídico, a chamada 
tomada de decisão apoiada, que será explanada na próxima seção. 
3.4 A TOMADA DE DECISÃO APOIADA 
Com todas essas alterações no instituto da curatela, o qual serviu gentilmente a 
legislação enquanto vigorou, no que tange à proteção do deficiente que não possui 
entendimento para decidir sobre seus atos existenciais, criou-se o instituto da tomada de 
decisão apoiada, que visa assegurar o maior respaldo para com a pessoa que necessita de 
cuidados, levando em conta seu empoderamento nas decisões referentes a ele. 
Todas as pessoas que possuem uma deficiência de longo prazo e que possuem 
condições para participar efetivamente da sociedade de igual para igual como outras pessoas 
não serão mais incapazes. Se o indivíduo acometido pela deficiência – inclui-se a deficiência 
 37 
mental – interagir e se adequar, mesmo que com dificuldades ou barreiras, será civilmente 
capaz, perante o ordenamento jurídico, porque é justamente isso que o Estatuto da Pessoa com 
Deficiência traz. 
Em análise anterior, verificou-se que a curatela não se extingue do ordenamento 
jurídico, todavia, ela é aplicada em casos excepcionais, conforme o art. 84 do