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F u n d a m e n to s e M e to d o lo g ia d o E n s in o d e A rt e s Silvia Sell Duarte Pillotto Eliana Stamm Fu nd am en to s e M et od ol og ia d o En si no d e Ar te s Si lv ia S el l D ua rt e Pi llo tto e E lia na S ta m m Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes Curitiba 2011 Silvia Sell Duarte Pillotto Eliana Stamm FAEL Diretor Executivo Luiz Carlos Borges da Silveira Filho Diretor Acadêmico Osíris Manne Bastos Coordenadora do Núcleo de Educação a Distância Vívian de Camargo Bastos Coordenadora do Curso de Pedagogia EaD Ana Cristina Gipiela Pienta Secretária Acadêmica Dirlei Werle Fávaro EDITORA FAEL Coordenador Editorial William Marlos da Costa Edição Silvia Milena Bernsdorf Revisão Jaqueline Nascimento Projeto Gráfico e Capa Denise Pires Pierin Ilustração da Capa Cristian Crescencio Diagramação Ana Lúcia Ehler Rodrigues Ficha Catalográfica elaborada pela Fael. Bibliotecária – Cleide Cavalcanti Albuquerque CRB 9/1424 Pillotto, Silvia Sell Duarte P642f Fundamentos e metodologia do ensino de artes / Pillotto, Silvia Sell Duarte; Stamm, Eliana. – Curitiba: Editora Fael, 2011. 104 p.: il. ISBN 85-64224-27-8 Nota: conforme Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. 1. Arte (Ensino fundamental). 2. Professores – Formação. I. Título. CDD 700 Direitos desta edição reservados à Fael. É proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem autorização expressa da Fael. apresentação Foi na metade dos anos 90 que conheci a Silvia, em um curso sobre arte na Educação Infantil. Lembro-me muito bem de seu entusiasmo ao falar sobre o imaginário infantil, da imensa bibliografia disponibilizada, de sua generosidade em compartilhar experiências, de suas sugestões e reflexões que nos proporcionou naquele breve período. Desde então, acompanho o seu trabalho, sei de suas publicações, andanças em terras lusitanas, pesquisas, cursos, engajamento institucional, entre tantos ou- tros fazeres, e a cada notícia que tenho, penso: “que bom que a Silvia existe!” Em Fundamentos e metodologia do ensino de artes, mais uma vez, Silvia, em parceria com Eliana – jornalista, artista, pesquisadora e professora – compartilha conosco reflexões sobre a importância dos pro- cessos de criação e das linguagens da arte na infância. Silvia e Eliana são como os theoros da Grécia Antiga, que tinham a responsabilidade de observar e relatar, para sua comunidade, o que viam em diferentes lugares, para que comparassem seus relatos com suas expe- riências, formando, assim, suas teorias. Nessa perspectiva, as autoras deste livro nos trazem suas reflexões, que partem de observações e dos aconteci- mentos vivenciados em seus cotidianos, como professoras e pesquisadoras do ensino de arte, a fim de que possamos produzir nossos pontos de vista e nossas teorias acerca do ensino de arte na contemporaneidade. Ou seja, as experiências das autoras, acompanhadas de reflexões e de exemplos, convocam-nos para relacionarmos nossas concepções e práticas pedagógi- cas cotidianas com as temáticas abordadas ao longo desta obra. Além da relevância da temática, a forma relacional com que as au- toras estruturam os capítulos fará com que o leitor sinta-se dialogando com os temas, que vão desde a história do ensino da arte no Brasil, pas- sando por conceitos, e chegando, ao final, nas práticas educativas. Dessa forma, a maneira como as autoras organizaram essa obra oportunizará o entendimento amplo do ensino de arte, bem como as minúcias do coti- diano nos modos de ensinar arte na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental. apresentação A intenção do livro é ser pedagógico, porém não dará uma receita pronta de como planejar e desenvolver proposições de arte, no espaço escolar ou fora dele, mas provocará a vontade de criar possibilidades educativas em arte, aqui entendidas como uma ida a uma exposição de arte, uma experiência estética ao olhar o céu, um projeto de trabalho, entre outras modalidades educativas. A provocação das autoras à cria- ção de processos educativos dos professores não se dá apenas pelas discussões teórico-metodológicas do livro, mas, também, pela proposi- ção de questões desafiadoras, por sugestões de produções e espaços culturais, apresentação de livros e relatos de experiências. A mescla de fundamentação teórica com propostas metodológicas “nutre” o lei- tor de referências diversas, impulsionando-o a outras buscas, como de filmes, livros, pesquisas e, principalmente, de um outro olhar sobre os processos de criação das crianças e de nós mesmos. Segundo a Fundação Iberê Camargo, o pintor gaúcho costumava afirmar: “[...] No meu andarilhar de pintor, fixo a imagem que se apre- senta no agora como retorno às coisas que adormeceram na memória. Essas estão escondidas no pátio da infância.” Ao longo de toda a obra, as autoras, assim como Iberê Camargo, enfatizam a necessidade vital de as crianças terem espaços de criação, experiências poéticas com as diferentes linguagens expressivas no “pá- tio da infância”, para que, pelo menos nesse período da vida, tenham o prazer de viver e expressar modos singulares de ser e de estar no mundo. Assim, considero fundamental a leitura desta obra, e que ela seja um convite aos leitores para criarem propostas educativas, sensíveis, críticas, reflexivas, afetuosas, lúdicas e prazerosas. Acredito que, assim, esses leitores contribuirão, de maneira diferenciada, com a formação de nossas crianças. apresentação apresentação apresentação Parabéns à Silvia e à Eliana por existirem e por produzirem este livro, que terá um papel importantíssimo na formação docente e de estudantes que acreditam na possibilidade da infância recuperar sua poesia. Susana Rangel Vieira da Cunha* * Professora e pesquisadora da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Trabalha na área de Educação Infantil, na interface com as artes visuais e estudos da cultura visual. Atua como docente nos cursos de Graduação em Pedagogia, Especialização, Mestrado e Doutorado em Educação, em disciplinas que abor- dam infância, artes visuais, cultura visual e Educação Infantil. apresentação Prefácio....................................................................................... 9 1 A arte como propulsora nos processos de aprendizagem humana ........................................................ 13 2 Uma educação pela infância .................................................... 27 3 Sincronias interativas: a arte como elemento integrador das demais áreas de conhecimento......................................... 41 4 Trajetórias expressivas nas conexões das linguagens artísticas ......................................................... 61 5 Práticas educativas .................................................................. 73 Referências............................................................................... 97 Glossário ................................................................................. 103 sumário sumário 9 prefácio prefácio O livro Fundamentos e metodologia do ensino de artes é refe- rência para discussões reflexivas sobre as linguagens da arte na infân- cia, com ênfase nos aspectos conceituais e metodológicos. As questões discutidas neste livro contribuem para a ampliação do olhar sensível de profissionais que atuam na área da Educação Infantil e dos anos iniciais do Ensino Fundamental, bem como para estudantes das licen- ciaturas dessa área e/ou de áreas afins. Entendemos que, para construir uma relação de afeto e significações com as crianças, é fundamental que todo professor tenha vivências artísticas, estéticas e culturais. A obra é constituída por aspectos teórico-conceituais, histó ri- co-culturais e processos metodológicos, sinalizando algumas ativida- des, como leitura (visual, corporal e sonora), questionários reflexivos, pesquisas complementares, apresentação de projetos, portfólio,ava- liação e relato de experiências. Para os quatro primeiros capítulos foi elaborada uma síntese contendo a essência das questões tratadas; já no último, o destaque foi dado aos relatos de experiências. O primeiro capítulo dá destaque às questões relacionadas aos pro- cessos de formação do professor como agente mediador e provocador de mudanças na ação pedagógica. Para que o docente se aproprie do conceito de mediador/provocador, é necessário que conheça a trajetó- ria da arte/educação no Brasil, refletindo sobre a importância dos con- teúdos/conceitos da arte para o desenvolvimento cognitivo e sensível da criança. Outra questão destacada neste capítulo são os processos de aprendizagem em arte e suas interfaces entre o ser e o estar professor. O segundo capítulo se propõe a dialogar sobre a importância da arte na infância e sua relevância no currículo da educação básica, 10 especialmente no período que se refere à infância. Também neste ca- pítulo serão apresentadas algumas possibilidades metodológicas para a Educação Infantil e anos iniciais do Ensino Fundamental. Ele- mentos como ludicidade, jogos e brincadeiras, articulação entre as linguagens artísticas, processos de leitura, vivências com suportes e materiais, construções poéticas e contextualização histórico-cultural serão pilares para os processos metodológicos. O terceiro capítulo aborda possíveis conexões interdisciplinares, deixando claro esse conceito e seus desdobramentos. Portanto, neste capítulo, a arte é apresentada como linguagem/expressão, possibili- tando experiências sensoriais e estéticas por meio da musicalização, da corporeidade e das artes visuais. A arte como elemento integrador das outras áreas pode construir conexões entre aspectos cognitivos e sensíveis; entre os saberes e as práticas cotidianas; entre o desejo e a realização de ser e conhecer; de transformar e transformar-se. O quarto capítulo trata das linguagens da arte (artes visuais, ex- pressão corporal e expressão sonora) como integrantes e integradoras do currículo escolar. Nesse sentido, um dos caminhos são os projetos pedagógicos, que possibilitam a interação entre as diversas lingua- gens e áreas de conhecimento. O projeto, na concepção deste livro, compreende a aprendizagem como desenvolvimento do pensamento crítico, constituída a partir da produção de sentidos e significados. Nesse processo, é possível identificar diferentes fatos, criando propo- sições reais e imagéticas, tendo como referência o entorno da criança. A avaliação, também abordada, é fundamental nesse contexto, para que possamos entender as trajetórias de aprendizagem da criança. Assim, optamos pelo registro e portfólio e a autoavaliação, uma vez prefácio prefácio 11 prefácio prefácio que esses instrumentos dão visibilidade tanto às produções quanto ao processo vivenciado pela criança e pelo professor. Além disso, tam- bém sinalizam para a reflexão da prática docente, apontando novos rumos para as práticas pedagógicas. O quinto capítulo aborda dois relatos de experiências, nos con- textos da Educação Infantil e dos anos iniciais do Ensino Fundamen- tal, tendo como balizadoras as discussões conceituais e metodológicas enfatizadas neste livro. Os relatos contribuem para que o leitor reflita sobre as várias possibilidades das linguagens da arte como integradora nos processos de ensinar e aprender. São essas as questões que o livro apresenta, no intuito de provo- car a reflexão/ação de professores, a fim de buscar caminhos possíveis para a arte no currículo da Educação Infantil e dos anos iniciais do Ensino Fundamental. As autoras.* * Silvia Sell Duarte Pillotto é Pós-doutora, pelo Instituto Estudos da Criança, na Uni- versidade do Minho (Uminho), em Braga/Portugal, Doutora em Engenharia da Produção (Gestão da Qualidade), pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), e Mestre em Educação (Currículo em Arte-Educação), pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Eliana Stamm é formada em jornalismo pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), com especialização em Prática Social da Arte, pela Escola de Comunicação e Artes da Universidade Estadual de São Paulo (ECA/USP). É professora na Universidade da Região de Joinville (Univille), no curso de licenciatura em Artes Visuais, coordenadora da escola de artes Fritz Alt, na Casa da Cultura, e sócia fundadora do centro de Educação Infantil Aldeia do Sol. 13 Este capítulo pretende iniciar um diálogo sobre a dimensão sen- sível na ação pedagógica e o quanto isso pode interferir nas interfaces entre o ser e estar professor no contexto da infância. Pensar no sensí- vel é pensar nas linguagens e expressões artístico-culturais nos âmbitos visual, corporal e sonoro. É inserir-se no universo da percepção, da imaginação, da criação e da emoção. Ser professor de Educação Infantil e dos anos iniciais do Ensino Fun- damental implica estar disponível a novas sensações e percepções, estar aberto ao inesperado, a descobertas sobre o outro e sobre si próprio, é na- vegar em um mundo desconhecido e surpreendente – o mundo infantil. É importante ressaltar que as atividades pedagógicas devem estar em consonância com a faixa etária das crianças, uma vez que apresen- tam diferenças nos processos de aprendizagem, nos interesses e nas ap- tidões. Especialmente na Educação Infantil, deve-se considerar que as crianças de 0 a 3 anos têm um desenvolvimento bastante diferente das que possuem de 4 a 5 anos. Nos capítulos a seguir, trataremos dessas questões com mais profundidade. Breve trajetória da arte/educação no Brasil A arte está inserida no currículo escolar há pouco tempo, embora, desde os primórdios, esteja sempre presente na vida dos sujeitos, seja nas manifestações em dança, música, teatro e/ou artes visuais. Conta a história que, no Brasil, alguns marcos deixaram rastros na educação formal e não formal, a Missão Artística Francesa foi um deles. A arte como propulsora nos processos de aprendizagem humana 1 Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes FAEL 14 Trazida por D. João VI, em 1816, ela fomentou a Academia Imperial de Belas Artes, que, “após a proclamação da República, passou a ser chamada de Escola Nacional de Belas Artes. O ponto forte dessa escola era o desenho, com a valorização da cópia fiel e a utilização de moldes europeus” (MARTINS; PICOSQUE; GUERRA, 2009, p. 10). Por muito tempo a ênfase na cópia permaneceu presente nas esco- las de artes e, posteriormente, na educação básica regular. Ainda hoje, verificamos que algumas instituições educacionais destinadas a crianças da Educação Infantil e dos anos iniciais do Ensino Fundamental exi- gem um rigor das produções infantis, no qual a cópia é privilegiada em detrimento da construção imagética e criativa da criança. Continuando nosso percurso histórico, o Brasil, em especial o estado de Minas Gerais, vivenciava o Barroco1 de forma intensa, em curvas, formas, cores, texturas e movimento, no período entre o início do século XVIII e o final do século XIX. No entanto, o estilo Neoclás- sico2, vindo com os franceses, se apoderou do contexto das elites. A arte, então, estava somente “no alcance de uma elite privilegiada que desvalorizava as manifestações artísticas que não seguiam esses padrões” (MARTINS; PICOSQUE; GUERRA, 2009, p. 10). Diante desse fato, a história do ensino da arte centrou-se no dese- nho, fundamentada em uma filosofia de educação autoritária, que tinha no produto final seu maior trunfo, menosprezando o processo de apren- der. Os objetivos, nessa concepção, baseavam-se na coordenação moto- ra, no acabamento, na técnica e no “bom comportamento”, sinalizando para atos de higiene, disciplina, ordem e organização e, principalmente, centrado na reprodução das atitudes e conhecimentos do mestre. A arte na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Funda- mental acompanha as trajetórias desse contexto histórico, artístico e social. Desse modo, é fundamental para o professor,hoje, compreender 1 “Cultura que enfatizava o contraste, o conflito, o dinâmico, o dramático, o grandiloquente, a dissolução dos limites, junto com um gosto acentuado pela opulência de formas e mate- riais.” (WIKIPÉDIA, 2010c). 2 “A arte neoclássica busca inspiração no equilíbrio e na simplicidade, bases da criação na Antiguidade. As características marcantes são o caráter ilustrativo e literário, marcados pelo formalismo e pela linearidade, poses escultóricas, com anatomia correta e exatidão nos con- tornos, temas ‘dignos’ e clareza.” (WIKIPÉDIA, 2010i). Capítulo 1 Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes 15 os caminhos trilhados pela arte/educação3 para a infância, no sentido de registrar os avanços em sua memória e romper com alguns resquícios que ainda perpetuam as instituições educativas. Um marco também significativo na trajetória das crianças e de suas famílias foi o evento da Revolução Industrial, no final do século XVIII. A mulher, nesse contexto, foi inserida no mercado de trabalho externo, fora do lar, sendo obrigada a deixar os filhos aos cuidados da escola. É nesse período, portanto, que surgem as primeiras instituições educativas para os pequenos. No Brasil, especificamente, essa preocupação foi mais forte na dé- cada de 20 do século XIX, quando estava latente no contexto social a construção de uma identidade nacional, na qual a criança era vista e compreendida como o futuro do país. Essa ideia dá margem à con- cepção pedagógica de que a criança exige cuidados e educação, ambos imprescindíveis para sua formação como cidadã. A institucionalização oficial da educação pré-escolar teve início na década de 80 do século XX, por meio da Constituição de 1988, que legitimou o atendimento às crianças de 0 a 6 anos. Já o termo Educação Infantil só foi de fato socializado com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996. No entanto, faz-se necessário pontuar algumas situações que ocor- reram nesse período, não apenas na Educação Infantil, mas, também, nos anos iniciais do Ensino Fundamental. A arte/educação, nesse con- texto, era vista pelos professores, pais e comunidade de forma geral como recreação, mero passatempo, passando a ter a especial finalidade de organizar materiais e apresentações “artísticas” em datas cívicas e comemorativas. Decorar a escola e dar suporte às outras áreas do co- nhecimento era a principal função da arte/educação. Nessa época, os documentos que subsidiavam as práticas pedagó- gicas dos professores/coordenadores eram os Cadernos de Atendimento ao Pré-Escolar, organizados e divulgados pelo Ministério da Educação 3 Utilizar o termo arte/educação foi uma opção nossa, especialmente pelo teor conceitual e atual que ele agrega. O termo fundamenta-se no conceito de arte, no currículo do ensino básico, como espaço para apropriação de conhecimentos e saberes, manifestações expres- sivas, diversidade cultural e redes de comunicação, sendo bastante utilizado por pesquisa- dores na área de arte/educação. Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes FAEL 16 e Cultura (MEC) (PILLOTTO, 1997)4. Os conteúdos dos referidos Cadernos enfatizavam a recreação em detrimento de um encaminha- mento também das questões voltadas à arte, à estética e à cultura. Na década de 90 do século XX, os conteúdos inseridos nos Ca- dernos voltaram-se para uma concepção sociointeracionista, na qual a arte/educação era vista como um eixo gerador, possibilitan- do a interdisciplinaridade com outras áreas do conhecimento e com as linguagens da arte (músi- ca, teatro, dança e artes visuais). Se, por um lado, essa década avançou nas questões pedagógi- cas e nas de arte/educação, por outro, houve uma tendência ao espontaneísmo, à individualida- de nos processos de aprendizagem e às ações com temáticas diversas (como datas comemorativas ou outros assuntos relevantes) como úni- ca possibilidade didática. Essas tendências são resquí- cios da década de 30, que foram intensificadas nas décadas de 50 e 60 do século XX, quando os estudos sobre a criatividade tomaram impulso nas áreas da psicologia e educação, dando sequência ao movimento da Es- cola Nova. Vale destacar alguns teóricos que desenvolveram pes- quisas a partir dessa concepção: Viktor Lowenfeld, Herbert Read e John Dewey. A Escola Nova, no que se refere à arte/educação, centrava-se na criança e em sua livre expressão, não aceitando qualquer tipo de inter- 4 Pesquisa realizada para a dissertação O ensino da arte na Educação Infantil, apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação, da Universidade Federal do Paraná. Área de concentração: currículo, linha de pesquisa em arte/educação. Os estudos de Lev Vygotsky (1896-1934) postu- lam uma dialética das interações com o outro e com o meio como a desencadeadora do desen- volvimento sociocognitivo. Para ele e seus cola- boradores, o desenvolvimento é impulsionado pela linguagem. De acordo com Vygotsky, é o próprio processo de aprender que gera e promove o desenvolvimento das estruturas mentais superiores (WIKIPÉDIA, 2010k). Saiba mais O movimento chamado Escola Nova esboçou-se na década de 20 do século XX, no Brasil. O mun- do vivia um momento de crescimento industrial e de expansão urbana e, nesse contexto, um grupo de intelectuais brasileiros sentiu a neces- sidade de preparar o país para acompanhar esse desenvolvimento, sendo a educação por eles per- cebida como o elemento-chave para promover a remodelação requerida ( WIKIPÉDIA, 2010e). Saiba mais Capítulo 1 Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes 17 venção, fosse de imagens ou do professor. Como afirmam Abramowicz e Wajskop (1995, p. 85): As crianças podem desenhar espontaneamente. A intervenção da educadora é necessária para introduzir as técnicas e a histó- ria do mundo das artes. Para isso é preciso tornar acessíveis as ferramentas e os suportes que permitem a expressão das crian- ças. Deve-se ampliar seu repertório mostrando obras de arte. A concepção da Escola Nova traz em seu bojo uma ruptura de valores, especialmente no que se refere aos métodos rígidos da escola tradicional. Os interesses se voltam para os aspectos lúdicos, e a psi- cologia conquista espaços no que diz respeito às questões referentes à autoestima da criança pela via da arte. Para Silva (1987, p. 34), “a livre expressão como conceito central da metodologia de arte/educação conduziu à convicção de que o funda- mental seria a criança expressar o seu mundo interior e que, portanto, a arte poderia ser ensinada”. Os professores passam a assumir o papel de orientadores, estimulando os alunos no desenvolvimento de suas ativi- dades. O que importava era a experiência em si, o processo de fazer, o prazer da criança no contato com materiais, suportes e espaços. No Brasil, temos importantes nomes das artes que foram inspira- dos pela Escola Novista, como: Mário de Andrade, colecionando dese- nhos infantis, Augusto Rodrigues, inspirador da criação das escolinhas de arte, Anita Malfatti, Flávio de Carvalho, entre outros. Na década de 70 do século XX, esteve no auge a tendência tecnicista, visualizada na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional n. 5.692/1971, que le gi timou a “educação artística” (nomenclatura utilizada naquela época) como parte integrante e obrigatória do currículo escolar. A controvérsia nessa lei e em sua interpretação ficou por conta da posição da educação artística no currículo como obrigatória, mas não considerada uma disciplina com conteúdos, filosofia e metodologias próprias. Diante desse fato, a polivalência ganha forças, impondo ao “A polivalência no ensino de artes refere-se à ideia de que um mesmo profissional poderia dar conta de ensinar artes visuais, teatro, mú- sica e dança. Alia-se a isso a formação superior precária desse profissional, nos chamados cursos de Licenciatura Curta, muito comuns na década de 70.” (WIKIPÉDIA, 2010d). Saiba mais Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes FAEL 18professor o domínio das linguagens das artes plásticas, do desenho geo- métrico, da música e das artes cênicas. Em outras palavras, o docente tinha que dar conta e ser “capaz de lecionar música, teatro, artes visuais, desenho, dança e desenho geomé- trico, tudo ao mesmo tempo, da 1ª a 8ª série [...]” (BARBOSA, 1996, p. 10). Isso desencadeou uma série de atividades centra- das na técnica pela técnica, no desenho mimeografado, na exe- cução de “teatrinhos e musiqui- nhas”, com a finalidade de fixar conteúdos de outras áreas de co- nhecimento, entre outras. A música, na trajetória his- tórica, teve pouca inserção nas escolas e somente por volta de 1950 foi incluída no currículo. Ressalta-se a importância de Heitor Villa-Lobos nessa inclusão e de sua influência para que a música fosse compreendi- da como arte/cultura e direito de todo cidadão. Porém, no interior das escolas, era dado destaque somente ao canto orfeônico, à memorização de hinos e ao solfejo. Pouca ênfase se dava à música como possibilidade de expressão e sensibilidade. Segundo Martins, Picosque e Guerra (2009, p. 11), nessa época, [...] surgiam também algumas disciplinas como “artes do- mésticas”, “trabalhos manuais” e “artes industriais”, em cujas aulas os meninos eram separados das meninas, pois havia artes “femininas” – bordados, tricô, roupinhas de bebê, aulas de etiqueta, etc. – e artes “masculinas” – geralmente exe- cutadas com madeira, serrote, serrinhas, martelo: bandejas, porta-retratos, descanso de pratos, sacolas de barbante, ta- petes de sisal. O final da década de 90 do século XX marcou definitivamente a arte/educação, pois pesquisas foram intensificadas e novas abordagens surgiram nas produções de alguns teóricos, como Barbosa, Martins, Fusari, Buouro, Ferraz, Cunha, Pillar, entre outros. Além disso, docu- mentos em forma de propostas curriculares e os Referenciais Curricula- Heitor Villa-Lobos (1887-1959) foi um maes- tro e compositor brasileiro. Destacou-se por ter sido o principal responsável pela des- coberta de uma linguagem peculiarmente brasileira em música, sendo considerado o maior expoente da música do Modernismo no Brasil, compondo obras que enalteciam o espírito nacionalista, nas quais incorpora elementos das canções folclóricas, populares e indígenas (WIKIPÉDIA, 2010g). Saiba mais Capítulo 1 Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes 19 res Nacionais (1998) trouxeram perspectivas para um outro olhar sobre a arte, integrando ações com foco nos processos de leitura/reflexão, na construção poética e na contextualização cultural. É importante destacar a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional n. 9.394/1996, que ressalta, em seu Artigo 26, parágrafo 2º, o seguinte texto: “O ensino da arte constituirá componente curricular obrigatório, nos diversos níveis da educação básica, de forma a pro- mover o desenvolvimento cultural dos alunos.” (BRASIL, 1996). Isso nos leva a pensar que a concepção de arte no currículo, compreendi- da como conhecimento, expressão, criação, imaginação e percepção, é fundamental para se buscar outros caminhos metodológicos que prio- rizem a condição humana e a construção dos saberes. Processos de aprendizagem em arte: interfaces entre o ser e estar professor Existe diferença entre ser professor e estar professor? Pensamos que a trajetória de estar professor está intimamente ligada à compreensão do que é ser criança hoje. Para isso, faz-se necessário revisitar a nossa própria infância, percebendo qual criança fomos e o que somos hoje dela. São as memórias que potencializam nosso estar professor, pois nos remetem às experiências com a arte, com os espaços, com as pessoas e com as relações que construímos. Essas experiências, muitas vezes, perdem-se no tempo/espaço; no entanto, estar professor de crianças implica reavivar memórias. E não apenas isso: implica, também, reani- má-las em ações. Um professor mediador não é um mero observador das crianças. É, principalmente, aquele que participa, envolve-se e aprende com as atividades em arte. A dimensão sensível na ação pedagógica parte desse princípio, pois o trato com as crianças requer ir além de ensinar. O professor do qual estamos falando é aquele que tem sensibilidade para se apropriar da arte como possibilidade de sua própria construção hu- mana, desdobrando-a em ações pedagógicas no espaço da escola, arti- culadas à sensibilização poética. Nessa perspectiva, é possível compreender o ato de aprender e co- nhecer arte também como processo de simbolização e reorganização Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes FAEL 20 dos signos que interpretamos. É dessa forma que criamos ideias e, para tê-las, devemos ser instigados a criar. “Ter ideias é, em certo sentido, es- tar engajado num processo de formação de conceitos nos quais estes são abstraídos ou criados, ou seja, transformados em realizações formais.” (MEIRA, 2003, p. 20). Assim, é possível aprender e conhecer os códigos subjetivos da arte e relacioná-los às nossas experiências, dando formas e sentidos diferenciados e únicos a partir da maneira como os vemos e como os internalizamos. Nesse caso, perceber o mundo significa uma atitude estética, isto é, por meio da arte podemos aprender a ver todas as coisas de um modo especial, superando os limites da não compreensão para uma compreensão, ainda que subjetiva, de nós mesmos. Nesse aprendizado, existe sempre uma escolha: por onde olhamos, o que queremos ver e o que fazemos com o que selecionamos, perce- bemos e vemos – apropriação – transformação – ressignificação. Por esse viés, podemos pensar na apreensão do conhecimento “nos níveis da racionalidade (argumentação/reflexão) e do sensível (emoção, intuição, percepção, etc.). Ambos devem ser considerados nos processos de apren- dizagem, pois fazem parte do contexto cotidiano e, sobretudo, da expe- riência humana” (PILLOTTO; SCHRAMM; CABRAL, 2004, p. 53). Também para Vasconcelos (2001, p. 98), “a pessoa cria ao reco- nhecer novas relações em antigas questões, ao construir respostas às situações-problema, ao redimensionar os próprios aprendizados”. Sendo assim, a construção do conhecimento só tem sentido quando ele é so- cializado e compartilhado com as pessoas. Para tanto, é imprescindível que as nossas práticas pedagógicas estejam fundamentadas em ações fle- xíveis, democráticas e, principalmente, comprometidas, considerando cada criança como um ser único em um universo de muitas diferenças. O professor pode ser um provocador de afeto, forma sensível de cons- truir relações de confiança e de amorosidade, o que constitui um mapa sensível do que ocorre no contexto da escola, por meio do qual inicia sua trajetória de aprendizagem contínua sobre como ser/estar professor. Uma aprendizagem que, sem a relação afetiva com sua própria obra pedagógica, sem a relação afetiva com suas cognições, seus sentimentos, emoções e ações acabam lamentavelmente em desencantamento. Desencantar-se também é parte do in- Capítulo 1 Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes 21 ventário das relações afetivas. Mas ponto arriscado de inflexão no qual estamos em disponibilidade para optar permanecer no desencanto ou dar a virada criativa para transmutar dor em prazer (MEIRA; PILLOTTO, 2010, p. 13). A relação de afeto entre a criança e o professor está ligada à experiên cia criadora de ambos. A arte como experiência humana está no âmbito dessas relações, pois manifestar-se por meio da expressão artística significa a possibilidade de aprender sobre nossas capacidades de criar e ver materializadas nossas fantasias, ideias e vontades. Permi- te-nos compreender a nós mesmos e aos outros, em um movimento intenso de construções de conhecimentos e sensibilidades. Nessa abordagem, vale destacar alguns aspectos importantes para ser/estar professor na infância: o emocional, o cognitivo e o comporta- mental (FERREIRA, 2001). Um professor que tem ativada sua capaci- dade de observar/interpretar é capazde identificar suas emoções e ati- tudes, aprendendo a expressá-las e, sobretudo, percebê-las também nas crianças. Saber lidar com seus sentimentos e os dos alunos, entenden- do-os e controlando-os, é fundamental na construção de um ambiente em que os conflitos possam ser minimizados, dando vez às relações de afeto, de amor, de ética e prazer (MEIRA; PILLOTTO, 2010). Nos processos de apropriação do conhecimento e de saberes, o professor precisa saber diferenciar emoção e ação na criança, pois nem sempre a primeira precede a segunda. Em algumas situações, a emoção é internalizada e manifesta em gestos e expressões, como movimentos mais bruscos, olhar mais demorado, aperto de lábios, silêncio, ruídos, isolamento, etc. A interpretação desses códigos infantis pode ajudar o professor a melhor compreender a singularidade de cada criança, articulando-os com as demais particularidades, formando um conjunto de elemen- tos que culminarão em dinâmicas socioculturais, ou seja, movimentos dialógicos de crianças com crianças, professor com crianças, famílias e comunidade em geral. Entender o que as crianças necessitam e de- sejam contribui para que as interações aconteçam sempre pautadas no respeito às diferenças. Essa atitude por parte do professor permite a resolução de problemas e, principalmente, o aprendizado de como lidar com eles. Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes FAEL 22 No que diz respeito aos aspectos comportamentais, a expressão não verbalizada da criança (bastante comum) revela seus pensamentos, atitudes e emoções. É importante para o professor acompanhar esse processo, no sentido de identificá-los para que possa ajudar a criança em sua trajetória cognitiva e sensível. Para La Taille, Dantas e Oliveira (1992), as manifestações expressivas (plástica, verbal, dramática, escri- ta, entre outras) estimulam os processos simbólicos das crianças, culmi- nando em processos de aprendizagem. Ser/estar professor implica uma concepção de educação humanís- tica, como aborda Saltini (1999), ao nos levar a refletir sobre o contexto educacional. Segundo a autora, as escolas deveriam estar mais atentas às questões da infância, do afeto e da amorosidade, e menos preocupadas em transmitir conteúdos e técnicas pedagógicas. A dimensão sensível na ação pedagógica Ser sensível: que caminho é esse? É possível educar pela sensibilidade? Às vezes, temos a impressão de que a escola ainda prioriza um ensino e uma aprendizagem centrados em um pensamento linear, disciplinar e téc- nico, em detrimento dos aspectos de uma educação pela sensibilidade. A educação pelo sensível é imprescindível nos processos de apren- dizagem infantil, uma vez que, ao se apropriar e internalizar os saberes, a criança é afetada pelos sentidos, que estão articulados à imaginação, criação, percepção e emoção. Dentre esses elementos, a criatividade é um dos mais pesquisados, seja pela área da psicologia, da arte ou da estética. Mas o que compreen- demos, enquanto professores de crianças, sobre o ato de criar? E o que ele implica no desenvolvimento do ser humano? Ostrower (1986, p. 10), sobre essa questão, afirma que “o homem cria, não apenas porque quer, ou porque gosta, e, sim, porque precisa; ele só pode crescer, enquanto ser humano, coerentemente, ordenando, dando forma, criando”. Ou seja, toda experiência requer uma abertura sem qualquer tipo de preconceitos; um acolhimento dos mais variados sentidos. Nessa trama, agregam-se razão e sensibilidade, desprendimento e construção de saberes. Criar não é privilégio somente de cientistas e artistas; é capa- cidade inerente aos seres humanos, mesmo que em níveis diferenciados, uma vez que nossos contextos também se diferenciam, como valores, crenças, conhecimentos, culturas, entre outros. Capítulo 1 Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes 23 Quando estamos receptivos a novas experiências, capazes de manter nossas singularidades e reintegrá-las ao coletivo, temos mais condições de criar vínculos afetivos, aprender e amadurecer. A crian- ça espera dos professores essa postura diante da vida e da educação. Cada um só pode falar/agir em nome de suas próprias experiências. Ao criar, corpo e mente formam um todo absoluto, absorvendo sen- tidos e percepções. Dessa forma, observar, identificar, absorver, inter- nalizar, relacionar e interagir são caminhos criativos que apresentam uma maneira dinâmica de aprender, na qual o professor e a criança tornam-se atores, que constroem significados a partir dos cenários culturais. Esse processo requer um movimento constante, que rompe com qualquer tipo de passividade. Em uma educação pela sensibilidade, é necessário dar destaque aos processos perceptivos, que têm, em suas bases, segundo Ostrower (1986), uma forma de absorver o mundo interno relacionado ao ex- terno na dimensão da compreensão. “Tudo se passa ao mesmo tempo. Assim, no que se percebe, se interpreta; no que se apreende, se compre- ende. Essa compreensão não precisa necessariamente ocorrer de modo intelectual, mas deixa sempre um lastro dentro da nossa experiência.” (OSTROWER, 1986, p. 57). Nas práticas educativas, a percepção pode ser um grande diferencial para o professor. É fundamental, nesse caso, que ele construa laços afe- tivos com as crianças, buscando perceber seus interesses/curiosidades, suas necessidades/anseios, organizando de forma compartilhada ações que envolvam aprendizagens significativas. Tão importante quanto o que pensamos e desejamos que as crianças aprendam é o que elas são capazes de aprender e o que as move para esse aprendizado. Nesse sentido, a escuta atenta do professor, suas observações refe- rentes à corporeidade e ao movimento da criança são ações indispensá- veis para o processo comunicacional e de aprendizagem sensível. No entanto, o desenvolvimento da percepção, em uma educação sensível, pressupõe um eterno aprendizado, pois essa atitude é estruturada por processos seletivos, que envolvem as condições físicas e psíquicas do professor e das suas necessidades e expectativas com relação à criança. Diante dos inúmeros estímulos do contexto contemporâneo, es- pecialmente das mídias, essa seletividade representa uma primeira ins- tância da filtragem de significados. Ou seja, tudo que é absorvido pelo Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes FAEL 24 professor e pela criança, no interior da escola e fora dela, interfere e influencia na filtragem do que é percebido: conflitos, interesses, neces- sidades, entre outros. Nesse contexto, outro elemento de grande ajuda para o professor é a emoção. Segundo Gardner (1999, p. 89), as emoções “servem como um ‘sistema primário de aviso’, assinalando tópicos e experiências”. São perceptíveis os desencontros com relação a esse sentimento no contexto da escola. Os professores encontram dificuldades em fazer uso das suas emoções e reconhecê-las nas crianças. Os cheiros, os olhares, os sons, os espaços e as relações, de uma forma geral, nos afetam e deixam rastros. Portanto, vale salientar que os sinais subjetivos nas relações cons- truídas acontecem, também, por meio das emoções. Segundo Schott (1996, p. 234), “ao admitir o papel cognitivo da emoção e da senso- rialidade, também desafiamos a concepção de que a argumentação é a principal forma do conhecimento”. O autor relaciona a cognição à experiência, destacando o quanto é importante que a escola desenvolva projetos focados na interação dos sujeitos com situações vividas. Na mesma linha de pensamento, Gardner (1999, p. 57) chama a nossa atenção, afirmando que “o sensível e o intelectual não estão dis- sociados dos processos cognitivos, uma vez que o indivíduo necessita do sistema corporal, sensível e cognitivo para comunicar-se no mundo das ideias, das sensações e das emoções”. Vale dizer, então, que uma educação pelo sensível está pautada no saber lidar com as nossas emoções e com as das crianças, ocorren- do sempre por meio da experiência da realidade e das relaçõesafetivas construídas. No contexto da sala de aula, é vital lidar com as emoções, uma vez que, desde muito cedo, enfrentamos questões que apontam para a violência, a corrupção, a inversão de valores, a competitividade e tantas outras que reiteram o individualismo. Todavia, identificar, in- terpretar e compreender as emoções da criança é ter um olhar sensível, que exige uma educação para a sensibilidade. Esse é, também, um olhar estético, que pode ser conduzido pelo professor como sentimentos de prazer, sentidos e reflexão. “O sentido do estético é um sentido sempre receptor de um perceptor que quer apro- fundar-se nesse mais além da imagem, transcendê-la, voltando-se sobre si mesmo sem perder seu entorno.” (FERNÁNDES, 2001, p. 129). Capítulo 1 Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes 25 Da teoria para a prática A atividade apresentada a seguir poderá auxiliar o professor em sua prática profissional, contribuindo tanto na Educação Infantil, quanto nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Proposta: autorretrato ● Organizar as crianças em uma roda de conversa e deixar circular entre elas um ou mais espelhos pequenos, por in- termédio dos quais estarão se observando, fazendo caretas e expressões diversas. O professor, então, poderá interagir com questões motivadoras, incentivando os alunos a terem um olhar mais atento. ● A seguir, apresentar às crianças um papel em formato A3 e tintas de diversas cores, que poderão ser utilizadas com pincéis ou com as mãos, para que os pequenos se expressem por meio do autorretrato. É importante ter cautela com a expectativa de representações que correspondam à realidade, pois, nessa fase, as crianças estão experimentando o corpo, o espaço e tudo o que está à sua volta e não estão preocupadas em representar o real. A fase das garatujas é muito importan- te para a criança, que inicia um processo de explorar o seu universo. Outro exercício bastante interessante nessa fase são os decalques e impressões com os mais diversos suportes e materiais. ● Finalizando essa ação, o professor deverá propor às crian- ças a construção de um painel coletivo com os autorretratos recortados e colados em suporte maior, podendo ajudar ou recortar as produções das crianças que estão em processo de aquisição de habilidade motora. Para que as produções infantis sejam valorizadas e respeitadas, o professor deverá organizar a exposição do painel de forma a dar visibilida- de e promover a educação estética. Também é interessante que seja elaborado um texto explicativo sobre o processo de aprendizagem, contendo as falas das crianças e do professor sobre as experiências vivenciadas. Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes FAEL 26 Síntese Neste capítulo, a intenção foi provocar a reflexão do leitor para questões que tratam a arte como propulsora nos processos de apren- dizagem humana, especialmente nos contextos da Educação Infantil e dos anos iniciais do Ensino Fundamental. O percurso das trajetórias da arte/educação no Brasil busca moti- var os leitores no sentido de refletirem sobre suas próprias caminhadas e em que medida a arte/educação, na Educação Infantil e anos iniciais, afetou os seres sensíveis que, hoje, são. A partir dessa leitura, é possível nos perguntarmos: a arte/educação hoje é compreendida da mesma for- ma que anos atrás? O que mudou? Por que mudou? Qual a sua contri- buição para o desenvolvimento cognitivo e sensível da criança? Outro destaque, neste capítulo, foi dado aos processos de apren- dizagem em arte e à condição de ser e estar professor/educador. O que nos leva a tomar decisões sobre nossas posturas frente ao ensino e à aprendizagem da criança? Qual o papel de um professor/mediador? As questões tomam um rumo focado na experiência de ser/estar professor e em como a arte e suas linguagens e expressões podem ser um diferen- cial na atitude e nas práticas desse profissional. 27 Este capítulo busca refletir sobre questões referentes à arte na infância, bem como à arte no currículo da Educação Infantil e dos anos iniciais do Ensino Fundamental. Arte na infância Esta seção tem o objetivo de propor uma reflexão sobre as questões da infância e da arte na infância, no sentido de pensar sobre as rupturas que ocorrem na transição da Educação Infantil para o 1º ano do En- sino Fundamental. Segundo Kramer (2006, p. 208), a “[...] Educação Infantil e Ensino Fundamental são instâncias indissociáveis; ambas en- volvem conhecimentos e afetos; saberes e valores; cuidados e atenção; seriedade e riso”. Ainda segundo a autora, não são as crianças a fragmentar o conhe- cimento, são os adultos e as instituições que constroem grandes lacunas e conflitos entre Educação Infantil e Ensino Fundamental, deixando de fora a experiência com a cultura e com a estética, elementos fundamen- tais na articulação dos saberes e deveres. Partindo dessas ideias, a arte, no currículo, deve priorizar os espa- ços, o lúdico, os jogos e brincadeiras, a imaginação, a percepção, o movimento e a criação nos processos de aprendizagem da criança. Os professores devem considerar que a criança aprende brincando e que, nessa fase infantil, a apropriação dos conhecimentos (cognitivos e sensíveis) deve ser explorada de maneira lúdica, dando ênfase à fami- liarização com as linguagens da arte e do mundo imagético. Uma educação pela infância 2 Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes FAEL 28 Nesse contexto, o jogo e a imaginação estão totalmente relaciona- dos, e é essa última a atividade básica da criação até o final de nossas vidas. A imaginação, então, é a responsável pela construção da cultura humana, sem a qual não conseguiríamos nos adaptar/ambientar a no- vos espaços, uma vez que tudo em nosso entorno é construído a partir da nossa imaginação. Por outro lado, as experiências com diferentes espaços, materiais e suportes podem contribuir para o desenvolvimento criativo da criança, pois ampliam a sua percepção, imaginação, intuição, criação e emoção. “Saber utilizar materiais e suportes e os espaços diversificados, além da alegria da investigação, aguça a curiosidade das crianças e lhes dá possibi- lidades de materializarem as suas ideias por meio das manifestações artís- ticas e culturais.” (PILLOTTO; PEREIRA; ROPELATO, 2009, p. 78). Meira (2003, p. 22), sobre essa questão, também nos orienta que: Trabalhar criadoramente um material não é somente expres- sar-se, é possibilitar que esse material também se expresse, ge- rando, a contrapelo, comportamentos de simultaneidade com quem o trabalha, ou dialoga virtualmente. Tais comportamen- tos são de apreensão, compreensão e atuação. Quando as crianças estão em contato com as tintas, por exem- plo, podem lambuzar-se, espalhando o material pelo corpo (mãos, pés, rosto, etc.) e pelas superfícies onde se encontra (chão, papéis, objetos, etc.). Nesse sentido, é importante evitar expressões, como: “não pode se sujar”, “cuidado com a roupa”, “não suje a mesa, nem o chão”, entre outras, pois podem inibir o processo de criação infantil. Como aborda Richter (2001, p. 53, grifo do autor), Só falta pedir para não sujarem os pincéis! Ou melhor: para não pintarem! Pintar e sujar tornam-se um ato só. Esses nãos geralmente são ditos em tom de voz já irritado e enojado pelo adulto de cara amarrada (talvez por suas lembranças de infân- cia). Adulto preocupado e nada satisfeito ante o que já sabe que irá acontecer: o caos. Ainda para a autora, esse caos pode ser aproveitado para a apren- dizagem de cooperação entre as crianças e o professor durante a reor- ganização do ambiente com a limpeza dos materiais, atividade que nem sempre é entendida como ação de aprendizagem e organização de pensamento. Capítulo 2 Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes 29 Compreendemos que as linguagens da arte, no currículo, devem proporcionar atividades pedagógicas articuladas ao lúdico, ao jogo e ao brincar, pois possibilitam às crianças um olhar mais sensível e apurado,integrando-as aos espaços sociais, construindo o sentimento de pertença. As linguagens da arte podem contribuir significativamente para o desenvolvimento infantil, tendo em vista o potencial que podemos ex- trair delas. As ações que incluem o movimento, por exemplo, são ricas na interação simbólica que a criança estabelece com o seu contexto e oportunizam o crescimento pessoal. Martins, Picosque e Guerra (1998, p. 133), sobre esse assunto, relatam que “o encantamento do faz de conta vira teatro e deixa-se conduzir com um novo significado, isto é, representar com parceiros uma história fictícia para outros”. Dessa forma, as crianças legitimam os seus direitos no grupo, construindo relações entre o singular e o coletivo. Nesse processo de conexões entre corpo e espaço e corpo dialogando com outros corpos, as crianças também aprendem a ouvir, manifestar suas opiniões, respei- tar as diferenças e a ordenar seu pensamento. Pular, correr, agarrar, passar por obstáculos e subir em objetos são ações ligadas à necessidade da criança de experimentar o corpo e de- senvolver sua autonomia. A expressão corporal é, sem dúvida, um forte quesito para a construção de identidades. Da mesma maneira, a expressão sonora contribui para que a criança participe como ouvinte e intérprete e para que experimente a sonorida- de do seu corpo, dos objetos, dos ambientes natural e cultural. Segundo Martins, Picosque e Guerra (1998, p. 131), “o modo de ser da lingua- gem musical tem como matérias-primas sons e silêncios articulados em pensamentos musicais. Assim, compor implica imaginar, relacionar e organizar sons, ouvindo-os internamente”. É possível, então, pensar em arte como linguagem, conhecimento, expressão, cultura e produção de sentido, compondo o universo curricular. Ainda para as autoras: A criança olha, cheira, toca, ouve, se move, experimenta, sen- te, pensa... Desenha com o corpo, canta com o corpo, sorri com todo o corpo. Chora com todo o corpo. O corpo é ação/ pensamento. Seu pensamento se dá na ação, na sensação, na percepção, sempre regado pelo sentimento. Convive, sen- te, reconhece e repete os símbolos do seu entorno, mas não é, ainda, um criador intencional de símbolos (MARTINS; PICOSQUE; GUERRA, 1998, p. 96). Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes FAEL 30 Esses aspectos nos remetem à arte no currículo, especialmente volta- do à infância, período em que a criança age e pensa movida pelo imagé- tico. Para Eisner (1988), a arte é fundamental no currículo, pois, no ato do fazer artístico, a criança torna-se capaz de expressar melhores ideias e sentimentos, desenvolve a autoestima, a empatia e a capacidade de sim- bolizar, além de possibilitar o pensamento flexível e a autonomia. O professor pode, ainda, ampliar os repertórios artísticos, estéticos e culturais das crianças, bem como as formas de comunicação, sociais e simbólicas, as quais são necessárias na construção de identidades. Isso nos mostra que a função da arte, através dos tempos, foi, continua e sempre será uma ação de construção da realidade. Nas artes, há uma construção de representações do mundo real e imaginário, que podem contribuir para que as pessoas criem para si mesmas uma possibilidade de futuro (EFLAND, 2005). Portanto, o objetivo essencial da arte, no currículo escolar e fora dele, é o de contribuir para a compreensão da “paisagem social e cultural” da qual cada um de nós faz parte. Vale refletir sobre as palavras de Fusari e Ferraz (1992, p. 52), quando afirmam que “todos nós nos extasiamos ao ouvir o canto dos pássaros e ver o nascer do sol ou a dança das borboletas, porque desen- volvemos um conhecimento específico de categorias sonoras, visuais, movimento, ritmo, etc.”. Permitir que as crianças vivenciem experiên- cias sensíveis com as linguagens da arte possibilita a aquisição de sa- beres estéticos, desenvolvendo, nelas, um olhar mais perceptivo sobre o seu entorno. A arte no currículo da Educação Infantil: procedimentos metodológicos Que espaços a escola oferece para a criança no contexto da Edu- cação Infantil? Espaços que promovem a autonomia ou que levam à passividade? Espaços que possibilitam a interação ou que reduzem o movimento? Existe o espaço ideal? O que pensamos sobre isso? De uma forma geral, observamos que as escolas, em sua grande maioria, ainda organizam seus espaços com móveis e objetos em exces- so, ocupando a maior parte do ambiente, dificultando a mobilidade e as produções expressivas das crianças. Capítulo 2 Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes 31 Em uma concepção que vê a criança como um sujeito em proces- so de aprendizagem, que se expressa e comunica-se por meio das lin- guagens sonoras, corporais e visuais, deve-se pensar nos espaços como construção de identidades. Os ambientes, portanto, são lugares de significações e intencionalidades. Neles e por meio deles construímos quem nós somos e quem desejamos ser. “A estrutura e o arranjo dos espaços escolares refletem culturas, filosofias e escolhas ali estabelecidas que favoreçam ou não a aprendizagem.” (MOGNOL, 2007, p. 118). As crianças pequenas são essencialmente sensoriais e, por isso, tran- sitam pelos espaços buscando sentidos. De um lado para outro, tocam nos objetos, ativando o sentido do tato; experimentam coisas usando o paladar e o olfato; criam sonoridades, explorando o sentido da audição; movimentam-se descobrindo obstáculos, frestas e cantos, por meio do corpo em interação com o espaço, outros corpos e objetos. Para a organização desses espaços, são necessários a sensibilidade e o desprendimento do professor, no sentido de ceder à vontade de orga- nizar tais ambientes apenas sob o seu ponto de vista, quando está preso a sentimentos de cuidar/proteger e à insegurança de romper com algu- mas rotinas. Algumas perguntas podem nos ajudar em nossas escolhas espaciais: quais espaços são motivadores para as crianças? Quais os que podem estimular sua curiosidade, desafiando-as a explorá-los? Pensar na organização espacial para as crianças, no contexto da es- cola, é pensar em possibilidades que provoquem sentidos e afetos, tanto nos ambientes internos, quanto nos externos. O mobiliário, os obje- tos e demais elementos que formam o ambiente interno, por exemplo, podem ser agrupados de modo a permitir o movimento das crianças. Além disso, é necessário pensar em espaços que promovam ações coleti- vas e individuais; espaços que respeitem a singularidade e a diversidade, nos quais todas as crianças sintam-se acolhidas e motivadas a aprender. Como aborda Richter (2001, p. 53), Torna-se fundamental o adulto planejar sua ação em relação à organização do espaço físico para suportar o inevitável e necessá- rio caos inicial, pois são destes momentos, com a ajuda do adul- to, que emerge a organização individual e coletiva da criança. Deve-se atentar, todavia, para a organização desses espaços no que diz respeito aos cuidados necessários, evitando acidentes de percurso, Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes FAEL 32 como: pisos escorregadios, angulações irregulares nas paredes, escadas sem proteção de corrimão ou portão, entre outros. E quanto aos objetos e brinquedos nesses espaços? A escolha deles pelo professor deve ser bastante cautelosa, pois pode envolver alguns riscos, e a segurança da criança deve ser preservada. Portanto, é preciso prestar atenção em brinquedos, como chocalhos com pontas ou de ma- terial frágil, que podem quebrar facilmente. Objetos e/ou brinquedos muito pequenos também podem causar danos, pois as crianças podem engoli-los. Pigmentos e massas constituídas de materiais tóxicos devem ser substituídos por aqueles que as crianças possam ingerir. Vale lembrar que, nessa fase, é comum elas colocarem objetos na boca, mordê-los, pegá-los, esmagá-los ou colocá-los nos olhos, orelhas e nariz, por exem- plo. Por isso, os materiais oferecidos devem ser selecionados cuidadosa- mente. As crianças, segundo Boff e Stamm (2006a,p. 11), [...] têm uma visão gestáltica, isto é, uma visão do todo. Não percebem detalhes como cílios nos olhos de uma boneca ou espelhos retrovisores em ca0rros. No entanto se encantam com bonecas de pano por serem quentinhas e aconchegan- tes e com carrinhos de rodas de madeira que podem ser puxados. A adequação do material é importante em todo o processo de construção da criança, pois alguns deles podem contribuir significa- tivamente, como gizes de cera, têmpera, massas de modelar, papéis e suportes resistentes (por exemplo, caixas de papelão, cartolinas, papel kraft, dupla face, entre outros). A seguir, apresentamos algumas possibilidades de materiais para crianças pequenas. Têmpera Material utilizado: uma caixa de ovo, vinagre, anilinas em cores variadas e água. Como fazer: separe a gema da clara, lembrando-se de retirar da gema a película que a reveste. Misture bem as gemas, colocando-as em pequenos recipientes, misturando a anilina, duas pequenas gotas de vinagre e um pouco de água. Bata as claras em neve e deixe descansar. Retire o soro e misture-o com anilina, duas gotas de vinagre e um pouco de água. Capítulo 2 Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes 33 Receita de tinta caseira Material utilizado: um copo e meio de água, uma pitada de anilina (na cor desejada), uma colher de sopa bem cheia de amido de milho e uma colher de sopa de sabão em pó. Como fazer: colocar um copo de água para ferver, dissolvendo nela a ani- lina. Assim que ferver, despeje o amido de milho, já diluído em meio copo de água, mexendo rapidamente, sem parar. Engrossando essa mistura, retire-a do fogo, adicionando sabão em pó. Bata bem até esfriar. Receita de massa para modelar Material utilizado: duas xícaras e meia de amido de milho, uma xícara de sal, meia xícara de água, uma pitada de corante (na cor desejada) e umas gotinhas de vinagre. Como fazer: misture todos os ingredientes e leve a massa ao forno em banho-maria até que se desprenda da panela. Guarde em saco plástico ou vidro bem tampado. Cola colorida Material utilizado: cola branca, pigmentos ou guache. Como fazer: basta misturar todos os ingredientes. Guache Material utilizado: uma colher de sopa de carbonato de sódio, uma colher de sopa de pó xadrez, na cor desejável, duas colheres de goma arábica, vinte gotas de desinfetante, quarenta gotas de glicerina. Como fazer: basta misturar todos os ingredientes. Tinta nanquim Material utilizado: sete partes de pigmento xadrez, quatro partes e meia de goma arábica, seis partes de água, meia parte de glicerina, vinte gotas de desinfetante. Observação: uma parte equivale a ¼ do material. Como fazer: basta misturar todos os ingredientes. Além disso, vale ressaltar a importância de estimular o contato com elementos da natureza, como areia, folhas, água, alimentos, barro e grama, possibilitando às crianças a construção de conceitos. Também é importante permitir o movimento da criança com os pés descalços sobre diferentes texturas, a exemplo: pedrinhas, tapetes, madeira, gra- ma, areia, lama, além de superfícies quentes, frias, úmidas, ásperas e macias. Essas experiências poderão estimular as terminações nervosas, Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes FAEL 34 possibilitando o exercício de preensão, que é imprescindível em todo o processo de amadurecimento infantil. Nessa fase de vida, o movimento corporal é vital para o desen- volvimento cognitivo e sensível da criança, pois ela é capaz de entre- gar-se “integralmente ao movimento permitindo que a profundidade aflore à superfície como expressão da própria vitalidade” (MEIRA; PILLOTTO, 2010, p. 72). Pelo movimento, a criança interage com as pessoas à sua volta, de- monstrando suas necessidades e vontades. Nos movimentos corporais de braços, pernas, ombros, cabeça e pés, a criança amplia seu conheci- mento espacial e inicia seu processo de consciência corporal. Segundo Boff e Stamm (2006b, p. 12), Ter consciência do seu corpo, da força de seus braços e pernas, da extensão de seus membros e do seu próprio corpo são alguns conceitos de sua corporeidade. Também é importante irem aprendendo aos poucos, através da interferência dos professores, quais as necessidades básicas do seu corpo, como, por exemplo, saber da necessidade de tomar água depois de brincar ao sol ou de jogar bola ou brincar de pega-pega. São conceitos básicos de necessidade física que devemos oferecer às nossas crianças. Da mesma forma, é possível perceber os sentimentos de alegria, tristeza, desagrado, dor, aflição, espanto e dúvida pelas expressões faciais, por meio das quais a criança se faz entender pelo adulto. Para que haja uma interação entre criança e professor, é fundamental que esse último esteja atento às manifestações corporais/expressivas de seus alunos. Na Educação Infantil, é necessário dar prioridade ao movimento, explorando e estimulando todo o corpo e a sua relação com o espaço e as outras crianças. Segundo Boff e Silva (2007, p. 88), [...] caminhar, correr, saltar, subir e descer escadas e rampas, subir em árvores são exercícios que a instituição educacional precisa fa- vorecer, pois são eles que vão promover a consciência corporal, o freio inibitório para as atividades que preparam a criança para a escrita, a consciência rítmica, a localização espacial. A partir das considerações referentes à arte no contexto da infân- cia, vale refletir sobre a necessidade de mudança de postura do adulto diante das exigências de um novo tempo e de uma outra criança: a do século XXI. Capítulo 2 Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes 35 A arte no currículo dos anos iniciais: procedimentos metodológicos Falar da arte no currículo dos anos iniciais do Ensino Fundamen- tal é caminhar por duas questões relevantes: a primeira, quando existe, nas instituições educativas, a figura do professor de arte, e a segunda, e mais comum no Brasil, a não existência desse profissional. Como, então, lidar com essas situações? É importante considerar que, mesmo existindo a atuação do pro- fessor de arte nos anos iniciais, é imprescindível que o professor regente transite pelo campo da arte com as crianças e com esse profissional de forma integrada, em que ambos tomem decisões referentes ao projeto de ensino e aos processos de aprendizagem. Caso não haja o professor de arte atuando, o professor regente deverá incluir no seu projeto de ensino as linguagens da arte, não só por sua legitimidade na Lei de Diretrizes e Bases da Educação, mas, principalmente, pelos benefícios que a arte possibilita nos processos cognitivos e sensíveis da criança. Um dos benefícios da arte na infância é a capacidade imagética da criança em articular situações reais com as do faz de conta. Desde o início de nossas vidas, estamos em contato com o brincar, seja cor- rendo com outras crianças, brincando de pega-pega ou, ainda, quando imaginamos cenas a partir de um objeto, de um cenário ou mesmo de elementos muito simples, como batatas e grãos de feijão. São muitas as formas de se brincar e isso tem a ver com algo que difere da gente, seja o ar (vento), um pedaço de pau, uma pedra, uma fogueira, uma folha, um som, uma pessoa. Es- ses “materiais” estão plenos de sugestões, de ideias e de pos- sibilidades que podem virar brinquedos, vindo ao nosso en- contro ou vindo de encontro com a gente, gerando vínculos ( PEREIRA, 2002, p. 7). Brincar, para a criança, é aprender, pois ela busca a satisfação da descoberta pela alegria de ver saciada a sua curiosidade. Nesse processo, a criança compreende o mundo que a cerca se reinventando em cada brincadeira. A arte relacionada às ideias do lúdico e da brincadeira nos remete ao prazer e dor da reinvenção. Dessa forma, a arte, os jogos e as brincadeiras infantis trazem uma relação entre o tempo e o espaço, entre o real e o imagético. Assim, para Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes FAEL 36 as crianças, as aulas que envolvem as linguagens artísticas criamum espaço de experimentações que podem levá-las a melhor compreender o contexto cultural e estético do seu entorno, possibilitando a ativação da imaginação. Outro aspecto “é que a prática artística é vivenciada pelas crian- ças pequenas como uma atividade lúdica, onde ‘o fazer’ se identifica com ‘o brincar’, ‘o imaginar’9 com a experiência da linguagem ou da representação” (FUSARI; FERRAZ, 1993, p. 84). Quando a criança se expressa por meio das linguagens da arte está em constante apren- dizado, articulando pensamento e ação. O ato de desenhar, bastante comum na infância, por exemplo, é parte constitutiva do desenvolvi- mento da criança. Muitas vezes, o desenho é compreendido pelo adulto como uma atividade sem propósito de aprendizagem; no entanto, ele é muito mais do que se possa imaginar. Nas palavras de Lima (1988, p. 47), “o desenho mesmo que, para o adulto, ele pareça algo estático, uni- dimensional no papel, para a criança ele é ativo, dinâmico, tridimen- sional e sequencial”. Se o desenho é, para a criança, ferramenta necessária para o seu crescimento, o que dizer dos estereótipos que insistem em permanecer nas escolas? E onde eles estão? Os estereótipos estão por todos os luga- res: nas portas das salas de aula, nos murais, nas janelas, nas paredes, nos materiais “educativos” e nos moldes trazidos pelos professores, o que reflete diretamente na criação e produção infantil. Admirando os estereótipos as crianças querem imitá-los e co- piá-los: dos murais, das cartilhas, das folhas mimeografadas que são obrigadas a colorir. Assim, aos poucos, vão desaprendendo o seu próprio desenho, perdendo a expressão individual e a confiança nos seus traços, começando a considerá-los “feios” ou “malfeitos”. Algumas crianças dizem então “não saber de- senhar” e com isso estão querendo dizer que “não sabem fazer estereótipos”, que “não sabem desenhar igual à professora”. Es- tão, em última análise, mostrando que já se tornaram inseguras em relação ao desenho, não acreditam que são capazes. Os desenhos estereotipados empobrecem a percepção e a ima- ginação da criança, inibem sua necessidade expressiva; embo- tam seus processos mentais, não permitem que desenvolvam naturalmente suas potencialidades (VIANNA, 2010). Capítulo 2 Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes 37 Como mudar esse contexto? Um dos caminhos é pensar na escola como espaço da criança, priorizando suas produções, vontades e dese- jos, estimulando seus processos de criação. Se assim o for, vale substi- tuir os estereótipos por intervenções desafiadoras, tanto na conforma- ção dos espaços quanto no uso de cores, formas e texturas diferenciadas que provoquem a imaginação infantil. Em cada início de ano, e no decorrer dele, a escola pode ser apresen- tada à comunidade de outras maneiras, por exemplo: murais e/ou painéis com fotos de atividades das crianças, produções infantis, exposições artís- ticas, sinalizações criativas, entre outras. Da mesma forma, reportamo-nos aos eventos realizados na escola em datas comemorativas, nos quais as crianças, muitas vezes, apresentam coreografias, peças teatrais e musicais, construídas pelo professor de forma estereotipada. Nesse caso, sugere-se integrar esses eventos aos projetos de ensino, apresentando os processos e resultados de sala de aula. As crianças devem participar das escolhas e do desenvolvimento das ações, para que haja uma harmonia entre o que desejam apresentar e o professor, como organizador dessas ações. Também é importante que as apresentações dos trabalhos das crianças sejam pensadas pelo professor de uma forma criativa e res- peitosa. Sinalizar os espaços e organizar material que apresente quais os processos de aprendizagem da criação foram realizados durante as experiências são ações que ajudam na comunicação. Da mesma forma, na organização de exposições didáticas, é fun- damental que o professor pense em questões referentes ao espaço, à organização das produções e à sinalização e, principalmente, dê visi- bilidade às produções infantis. Durante esse processo, as crianças esta- rão aprendendo sobre respeito, argumentação, compartilhamento de ideias, decisão, entre outros. Outro aspecto de grande destaque, especialmente para os anos ini- ciais, diz respeito aos processos de leitura, sejam sonoros, visuais e/ou corporais. Segundo Manguel (2001, p. 21), As imagens que formam nosso mundo são símbolos, sinais, mensagens e alegorias. Ou talvez sejam apenas presenças va- zias que completamos com o nosso desejo, experiência, ques- tionamento e remorso. Qualquer que seja o caso, as imagens, assim como as palavras, são a matéria de que somos feitos. Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes FAEL 38 No contexto da infância, a imagem está bastante presente nos desenhos, naquilo que as crianças observam, no contato com os objetos e com as mídias de uma forma geral. No entanto, há que se tomar cuidado com a forma que tratamos as imagens e as apre- sentamos às crianças. Segundo Hernández (2007, p. 83), “não se deve trabalhar em torno de apenas uma representação visual, ainda que se possa partir de um único exemplo”. Utilizar várias imagens, objetos e artefatos que fomentem a curiosidade reflexiva das crianças é um bom começo para que possamos, de fato, desenvolver uma compreen são crítica e a sensibilidade. E o papel do professor nesse processo? Podemos dizer que é de me- diador e provocador, pois se predispõe a indagar, criticar e motivar as crianças a criar, tendo como referência a produção cultural. “Deixam, então, de ser transmissores a uma audiência passiva, para transforma- rem-se em “atores”, junto com os alunos, em um processo de reelabora- ção de suas próprias experiências.” (HERNÁNDES, 2007, p. 89). Quando estamos diante de uma produção artística (visual, sonora e/ou corporal), estamos diante de nós mesmos; podemos descobrir algo que ainda não sabemos, recriando e ressignificando isso. Somos desper- tados para novas sensibilidades. É sobre esta questão que o professor/mediador/provocador deve centrar seus esforços: quais sentidos podem ser produzidos pelas crian- ças no contato com a produção artística? Quais aprendizados podem ser apropriados por elas ao ouvir uma história, uma música? Ou quando assistem a um filme, uma dança, um teatro? “Quando você assiste a um filme ou ouve uma música, é impossível interpretá-los desvinculados da sua história de vida e do momento no qual você vive a experiência estética. Você vê a obra de acordo com a sua ótica [...]” (MARTINS; PICOSQUE; GUERRA, 2009, p. 66). De fato, os processos de leitura, no contexto da infância, podem contribuir para que a criança perceba o mundo de uma outra forma, em uma outra perspectiva, para além da intelectual: a sensível. Ela pode ser tocada pela experiência com a arte, afetada na sua percepção, emoção e pensamento. Por isso, é válido o professor oportunizar os processos de leitura na sala de aula e fora dela, uma vez que vivemos envolvidos por múltiplas imagens e variadas interpretações e significações. Capítulo 2 Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes 39 Da teoria para a prática Proposta: brinquedos e brincadeiras com arte ● Apresentar às crianças a imagem da obra Jogos infantis, de Pieter Bruegel, conversando sobre as temáticas percebidas por elas: bichos, crianças, espaços, brincadeiras, brinquedos, adultos, objetos, etc. No diálogo, questionar se elas têm contato com animas. Quais? Onde? Gostam deles ou não? Por quê? Explorar bastante a interação das crianças com as ações apresentadas na imagem. O encaminhamento desta atividade, com crianças de 0 a 3 anos, deve respeitar o tempo de atenção e envolvimento de cada uma delas. Com os bebês, o importante é trabalhar o visual, o tátil e a curiosidade, por meio das formas, cores, luz, textura, etc., podendo trazer elementos concretos, como obje- tos e brinquedos, de modo a contextualizar a imagem da obra. RE PR OD UÇ ÃO Fonte: BRUEGEL, P. Jogos infantis,1560. 1 óleo sobre painel de madeira, 118 x 160,9 cm. Museu de História da Arte, Viena. ● Propor às crianças uma investigação, junto aos seus familiares, relacionada à temática brinquedos e brincadeira: quais brin- quedos e brincadeiras estão na lembrança das famílias? Quais ainda hoje permanecem nas brincadeiras das crianças? ● Organizar com as crianças um mural com os relatos trazidos e propor algumas brincadeiras com elas. Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes FAEL 40 Síntese Este capítulo propôs ao leitor a reflexão sobre alguns pontos re- ferentes à inserção das linguagens da arte nos currículos da Educação Infantil e dos anos iniciais do Ensino Fundamental. É evidente que pensar no currículo é pensar em ações implícitas e explícitas que fazem parte desse cenário, em seus protagonistas (crianças e professores) e em seus processos de aprendizagem. Nessa perspectiva, apontamos algumas questões imprescindíveis que devem ser levadas em conta no contexto da escola: os espaços, a ludicidade, os jogos e brincadeiras e os processos de leitura. Os procedi- mentos metodológicos também estão presentes no capítulo, sinalizan- do possibilidades para a sala de aula. Os temas selecionados para este capítulo visam alertar o professor para algumas situações de aprendizagem que exigem um olhar sensível e diferenciado, considerando não apenas os componentes cognitivos do currículo, mas, também, aqueles que desenvolvam o pensamento reflexivo, a capacidade criativa e a compreensão crítica. 41 Este capítulo tem como meta provocar a reflexão sobre a im- portância de ações pedagógicas no contexto da Educação Infantil e dos anos iniciais do Ensino Fundamental, tendo a interdisciplinaridade como base constituinte do currículo. A arte como elemento integrador: conexões metodológicas interdisciplinares Como vimos nos capítulos anteriores, a arte no currículo tem natureza interativo-interdisciplinar, pois agrega várias áreas do conhe- cimento: Filosofia, História, Geografia, Antropologia, Estética, Li- teratura, entre outras. Dessa forma, entendemos que os conteúdos e conceitos desenvolvidos no contexto da Educação Infantil e dos anos iniciais do Ensino Fundamental devem propor às crianças a discussão sobre as diversas culturas, costumes, tradições, produções e manifesta- ções artísticas e espaços culturais, relacionando esses saberes, experiên- cias e conhecimentos aos movimentos presente/passado. É fundamental incorporar ao currículo (escrito e vivido) conteúdos e conceitos referentes ao cenário social, econômico, político, artístico e cultural, bem como à origem cultural de crianças e professores. Alguns processos de aprendizagem se inserem por meio desse viés, como a criatividade, a invenção, a imaginação e as representações so- ciais. Espaços culturais, como museus, feiras de artesanato, arquivos históricos, teatro, cinema, concertos, e outros tantos, que materializam conceitos, ideias e questões presentes no cotidiano, são, também, espa- ços de aprendizagem. Sincronias interativas: a arte como elemento integrador das demais áreas de conhecimento 3 Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes FAEL 42 Esses ambientes envolvem, de certo modo, a aprendizagem política dos direitos dos indivíduos enquanto cidadãos, ou seja, o processo que gera a conscientização das crianças para a compreensão de seus interesses, do meio social e da natureza que as cerca, por meio da participação em atividades grupais. Também contribuem para que aprendam a se organi- zar com objetivos comunitários, voltados à resolução de problemas. Nessa perspectiva, um dos aspectos relevantes é o campo da edu- cação para a vida e seu gerenciamento. A educação transmitida pela família, no convívio com amigos nos espaços culturais e de lazer, é con- siderada tema importante em uma educação que prima pela postura interdisciplinar, formando uma rede de significados e de possibilidades diversas nos processos de aprendizagem. Qual a diferença entre a educação formal e não formal? Basicamen- te, o que diferencia uma da outra é que, na primeira, existe intencionali- dade em criar objetivos para determinados fins. A educação não formal, ao contrário, decorre de processos espontâneos, ainda que carregados de valores e representações, como é o caso da educação familiar, da educa- ção advinda de relações, de grupos de amigos, de turmas, entre outras. A interação entre os espaços da escola com outros espaços não formais da educação (por exemplo: museus, feiras de arte e artesanato, espaço gastronômico, teatro, bairros, associações) pode contribuir para a compreensão de professores e crianças de que os processos de apren- dizagem estão em vários lugares. Na educação, seja formal (escola) e/ou não formal, o foco princi- pal deve estar centrado na cidadania, nas conexões com a coletivida- de e com o aprendizado com- partilhado. A voz, ou as vozes, que entoam ou ecoam de seus protagonistas – crianças e pro- fessores – são mescladas a senti- mentos, como desejos, dúvidas, sensações, sonhos, entre outros. Ao se expressarem, as crianças articulam o universo de saberes disponíveis com o esforço de apropriar/elaborar/ressignificar a realidade em que vivem. Os A educação não formal designa várias dimen- sões tais como: aprendizagem política dos direitos dos indivíduos enquanto cidadãos; a capacitação dos indivíduos para o trabalho; a aprendizagem e exercício de práticas que capacitam os indivíduos a se organizarem com objetivos comunitários; a aprendizagem de conteúdos que possibilitem aos indivíduos fazerem uma leitura do mundo; a edu- cação desenvolvida na mídia e pela mídia (GOHN, 2006, grifo nosso). Educação formal: reconhecida oficialmente, é oferecida nas escolas em cursos com níveis, graus, programas, currículos e diplomas. (GASPAR, 2010). Saiba mais Capítulo 3 Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes 43 códigos culturais são acionados e se desvelam nas emoções contidas na subjetividade de cada um. Para que possamos compreender a postura interativo-interdiscipli- nar, vale buscar a essência do conceito. Para Brinhosa (1996, p. 165), “a interdisciplinaridade é a possibilidade de interpenetração de conteúdo/ forma entre as disciplinas e o conhecimento universalmente produzido. Em outras palavras, trabalhar de forma interdisciplinar pressupõe o desenvolvimento de um projeto pedagógico no qual as diferentes áreas de conhecimento sejam tratadas na sua singularidade e, ao mesmo tempo, conectadas umas às outras, ou seja, “quanto mais eu souber do meu campo de conhecimento, mais condições terei de ouvir o que os outros campos têm a me dizer” (FAZENDA, 2005, p. 7). Trabalhar nesse viés exige uma visão do todo, desde o início das atividades até gerar um novo conhecimento de forma não fragmentada e que esteja vinculado à vida. Assim, desenvolver um projeto “de for- ma sistematizada e contextualizada requer uma mudança na postura político-pedagógica e no assumir, com real competência, o espaço sala de aula” (BRINHOSA, 1996, p. 167). O professor, em uma concepção interdisciplinar, precisa conhecer a criança e suas infâncias, suas dificuldades e desejos, para, a partir deles, buscar soluções para suas necessidades, construindo, assim, uma metodologia interativa. Para tanto, é necessário ouvir o que as crianças têm a dizer, pois essa escuta pode sinalizar atitudes e estratégias capazes de educar para a vida. A arte no currículo pode ser o elemento integrador, possibilitando a criação de metodologias, unindo os diferentes campos de conhecimento no processo de aprendizagem. Uma obra/objeto de arte, seja visual, cor- poral, sonora ou literária, pode possibilitar a contextualização geográfi- ca, histórica, estética, ambiental, lógico-matemática, entre outras. Arte e linguagem As diferentes linguagens (visual, sonora e corporal), no contexto da Educação Infantil e dos anos iniciais do Ensino Fundamental, con- tribuem para a ampliação das formas
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