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O MEDO NO CONTEXTO ORGANIZACIONAL MARCELO ACAR PEREIRA 2. A PSICOLOGIA DO MEDO Há décadas que pesquisadores, como Ciceri (2004), Dejours (1992; 2005), Gray (1976), Mira y López (2002), Riezler (1944), dentre outros, direcionam seus estudos, ou parte deles, para compreender e mapear psicologica, biologica e sociologicamente as maneiras pelas quais o medo pode ser estimulado no ser humano, as diferentes caracteríticas apresentadas por este sentimento e as diversas reações manifestadas pelo homem ao sentir-se amedrontado. Este capítulo descreve, sob uma visão psicológica e psicopatológica, as formas e intensidades que o medo pode assumir em um indivíduo, de que maneiras este sentimento pode vir a afetá-lo e quais são seus mecanismos de defesa contra este estímulo fóbico. As Manifestações do Medo O medo mostrou-se capaz de apresentar-se de várias formas e intensidades. Este tipo de sentimento pode ser incitado por estimuladores variados, e dependendo do estimulador, ou como diria Mira y Lopez (2002), do agente fobígeno, o indivíduo amedrontado pode reagir de maneiras distintas. Neste sentido é que Ciceri (2004) afirma que a distinção entre as muitas faces do medo pode ser feita em função dos seus diferentes graus de intensidade e de ativação. Mira y López (2002, p.38) assevera que: Qualquer que seja a forma que adote, a apresentação e a ação do medo pode alcançar diversos graus de intensidade, correspondendo cada um deles a um avanço na difusão e profundidade de seus efeitos inativantes sobre os centros propulsores da vida pessoal e vegetativa. Ao introduzir seu estudo sobre a psicologia do medo, focado apenas no âmbito social, Riezler (1944) expõe duas amplas classes, na finalidade de categorizar o medo. Para o autor, o homem pode manifestar o medo de alguma coisa ou por alguma coisa: medo de uma doença, de perder dinheiro, da desonra, de perder o emprego; ou medo pela sua família ou pelo seu status social. Cada tipo de medo possui sua particularidade, natureza distinta e intensidade (RIEZLER, 1944). Gray (1976) criou três categorias para classificar as origens do amedrontamento no indivíduo. O autor explica que o medo pode ser estimulado de maneira intensa (uma dor ou um forte ruído), por uma novidade (objetos, ambientes novos ou pessoas estranhas) ou pela interação social com membros da mesma espécie (universo desta pesquisa). Um estímulo intenso pode ter sua amplitude reduzida, gradativamente, a cada repetição do evento, caracterizando um fenômeno conhecido por adaptação. Portanto, a sensação de medo, derivada de um estímulo intenso, poderá tender à extinção depois de certo número de repetições. O mesmo pode ocorrer com estímulos originados pelo novo e pela interação social, tornando-se comuns pela ocorrência repetitiva do estimulador, minimizando, a cada repetição, o medo associado ao estímulo (GRAY, 1976). Contudo, nem todo tipo de aprendizagem reduz a intensidade do medo e, sustentando este conceito, Gray (1976) faz uma nova correspondência entre a intensidade do medo e outra forma de aprendizagem, para mostrar que a magnitude do amedrontamento também pode ser aumentada. O autor utiliza-se do seguinte exemplo na intenção de ilustrar sua teoria: um indivíduo pode ter medo do escuro, pelo simples fato de ser algo desconhecido. No entanto, este medo pode ser intensificado caso este indivíduo venha a ler, ou ouvir falar que o escuro é aterrorizador. Esta situação pode ser agravada caso este mesmo indivíduo já tenha passado por uma experiência desagradável no escuro. O exemplo dado por Gray (1976) pode ser trazido para o campo das organizações. Entretanto, ao invés de tratar-se do escuro, pode-se observar o medo em relação às punições e castigos deliberados. Indivíduos têm medo de ser punido, mesmo que nunca tenham passado por este desgosto. Este sentimento de amedrontamento pode ser potencializado, caso o mesmo indivíduo tenha lido algo sobre punições nas organizações, ou até mesmo por uma conversa informal com um colega de trabalho sobre este assunto. Para aumentar ainda mais o medo de ser vítima de uma punição, o indivíduo já pode ter sofrido algum tipo de punição em seu passado profissional. Esta flutuação na intensidade do sentimento fobígeno no homem, apresentada por Gray, (1976) é definida por Ciceri (2004) pela capacidade de pressentir o perigo de modo competente. Para isso, a autora explora dois fenômenos chamados de: sensibilização e hábito. A sensibilização abaixa o limiar do medo, mostrando a periculosidade de ações e objetos que antes não geravam preocupação. O fenômeno da sensibilização apresenta-se no dia-a-dia do ser humano quando, por meio de leituras, informações vindas pelos meios de comunicação ou interações sociais, o homem gradualmente perde sua ingenuidade, tornando-se mais atento ao seu comportamento e ao ambiente (CICERI, 2004). Em complementaridade ao fenômeno da sensibilização, aparece o mecanismo do hábito. Nesta situação, o limiar do medo sobe ao haver a experimentação repetitiva do mesmo estímulo perigoso sem que haja a verificação do prejuízo (CICERI, 2004), ratificando o conceito de adaptação definido por Gray (1976). É importante ressaltar, também, o poder de imaginação do homem. O processo imaginativo de um indivíduo pode discorrer por vários caminhos, sendo que, caso um desses caminhos venha a sofrer interferência de dúvidas, desconfianças, pressentimentos e receios, a imaginação pode tornar-se um estimulador do medo. Riezler (1944) comenta que o medo dos indivíduos pela morte se mistura com o medo de sofrer ao morrer e com o medo do que acontecerá após a morte. A falta de controle e informação sobre o que pode acontecer incita mais ainda este processo imaginativo, podendo potencializar a estimulação fobígena. No objetivo de impedir o medo de controlá-lo, acarretando no aparecimento de uma possível paranóia, o homem, sabendo que a morte é inevitável, evita o pensamento excessivo sobre ela. O ser humano acaba por dirigir seus sentimentos no intuito de viver o melhor possível sua vida, reprimindo, assim, seu medo de morrer (RIEZLER, 1944). No ambiente organizacional não é muito diferente. Há uma combinação de sentimentos no que diz respeito à palavra demissão. O indivíduo tem medo de ser demitido, e este sentimento é composto por uma mistura entre o medo de sofrer ao ser demitido e o medo do que irá acontecer com sua vida após sua demissão. Mas, mesmo sabendo que um dia poderá perder seu emprego, este indivíduo concentra-se em seu trabalho, esquivando-se de pensar diariamente neste medo pela demissão. O ser humano convive todos os dias com seus medos. Medos ligados a algo que está acontecendo no presente e medos ligados ao futuro (CICERI, 2004). Deve-se dar crédito a esses medos, não subestimá-los e levá-los a sério, já que são sinais de alarme de algo que o ameaça (CICERI, 2004). Mas, não se deve deixá-los dominar. O poder imaginativo do indivíduo é gigantesco e é capaz de gerar grandes danos físicos e psicológicos. Como descreve Mira y López (2002, p.17): “A Imaginação, poderosa aliada do Medo.” e “o que não existe oprime mais do que aquilo que existe”. Diante destes fatos é que Mira y López (2002, p.20) sintetiza: O homem sofre então, não somente o Medo ante a situação absoluta, concreta, presente e maléfica, como ante quantos sinais restaram associados a ela e agora evocam; sofre também a incapacidade de assegurar sua fuga; sofre ante o conflito (ético) que se lhe depara (...). Finalmente, surge o medo imaginário – quarta e pior das modalidades fatoriais – (...) leva o homem ao temor do desconhecido, do inexistente e do inesperado (...) culminando tudo isso no Medo e na angústia ante a face côncava da realidade: o NADA. O medo é uma fonte geradora de angústia, pressão, ansiedade,estresse e sofrimento. Possui a habilidade de criar um permanente estado de insegurança, pessimismo e insuficiência do Eu (MIRA y LÓPEZ, 2002), e caso essa fonte de sofrimento não seja controlada, é capaz de paralisar o ser humano. Ciceri (2004, p.67) atesta que: “O medo é capaz de influenciar e modificar nosso equilíbrio psicofísico”. Para Dejours (2005), se o sofrimento causado pelo medo não vem acompanhado de uma descompensação psicopatológica, ou seja, de uma ruptura do equilíbrio psíquico, ou físico, que se manifesta pela eclosão de uma doença, é porque o indivíduo emprega contra ele defesas que lhe permitem controlá-lo. O estado de ansiedade consome, porque perdura até a verificação do que se teme, e pode ser que o que se teme não se verifique jamais (CICERI, 2004). Ciceri (2004, p.79-80) afirma que: “A ansiedade foi definida também como a resultante da composição do medo e a antecipação. (...) é o preço que o homem paga por sua extraordinária capacidade de imaginar e construir mentalmente a realidade”. Assim, o indivíduo com medo por algum motivo, torna-se ansioso, mantendo ativo seu sistema defensivo, consumindo muita energia, o que pode levá-lo a um estado de estresse. A ansiedade tem a habilidade de afetar os indivíduos do mesmo modo que a carga física de trabalho, levando-os ao esgotamento progressivo e ao desgaste (DEJOURS, 1992). Em contrapartida aos sofrimentos, ansiedades e estresses, o medo também pode ser um limitador natural, importante para o homem, já que, como assevera Riezler (1944, p.492): “Nós desenhamos uma linha entre o que é possível e o que é impossível. A esperança transgride essa linha, o medo nunca.”. Sentir medo em relação a um objeto ou a um evento significa ter a capacidade de avaliar sua periculosidade e, assim, acionar uma série de ações que limitem sua força negativa e destrutiva (CICERI, 2004). Ciceri (2004) ainda diz que o medo pode ser visto como um regulador, interno e sofisticado, dos perigos externos, que envolve todo o organismo do homem e o prepara para agir. Em um ambiente fechado de trabalho, o medo, mesmo que tenha sido estimulado em apenas um indivíduo, pode desencadear o que Riezler (1944) chama de “insegurança coletiva”. O autor diz que a insegurança coletiva pode ser interpretada como uma aglomeração de sentimentos gerados por um medo definido, que ameaça a coletividade dos indivíduos. O medo, depois de instaurado, se espalha rapidamente, contaminando a todos, podendo tornar um ambiente de trabalho um tanto o quanto desconfortável. Foucault (1989, p.354), dissertando sobre sentimentos perniciosos ao ser humano e sobre o comportamento desses indivíduos perante este mal, afirma que: Antes de mais nada, o mal entra em fermentação nos espaços fechados (...) Essa mistura logo entra em ebulição, soltando vapores nocivos e líquidos corrosivos. (...) Esses vapores ferventes elevam-se a seguir, espalham-se pelo ar e acabam por cair nas vizinhanças, impregnando os corpos e contaminando as almas. No entanto, o homem desenvolveu estratégias e mecanismos de defesa, conscientes e inconscientes, para evitar ou livrar-se do medo e das sensações desconfortáveis associadas a este sentimento. Mira y López (2002) atesta que, intencionalmente, o ser humano busca uma conduta fugitiva, ou reação de fuga, cujo propósito é o afastamento material do indivíduo de uma situação perigosa. As Estratégias Defensivas O indivíduo não foge porque tem medo, mas sim foge para livrar-se do medo. A individualidade põe em jogo os recursos para superar a situação, libertando-se dela sem sofrer maiores danos (MIRA y LÓPEZ, 2002). A fuga exige uma concomitante avaliação entre a competência para enfrentar o perigo e a identificação de uma rota de fuga. A retirada não é apenas uma instintiva e imediata modalidade de se subtrair ao perigo; ela exige também uma cuidadosa observação da relação entre os próprios recursos e as oportunidades oferecidas pela situação (CICERI, 2004). Diante dos estímulos causadores do medo, o ser humano, ao se sentir amedrontado, poderá responder, fundamentalmente, com duas formas de comportamento: pela fuga passiva ou pela fuga ativa (GRAY, 1976). Ciceri (2004), anos depois, definiu estes mesmos dois tipos de estratégias de fuga como: coping ativo e coping passivo. A fuga passiva, ou coping passivo, caracteriza-se no momento em que um indivíduo tem o desejo de realizar algo em seu trabalho, mas este desejo o leva ao contato com estímulos do medo. Assim, para esquivar-se deste sentimento fobígeno, associado ao que possa vir a acontecer caso opte por realizar seu desejo, o ser humano se utiliza da fuga, reprimindo sua vontade de realização. Gray (1976) afirma que a fuga passiva acontece quando o indivíduo abandona uma, ou outra atividade por temer que a conseqüência de seus atos seja seguida de um castigo. É uma preparação do homem para a defesa, como esperar e resistir (CICERI, 2004). Esta fuga passiva é denominada por Mira y Lopez (2002) como uma fuga profilática. A sua fórmula é a de não se arriscar, e sua roupagem é a atitude da prudência (MIRA y LÓPEZ, 2002). Neste estado de prudência, o indivíduo adota uma atitude modesta, de autolimitação voluntária de suas ambições e possibilidades de criação. Desta forma, afirma seu presente desejo em passar despercebido e não entrar em conflito com o ambiente, mesmo que isto lhe custe renunciar aos prazeres, sempre que julgar que sua realização implique riscos e, portanto, vislumbre a possibilidade de sentir medo (MIRA y LOPEZ, 2002). Em contrapartida, a fuga ativa, ou coping ativo, é definida em situações nas quais o indivíduo encontra-se em um momento em que deseja que sua rotina não seja alterada, pois é controlador de todas as variáveis, e sente-se em um estado de pseudo- segurança, ou acomodação. A partir do momento em que outro indivíduo, ansioso, quer que este adquira uma nova forma de comportamento, gerando uma mudança brusca e impositiva, será formado um estímulo de medo. A fuga ativa acontece porque o indivíduo é obrigado, por meio de ameaças, a mudar seu comportamento, e assim, o faz como fuga do sentimento de amedrontamento (GRAY, 1976). A fuga ativa caracteriza-se no momento em que o ser humano é obrigado a aprender uma nova forma de agir que o habilitará a evitar qualquer tipo de castigo. Em organizações onde se utiliza o medo para obter uma ação desejada, é comum ouvir de um indivíduo ansioso, e detentor de poder, o seguinte: “É melhor que faça dessa maneira, senão...” ou “Isto deve ser feito para ontem”. Morgan (1996), corroborando com o conceito de fuga ativa, explica que um indivíduo, no momento em que surgem problemas que podem comprometê-lo, tende, então, a desviar a sua energia utilizada para desempenhar suas funções diárias e usá-la para defender-se das ansiedades associadas à nova função. Sob a influência do medo, com a ameaça de demissão constantemente incomodando os indivíduos, a maioria dos que trabalham se mostra capaz de acionar um lado criativo e inventivo para melhorar sua produção, em quantidade e em qualidade, bem como para constranger seus colegas, de modo a ficar em posição mais vantajosa do que eles em caso de um processo de seleção de dispensa (DEJOURS, 2005). A fuga ativa pode despertar na maioria dos indivíduos um lado criativo e imaginativo, que os auxiliarão em suas estratégias de defesa. Mas, por outro lado, esta face criativa pode ser reprimida nos momentos de escolha por uma fuga passiva. A estratégia defensiva da fuga passiva de Gray (1976) pode ser exemplifica pela teoria do Knowing-Doing-Gap de Pfeffer (1999), e que pode ser traduzida como: Espaço entre o conhecimento e a ação. Segundo Pfeffer (1999), as empresas costumam promover uma cultura do medo e da desconfiança. Por temer algum tipo de punição pelo fracasso,os indivíduos se privam de atuar de acordo com o que sabem, e de fazer o que é necessário fazer. O medo apenas aumenta a lacuna entre o conhecimento e a ação, porque é necessário que o indivíduo tenha a convicção de que não será punido para trabalhar de acordo com o que sabe (PFEFFER, 1999). Um dos efeitos do medo da penalização é a resistência dos indivíduos em contar as más notícias, mesmo que eles não sejam os responsáveis por elas. Por isso, eles se vêem privados, e com medo, de fazer qualquer tipo de sugestão no objetivo de uma melhora na empresa, principalmente quando isso implica reconhecer que algo está mal. Mira y Lopez (2002, p. 23) assevera que: “maior é o medo do fracasso em conseguir o êxito, que o medo da ação em si mesmo”. Nesta mesma linha de pensamento, Gilley (1999, p.20-22) diz que: Nossos temores nos mantêm presos em autocensura, na censura das pessoas que nos cercam, e intimidados, com medo de dizer o que precisa ser dito (...). Para manter os medos encobertos, concordamos velada e inconscientemente em “sufocar” todas as nossas reações emocionais, tanto as boas quanto as ruins. Como conseqüência, num momento em que as empresas necessitarem de criatividade, aptidão, coragem e alegria, não disporão mais dessas emoções. Ryan (1993), em sua pesquisa, afirma que mais da metade de seus entrevistados disseram que haviam hesitado quanto a expressar suas verdadeiras opiniões, porque temiam algum tipo de repercussão. Outra possível reação defensiva produzida pelos indivíduos nas organizações, e que é descrita por Jaques (1955), em um dos clássicos da Psicodinâmica Organizacional, é a reação definida como scapegoating, ou “bode expiatório”. Isto acontece quando um indivíduo, com medo de perder o emprego, atribui a culpa de determinados problemas a um scapegoating – em seu departamento, em uma situação ruim, a outro indivíduo ou a um grupo de indivíduos. Freud (1974) afirma que as defesas de um indivíduo desenvolvem-se no momento em que este se sente ameaçado, visando minimizar qualquer impacto destrutivo da realidade e, ao mesmo tempo, proteger sua integridade. A autora também comenta que, associado às reações defensivas, encontra-se o sentimento de ansiedade, que aparece no instante que o indivíduo nota uma ameaça ou um perigo iminente. Os mecanismos de defesa do ser humano surgem para preencher o vazio deixado por uma frustração. Este sentimento de frustração pode ser ocasionado por meio de um castigo recebido inesperadamente, ou pela supressão de uma recompensa esperada. Dejours (1992) assegura que a ideologia defensiva funcional tem como objetivo mascarar, conter e ocultar uma ansiedade particularmente grave. Para o autor, a ideologia defensiva tem um caráter vital, funcional e necessário. Ciceri (2002, p.17, 47), complementando, afirma que: As respostas de defesa apresentam-se numerosas e de interessantes diferenças. Elas mudam e envolvem continuamente, pois representam soluções para o problema da sobrevivência, que se apresenta sempre de modo diferente, exigindo contínuas modificações no sistema defensivo. (...) A identificação da ameaça pode variar de cultura para cultura, de pessoa para pessoa e de contexto para contexto. Tanto nas complexas estruturas sociais, quanto nas organizações, os indivíduos que nelas residem estruturam seu cotidiano, por meio de regras e um conjunto de valores oferecidos por esses ambientes. No momento em que houver uma mudança nessas regras e valores, o indivíduo perde seu sistema de referência, aumentando a ansiedade, a insegurança e o medo nas organizações, ativando seus mecanismos de defesa (JAQUES, 1955). Pode-se observar que nos estudos sobre o medo de Reizler (1944), o autor atribui um enfoque diferente quando relaciona o medo às regras e valores oferecidos pelo ambiente. Para Reizler (1944), o tipo e a intensidade do medo de um indivíduo estão estritamente associados ao seu nível de conhecimento, ou de ignorância. Existe uma estrutura complexa, composta por leis, princípios, normas sociais, suposições, hábitos, hipóteses e convenções. Fundamentado nesta estrutura complexa, Reizler (1944, p.494) diz que: “Caso não se saiba a natureza do perigo, faz-se uma suposição. Sem uma suposição não se age. Mas, sem uma estrutura, nem uma suposição se consegue fazer.”. Ou seja, dependendo da situação em que o indivíduo se encontra e o nível de complexidade de sua estrutura de conhecimento, este poderá sentir-se amedrontado, ou não, dependendo apenas de sua capacidade de compreender o acontecido, tomando, deste modo, uma atitude para cessar o estímulo do medo. Dejours (1992), em consonância com a teoria de Reizler (1944), assevera que o medo relativo ao risco pode ficar sensivelmente amplificado pelo desconhecimento dos limites deste risco, ou pela ignorância dos métodos eficazes de prevenção. Além de ser um coeficiente de multiplicação do medo, a ignorância aumenta também o custo mental ou psíquico do trabalho. “O medo aumenta com a ignorância. Quanto mais a relação homem/trabalho está calcada na ignorância, mais o trabalhador tem medo.” (DEJOURS, 1992, p.107). O ser humano, angustiado, estressado e pressionado pelo medo que lhe foi estimulado, tomará atitudes diversas, mas que se assemelham em um ponto central: conter este amedrontamento. Após terem sido analisados teorias diversas, de diferentes pesquisadores, é possível concluir-se que, independentemente do teórico que esteja analisando o medo no ser humano, há uma grande variação de agentes fobígenos capazes de estimular o medo, de várias formas e intensidades, no indivíduo. Neste conjunto de múltiplos estimuladores existem agentes fobígenos específicos do ambiente organizacional, e que podem estar presentes na estrutura da organização como: a cultural organizacional praticada ou as relações de poder e hierarquização dos cargos e funções entre os indivíduos. Ou, até mesmo um momento de mudança em que a organização esteja passando pode ser considerado como um estimulador do medo.
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