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MÓDULO FADIGA, PERDA DE PESO E ANEMIA – P2 | Luíza Moura e Vitória Neves MONONUCLEOSE INFECCIOSA INTRODUÇÃO E DEFINIÇÃO A mononucleose infecciosa (MI), popularmente conhecida como “Doença do Beijo”, é uma doença transmissível, causada por infecção primária pelo Epstein-Barr (EBV) que afeta, principalmente jovens entre 15 e 25 anos de idade. A!! Há muitos quadros clínicos indistinguíveis da MI provocada pelo VEB, mas que não são causadas por esse vírus, e a esse quadro foi dado o nome de “Síndrome mononucleose smile” ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA O vírus de Epstein-Barr pertence à família Herpesviri dae, subfamília Gammaherpesvirinae, gênero Lymphocryp tovirus. É um vírus DNA, de fita dupla, que infecta mais de 90% da população mundial. O hospedeiro suscetível é infectado por meio da entrada do vírus pela orofaringe, pelo contato com saliva contaminada com o VEB. → Como todos os outros membros da família, o VEB é capaz de persistir no hospedeiro humano pelo resto da vida, mas na absoluta maioria das vezes não produz nenhum sintoma nesses portadores. O VEB infecta preferencialmente os linfócitos B pela ligação da glicoproteína gp350 de seu envelope ao receptor CD21, presente na superfície dos linfócitos. → O VEB pode infectar outros tipos de células, como as células epiteliais, mas a infecção é muito menos eficiente e ocorre por um mecanismo ainda não bem estabelecido. A!! O mecanismo exato que se segue à transmissão oral do VEB para o hospedeiro suscetível ainda não está total mente elucidado. Após o período de incubação, estimado em 4 a 6 semanas, altos títulos de partículas virais são detectados em secreções de orofaringe e saliva. → Além disso, linfócitos B contendo partículas virais já foram demonstrados na região próxima às criptas amigdalianas, levando à suposição de que essas células também possam contribuir para a liberação de vírus infectantes nas secreções de orofaringe. Inicialmente, o VEB passa por uma replicação viral na orofaringe, em seguida, alcança as células Be ganham a circulação. → Admite-se que as células epiteliais constituiriam o alvo inicial do VEB, que, após multiplicação, infectaria os linfócitos B circulantes. Esses linfócitos são não permissivos para infecção produtiva do VEB, ou seja, não há formação de novas partículas virais com subsequente lise da célula infectada, ficando o vírus em fase latente, como um epissomo (uma estrutura genética extra cromossômica) Porém, essa latência não é estática, e os genes do vírus latente passam a produzir várias proteínas; algumas delas interagem com os genes do linfócito, estimulando alguns e reprimindo outros. Como resultado da interação VEB- latente/linfócito ocorre uma transformação dos linfócitos infectados, que resulta em: MÓDULO FADIGA, PERDA DE PESO E ANEMIA – P2 | Luíza Moura e Vitória Neves → Proliferação importante na circulação e nos tecidos linfoides de todo o organismo. Contudo, como esses linfócitos B ativados apresentam alguns antígenos do vírus em sua superfície, há uma sinalização para o sistema imune-celular, provocando uma resposta primária de células T específica para os antígenos virais presentes nos linfócitos B. Os linfócitos “atípicos” característicos da mononucleose infecciosa resultam da somatória de: Linfócitos B em fase de proliferação induzida pelo VEB + Linfócitos T que estão tentando remover esses linfócitos B contendo antígenos virais. A!! Estima-se que mais de 70% dos linfócitos atípicos sejam linfócitos T citotóxicos ativados, CD8+. Assim, a viremia e a proliferação dos linfócitos B no sistema linfoide, juntamente com o processo inflamatório secundário à reação imune-celular, com grande liberação de citocinas que vai levar à destruição destes linfócitos B, explica as diferentes manifestações clínicas da doença, como: → Febre; → Linfonodomegalia generalizada; e → Hepatoesplenomegalia. A destruição dos linfócitos B infectados, via de regra, leva ao controle do processo infeccioso após 2 a 6 semanas, com o desaparecimento dos sintomas mais agudos da mononucleose infecciosa. Mas, alguns dos linfócitos B infectados (provavelmente linfócitos B de memória), escapam da ação dos linfócitos T citotóxicos por não expressarem, em sua superfície, os antígenos VEB-específicos que desencadearam a resposta imune do organismo. → Esses linfócitos vão constituir um reservatório estável de células B de memória que contém o VEB em estágio de “latência zero”, no qual a expressão de antígenos virais é praticamente ausente. A!! Estima-se que mais de 90% da população mundial apresente infecção latente e assintomática pelo VEB, que persiste por toda vida. Acredita- se que, ocasionalmente, esses linfócitos B de memória infectados seriam recrutados pelos centros germinativos dos linfonodos, onde estariam sujeitos à modificação de seu estado de latência, que poderia resultar em ativação do ciclo produtivo lítico do vírus. Esse novo ciclo lítico pode: → Reiniciar o ciclo lítico nas células epiteliais da orofaringe: levando a novos episódios de eliminação do vírus na saliva, agora em níveis mais baixos; também → Por meio da infecção de linfócitos naives, iniciar novo episódio de linfoproliferação no sangue periférico. Esse novo episódio, que é totalmente assintomático, irá, por sua vez, estimular o sistema imune-celular, que agora irá responder de forma mais rápida e eficiente, por meio da mobilização de linfócitos T de memória que eliminarão os linfócitos B infectados. Essa dinâmica da infecção pelo VEB e sua relação com o sistema imune do hospedeiro é totalmente modificada na presença de uma deficiência grave da imunidade celular. Nessas condições, não há controle, por parte do hospedeiro, da replicação do VEB, dando origem a doenças linfoproliferativas de células B, como: → Linfoma de Burkitt; → Carcinoma de nasofaringe; → Síndromes linfoproliferativas pós- transplantes (DLPT) e neoplásicas, etc. MÓDULO FADIGA, PERDA DE PESO E ANEMIA – P2 | Luíza Moura e Vitória Neves Modelo da interação do VEB com as células de indivíduos infectados pelo vírus, durante a infecção primária e na latência e reativação da infecção. A linha tracejada indica diminuição acentuada da imunidade celular com consequente “liberação” da linfoproliferação dos linfócitos B infectados pelo VEB. QUADRO CLÍNICO HISTÓRIA CLÍNICA A MI é caracterizada clinicamente por: → Febre; → Amigdalofaringite; → Linfadenomegalia generalizada; e → Hepatoesplenomegalia. Ocorrendo sobretudo em crianças e adultos jovens. Os principais sintomas da doença são: → Calafrios; → Dor de garganta; → Astenia intensa; → Cefaleia; e → Dor abdominal. A febre, na maioria dos casos, não ultrapassa 2 semanas de duração, mas a resolução completa dos sinais e sintomas pode levar várias semanas. O período de incubação da MI é de cerca de 4 a 6 semanas, mas a fonte da infecção é raramente identificada, acreditando-se que a maioria absoluta das infecções é transmitida por excretores assintomáticos do VEB na saliva. A!! A excreção do VEB perdura por muitos meses após a infecção primária. → Em estudo 32 pacientes com MI foram acompanhados por até 6 meses após a doença aguda; → O VEB foi detectado na saliva de 92% dos pacientes em um período de 61 a 150 dias após o início do quadro clínico. Os sinais e os sintomas da MI são autolimitados e regridem de forma espontânea após 2 a 3 semanas. EXAME CLÍNICO Normalmente apresentam BEG, apesar dos achados do exame clínico. FARINGE Encontra-se sempre muito hiperemiada; O exsudato de amígdalas, quando presente, é membranoso, de aspecto branco-acinzentado, cobrindo em geral toda a loja amigdaliana; → O exsudato da mononucleose infecciosanunca invade os tecidos adjacentes à loja amigdaliana Em casos raros, o processo inflamatório na faringe é muito intenso e, além do exsudato, observa-se hiperemia e edema importantes, chegando a prejudicar a respiração. Petéquias de palato ocorrem em cerca de 50% dos pacientes. Exsudato membranoso das amígdalas MÓDULO FADIGA, PERDA DE PESO E ANEMIA – P2 | Luíza Moura e Vitória Neves Exsudato membranoso, esbranquiçado, restrito às lojas amigdalianas, típico da mononucleose infecciosa, com presença de petéquias de palato. LINFONODOS Linfonodomegalia é dolorosa e generalizada e atinge praticamente todas as cadeias ganglionares: → Occipital; → Retroauricular; → Cervical posterior e anterior; → Axilar; e → Inguinal. A linfonodomegalia caracteristicamente já está presente logo no início do quadro clínico. Linfonodomegalia generalizada FÍGADO E BAÇO Apresentam aumento moderado e são dolorosos. Icterícia cutaneomucosa pode ser eventualmente observada. O aumento dos linfonodos, fígado e baço podem perdurar por semanas ou meses após o término da febre. Eventualmente, pode ser observado um edema palpebral de curta duração, que é conhecido como “sinal de Hoagland”. DIAGNÓSTICO É realizado a partir da apresentação clínica associada aos exames complementares. HEMOGRAMA As enzimas hepáticas (TGO e TGP) estão moderadamente aumentadas. Presença de leucocitose, usualmente 10.000- 20.000 leucócitos/mm3. Existe uma linfocitose com número superior a 50%, dos qual mais de 10% correspondem a formas atípicas. Essa linfocitose absoluta usualmente precede o aparecimento dos anticorpos heterofilos e costuma atingir um ápice em 2 a 3 semanas de doença. Praticamente todos os pacientes que mostram linfocitose atípica de 40% ou mais têm sorologia compatível com MI. TESTES DE FUNÇÃO HEPÁTICA Os testes de função hepática estão discretamente alterados em mais de 80% dos casos, mesmo sem hepatomegalia, geralmente, entre a segunda e a terceira semanas de doença. As transaminases e a fosfatase alcalina sofrem um aumento discreto. As bilirrubinas raramente superam 5 mg%. Alguns doentes desenvolvem significativa elevação de globulina alfa 2. Hiperuricemia está presente em mais de 50% dos casos de MI. MÓDULO FADIGA, PERDA DE PESO E ANEMIA – P2 | Luíza Moura e Vitória Neves SOROLOGIA O teste de Paul-Bunnel, o monoteste e o Spot teste, todos inespecíficos, detectam anticorpos heterófilos, os quais podem ser evidenciados a partir do 9º dia de doença. A negativação se inicia a partir do 1º ou 2 º mês após o início da doença. → Tais testes são usados em crianças maiores e adultos; → Estes testes têm baixa especificidade e sensibilidade em lactentes e escolares. Em lactantes e escolares são usados: → IgM VCA-EBV e a; → IgG VCA-EBV (anticapsídeo viral); ... pela técnica de imunofluorescência (IFI) ou ELISA. A!! Esses exames tornam-se positivos em uma a duas semanas do início da infecção. → IgM VCA-EBV persiste por 4 - 8 semanas; → IgG VCA-EBV persiste por toda a vida. A reação de Paul-Bunnel pode dar falso-positivo. TRATAMENTO O tratamento é sintomático. Não há tratamento farmacológico antiviral específico que atue adequadamente na terapêutica da MI. → A enfermidade evolui para a resolução clínica em um a dois meses; a recuperação habitual ocorre em duas a quatro semanas e, mais raramente, após 120 dias. REPOUSO O repouso relativo por cerca de três semanas é recomendado; para evitar aumento de pressão intra-abdominal, por traumatismo, constipação intestinal ou excesso de palpação. Em situação de grave comprometimento hepático, tratar como hepatite viral aguda, por aproximadamente um a dois meses. → Normalmente, nesse período há regressão do quadro hepático. ANTIRRETROVIRAL A terapêutica com Aciclovir inibe replicação do EBV em células linfoblastoides em concentrações não tóxicas ao crescimento celular. Portanto, o aciclovir: → Inibe a replicação dos genomas lineares (in vitro); e → Suspende a produção do vírus; O aciclovir não tem efeito na infecção celular latente. O mesmo não altera a evolução clínica da doença, não apresenta eficácia comprovada e não gera redução significativa da duração dos sintomas da MI. A!! Alguns relatos sugerem que o tratamento com Fanciclovir e Valaciclovir, análogos do aciclovir, poderia ter efeito benéfico na evolução clínica da MI. ANTIBIOTICOTERAPIA A Antibioticoterapia não está indicada para tratamento da MI sem infecção bacteriana secundária. Recentemente tem-se destacado as bactérias anaeróbias, suspeitas de manter a faringoamigdalite causada pelo EBV e sobre o uso dos nitroimidazóis por seu efeito antibacteriano e efeito imunossupressor, podendo agir nos mecanismos imunológicos, interferindo no linfócito B. CORTICOIDE O uso de terapia com corticoides não está indicado para os casos de MI não complicada, podendo, predispor às infecções secundárias. Tais medicamentos devem ser restritos aos casos mais complicados, os quais incluem: MÓDULO FADIGA, PERDA DE PESO E ANEMIA – P2 | Luíza Moura e Vitória Neves → Mal-estar intenso; → Risco de obstrução de vias aéreas por importante hipertrofia de tonsilas; → Trombocitopenia grave; → Anemia hemolítica autoimune; → Cardite; → Pneumonite intersticial linfóide; → Derrame pleural; e → Edema cerebral. Inicia-se prednisona 60 a 80mg, por dois a três dias, seguida de redução gradual da dose (10 mg por dia), por uma a duas semanas. A MI é autolimitada na maioria dos casos. Pode ocorrer: → Obstrução da via aérea superior por hipertrofia amígdalas palatinas; → Infecção bacteriana secundárias podem sobrevir em alguns enfermos. As complicações neurológicas podem ocorrer na ausência das manifestações clássicas de mononucleose e incluem: → Convulsões; → Ataxia; → Síndrome de meningite asséptica; → Paralisia de Bell; → Mielite transversa; → Encefalite; e → Síndrome de Guillian-Barré. Anemia hemolítica ocorre em cerca de 2% dos casos, bem como trombocitopenia grave e síndrome hemofagocitária. Outras complicações raras são descritas, como: hepatite fulminante, miocardite, pericardite com alterações eletrocardiográficas, pneumonia com derrame pleural, nefrite intersticial, ulcerações genitais, orquite, vasculite, pancreatite, parotidite e síndrome de Reye.
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