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PRINCÍPIOS JURÍDICOS NAS ORGANIZAÇÕES E-book 4 Natália Bonfim Neste E-Book: Introdução ����������������������������������������������������4 Teoria geral do direito empresarial ����� 5 Origens do direito comercial �����������������������������������5 Teoria dos atos de comércio �����������������������������������6 Teoria dos atos de comércio na legislação e doutrina brasileiras ��������������������������������������������������7 Teoria da empresa ���������������������������������������������������9 Teoria da empresa no Brasil ��������������������������������� 10 Conceito de empresa �������������������������������������������� 11 Conceito de empresário ��������������������������������������� 15 Inscrição do empresário ��������������������������������������� 18 Autonomia do direito empresarial ����������������������� 19 Princípios do direito empresarial �������20 Princípio da livre iniciativa ������������������������������������ 21 Princípio da liberdade de concorrência ��������������� 24 Princípio da função social da empresa ��������������� 26 Princípio da liberdade de associação ������������������ 29 Princípio da preservação da empresa ����������������� 30 Princípio da autonomia patrimonial da sociedade empresária ������������������������������������������ 32 Limitação e subsidiariedade da responsabilidade dos sócios pelas obrigações sociais ������������������������������������������������ 34 2 Princípio majoritário nas deliberações sociais e princípio da proteção do sócio minoritário ������ 36 Considerações finais�������������������������������38 Síntese �������������������������������������������������������� 40 3 INTRODUÇÃO Neste módulo, você irá estudar os princípios jurídicos aplicados ao direito empresarial� Tendo em vista que o direito empresarial disciplina as relações empre- sariais dispondo sobre regras, princípios e institutos jurídicos a serem aplicados à matéria, é essencial que você compreenda quais são os preceitos que fundamentam essas relações� Por isso, você irá estudar: • Teoria geral do direito empresarial: origens do direi- to comercial, teoria dos atos de comércio, teoria dos atos de comércio na legislação e doutrina brasileiras, teoria da empresa, teoria da empresa no Brasil, con- ceito de empresa, conceito de empresário, inscrição do empresário, autonomia do direito empresarial; • Princípios do direito empresarial: princípio da livre iniciativa, princípio da liberdade de concorrência, princípio da função social da empresa, princípio da liberdade de associação, princípio da preservação da empresa, princípio da autonomia patrimonial da empresa, limitação e subsidiariedade da responsabi- lidade dos sócios pelas obrigações sociais, princípio majoritário nas deliberações sociais e princípio da proteção do sócio minoritário� Bons estudos! 4 TEORIA GERAL DO DIREITO EMPRESARIAL Origens do direito comercial Sabemos que o comércio existe desde as primeiras civilizações, antes mesmo do Direito Comercial exis- tir� Na Idade Antiga, não havia um Direito Comercial propriamente dito, ou seja, um regime jurídico siste- matizado, com princípios e regras, para disciplinar a matéria� Também em Roma havia algumas regras comerciais, porém estas faziam parte do direito civil� É na Idade Média que começam a surgir as raízes do direito comercial, com a burguesia se organizando e criando o seu próprio direito, sem participação do Estado, a ser aplicado em suas relações comerciais� Nessa primeira fase do direito comercial, verifica- -se que as regras comerciais surgiram da própria atividade negocial, por meio dos usos e costumes utilizados nas relações jurídico-comerciais� Nesse período também surgiram os primeiros institutos jurídicos, como os títulos de crédito, as sociedades, os contratos mercantis e os bancos� Assim, nessa fase começam a se delinear as primei- ras características do direito comercial, quais seja, o 5 informalismo, a influência dos usos e costumes na elaboração de suas regras e o seu caráter subjetivis- ta, isto é: o direito comercial era um direito voltado aos comerciantes� Bastava que uma das partes da relação jurídica fosse comerciante para que fossem aplicadas as regras do direito comercial, em detri- mento de outros direitos aplicáveis à hipótese� O direito comercial desse período também foi o res- ponsável por provocar uma evolução da doutrina contratualista romana, que tinha o contrato como um instrumento de aquisição da propriedade� Porém, essa ideia de contrato como algo estanque não aten- dia aos interesses da classe mercantil, que estava em ascensão, e assim a formalidade passa a perder espaço, surgindo o princípio da liberdade na celebra- ção dos contratos� Teoria dos atos de comércio Com a expansão do comércio e a ascensão do ab- solutismo, pelo qual o Estado passa a impor regras e aplicá-las a todos os seus súditos, o direito comercial continua a evoluir e, em 1804, é editado na França o Código Civil, seguido pelo Código Comercial, em 1808� Nesse momento começa a segunda fase do direito comercial, que deixa de ser um direito voltado a co- merciantes, por eles criado e aplicado, para ser um sistema jurídico estatal destinado a disciplinar as relações jurídico-comerciais� 6 O sistema francês dividia claramente o direito privado em direito civil e direito comercial� Mas era preciso que se criasse um critério para estabelecer quais seriam as regras a serem aplicadas nas relações jurídicas entre particulares e, daí, a doutrina criou a teoria dos atos de comércio� Por essa teoria, o direito comercial seria aplicado às relações jurídicas que envolvessem a prática de determinados atos definidos em lei como atos de comércio� Se a relação jurídica em apreço não envol- vesse a prática de atos de comércio, ela seria regida pelo Código Civil� Teoria dos atos de comércio na legislação e doutrina brasileiras Nota-se, portanto, que o caráter subjetivista do direito comercial evoluiu para um caráter objetivo: se na pri- meira fase o direito comercial era um direito voltado aos comerciantes, na segunda fase ele passa a ser um direito voltado ao objeto das relações jurídicas (atos de comércio)� A teoria dos atos de comércio espalhou-se pelo mundo e foi adotada também pelo Brasil� Em 1850, foi editado o nosso Código Comercial, que definia comerciante como aquele indivíduo que exercia a mercancia como profissão habitual, mas não definia o conceito de mercancia� 7 Naquele mesmo ano, foi editado o Regulamento 737, que dispunha, em seu art� 19, os atos que se enqua- dravam como mercancia: § 1.º a compra e venda ou troca de efeitos móveis ou semoventes para os vender por grosso ou a retalho, na mesma espécie ou manufaturados, ou para alugar o seu uso; § 2.º as operações de câmbio, banco e corretagem; § 3.º as empresas de fábricas; de comissões; de depósito; de expedição, consignação, e transporte de mercadorias; de espetáculos públicos; § 4.º os seguros, fretamentos, riscos e quais- quer contratos relativos ao comércio marítimo; § 5.º a armação e expedição de navios. A crítica que se fazia ao sistema francês, também replicada ao sistema brasileiro, é que atividades eco- nômicas eram tão importantes quanto a mercancia, como as atividades de prestação de serviços, nego- ciação imobiliária e atividades rurais, ficaram de fora da definição de mercancia. Na tentativa de conceituar atos de comércio, sobres- saiu na doutrina brasileira a teoria de Carvalho de Mendonça, que os dividiu em três classes: 8 (i) atos de comércio por natureza: compreendiam as atividades típicas de mercancia, como a compra e venda e a atividade bancária; (ii) atos de comércio por dependência ou conexão: compreendiam as atividades auxiliares à mercancia; (iii) atos de comércio por força ou autoridade de lei, como as operações realizadas pelas sociedades anônimas� O que se nota da classificação sugerida por Carvalho de Mendonça é a dificuldade de englobar todas as espéciesde atividades de mercancia dentre os atos de comércio, principalmente tendo em vista que al- gumas dessas atividades assim eram consideradas por vontade política do legislador� Teoria da empresa Após a Revolução Industrial, surgiram outros tipos de atividades econômicas relevantes que não estavam incluídas nos conceitos de mercancia ou atos de co- mércio� Logo, a noção de direito comercial fundada exclusivamente na teoria dos atos de comércio ficou ultrapassada, surgindo assim a teoria da empresa� A teoria da empresa apareceu no Código Civil Italiano de 1942, e sustenta que o direito comercial não deve se ocupar apenas com alguns atos definidos em lei, como atos de comércio; ele deve se ocupar com uma forma específica de exercer uma atividade econômi- ca: a forma empresarial� Assim, em princípio, qual- 9 quer atividade econômica, desde que seja exercida empresarialmente, está submetida à disciplina das regras do direito empresarial (RAMOS, 2017, p� 18)� Nesse contexto, nessa terceira fase, o direito comer- cial deixou de ser o direito dos atos de comércio para ser o direito da empresa, englobando um maior número de atividades econômicas até então deixadas de lado pela teoria dos atos de comércio� Teoria da empresa no Brasil Já na década de 1960, a doutrina brasileira começou a apontar os problemas da teoria dos atos de comér- cio e ressaltar os benefícios da teoria da empresa, trazida pelo Código Civil Italiano de 1942� Os Tribunais pátrios passaram a afastar o critério da mercantilidade e abraçaram o critério da empresaria- lidade para fundamentar suas decisões, e algumas legislações se mostraram atentas ao fenômeno eco- nômico da empresa como nova realidade do direito brasileiro, como é o caso do Código de Defesa do Consumidor, de 1990, que aproximou o conceito de fornecedor ao conceito moderno de empresário� Em 2002, com a promulgação do Código Civil, foi revogado o Código Comercial de 1850, restando hoje em vigor apenas a parte relativa ao comércio marítimo� O Código Civil de 2002 trouxe todo um Livro dedicado ao Direito de Empresa, afastando-se definitivamen- 10 te da teoria dos atos de comércio e incorporando a teoria da empresa em nosso ordenamento jurídico� O conceito de ato de comércio é substituído pelo con- ceito de empresa, e a figura do comerciante desapare- ce, surgindo a figura do empresário, conforme dispõe o art� 966: “Considera-se empresário quem exerce pro- fissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços�” Restando superada a teoria dos atos de comércio na legislação brasileira, pergunta-se: ainda se deve utilizar a nomenclatura direito comercial? É evidente que a terminologia direito comercial é tradicional e ainda utilizada por muitos, não sendo incorreta a sua adoção� Todavia, o direito comercial não trata mais somente das atividades de mercancia, passando a abranger várias atividades econômicas, desde que exercidas profissionalmente e com vistas à produção ou à circulação de bens ou de serviços� Haja vista que, hoje, o direito comercial trata das relações empresariais, a melhor nomenclatura a se utilizar é, sem dúvida, direito empresarial. Conceito de empresa Observe que o Código Civil de 2002 manteve a distin- ção entre os regimes jurídicos a serem aplicados às relações jurídicas: em se tratando de relações civis, aplicam-se as regras de direito civil; em se tratando de relações empresariais, aplicam-se as regras de direito empresarial� 11 Exatamente por isso, é necessário que se estabeleça um critério que delimite o âmbito de incidência do di- reito empresarial� Esse critério é a teoria da empresa� Portanto, para sabermos o âmbito de incidência do direito empresarial, devemos conhecer os conceitos de empresa e empresário, trazidos pela teoria da empresa� O legislador brasileiro não cuidou de definir o concei- to de empresa, bastando-se dizer que empresários e sociedades empresárias são aqueles que exercem profissionalmente atividade econômica organizada para a produção e circulação de bens e serviços, nos termos do art� 966, acima transcrito� Gladston Mamede extrai desse dispositivo alguns elementos que permitem a compreensão jurídica da empresa (2019, p� 4): Estrutura organizada: não se atenta mais para o ato (ato de comércio), mas para a estrutura- ção de bens materiais e imateriais, organiza- dos para a realização, com sucesso, do objeto de atuação. Esses bens se constituem a partir de um capital que se investe na empresa. • Atividade profissional: não um ou alguns atos, mas atividade, isto é, sucessão con- tínua de ações para realizar o objeto pro- fessado (sua profissão, o motivo para o qual se constituiu a empresa). 12 • Patrimônio especificado: os bens materiais e imateriais organizados para a realização do objeto, e a atividade com eles realizada (conjunto de atos jurídicos), são específicos da empresa: faculdades e obrigações em- presariais, que deverão experimentar escri- turação (contabilidade) própria. • Finalidade lucrativa: a atividade realizada com a estrutura organizada de bens e proce- dimentos visa à produção de riquezas apro- priáveis, mais especificamente, de lucro, ou seja, de uma remuneração para o capital. • Identidade social: quando o legislador usa a expressão considera-se empresário, remete a um aspecto comunitário da empresa, que tem uma existência socialmente reconhe- cida. Fala-se, por exemplo, que o Bradesco fez isso ou aquilo, deixando perceber que a comunidade compreende a empresa como um ente existente em seu meio. Analisando o art� 966 do Código Civil, Silvio de Salvo Venosa e Cláudia Rodrigues (2017, p. 22) afirmam que empresário é aquele que exerce atividade eco- nomicamente organizada, com profissionalidade. A profissionalidade decorre da exploração não ocasio- nal dessa atividade, enquanto a organização repre- senta o aparato produtivo que coordena os meios de 13 produção por meio da reunião de quatro fatores de produção: capital, mão de obra, tecnologia e insumos� Logo, se o empresário se vale do trabalho de outras pessoas e usa capital próprio ou de terceiros para um fim produtivo, com intuito de obter lucro, a atividade econômica será organizada e, portanto, profissional, sendo abrangida pelo direito empresarial� Destaque-se que, no parágrafo único do art� 966 do CC, o legislador expressamente excluiu da definição de empresa quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa. Nessa regra, incluem-se médicos, advogados, en- genheiros etc. A exceção consta na parte final do parágrafo: os profissionais intelectuais e os artistas apenas serão considerados empresários se desenvol- verem atividade distinta da intelectual ou artística e considerada em si mesma empresária� Por exemplo, o médico que administra um hospital ou o músico que é empresário de sua banda� Ainda é importante lembrar que a atividade rural tam- bém pode ser considerada empresária, desde que o sujeito que a explora o faça de forma organizada e esteja inscrito na Junta Comercial, como determina o art� 971 do Código Civil: Art. 971. O empresário, cuja atividade rural constitua sua principal profissão, pode, ob- servadas as formalidades de que tratam o art. 14 968 e seus parágrafos, requerer inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis da respectiva sede, caso em que, depois de ins- crito, ficará equiparado, para todos os efeitos, ao empresário sujeito a registro. Por fim, ressalte-se que empresa é a atividade, algo abstrato, enquanto empresário é quem exerce a empresa� Assim, a empresa não é sujeito de direi- to� Quem é sujeito de direito é o titular da empresa, quem exerce a empresa, que pode ser pessoa física (empresário individual) ou pessoa jurídica (sociedade empresária ou EIRELI)� Conceito de empresárioComo já mencionamos, o art� 966 do Código Civil refere- -se tanto ao empresário quanto à sociedade empresária� Empresário é quem exerce profissionalmente ati- vidade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços� Empresa é a atividade econômica organizada com a finalidade de fazer circular ou produzir bens ou serviços� O parágrafo único do art� 966 do CC estabelece ex- pressamente quem não pode ser empresário: os pro- fissionais intelectuais e os artistas, salvo se o exer- cício da profissão constituir elemento de empresa. Por sua vez, o art� 971 do CC assegura que o em- presário cuja atividade rural constitua sua principal 15 profissão pode, observadas as formalidades de que tratam o art� 968 e seus parágrafos, requerer inscri- ção no Registro Público de Empresas Mercantis da respectiva sede, caso em que, depois de inscrito, ficará equiparado, para todos os efeitos, ao empre- sário sujeito a registro� O art� 970 do Código Civil dispõe que a lei assegurará tratamento favorecido, diferenciado e simplificado ao empresário rural e ao pequeno empresário� As formas encontradas para favorecer o pequeno empresário são a simplificação de procedimentos, tais como a dispensa de apresentação de certos documentos para sua inscrição na Junta Comercial� Conforme observam Venosa e Rodrigues (2017, p� 24), a legislação civil empresarial brasileira vem ofe- recendo cada vez mais possibilidades para a formali- zação de negócios e incentivos aos empreendedores, como os seguintes tipos societários: MEI – Esta é a sigla para o Microempreendedor Individual. Trata-se de empresário individual, criado pela Lei Complementar nº 123/06, de- vendo ter faturamento anual de até R$ 60 mil, podendo se ajustar ao Simples Nacional. O MEI não pode ter participação em outra em- presa como sócio ou titular. Em contrapartida, pode ter um empregado que receba salário mí- nimo ou o piso da categoria. Será enquadrado no Simples Nacional e fica isento dos tribu- tos federais (Imposto de Renda, PIS, Cofins, IPI e CSLL). Paga apenas o valor fixo mensal 16 pequeno dependendo da categoria, que será destinado à Previdência Social e ao ICMS ou ao ISS. Essas quantias são atualizadas anual- mente, de acordo com o salário mínimo. Empresário Individual – Muitos acham que é o mesmo que MEI, mas não é. Eles se diferenciam principalmente com relação à restrição de ati- vidades, ao faturamento anual e ao número de obrigações acessórias. O Empresário Individual também é um profissional que trabalha por con- ta própria, mas seu faturamento anual máximo pode chegar até a R$ 360 mil, sendo conside- rado ME (Microempresa), ou até 3,6 milhões, sendo EPP (Empresa de Pequeno Porte). EIRELI – Esta é a sigla para Empresa Individual de Responsabilidade Limitada, instituída pela Lei nº 12.441/11. Trata-se de uma empresa cons- tituída por apenas uma pessoa, detentora de 100% do capital, que não pode ser inferior a cem vezes o valor do salário mínimo do ano. A EIRELI estabelece que apenas o patrimônio social da empresa esteja comprometido em casos de dívidas do negócio, protegendo assim os bens pessoais. A criação da EIRELI, sem dúvidas, foi uma forma encontrada para brecar o modelo de sociedades de responsabilidade limitada, constituídas apenas para fins de limitação pa- trimonial, nas quais um dos sócios era detentor de geralmente 99% do capital social e, outro, de apenas 1%. Sem dúvidas a EIRELI é um instru- 17 mento de fomento da exploração da atividade econômica, eminentemente de risco. Entretanto, essa prerrogativa é limitada à exploração de apenas uma EIRELI por empresário. Inscrição do empresário Para que a atividade econômica seja considerada em- presária, é necessário que o empresário realize sua inscrição na Junta Comercial, para que se dê a ela pu- blicidade, ou seja, para que terceiros tenham conheci- mento da sua existência� O primeiro efeito que decorre da inscrição é a aquisição da condição de empresário� A personificação da sociedade é essencial para limitar a responsabilidade patrimonial dos sócios e garantir certeza jurídica a interessados, terceiros e sociedade� Assim, a ausência de inscrição implica a ampliação da responsabilidade patrimonial dos sócios� A exploração de atividade econômica sem o devido registro sujeita o seu titular a sanções, principalmen- te de natureza patrimonial� Além disso, a sociedade estará irregular, ficando sujeita às regras da socie- dade em comum, respondendo os sócios solidária e ilimitadamente pelas obrigações sociais, nos termos do art� 990 do Código Civil� O empresário irregular também fica impedido de se registrar no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ) e de se matricular no INSS, além de estar sujeito a outras sanções de natureza fiscal e administrativa� 18 Autonomia do direito empresarial Por tudo que foi estudado até aqui, nota-se que o direito empresarial constitui um ramo autônomo e independente do direito, pois é um regime jurídico es- pecial que contempla normas específicas que se apli- cam aos empresários e às sociedades empresárias� No entanto, isso não significa que o direito empre- sarial está dissociado do direito civil, afinal, ambos compartilham institutos jurídicos e, muitas vezes, o direito comercial irá buscar no direito civil a solução para sanar lacunas do seu texto legal� Além disso, com o passar do tempo, alguns institutos de direito empresarial acabam sendo incorporados pelo direito comum, tal como ocorreu com o bem de família, que foi pensado originalmente como forma de limitar a responsabilidade do comerciante indi- vidual e foi incluído no antigo Código Civil de 1916 (RAMOS, 2017, p� 17)� Em suma, não há como negar que o direito empre- sarial é ramo independente e autônomo do direito, haja vista que disciplina as atividades econômicas desenvolvidas no mercado, com regras, princípios e institutos jurídicos próprios� 19 PRINCÍPIOS DO DIREITO EMPRESARIAL Segundo Fábio Ulhôa Coelho (2012), os princípios de direito empresarial podem ser classificados segundo três critérios: (i) hierarquia: de acordo com esse critério, os prin- cípios dividem-se em constitucionais ou legais� Constitucionais são os princípios enunciados pela Constituição Federal� Legais são os princípios enun- ciados em lei ordinária; (ii) abrangência: por esse critério, os princípios po- dem ser gerais ou especiais� Gerais são os princípios aplicáveis a todas as relações jurídicas regidas pelo direito comercial� Especiais são os princípios que regulam as relações regidas por desdobramentos do direito empresarial, como as relações de direito societário, cambiário, falimentar etc�; (iii) positivação: de acordo com esse critério, os prin- cípios podem ser explícitos ou implícitos� Explícitos são os princípios enunciados expressamente pelo constituinte ou pelo legislador� Implícitos são os prin- cípios cujos enunciados o julgador ou doutrinador concluem dos dispositivos vigentes� 20 SAIBA MAIS O Grupo de Estudos Preparatórios “Princípios do Direito Comercial”, coordenado pelo profes- sor Fábio Ulhoa Coelho, elaborou, em 2011, um relatório sobre os princípios de direito comercial para estudá-los no contexto de sua atualização e contribuir para reforçar o valor embutido em cada um deles� Para ler o trabalho e aprender mais so- bre princípios de direito empresarial, acesse esse link: https://www.congressodireitocomercial.org. br/sites/wp-content/uploads/2016/12/gep2.pdf� Para os fins dessa disciplina, vamos destacar os princípios que são mais importantes para a disciplina do direito empresarial� Princípio da livre iniciativa O princípio da livre iniciativa está previsto no art� 170 da Constituição Federal, que assim dispõe: “a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho hu- mano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da jus- tiça social, observados os seguintes princípios […]”� Assim,a livre iniciativa é um princípio constitucional, geral e explícito, que garante o direito à livre produção e circulação de bens e serviços e, consequentemente, o respeito dos demais (Estado e terceiros) a essa liberdade, garantido pelo princípio da livre concor- rência (COELHO; NUNES, 2011, p� 7)� 21 https://www.congressodireitocomercial.org.br/sites/wp-content/uploads/2016/12/gep2.pdf https://www.congressodireitocomercial.org.br/sites/wp-content/uploads/2016/12/gep2.pdf A liberdade de iniciativa tem duplo aspecto: por um lado, significa um freio à intervenção do Estado na economia, impondo a ele a obrigação de não dificul- tar ou impedir a formação e o desenvolvimento de empresas privadas� D’outro lado, coíbe determinadas práticas empresariais incompatíveis com a liberdade de iniciativa, assegurando aos empresários condi- ções para concorrerem licitamente entre si� O princípio da livre-iniciativa se desdobra em quatro con- dições para o funcionamento mais eficiente do modo de produção capitalista (COELHO, 2012, pp� 53-54): (i) imprescindibilidade da empresa privada para o atendimento das necessidades e que- rências de cada um e de todos. Ao interesse dos empresários em obter lucro corresponde os interesses de todos os integrantes da so- ciedade em terem acesso aos bens e serviços de que necessitam ou desejam; (ii) o lucro, obtido com a exploração regular e lícita da empresa, é o principal fator de motiva- ção da iniciativa privada. O lucro não pode ser considerado jurídica ou moralmente condena- do, pois sem a perspectiva de lucro, ninguém se propõe a empreender ou investir, e restarão desatendidas as necessidades e querências de todos os integrantes da sociedade; (iii) necessidade jurídica de proteção do inves- timento privado. Ao definir a liberdade de ini- ciativa como um dos fundamentos da ordem 22 econômica, a Constituição Federal não está protegendo apenas os interesses individuais dos empresários; ela está protegendo também os interesses de toda a sociedade. Assim é que, em caso de conflito entre os interesses dos em- presários e os dos integrantes das sociedades, estes últimos devem sempre prevalecer; (iv) importância da empresa na geração de postos de trabalho e tributos, bem como no fomento da riqueza local, regional, nacional e global. Ao redor da empresa, gravitam vários interesses, como os dos consumidores e dos trabalhadores. Logo, o sucesso da empresa interessa a todos esses grupos, pois se a em- presa não prospera, os empregados têm me- nor margem para exigir melhorias salariais ou nas condições de trabalho; o atendimento aos consumidores é mais precário; menos ativida- des econômicas geram menos impostos etc. Ao assegurar a liberdade de iniciativa, a Constituição Federal garantiu a todos os brasileiros e residentes no Brasil o direito de ser empresário� Todavia, ao mes- mo tempo em que consagra a liberdade de iniciativa como direito fundamental, a Constituição Federal limita seus efeitos, pois possibilita ao Estado inter- vir no mercado por meios de leis para assegurar os direitos dos consumidores� Diz-se, portanto, que a liberdade de iniciativa e a valorização do trabalho previstos no art� 170 da 23 Constituição Federal constituem a base da ordem econômica e que o desempenho de atividade econô- mica deve observar os outros princípios igualmente importantes previstos naquele dispositivo legal, como a proteção ao meio ambiente, a função social da propriedade, a defesa do consumidor etc� O que se nota em nossos Tribunais é que, quando confrontado com outros princípios, a livre iniciativa frequentemente é deixada de lado� No entanto, em caso de grande repercussão, o STF julgou decidiu que são inconstitucionais leis que restringem ou proíbem a atividade de transporte individual de passageiros por meio de aplicativos, como Uber, Cabify e 99, por entender que a restrição dessas atividades viola os princípios da livre iniciativa e da livre concorrência� Saiba mais no podcast 1 - Constitucionalidade dos serviços de aplicativos de transporte. Podcast 1 Princípio da liberdade de concorrência Outro princípio fundamental da ordem econômica é a liberdade de concorrência, prevista no inc� IV do art� 170 da Constituição Federal: Art. 170. A ordem econômica, fundada na va- lorização do trabalho humano e na livre inicia- tiva, tem por fim assegurar a todos existência 24 https://famonline.instructure.com/files/118840/download?download_frd=1 digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: [...] IV - Livre concorrência. O princípio da livre concorrência é uma manifesta- ção do princípio da liberdade de iniciativa, muitas vezes, com ele se confundindo� É por meio dele que se garante que cheguem ao mercado produtos e ser- viços com qualidade e preços razoáveis� É, também, princípio constitucional, geral e explícito do direito empresarial� No direito empresarial, o princípio da liberdade de concorrência tem dois sentidos: o primeiro se relacio- na à coibição de determinadas práticas empresariais que configuram concorrência ilícita. A concorrência ilícita pode ocorrer por intermédio da prática de atos de concorrência desleal ou por meio de atos que configuram infração contra a ordem econômica� No primeiro caso, estão compreendidas as condu- tas que atingem um concorrente in concreto (por exemplo, a venda de produtos pirata)� No segundo, as condutas que atingem um concorrente in abstrato, isto é, o próprio ambiente concorrencial, por exemplo, a formação de cartéis (RAMOS, 2017, p� 23)� 25 FIQUE ATENTO O princípio da livre concorrência esteve amea- çado por leis aprovadas por alguns municípios brasileiros, que visavam a impedir o livre comér- cio� A discussão chegou ao STF e, em 2015, esse Tribunal editou a Súmula Vinculante n° 90, que tem o seguinte teor: Ofende o princípio da livre concorrência lei municipal que impede a instala- ção de estabelecimentos comerciais do mesmo ramo em determinada área. Para saber mais sobre essa Súmula, assis- ta ao vídeo da TV Justiça sobre a matéria, dis- ponível no link: https://www�youtube�com/ watch?v=GDBPKSTSQNk� Princípio da função social da empresa Assim como a noção de função social do contrato, o princípio da função social da empresa é um desdo- bramento do princípio da função social da proprie- dade consagrado nos arts� 5°, inc� XXIII e 170, inc� III da Constituição Federal� É princípio constitucional, geral e implícito do direito empresarial� Por esse princípio, os bens de produção, isto é, todos aqueles necessários para o desempenho da ativida- de econômica, deverão cumprir uma função social� Isso significa que os bens de produção devem ser 26 https://www.youtube.com/watch?v=GDBPKSTSQNk https://www.youtube.com/watch?v=GDBPKSTSQNk empregados de forma que atendam aos interesses de todos aqueles que gravitam em torno da empresa – acionistas, empregados, consumidores, comunida- de –, como ensina Fábio Ulhoa Coelho (2012, p� 81): Cumpre sua função social a empresa que gera empregos, tributos e riqueza, contribui para o desenvolvimento econômico, social e cultural da comunidade em que atua, de sua região ou do país, adota práticas empresariais susten- táveis visando à proteção do meio ambiente e ao respeito aos direitos dos consumidores. Se sua atuação é consentânea com estes ob- jetivos, e se desenvolve com estrita obediência às leis a que se encontra sujeita, a empresa está cumprindo sua função social; isto é, os bens de produção reunidos pelo empresário na organização do estabelecimento empresa- rial estão tendo o emprego determinado pela Constituição Federal. A função social da empresa foi prevista expressa- mente na Lei n° 6�404/76, a Lei das Sociedades Anônimas, em seus arts� 116 e 154, como seguem: Art. 116. Entende-se por acionista controlador a pessoa, natural ou jurídica, ou o grupo de pessoas vinculadas por acordo de voto, ou sob controle comum, que: [...] 27Parágrafo único. O acionista controlador deve usar o poder com o fim de fazer a companhia realizar o seu objeto e cumprir sua função so- cial, e tem deveres e responsabilidades para com os demais acionistas da empresa, os que nela trabalham e para com a comunidade em que atua, cujos direitos e interesses deve le- almente respeitar e atender. [...] Art. 154. O administrador deve exercer as atri- buições que a lei e o estatuto lhe conferem para lograr os fins e no interesse da compa- nhia, satisfeitas as exigências do bem público e da função social da empresa. No sentido que é dado pela Lei das Sociedades Anônimas, a função social pode ser identificada com a exigência de um comportamento “idôneo e probo” de controladores e dos administradores das pessoas jurídicas, ganhando maior destaque em processos de recuperação judicial e falências, nos quais é aplicada com vistas à preservação da empresa em crise, caso em que passa a ser identificada com a importância da preservação de empregos, arrecadação de tribu- tos e desenvolvimento econômico do país (COELHO; NUNES, 2011, p� 13)� 28 Princípio da liberdade de associação O princípio da livre associação está previsto nos inc� XVII e XX do art� 5° da Constituição Federal: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à pro- priedade, nos termos seguintes: [...] XVII - é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar; [...] XX - ninguém poderá ser compelido a asso- ciar-se ou a permanecer associado. Esse princípio é especial, constitucional e explícito e destina-se a assegurar que todos possam se reunir para somarem forças na realização de interesses em comum, por exemplo, a participação em um partido político ou em um clube� Transposto ao direito empresarial, esse princípio significa que tanto as pessoas físicas quanto as pes- soas jurídicas são livres para se reunir com vistas 29 a atingir os fins pretendidos com a exploração da atividade econômica� A liberdade de associação contém quatro direitos: o de criar associações e cooperativas sem a necessi- dade de se obter prévia autorização do Estado; a de aderir ou não a qualquer associação, pois ninguém pode ser obrigado a se associar; o direito de se desli- gar da associação, justamente porque ninguém pode ser obrigado a permanecer associado; e o direito de dissolver espontaneamente a associação� Entretanto, aplicado esse princípio à empresa, há uma peculiaridade no que se refere ao direito de se desligar da associação: na sociedade empresária, o sócio investe recursos (dinheiros, bens, créditos), logo, o seu desligamento da empresa tem reflexos, tanto nos direitos e interesses da pessoa jurídica quanto nos dos sócios e, até mesmo, de terceiros� Por isso, o direito de se desligar de uma empresa apenas pode ser exercido sob determinadas condi- ções, estabelecidas pelo direito societário� Princípio da preservação da empresa Ao analisarmos a função social da empresa, disse- mos que esse princípio tem sido muito utilizado em sede de processos de recuperação judicial e falência, com vistas à preservação da empresa� 30 Note que esse princípio busca proteger a atividade econômica desenvolvida, não o empresário nem o estabelecimento comercial� Ele visa a assegurar a continuidade da atividade eco- nômica desenvolvida, pois, como já observamos, o sucesso da empresa interessa a todos os grupos que gravitam ao seu redor, sendo responsável pela gera- ção de postos de trabalho e tributos, bem como no fomento da riqueza local, regional, nacional e global� Nesse contexto, em 2012, o STJ decidiu que dívi- da de valor insignificante assumida pela empresa não é capaz de causar a decretação de sua falência, devendo-se privilegiar o princípio da preservação da empresa� Sobre o assunto, atente-se ao podcast 2 - Débito de valor ínfimo e preservação da empresa. Podcast 2 Esse princípio não está previsto expressamente na lei; ele decorre das conclusões retiradas pela doutrina e jurisprudência das normas relacionadas à resolu- ção da sociedade em relação a um sócio (CC, arts� 1�028 e seguintes), desconsideração da personalida- de jurídica (CC, art� 50; CDC, art� 28) e recuperação judicial (Lei n° 11�101/2005)� É, portanto, um princípio legal, especial e implícito� 31 https://famonline.instructure.com/files/118841/download?download_frd=1 REFLITA Em 2018, o STJ decidiu que empresas que estão em recuperação judicial podem participar de pro- cessos de licitação, desde que demonstrem ter viabilidade econômica� Para o Tribunal, o objetivo principal da Lei de Fa- lências é viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, a sua função social e o estímulo à ati- vidade econômica� Dessa forma, negar à pessoa jurídica em crise o direito de participar de licita- ções públicas vai de encontro ao sentido atribuí- do pelo legislador na Lei de Falências� Para ler essa decisão no site do STJ, busque na Pesquisa de Jurisprudência pelo Agravo em Re- curso Especial n° 309�867 – ES, Relator Ministro Gurgel de Faria, julgado em 26 de junho de 2018� Princípio da autonomia patrimonial da sociedade empresária Pelo princípio da autonomia patrimonial, os bens, direitos e obrigações da pessoa jurídica não se con- fundem com os dos seus sócios� Disso decorre a impossibilidade de se cobrar os sócios pelas dívidas assumidas pela sociedade� 32 Apenas depois de executados os bens da socieda- de, e mesmo assim observando-se eventuais limita- ções impostas pela lei, é que os sócios poderão ser responsabilizados� O princípio da autonomia patrimonial é legal, especial e implícito� A autonomia patrimonial das sociedades empresá- rias é uma técnica de segregação de riscos que está ao alcance das duas partes da relação obrigacional� Se uma sociedade empresária devedora de certa obri- gação está sob o abrigo do princípio da autonomia empresarial, ela não pode, na posição de credora, que- rer impedir outra sociedade empresária, que lhe deve, de ter o mesmo benefício (COELHO, 2012, p� 62)� Deve-se destacar que, para evitar que a autonomia empresarial da sociedade seja utilizada com fraude ou abuso de direito em prejuízo do consumidor, o Código de Defesa do Consumidor prevê o instituto da descon- sideração da personalidade jurídica em seu art� 50: Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a perso- nalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, esta- do de insolvência, encerramento ou inativi- dade da pessoa jurídica provocados por má administração. 33 Assim, o intuito da desconsideração da personalida- de jurídica é afastar a divisão existente entre os bens dos sócios e da empresa, considerando-os como uma universalidade de bens que deve responder pe- las dívidas da sociedade assumidas pelos sócios com fraude ou abuso de direito� SAIBA MAIS Para aprender mais sobre a desconsideração da personalidade jurídica, assista ao vídeo AGU Explica – Desconsideração da Personalidade Jurídica, disponível no link https://www.youtube. com/watch?v=cmQZPbyhl2E� Limitação e subsidiariedade da responsabilidade dos sócios pelas obrigações sociais O princípio da subsidiariedade da responsabilidade dos sócios pelas obrigações sociais significa que, em caso de dívida assumida pela sociedade, os bens dos sócios apenas poderão ser executados após a execução dos bens da sociedade� O princípio da limitação da responsabilidade dos sócios pelas obrigaçõessociais leva em conside- ração os riscos inerentes à exploração da atividade econômica, pois limita a responsabilidade dos sócios pelas dívidas assumidas pela sociedade, estimu- 34 https://www.youtube.com/watch?v=cmQZPbyhl2E https://www.youtube.com/watch?v=cmQZPbyhl2E lando investimentos, como ensina Áurea Moscatini (COELHO; NUNES, 2011, pp� 18-19): Importante demonstrar que os princípios da autonomia patrimonial e da subsidiariedade da responsabilidade dos sócios pelas dívidas sociais são importantes, a fim de que os in- vestimentos continuem sendo feitos, o que garantirá via de consequência a sobrevivência da figura do empresário, na forma de socie- dade ou individual, o que é muito importante para a sociedade e mais ainda para a sobre- vivência do próprio homem, como ser social que é. Não se pode esquecer que o homem necessita da imposição de normas que ga- rantam sua tranquilidade no convívio social e especialmente lhe garantam os bens, com a crescente evolução tecnológica a que está acostumado. Se por um lado existem fortes investimentos na área tecnológica, por outro lado, verifica-se a aproximação de um mal inevitável, como as mudanças climáticas, as quais representam grandes catástrofes, com fortes impactos ambientais, sociais e econô- micos, o que num curto espaço de tempo, fará com que o homem dispute por água e comida e não petróleo ou bens sofisticados tecnologi- camente, como se imaginava, anteriormente. Portanto, a limitação da responsabilidade dos só- cios não visa a eximi-los da responsabilidade pelas 35 dívidas assumidas pela sociedade, ao contrário: res- tringindo o risco para os empresários, a tendência é estimular novos investimentos, pois o investidor não terá receio de perder a totalidade dos bens de seu patrimônio em caso de insucesso da empresa� Por fim, destaque-se que ambos os princípios são legais, especiais e implícitos� Princípio majoritário nas deliberações sociais e princípio da proteção do sócio minoritário O princípio majoritário nas deliberações sociais está relacionado ao direito de voto nas sociedades empresárias� A sociedade empresária manifesta sua vontade por meio das pessoas naturais, investidas pela lei ou pelo ato constitutivo (contrato ou estatuto social) – os sócios� Em vista desse princípio, prevalecerá a vontade ou o entendimento da maioria em uma deliberação de interesse geral da empresa� De modo geral, ensina Fábio Ulhoa Coelho (COELHO, 2012, p� 66): [...] o princípio majoritário se expressa pela atribuição de poder deliberativo ao sócio pro- porcionalmente às quotas ou ações (votantes) tituladas. Em decorrência, numa sociedade limi- tada, o sócio titular de quotas representativas 36 de mais da metade do capital social é o majo- ritário; e na anônima, será o acionista titular de mais da metade das ações votantes, presentes na assembleia geral. Este sócio majoritário, so- zinho, pode definir a vontade da sociedade em- presária, mesmo que com ele não concordem os demais. As deliberações sociais dependem da vontade ou entendimento de outros sócios, além do majoritário, somente se previsto algum mecanismo que o assegure num acordo de quotistas ou de acionistas. Assim, pelo princípio majoritário, as deliberações sociais são adotadas, em princípio, pelo sócio que mais investiu na sociedade e, consequentemente, assumiu maior risco� Em contraposição, o princípio da proteção do sócio minoritário limita o princípio majoritário por meio de instrumentos disponibilizados aos minoritários, como o direito de fiscalização e o direito de recesso, im- pedindo que os majoritários acabem se apropriando de ganhos que devem se repartidos entre os sócios� Ambos os princípios são legais, especiais e implícitos� 37 CONSIDERAÇÕES FINAIS Bem, estudante, vamos recapitular o que você apren- deu neste módulo da disciplina? Você aprendeu que o direito comercial evoluiu ao longo do tempo, passando por diferentes fases, até chegar à teoria da empresa, que foi adotada pela legislação e doutrina brasileiras� O Código Civil de 2002 incorporou a teoria da em- presa em nosso ordenamento jurídico, substituindo o conceito de ato de comércio pelo conceito de em- presa, o conceito de comerciante pelo conceito de empresário� Assim, o direito comercial passou a ser denominado de direito empresarial, pois deixou de tratar apenas das atividades de mercancia, para abranger várias atividades econômicas, desde que exercidas profis- sionalmente e com vistas à produção ou à circulação de bens ou de serviços� O direito empresarial tem como fundamento diversos princípios; dentre eles, destacamos aqueles mais im- portantes para a compreensão da matéria: princípio da livre iniciativa, princípio da liberdade de concorrên- cia, princípio da função social da empresa, princípio da liberdade de associação, princípio da preservação da empresa, princípio da autonomia patrimonial da empresa, limitação e subsidiariedade da responsabi- 38 lidade dos sócios pelas obrigações sociais, princípio majoritário nas deliberações sociais e princípio da proteção do sócio minoritário� Destaque-se que os princípios direcionam as con- dutas dos cidadãos no cumprimento das normas e, por isso, é importante que você compreenda como eles são aplicados nas relações jurídicas travadas nas organizações� E isso você fez com sucesso ao longo dessa disci- plina! Parabéns e bons estudos! 39 Síntese • Livre iniciativa, liberdade de concorrência, função social da empresa, liberdade de associação, preservação da empresa, princípio da autonomia patrimonial da sociedade empresária, limitação e subsidiariedade da responsabilidade dos sócios pelas obrigações sociais, princípio majoritário nas deliberações sociais e princípio da proteção do sócio minoritário. PRINCÍPIOS DE DIREITO EMPRESARIAL • Teoria da empresa no Brasil: Código Civil de 2002 ato de comércio é substituído pelo conceito de empresa, e desaparece a figura do comerciante, surgindo a figura do empresário. • Conceitos de empresa e empresário: art. 966 do Código Civil considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços. TEORIA GERAL DO DIREITO EMPRESARIAL Parabéns, estudante! Você chegou ao fim da quarta unidade dessa disciplina. Em síntese, isso é o que você aprendeu até agora: PRINCÍPIOS JURÍDICOS NAS ORGANIZAÇÕES Referências Bibliográficas & Consultadas BRASIL� Constituição (1988)� Constituição Federativa do Brasil. Brasília, DF, 1988� BRASIL, Constituição� Lei nº 10�406, de 10 de janei- ro de 2002� Institui o Código Civil. Diário Oficial da União, n� 8, 2002� COELHO, Fábio Ulhoa� Curso de direito comercial: direito de empresa� 16� ed� São Paulo: Saraiva, 2012� COELHO, Fábio Ulhoa; NUNES, Marcelo Guedes (Org�)� Princípios do direito comercial� GEP - Grupo de Estudos Preparatórios do Congresso de Direito Comercial, pp� 1-67, 2011� Disponível em: https:// www.congressodireitocomercial.org.br/sites/wpcon- tent/uploads/2016/12/gep2.pdf. Acesso em: 01 ago. 2019� MAMEDE, Gladston� Manual de direito empresarial� 12� ed�, rev� e atual� São Paulo: Atlas, 2018� https://www.congressodireitocomercial.org.br/sites/wpcontent/uploads/2016/12/gep2.pdf https://www.congressodireitocomercial.org.br/sites/wpcontent/uploads/2016/12/gep2.pdf https://www.congressodireitocomercial.org.br/sites/wpcontent/uploads/2016/12/gep2.pdf RAMOS, André Luiz Santa Cruz� Direito empresarial� 7� ed� rev� e atual� São Paulo: Método, 2017� VENOSA, Silvio de Salvo; RODRIGUES, Cláudia� Direito empresarial� 7� ed� São Paulo: Atlas, 2017� Introdução Teoria geral do direito empresarial Origens do direito comercial Teoria dos atos de comércio Teoria dos atos de comércio na legislação e doutrina brasileiras Teoria da empresa Teoria da empresa no Brasil Conceito de empresa Conceito de empresário Inscrição do empresário Autonomia do direito empresarialPrincípios do direito empresarial Princípio da livre iniciativa Princípio da liberdade de concorrência Princípio da função social da empresa Princípio da liberdade de associação Princípio da preservação da empresa Princípio da autonomia patrimonial da sociedade empresária Limitação e subsidiariedade da responsabilidade dos sócios pelas obrigações sociais Princípio majoritário nas deliberações sociais e princípio da proteção do sócio minoritário Considerações finais Síntese
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