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INFECÇÕES DO TRATO GENITAL INFERIOR

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VAGINITES E VAGINOSES
MICROBIOMA VAGINAL
· “Bioma” = comunidade vegetal ou animal que vive em um habitat específico. O microbioma refere-se a seres microscópicos, podendo abranger bactérias e fungos.
· O microbioma vaginal é, na grande maioria das vezes, dominado por uma ou duas espécies de Lactobacillus, sendo os mais frequentes Lactobacillus inner, Lactobacillus crispatus, Lactobacillus gasseri ou Lactobacillus jensenii.
· Entretanto, em algumas mulheres assintomáticas e saudáveis, o predomínio no meio vaginal não é dos Lactobacillus, mas sim de outras bactérias, incluindo espécies de Prevotella, Gardnerella, Atopobium e Megasphaera (Zhou et al., 2004).
ÁCIDO LÁTICO E pH VAGINAL
O estrogênio estimula o depósito de glicogênio nas células epiteliais vaginais, que posteriormente é degradado em glicose e ácido lático, por ação dos Lactobacillus.
Resultando em um pH vaginal igual ou menor a 4,5 na maioria das mulheres assintomáticas na idade reprodutiva, com ciclos menstruais normais.
A produção de ácido lático vaginal não depende apenas da ação de microrganismos.
A segunda fonte produtora de ácido lático são as células da mucosa vaginal de mulheres em idade reprodutiva, por meio de seu metabolismo, particularmente nas células da camada intermediária. O ácido lático é difundido para fora das células e acumulado no lúmen vaginal. Tal produção é estrogênio-dependente e explica, ao lado da diminuição da população de Lactobacillus, a elevação do pH em mulheres na pós-menopausa que não estejam recebendo terapia hormonal (Witkin, 1987).
· VAGINOSE BACTERIANA:
É o desequilíbrio da flora vaginal caracterizado pela substituição da flora microbiana saudável (dominada por Lactobacillus) por microbiota variável, composta por mistura de bactérias anaeróbias e facultativas.
Mais frequentes: Gardnerella, Atopobium, Prevotella, Megasphaera, Leptotrichia, Sneatia, Bifidobacterium, Dialister, Clostridium e Mycoplasmas.
Mais frequente afecção do trato genital inferior feminino!
Pode facilitar a transmissão/aquisição de outros agentes de transmissão sexual como C. trachomatis e N. gonorrhoeae.
FATORES DE RISCO:
· Uso de duchas vaginais;
· Tabagismo;
· Menstruação;
· Raça negra;
· Estresse crônico;
Comportamentos sexuais: elevado número de parceiros masculinos, sexo vaginal desprotegido, sexo anal receptivo antes do sexo vaginal e sexo com parceiro não circuncisado.
Mulheres que fazem sexo com mulheres têm alta prevalência de VB (25% a 52%).
QUADRO CLÍNICO:
Corrimento de intensidade variável.
Odor vaginal fétido (“odor de peixe” ou amoniacal).
OBS: O odor fétido piora com o intercurso sexual desprotegido e durante a menstruação, devido à volatização de aminas aromáticas (putrescina, cadaverina, dimetilamina) resultantes do metabolismo das bactérias anaeróbias pela alcalinidade do sêmen ou do sangue menstrual.
AO EXAME GINECOLÓGICO ESPECULAR:
Conteúdo vaginal homogêneo, em quantidade variável (geralmente escassa, mas pode ser moderada ou abundante).
Coloração geralmente esbranquiçada, branco-acinzentada ou amarelada.
CRITÉRIOS DE AMSEL: 3 DE 4 (PROVA!!!!)
· Corrimento vaginal branco-acinzentado homogêneo aderente às paredes vaginais;
· pH vaginal > 4,5;
· Teste das aminas (whiff test): positivo, ou seja, desprendimento de odor fétido após a adição de KOH 10% a uma gota de conteúdo vaginal;
· Presença de “células-chave” (“clue cells”) >>> células epiteliais recobertas por cocobacilos Gram variáveis na bacterioscopia;
CLUE CELLS
ESCORE DE NUGENT:
Elementos avaliados na bacterioscopia com coloração pelo método de Gram, particularmente os morfotipos de Lactobacillus, de Gardnerella vaginalis e de Mobiluncus sp.
· Escore de 0 a 3 – padrão normal;
· Escore de 4 a 6 – flora vaginal intermediária;
· Escore de 7 a 10 – vaginose bacteriana;
TRATAMENTO RECOMENDADO:
Metronidazol 500 mg por via oral duas vezes ao dia durante sete dias.
 	OU
Metronidazol gel 0,75% – 5g (um aplicador) intravaginal ao deitar durante cinco dias.
OU
Clindamicina creme 2% – 5g (um aplicador) intravaginal ao deitar durante sete dias.
TRATAMENTOS ALTERNATIVOS:
Tinidazol 2g por via oral duas vezes ao dia durante dois dias.
OU
Tinidazol 1g via oral uma vez ao dia durante cinco dias.
OU
Clindamicina 300 mg por via oral a cada 12 horas durante sete dias.
RECORRÊNCIA:
Metronidazol 500mg, via oral, 12/12h, durante 10 a 14 dias.
Metronidazol geléia vaginal 2x/semana, durante 4-6 meses.
Tinidazol 2g, via oral em dose única seguida da aplicação de óvulos vaginais de ácido bórico 600mg, e terapia supressiva com metronidazol gel.
OBS: Recidivas ocorrem em mais de 30% dos casos, aproximadamente três meses após o término do tratamento.
EFEITOS COLATERAIS DOS MEDICAMENTOS:
· Imidazólicos: náuseas, vômitos, cefaléia, insônia, tontura, boca seca e gosto metálico.
· Recomendar abstinência de álcool durante 24 horas após o tratamento com metronidazol (efeito dissulfiram), e 72 horas após o uso de tinidazol, e abstenção de atividade sexual ou o uso de preservativos correta e consistentemente durante o tratamento.
· Lembrar que a clindamicina tem base oleosa e pode enfraquecer preservativos e diafragmas até cinco dias após o uso.
· CANDIDÍASE VULVOVAGINAL
“...75% das mulheres em idade reprodutiva apresentarão pelo menos um episódio de vulvovaginite por Candida sp. durante suas vidas; 50% apresentarão dois ou mais episódios e 5% terão episódios recorrentes, ou seja, quatro ou mais episódios por ano, confirmados clínica e laboratorialmente (Sobel et al., 1995).”
São leveduras saprófitas.
 TIPOS:
· Candida albicans (85% a 95% dos casos);
· Candida glabrata e Candida tropicalis (5% a 10% dos casos);
· Candida krusei, Candida parapsilosis e Candida guilliermondii são raramente identificadas. 
FATORES DE PREDISPONENTES:
· Hormônio-dependente (mulheres em idade reprodutiva, em TH e métodos anticoncepcionais de alta dosagem);
· Uso de antibióticos – altera flora vaginal;
· Diabetes melitus descompensada;
· Estados de imunossupressão;
· Tabagismo;
· Distúrbios alimentares com excesso de ingestão de hidratos de carbono;
· Hábitos de higiene ou vestuário inadequados;
· Estresse excessivo;
QUADRO CLÍNICO:
· Prurido, de intensidade variável;
· Corrimento geralmente esbranquiçado (fluido ou com aspecto de “leite talhado”);
· Dependendo da intensidade do processo inflamatório, pode haver queixa de desconforto, dor, disúria e dispareunia;
AO EXAME GINECOLÓGICO:
· INSPEÇÃO: hiperemia vulvar, edema e fissuras.
· ESPECULAR: hiperemia da mucosa vaginal e conteúdo vaginal esbranquiçado, em quantidade escassa, moderada ou abundante, de aspecto espesso ou flocular, aderido ou não às paredes vaginais.
· pH vaginal < 4,5
· Teste das aminas (whiff test): negativo
CLASSIFICAÇÃO
· NÃO COMPLICADA: Episódios esporádicos ou infrequentes, de intensidade leve ou moderada, cujo agente etiológico provavelmente é a Candida albicans e ocorre em mulheres não imunocomprometidas.
· COMPLICADA: Recorrente ou severa ou por espécies não albicans, ou em mulheres com diabetes, condições que comprometam o sistema imune (por exemplo, infecção por HIV), debilitadas ou recebendo imunossupressores. (10-20% das mulheres).
Diagnóstico confirmatório:
Exame a fresco, colocando-se em lâmina de vidro uma gota de conteúdo vaginal e uma gota de soro fisiológico ou hidróxido de potássio a 10% e observando ao microscópio a presença de hifas e/ou esporos (sensibilidade 50-60%).
Bacterioscopia com coloração pelo método de Gram.
Cultura em meios específicos, o que permite a identificação do fungo, sua espécie e eventual realização do antifungigrama, recomendável nos casos recorrentes. 
 
TRATAMENTO CANDIDA NÃO COMPLICADA: TÓPICO
· Fenticonazol (creme 0,02 mg/g, um aplicador vaginal ao deitar durante sete dias ou óvulo com 600 mg dose única),
· Clotrimazol (creme 10 mg/g por sete dias ou comprimido vaginal de 500 mg em dose única),
· Miconazol (creme 20 mg/g por 14 dias),
· Econazol (creme 10 mg/g por 14 dias),
· Butaconazol (creme 20 mg/g em dose única),
· Terconazol (creme 8 mg/g por cinco dias),
· Tioconazol( creme 20 mg/g por sete dias ou óvulo 300 mg em dose única).
· Nistatina (creme 25.000 UI/g por 14 dias) - GESTANTE
TRATAMENTO CANDIDA NÃO COMPLICADA: SISTÊMICO
· Fluconazol (comprimido 150 mg, dose única),
· Cetoconazol (comprimidos de 200 mg, 2cp/dia por cinco dias),
· Itraconazol (cápsulas de 100 mg, 12/12 horas, por um dia).
Efeitos colaterais: náusea, dor abdominal e cefaléia. Raramente ocorre elevação das enzimas hepáticas.
O tratamento do parceiro sexual não é recomendado nos episódios simples!
Nos raros casos em que ocorre balanite (inflamação da glande peniana com prurido ou irritação), pode haver benefício no uso de antifúngicos tópicos para alívio sintomático.
TRATAMENTO CANDIDÍASE COMPLICADA:
Requer a confirmação diagnóstica para a identificação de eventuais cepas não albicans (Candida glabrata e outras, de difícil identificação à microscopia, sendo necessária a cultura).
→ CANDIDÍASE RECORRENTE (4 ou mais episódios/ano confirmados laboratorialmente):
· Tratamento prolongado dos episódios agudos: agentes tópicos por período de 7 a 14 dias ou antifúngico por via oral (fluconazol 150 mg) em um total de três doses, com intervalos de três dias.
· Após a remissão dos episódios agudos, recomendam-se esquemas de supressão utilizando um comprimido de fluconazol (150 mg) 1x/semana, durante 6 meses.
· Outra alternativa são os tratamentos por via local, de maneira intermitente.
Tratamento Candida não albicans:
Ácido Bórico 600mg, 1 óvulo via vaginal ao dia, usar por 14 noites (manipular).
· VAGINITE POR TRICHOMONAS VAGINALIS
A Tricomoníase é a infecção sexualmente transmissível não viral mais comum no mundo.
1/3 das mulheres infectadas são assintomáticas e a infecção pode persistir por meses ou anos.
Os homens, por geralmente apresentarem menos sintomas do que as mulheres, servem como vetores assintomáticos da infecção.
O parasita Trichomonas vaginalis possui quatro flagelos e uma membrana ondulante, responsável por sua grande mobilidade.
Transmissão: predominantemente sexual.
Ele deve adquirir nutrientes do meio externo para sua sobrevivência e consegue isso, fagocitando fungos, vírus e bactérias como Micoplasmas, Chlamydia trachomatis, Neisseria gonorrhoeae, transportando-os ao trato genital superior e facilitando, assim, o aparecimento de doença inflamatória pélvica.
QUADRO CLÍNICO:
Corrimento geralmente profuso, amarelado ou amarelo-esverdeado.
Ardor genital, sensação de queimação, disúria e dispareunia.
Os sintomas acentuam-se no período pós-menstrual devido à elevação do pH vaginal e à aquisição de ferro da hemoglobina pelo parasita, o que aumenta sua virulência.
EXAME GINECOLÓGICO:
· INSPEÇÃO: hiperemia dos genitais externos e presença de corrimento espesso, de aspecto purulento, exteriorizando-se pela fenda vulvar.
· ESPECULAR: aumento do conteúdo vaginal, de coloração amarelada ou amarelo-esverdeada, por vezes acompanhado de pequenas bolhas. As paredes vaginais e a ectocérvice apresentam-se hiperemiadas, observando-se ocasionalmente o “colo uterino com aspecto de morango” (colpitis maculáreis), devido às pequenas sufusões hemorrágicas.
· pH vaginal: > 4,5
· Teste das aminas (whiff test): pode ser positivo devido à presença de germes anaeróbios associados à VB.
· É importante lembrar que em muitas mulheres os sintomas podem ser discretos ou mesmo ausentes = ASSINTOMÁTICAS!!!
DIAGNÓSTICO CONFIRMATÓRIOS:
· Bacterioscopia a fresco: lâmina de vidro com uma gota de conteúdo vaginal e uma gota de solução salina e observando-se ao microscópio; o parasita é identificado pela movimentação pendular (lembrar que o uso de solução salina gelada pode imobilizar o T. vaginalis; utilizá-la à temperatura ambiente ou levemente aquecida).
· Bacterioscopia com coloração Gram: permite a identificação do parasita, nesse caso sem os movimentos, o que pode dificultar o reconhecimento.
· Cultura (meio específico Diamond): maior sensibilidade (75% a 96%) e especificidade de 100%, embora sejam necessários alguns dias para o resultado.
OBS: Recomenda-se a realização da cultura em presença de sintomas, mas negatividade do exame a fresco. 
 
TRATAMENTOS RECOMENDADOS:
Metronidazol – 2g via oral em dose única.
 OU
Tinidazol – 2g via oral em dose única.
TRATAMENTO ALTERNATIVO:
Metronidazol – 500 mg via oral a cada 12 horas durante sete dias.
Restrições ao consumo de álcool durante 24 horas após o uso de metronidazol e 72 horas após o uso de tinidazol.
O tratamento com metronidazol gel por via vaginal não é recomendado, porque o medicamento não atinge níveis terapêuticos na uretra e glândulas de Skene e Bartholin.
Recomenda-se abstinência sexual durante o tratamento.
OBS: Tratar parceiro = mesmos regimes anteriormente expostos, preferencialmente em dose única!
RECORRÊNCIAS:
Elevada taxa de reinfecção em mulheres = recomenda-se nova avaliação três meses após o término do tratamento.
Episódios de recorrência ou persistência da infecção devem ser diferenciados de reinfecção por parceiro não tratado ou não aderente ao tratamento.
Se recorrência, evitar esquemas dose única, utilizar Metronidazol 500 mg, VO, 12/12 horas por dias, ou Tinidazol 2g, VO,por 7 dias.
· VAGINOSE CITOLÍTICA
É a proliferação excessiva de Lactobacillus, que danifica o epitélio vaginal, e diminui o pH.
Diagnóstico diferencial = Candidíase!!!!
Causa de vulvovaginite cíclica em mulheres na idade reprodutiva, porque a exacerbação dos sintomas ocorre na fase lútea do ciclo e particularmente no período pré-menstrual.
QUADRO CLÍNICO:
· Corrimento esbranquiçado e abundante;
· Prurido, eventualmente ardor, queimação, disúria, dispareunia, com maior intensidade no período pré-menstrual;
EXAME FÍSICO ESPECULAR:
· Conteúdo vaginal geralmente aumentado, de aspecto flocular, fluido ou em grumos, aderente ou não às paredes vaginais. Sinais inflamatórios podem estar presentes devido à irritação da mucosa causada pelos detritos celulares e acidez excessiva.
· pH < OU = 4.
DIAGNÓSTICO CONFIRMATÓRIO:
Bacterioscopia do conteúdo vaginal (Gram): aumento excessivo na população lactobaciliar (>1.000/campo de imersão), presença de raros leucócitos ou ausência deles e presença de núcleos celulares desnudos e de restos celulares devida à lise das células epiteliais. Importante ressaltar que não são encontrados elementos fúngicos (hifas e/ou esporos).
Recomenda-se também cultura para fungos, que, quando negativa e diante dos achados da bacterioscopia anteriormente mencionados, confirmará o diagnóstico de vaginose citolítica.
TRATAMENTO:
Não existe um tratamento específico para a afecção, já que a etiopatogenia não é conhecida.
Medidas que alcalinizam o meio vaginal, como o uso de duchas vaginais com bicarbonato de sódio, particularmente no período pré-menstrual.

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