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O texto de Onfray aborda as questões das viagens, o primeiro assunto a ser abordado é acerca do querer a viagem. Para ele, antes da iniciativa de viajar, todo o corpo trabalha.O desejo de viajar não está conosco desde o ventre, e sim ocorre mais tarde, quando o ser humano se descobre nômade ou sedentário (que são os dois tipos de seres humanos). Os nômades amam a estrada , ao passo que os sedentários se contentam com a toca. Desse esse modo, criou-se através de uma narrativa genealógica e mitológica, o pastor e o camponês, os pastores percorrem e levam os rebanhos a pastar em vastas extensões, sem preocupação política ou social; já os camponeses se instalam, constroem, edificam aldeias e cidades. Através da análise bíblica, é possível perceber uma relação com a narrativa de Caim e Abel, onde o primeiro era um agricultor ,e o segundo pastor, logo Abel era inquieto e viajante, enquanto que Caim era agricultor e permanecia em seu lugar. Porém como Caim mata Abel, Deus o amaldiçoa a vagar eternamente, sendo assim, o viajante é o procedente da raça de Caim. Após isso, associa-se a viagem sem retorno com a vontade punitiva de Deus, e em todas as ideologias dominantes,há a dominação ou violência aplicada sobre os nômades. Para o autor, o nômade recusa a lógica de transformar tempo em dinheiro, para ele, a energia singular é o único bem que possui. O segundo assunto tratado pelo autor é sobre a escolha de uma destinação; para ele, quando se olha para o planisfério, não se tem dimensão das distâncias, ele não demonstra detalhes, e sim representa o planeta, e o reduz a convenções conceituais.Sendo assim, o autor diz que somos pegos em um paradoxo: o planisfério parece pequeno, e o mundo vasto, ou é o inverso que é verdadeiro ? A partir disso, o autor diz que hoje, com os transportes e os mapas, todos os destinos se tornaram possíveis, e com isso, vem a pergunta: O que escolher? A partir daí vem um determinismo genealógico, já que não escolhemos os locais por predileção , somos requisitados por eles, e cada um se descobre portador de uma paixão pelos elementos da natureza, seja a água, terra ou ar; o fogo, já circula no corpo do viajante.Cada corpo busca encontrar um elemento que se sente mais à vontade. Sonhar com um destino é obedecer uma voz que se pronuncia dentro de nós, é como uma espécie de demônio socrático, sendo assim, o demônio diz, e a nós, resta a vontade de consentir. O próximo tema tratado pelo autor é sobre o desejo de viajar, para ele a viagem começa no sedentarismo, no momento em que começamos a pesquisar e planejar. Nesse instante é que são ativadas as emoções e a sensações, e com isso, amplia-se a possibilidade de de percepções. A leitura funciona como um rito de inicialização e revela uma mística pagã. O atlas é a bíblia do nômade, pois é onde estão os mapas; neles, acontece a primeira viagem, a mais mágica e misteriosa, as convenções gráficas que estão presentes neles, nos ajudam a imaginar o lugar e enxergar e enxergar os mares, vegetação, política, características naturais, história, economia, fuso horário, economia, e meios de locomoção, que permitem o deslocamento entre pessoas, cargas e informações. Os mapas representam a projeção intelectual de quem o produziu. O atlas diz o essencial, mas não tudo, ele faz o seu prejulgamento conceitual,e pode ser acrescentada pela literatura e pela poesia.Ler um poema, permite chegar ao lugar imaginário que recebe informações do lugar, o poeta transforma as sensações em informações destinadas a ampliar as nossas percepções. Além dessas formas, há a prosa, ela exprime diferentemente, de maneira menor, mais diluída, o que o poeta, ela fala da paisagem, refeição, encontro, monumento, emoção e fadiga; o autor se descreve no trajeto, no detalhe do itinerário. Além do poema, existem os livros, que são capazes de obter informações práticas. Os utilitários e guias, se demonstram úteis para auxiliar o viajante com endereços, referências, locais para se hospedar, o que comer, o que vestir, etc. O guia, a prosa, o poema e o atlas, oferecem uma dialética descendente, com detalhes, lembranças, ideias, conceito; e tudo isso contribui para a solicitação do desejo. O próximo tema abordado pelo autor se chama “ Habitar o entremeio”, nessa sessão, é iniciado com uma explicação sobre o momento em que a viagem começa, para ele, o início da viagem se dá quando o agente fecha a fechadura da porta de casa. O entremeio se demonstra como o primeiro passo, já que não é o local cobiçado, e nem o lugar deixado. Independentemente do meio de transporte, partilhamos um espaço em comum no tempo de passagem de um ponto a outro. Esses ambientes comuns como vagões e cabines de vôos oferecem ocasiões de proximidade, e forçam um relacionamento ou uma conversação. Nesses entremeios, é possível trocar palavras, simpatizar, contar a vida sem complexos, sem contenções, pois o ambiente permite isso de maneira estranha. Esse lugar, também é uma exterioridade e não é governado nem por uma língua e nem por tempo algum. No entremeio, quando os referenciais de civilização desaparecem, o corpo tende a reencontrar seus movimentos naturais e obedece mais ardentemente à soberania dos ritmos biológicos: come e bebe quando tem necessidade, e dorme quando tem sono. Partindo para o próximo assunto, o autor fala sobre a amizade, em todos os momentos ao se viajar sozinho, teremos que aceitar a nossa própria companhia, porém, essa nem sempre é a melhor forma. A solidão implica em viver apenas consigo mesmo enquanto que viajar a dois, ilustra uma fórmula romana, pois permite uma amizade construída dia após dia. Viajar a dois supõe uma eleição, e por isso, sempre se busca um destino comum para que se possa agradar o companheiro, além disso, permite distanciar dos grupos indesejáveis solitários e também evita a angústia multiplicada no trajeto solitário, da barreira da língua, e dos incômodos burocráticos. Na amizade, o outro é o menos estranho possível, e no detalhe da amizade, é possível conhecer a si mesmo e o outro. Organizar a memória, é uma necessidade da viagem segundo o autor, e para ele, este é o momento de se ampliar os cinco sentidos, o corpo fica mais dispostos à novas experiências e registra mais dados que o costume. O viajante fica menos preso aos aspectos do cotidiano do que submetido à prova fenomenológica: imerso no real, ele se conhece através do jogo da intencionalidade e da consciência, experimenta ser forçado a emergir como acontecimento e do nada onde são encontrados os resíduos da decisão. Registrar os acontecimentos na viagem, traz sentido para a viagem. A memória extrai da imensidão longa e lenta do diverso, os pontos de referências vivos ajudam a cristalizar, constituir e endurecer as lembranças. Elas devem produzir referências que permitem mais tarde, organizar os sentidos da viagem. Para ir à destinação eleita é necessário deixar de lado nossas idéias preconceituosas acerca do mundo, e é exatamente sobre essa questão da alteridade que o autor trata no capítulo “Inventar uma Inocência”. Essa inocência é o distanciamento de tudo que se leu e aprendeu, distanciamento dos clichês, das visões morais e moralizadoras que nos são transmitidas de geração em geração, o que demanda que o viajante seja mais receptivo ao mundo não só a partir de sua mente, mas também através de seus sentidos, como a visão, para apreciar as belezas do lugar até mesmo de forma artística e contemplativa que o permite fotografar em sua memória os acontecimentos. Nessa parte, Onfray enfatiza o encurtamento da distância e do tempo a partir da difusão do uso do avião, o que está ligado à revolução informática, à globalização e que transforma e amplia nossas visões acerca do real. E é justamente por meio das viagens que é possível o encontro com nós mesmos, de forma subjetiva, não só através da estetização das circunstâncias, mas também através de um encontro metafísico com o próprio eu, de forma a se autoconhecer melhor.Assim como é possível o sujeito se reencontrar, também há o momento do retorno, ou seja o momento de reencontro com o domicílio, onde as lembranças substituem as expectativas e excitação que o indivíduo havia anterior à viagem. O retorno ao domicílio inclui o ato de descanso, e repouso do corpo que se encontra fatigado após a viagem. De acordo com Michel, voltar engloba a decisão de não ficar de forma definitiva no lugar visitado, e é nesse momento que o indivíduo trabalha com a memória, de forma a retomar suas lembranças e considerações acerca da viagem realizada, uma vez que também há sempre uma questão de busca, sendo que, muitos sujeitos voltam de maneira compulsiva a lugares outrora visitados. Contudo devemos nos atentar de que a questão da viagem inclui não só a questão da repetição como da inovação. Na obra, o mesmo trabalha conceitos como já mencionado, de memória e subjetividade, relacionando-os com a escolha de um destino, a partir de um estilo poético. O que é relevante compreender é que apesar das diversas justificativas, o que impulsiona o ser humano para a viagem é o propósito de se buscar, de se encontrar e reencontrar com si próprio. Nesse contexto, é possível estabelecer-se uma dicotomia, segundo a qual o sentido de viajar aparece claramente dissociado da noção de pertencimento. Muitas vezes, por exemplo, o trajeto que o sujeito percorre é sua morada. Em seu apartamento, onde pouco fica, não há nada que permita a sensação de acolhimento, representando apenas um lugar transitório como um aeroporto. Através da leitura do texto, foi possível perceber que o autor traz uma visão das viagens, por meio de uma geografia poética. Além disso, é possível compreender que durante todas as etapas da viagem, há uma interdisciplinaridade, pois toca áreas como a filosofia, sociologia,mitologia, psicologia, biologia, e literatura. Podemos também considerar que Onfray, nos faz refletir sobre a noção de localização humana estar atrelada à compreensão da necessidade de que se levem em conta os fatores dinamicamente colocados dentro de uma perspectiva histórica em um determinado local geográfico. Percebe-se também que a representação mental incentiva o desejo que, por sua vez, é uma das razões motivadoras da viagem. Desse modo, podemos dizer que o referido autor explora de maneira filosófica questões como a medida em que nos sentimos mais nômades ou mais sedentários, nos fazendo refletir ao mesmo tempo, se somos de fato impulsionados ao movimento constante ou se amamos nossas raízes bem como nos mostra as motivações e desejos que permearam sempre o ser humano durante seu deslocamento pelo mundo desde as antigas civilizações, comparando-os com os anseios e com a conjuntura da modernidade. Tudo isso, nos faz pensar sobre diversos aspectos de nossas vidas, como por exemplo, sobre o quanto somos inerentes ao nosso espaço, tempo e à sociedade; uma vez que durante toda a história da humanidade, tem havido um fluxo constante de indivíduos, certo que nosso eu mistura-se com nossa linguagem, com as nossas lembranças, memórias e costumes, de forma intersubjetiva e multidisciplinar. Vale ressaltar que o autor aborda que a geografia poética é algo ainda novo e frágil e que há ainda resistência para com ela da parte de vários estudiosos. Outra crítica que se faz é a de que vivemos em uma época de renúncia à memória, devido ao “imediatismo” e ao uso das diversas tecnologias, em que muitas vezes o exercício do próprio “pensar” é deixado de lado, devido à fluidez e inércia das próprias circunstâncias. REFERÊNCIA ONFRAY, Michel, 1959- TEORIA DA VIAGEM:poética da geografia/ Michel Onfray; tradução de Paulo Neves.-Porto Alegre, RS:L&PM, 2009. INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS CURSO DE TURISMO RESENHA DO LIVRO “TEORIA DA VIAGEM” DE MICHEL ONFRAY Alunas: Carolina Lorenzeto Terra Karine Valesca de Freitas Verdugo Juiz de Fora, 8 de Outubro de 2018
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