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UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL CAMPUS UNIVERSITÁRIO DE VACARIA DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E COMUNICAÇÃO CURSO DE CIÊNCIAS CONTÁBEIS MAICON JOSÉ PARIZOTTO ZULIANELLO EXTRAFISCALIDADE: TRIBUTAÇÃO COMO INSTRUMENTO DE PROTEÇÃO SOCIOAMBIENTAL VACARIA 2015 UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL CAMPUS UNIVERSITÁRIO DE VACARIA DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E DE COMUNICAÇÃO CURSO DE CIÊNCIAS CONTÁBEIS MAICON JOSÉ PARIZOTTO ZULIANELLO EXTRAFISCALIDADE: TRIBUTAÇÃO COMO INSTRUMENTO DE PROTEÇÃO SOCIOAMBIENTAL Trabalho de Conclusão de Curso para obtenção do Grau de Bacharel em Ciências Contábeis Orientador Profª. Me. Maria Teresa Martinigui Pacheco VACARIA 2015 3 MAICON JOSÉ PARIZOTTO ZULIANELLO EXTRAFISCALIDADE: TRIBUTAÇÃO COMO INSTRUMENTO DE PROTEÇÃO SOCIOAMBIENTAL Trabalho de Conclusão de Curso para Obtenção do Grau de Bacharel em Ciências Contábeis Aprovado em 16 de Julho de 2015. BANCA EXAMINADORA ____________________________________________ Professora Me. Maria Teresa Martinigui Pacheco Universidade de Caxias do Sul ____________________________________________ Professor Me. Marco André Pegorini Universidade de Caxias do Sul ____________________________________________ Professor Me. Oderson Panosso Universidade de Caxias do Sul 4 Dedico este trabalho à minha esposa Liliane Melo do Amaral por ter sido a grande incentivadora e companheira desde o início de minha jornada acadêmica. 5 AGRADECIMENTOS Agradeço à minha esposa Liliane Melo do Amaral, pelo incentivo e apoio nestes anos de graduação; Aos meus pais Neusa Parizotto e Elton José Zulianello, pela educação e valores recebidos; Aos meus avós Mario Zulianello (em memória) e Lodovina Bizotto Zulianello, pelo carinho e afeto que sempre a mim dedicaram; A minha orientadora Professora Maria Teresa Martiningui Pacheco, pela paciência e orientações prestadas na execução deste trabalho; Ao Professor Marco André Pegorini, pelo apoio e compreensão durante minha jornada acadêmica; A direção da empresa Transportes Cavalinho, em especial ao Sr. Afrânio Mendes, pela prontidão em atender minhas solicitações; Ao professor Sérgio Hoffman, pela atenção dedicada e conhecimentos transferidos. 6 “O que sabemos é uma gota; o que ignoramos é um oceano.” (Isaac Newton) 7 RESUMO Partindo do princípio de que o meio ambiente é um bem comum a toda sociedade, sendo responsabilidade coletiva sua preservação para as gerações futuras, o presente trabalho apresenta um estudo à respeito da extrafiscalidade, evidenciando os benefícios sociais e tributários que as organizações podem receber em contrapartida à adoção de uma postura voltada à preservação ambiental. Em razão da característica coletiva que os impactos ambientais causam, esta postura favorece à própria empresa, satisfazendo o objetivo geral que é demonstrar as implicações que atitudes socioambientais positivas causam nas organizações. Para tanto, efetuou-se um levantamento da bibliografia relacionada, bem como, da legislação pertinente, encerrando com um estudo de caso onde se demonstrou a aplicabilidade dos conceitos expostos. A empresa estudada tem sua administração voltada para o socioambiental, desenvolvendo diversos projetos visando a conscientização da sociedade para a preservação, além do controle total sobre os resíduos gerados por sua atividade. Tais fatos evidenciam a responsabilidade social da empresa, justificando uma contrapartida do Estado que pode se dar por intermédio da diminuição da carga tributária. Conclui-se que a utilização da extrafiscalidade reduz significativamente o valor dos tributos os quais as empresas estão sujeitas. Inevitavelmente, o desenvolvimento econômico e a preservação ambiental devem caminhar num mesmo sentido, visto que com as novas exigências e anseios da sociedade, empresas que não demonstrem seu respeito a essas questões tendem a ser superadas. Palavras-Chave: Meio Ambiente. Sustentabilidade. Tributação. Extrafiscalidade. 8 ABSTRACT Assuming that the environment is a common good the whole society, collective responsibility and its preservation for future generations, this paper presents a study regarding the extrafiscality, highlighting the social and tax benefits that organizations can receive in return the adoption of a targeted approach to environmental preservation. Due to the collective character that environmental impacts cause, this posture favors the company itself, meeting the overall goal is to demonstrate the implications of positive environmental attitudes cause in organizations. Therefore, we performed a survey of the related literature, as well as the relevant legislation, ending with a case study where it demonstrated the applicability of the concepts exposed. The company studied has directed his administration to the environmental, developing several projects aimed at raising awareness of society to preserve, in addition to full control over the waste generated by their activities. These facts show the social responsibility of the company, justifying a consideration of the state that can occur through low taxes. We conclude that the use of extrafiscality significantly reduces the amount of taxes which companies are subject. Inevitably, economic development and environmental protection must go in the same direction, where as with the new demands and aspirations of society, companies that do not show their respect to those issues tend to be overcome. Keywords: Environment. Sustainability. Taxation. Extrafiscality. 9 LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Veículos fabricados no Proconve Fase 7 (2012-2013).................... 79 Tabela 2 – Veículos fabricados no Proconve Fase 6 (2011)............................. 82 Tabela 3 – Veículos fabricados no Proconve Fase 6 (2010)............................. 83 Tabela 4 – Veículos fabricados no Proconve Fase 6 (2009)............................. 83 Tabela 5 – Veículos fabricados no Proconve Fase 5 (2008)............................. 84 Tabela 6 – Veículos fabricados no Proconve Fase 5 (2007)............................. 85 Tabela 7 – Veículos fabricados no Proconve Fase 5 (2006)............................. 87 10 LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Alíquotas de ICMS sobre combustíveis, por estado.......................... 63 Figura 2 – Fases do PROCONVE para veículos à diesel.................................. 77 11 LISTA DE QUADROS Quadro 1 - Princípios da Prevenção e Precaução............................................. 37 Quadro 2 - Benefícios tributários....................................................................... 51 Quadro 3 - Alíquotas PIS e COFINS – Combustível (por m³)............................ 64 Quadro 4 - CIDE – Combustível (por m³).......................................................... 65 Quadro 5 - Diferença no Valor do IPVA aplicando-se a extrafiscalidade.......... 87 12 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 15 1.1 JUSTIFICATIVA .................................................................................................. 16 1.2 TEMA E PROBLEMA DE PESQUISA .................................................................17 1.3 HIPÓTESES OU PROPOSIÇÕES ...................................................................... 17 1.4 OBJETIVOS ........................................................................................................ 18 1.4.1 Objetivo geral ................................................................................................. 18 1.4.2 Objetivos específicos ..................................................................................... 18 1.5 METODOLOGIA .................................................................................................. 18 1.6 ESTRUTURA DO ESTUDO ................................................................................ 19 2 REFERENCIAL TEÓRICO ..................................................................................... 21 2.1 RESPONSABILIDADE SOCIAL .......................................................................... 22 2.2 SUSTENTABILIDADE ......................................................................................... 24 2.2.1 Desenvolvimento sustentável ....................................................................... 24 2.2.2 Gestão ambiental............................................................................................ 27 2.2.2.1 Política nacional do meio ambiente ............................................................... 28 2.2.2.2 Normatização ISO 14001 e implantação de sistema de gestão ambiental.... 29 2.3 CRÉDITOS DE CARBONO ................................................................................. 31 2.3.1 Efeito estufa e aquecimento global .............................................................. 31 2.3.2 Mercado de carbono ...................................................................................... 32 2.4 PRINCÍPIOS AMBIENTAIS BÁSICOS ................................................................ 34 2.4.1 Da prevenção .................................................................................................. 36 2.4.2 Da precaução .................................................................................................. 36 2.4.3 Do poluidor pagador ...................................................................................... 37 2.4.4 Do usuário pagador........................................................................................ 39 2.4.5 Do protetor recebedor .................................................................................... 39 2.5 TRIBUTAÇÃO VOLTADA AO MEIO AMBIENTE ................................................ 41 2.5.1 Tributação ambiental ..................................................................................... 41 2.5.2 Princípios constitucionais da tributação ..................................................... 43 2.5.2.1 Da seletividade tributária ............................................................................... 44 2.5.2.2 Da parafiscalidade ......................................................................................... 44 13 2.5.2.3 Da extrafiscalidade ........................................................................................ 45 2.5.2.3.1 Do incentivo fiscal....................................................................................... 47 2.5.2.3.2 Da extrafiscalidade ambiental .................................................................... 48 2.6 ESPÉCIES DE TRIBUTOS ................................................................................. 51 2.6.1 IPI ..................................................................................................................... 52 2.6.2 ICMS ................................................................................................................ 53 2.6.3 ISSQN .............................................................................................................. 54 2.6.4 Imposto de renda ........................................................................................... 55 2.6.5 Contribuição social ........................................................................................ 56 2.6.6 ITR.................................................................................................................... 57 2.6.7 IPTU ................................................................................................................. 57 2.6.8 IPVA ................................................................................................................. 59 2.6.9 IOF ................................................................................................................... 61 2.6.10 Impostos sobre combustíveis ..................................................................... 62 2.6.10.1 ICMS - Combustíveis ................................................................................... 62 2.6.10.2 PIS/COFINS combustíveis .......................................................................... 64 2.6.10.3 CIDE combustíveis ...................................................................................... 64 2.6.11 Taxas ambientais ......................................................................................... 65 2.7 CONTABILIDADE AMBIENTAL .......................................................................... 66 2.7.1 Ativos ambientais ........................................................................................... 68 2.7.2 Passivos ambientais ...................................................................................... 69 2.7.3 Receitas ambientais ....................................................................................... 70 2.7.4 Custos ambientais.......................................................................................... 70 2.7.5 Despesas ambientais ..................................................................................... 71 2.7.6 Evidenciação da contabilidade ambiental .................................................... 71 2.8. PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO ........................................................................ 73 3 ESTUDO DE CASO ............................................................................................... 74 3.1 CONCEITUAÇÃO DA EMPRESA ....................................................................... 74 3.1.1 Ações socioambientais desenvolvidas ........................................................ 75 3.2 PROCONVE ........................................................................................................ 76 3.2.1 Padronização EURO 5 .................................................................................... 77 3.3 APLICAÇÃO DA SELETIVIDADE TRIBUTÁRIA NO IPVA .................................. 78 14 3.3.1 Análise dos resultados .................................................................................. 87 3.4 SELETIVIDADE DE CRÉDITO DE CARBONO ................................................... 88 4 CONCLUSÃO ........................................................................................................ 89 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 92 15 1 INTRODUÇÃO O Artigo 225 da Constituição Federal de 1988 considera que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado”, sendo dever da coletividade a sua preservação e manutenção para as gerações futuras. Dentro do contexto da responsabilidade social, inclusive como forma de se justificar à sociedade consumidora cada vez mais exigente com o respeito ao meio ambiente por parte das organizações, constata-se a convergência dos interesses da comunidade, Estado e empresas no que tange à preservação dos recursos naturais. Não obstante, o artigo 170 disciplina que "a ordem econômica, fundadana valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos a existência digna, conforme os ditames da justiça social", observando-se, dentre outros princípios, a defesa do meio ambiente. Após séculos de degradação ambiental causada pela expansão da economia e a intensa produção industrial, consumidores, investidores, empresas e instituições despertaram para a necessidade do crescimento sustentável, de forma a não esgotar os recursos ainda disponíveis. Apesar de o tema da convergência entre desenvolvimento econômico e ambiente não ser recente, visto que começou a ser discutido de forma global na Conferência de Estocolmo no ano de 1972, grande parte das empresas ainda não entende a preservação como forma de obtenção de benefícios, tanto fiscais como mercadológicos, sendo que no atual cenário corporativo, altamente competitivo e globalizado, uma atitude ambientalmente consciente resulta em vantagens essenciais para o fortalecimento da organização. Apesar de um tanto quanto vaga, a legislação brasileira possui dispositivos que visam incentivar as empresas que adotam condutas ambientalmente responsáveis, bem como buscam desestimular comportamentos contrários a essas boas práticas. Dentre eles, os que impactam grandemente na economia das organizações modernas são os “tributos ambientais”, que possuem tratamento diferenciado para os que abraçam uma atitude consciente, e também o comércio dos créditos de carbono, que, a partir dos anos 2000 com a assinatura do Protocolo de Quioto, criou um mercado internacional com o objetivo de reduzir a emissão dos 16 gases que interferem no clima do planeta. Empresas que diminuem o lançamento dos chamados “Gases de Efeito Estufa” (GEE) obtêm tais créditos, podendo comercializá-los como commodities nos mercados financeiros. O estudo do direito ambiental, a aplicação dos benefícios da extrafiscalidade voltada ao meio ambiente e a comercialização dos créditos de carbono, apesar de sua atualidade e publicidade ainda é assunto recente no Brasil e restrito, praticamente, às grandes corporações, porém, este tema, é de extrema importância para as organizações, tendo em vista que tais instrumentos são excelentes ferramentas para a obtenção de uma satisfatória qualidade do meio ambiente, sem detrimento do crescimento econômico. Desta forma, a chamada “tributação ambiental” mostra sua capacidade de ser usada não somente como instrumento de arrecadação e sustentação financeira estatal, mas também, e principalmente, como mecanismo de desenvolvimento sustentado e controle social. Além disso, a preservação pode ser usada efetivamente como mercadoria, comercializável, com um grande potencial de geração de receitas. O presente trabalho visa demonstrar os benefícios fiscais, mercadológicos e sociais que a preservação ambiental e a promoção da sustentabilidade podem proporcionar às organizações. 1.1 JUSTIFICATIVA A carga tributária brasileira representa mais de 35% do PIB (Produto Interno Bruto) nacional1, o que significa dizer que 1/3 de toda a riqueza produzida no país é direcionada para o pagamento de impostos. Somente no primeiro trimestre de 2015, 293 Bilhões de reais foram arrecadados em tributos pelo governo nas três esferas2. Tendo em vista este cenário, para a sobrevivência das empresas o ato de gerenciar tributos é gerenciar custos que impactam diretamente no resultado. Algumas classes de impostos podem ser utilizadas como instrumento de planejamento tributário no campo ambiental, por meio da seletividade e extrafiscalidade e conforme sua natureza, possibilitando desestimular atividades produtivas que afetem 1 PIB Brasileiro. Disponível em: <http://goo.gl/585MsL> Acesso em: 14/03/2015 2 Arrecadação Tributária. Disponível em: <http://goo.gl/RYZSm8> Acesso em: 14/03/2015 17 negativamente o meio ambiente, e no sentido contrário incentivar as empresas que se comprometam com a preservação, de forma a balizar o comportamento empresarial. Ao proporcionar tais benefícios, além de desencorajar as atividades danosas ao meio ambiente sem que haja a criação ou instituição de novos tributos, pretende-se “premiar” os setores que mudarem sua forma de produzir e implementam novas tecnologias e métodos, objetivando o desenvolvimento sustentável. 1.2 TEMA E PROBLEMA DE PESQUISA Com base na delimitação do tema proposto, a questão de pesquisa para o estudo é: Como os mecanismos de tributação ecológica afetam as organizações? 1.3 HIPÓTESES OU PROPOSIÇÕES H1: A extrafiscalidade ambiental é uma forma de diminuir consideravelmente a carga tributária das empresas. H2: Medidas socioambientais, voltadas ao desenvolvimento sustentável beneficiam tanto às organizações quanto o Estado e a própria sociedade. H3: A economia moderna não mais comporta empresas que não se voltaram para novas formas de produção, visando a sustentabilidade. H4: Desenvolvimento econômico e preservação ambiental devem ser trabalhados de forma conjunta. 18 1.4 OBJETIVOS 1.4.1 Objetivo geral Demonstrar com a adoção de práticas socioambientais os benefícios fiscais e tributários a uma empresa de transporte rodoviário, com a matriz localizada no Município de Vacaria/RS. 1.4.2 Objetivos específicos - Pesquisar na literatura científica disponível sobre responsabilidade social, sustentabilidade, extrafiscalidade e contabilidade ambiental; - Efetuar pesquisa na legislação fiscal e tributária relacionado à tributação voltado ao meio ambiente; - Verificar quais são os principais tributos que podem sofrer alterações ao se adotar uma administração empresarial voltada à sustentabilidade; - Realizar estudo de caso da empresa do ramo do transporte rodoviário, com matriz localizada no Município de Vacaria/RS, que utiliza a preservação ambiental como princípio norteador de suas atividades. 1.5 METODOLOGIA A metodologia da pesquisa caracteriza o perfil científico de estudo. Para alcançar os objetivos almejados com o desenvolvimento desta pesquisa, serão utilizados procedimentos metodológicos. Segundo Cervo et al. (2007, p. 27), método é “a ordem que deve se impor aos diferentes processos necessários para atingir um certo fim ou um resultado desejado”. Os autores prosseguem afirmando que em se tratando de ciência, método pode ser entendido como o “conjunto de processos empregados na investigação e na demonstração da verdade”. 19 Quanto aos procedimentos técnicos, será realizada uma pesquisa bibliográfica por meio de levantamento dos assuntos relacionados ao tema da investigação, procurando evidenciar os mais variados assuntos que devem ser considerados na tributação voltada ao meio ambiente. Em relação à pesquisa bibliográfica, Gil (1999) coloca que a mesma é desenvolvida a partir de material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos científicos. A principal vantagem da pesquisa bibliográfica reside no fato de permitir ao investigador a cobertura de uma gama de fenômenos muito mais ampla do que aquela que poderia pesquisar diretamente. Esta vantagem se torna particularmente importante quando o problema de pesquisa necessita de dados muito esparso pelo espaço. Para Mattar (1997), as pesquisas bibliográficas são vantajosas por serem mais rápidas e econômicas, sendo que para o autor a melhor forma de aprofundar um problema de pesquisa é mediante o levantamento de trabalhos já realizados. O estudo de caso na visão de Yin (2005, p. 20) pode ser utilizado em diversas situações: “para contribuir com o conhecimento que temos dos fenômenos individuais, organizacionais, sociais, políticos e de grupo”, surgidas da necessidade de entender os fenômenos sociais. Segundo o autor, o estudo de caso não necessita ser uma interpretação precisada realidade, mas sim uma ferramenta para “estabelecer uma estrutura de discussão e debate entre os estudantes”. Neste contexto, será realizado um estudo de caso relacionado a uma empresa do ramo de transporte rodoviário, localizada no Município de Vacaria-RS, visando aplicar de forma prática os conceitos teóricos levantados através da pesquisa bibliográfica, mediante o emprego dos princípios da extrafiscalidade no Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores – IPVA. 1.6 ESTRUTURA DO ESTUDO Este trabalho estrutura-se em três capítulos, com a intenção de proporcionar uma melhor compreensão do tema escolhido. 20 No primeiro capítulo será apresentada uma contextualização do tema, a questão de pesquisa, as hipóteses, os objetivos gerais e específicos, a metodologia a ser utilizada, bem como a descrição da organização do trabalho. No segundo capítulo será abordada a fundamentação teórica, onde se busca subsídios para efetivação da pesquisa. Inicialmente serão explanados alguns conceitos e definições referentes a responsabilidade socioambiental, bem como suas implicações na administração das organizações. Na sequência, serão apresentados os princípios ambientais e tributários básicos, além dos fundamentos da contabilidade ambiental, culminando com a exposição dos principais tributos que podem sofrer alterações quando da adoção de uma mentalidade de responsabilidade por parte das empresas. No terceiro capítulo será efetuado um estudo de caso em uma empresa do ramo de transportes na cidade de Vacaria-RS, onde se buscará aplicar os conceitos teóricos na prática, mediante o emprego dos preceitos da extrafiscalidade no Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores – IPVA. Ao término, serão apresentadas as conclusões da pesquisa onde se pretende atingir o objetivo principal, ou seja, demonstrar se a adoção de práticas socioambientais por parte das empresas se reflete em ganhos contabilizáveis pelas organizações, principalmente na diminuição das alíquotas ou base de cálculo dos impostos que impactam diretamente nos resultados financeiros. 21 2 REFERENCIAL TEÓRICO A Constituição Federal de 1988 fixa objetivamente o direito ambiental brasileiro e determina seus parâmetros e critérios fundamentais para a interpretação desse direito, oferecido a todos os brasileiros e estrangeiros que vivam no país. Voltando ao já citado Artigo 225 da Constituição Federal, tanto a sociedade quanto o Estado tem o dever de conservar o meio ambiente ecologicamente equilibrado e, especialmente, preservar a vida de ameaças que possam surgir. Segundo Fiorillo e Ferreira (2005), o direito fundamental ao meio ambiente está intimamente ligado à cidadania, aos valores sociais do trabalho, a livre iniciativa, a soberania da nação, ao pluralismo político e, principalmente, a dignidade da pessoa humana. Ainda, de acordo com os autores, exatamente para fixar a existência concreta dos direitos constitucionais coletivos no Brasil, a Carta Magna não só disciplinou sua existência (art. 5º) como propiciou sua proteção atribuindo a defesa dos interesses da coletividade a toda à sociedade. O patrimônio ambiental são todos os bens considerados essenciais para a manutenção da vida humana e animal, constantes no Art. 6º da CF, e são fundamentalmente o direito à educação, saúde, trabalho, moradia, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e infância e assistência social, ou seja, para Fiorillo e Ferreira (2005), juridicamente “bem ambiental” não está ligado apenas à proteção da vida humana, mas, sobretudo à proteção da vida humana com dignidade (grifo nosso). Vale ressaltar que os bens ambientais são de “uso comum do povo”, de forma que não se pode dispor e usufruí-los da forma como for conveniente a cada um, pelo fato de que eles ultrapassam a esfera individual e suas implicações tem reflexo coletivo. Neste sentido, Miranda (2009) considera que o patrimônio ambiental precisa ser essencialmente defendido em razão dos interesses da coletividade, resultando em normas ambientais que tenham por objetivo garantir a vida saudável, derivada do ambiente ecologicamente preservado. 22 2.1 RESPONSABILIDADE SOCIAL A partir do final do século XX, com o crescente processo de globalização e incremento da tecnologia, a sociedade passou por intensas e expressivas alterações. Após a Revolução Industrial se convencionou explicar a questão do desenvolvimento somente pela ótica econômica, porém, o progresso da ciência e o surgimento das mais diversas tendências sociais, culturais e econômicas modificaram profundamente os costumes e romperam com antigos paradigmas, obrigando a sociedade á percepção de sua responsabilidade para com o bem estar da coletividade e com a manutenção da qualidade de vida de sua geração e das futuras. Com o crescimento populacional desordenado, principalmente nos países subdesenvolvidos, o Estado passa a encontrar dificuldades em suprir todas as demandas da população, obrigando-se, em conjunto com as empresas e a própria sociedade a assumirem e partilharem a responsabilidade pela sua própria sobrevivência, tal qual discorre Benedicto (1997): Toda empresa tem uma responsabilidade social. É seu dever pensar no bem-estar da sociedade, e não apenas no lucro. A preocupação com o social passou a ser até uma questão de sobrevivência. É uma forma de "marketing”. (...) A responsabilidade social pode ser definida como o dever da empresa de ajudar a sociedade a atingir seus objetivos (grifo nosso). É uma maneira de a empresa mostrar que não existe apenas para explorar recursos econômicos e humanos, mas também para contribuir com o desenvolvimento social. É, em síntese, uma espécie de prestação de contas. (BENEDICTO, 1997, p. 76) Neste entendimento, a empresa retira seus recursos quer seja do meio ambiente (recursos naturais), seja da própria sociedade (recursos humanos, subsídios governamentais), logo, é sua obrigação “pagar” por tais recursos, por meio da comercialização de seus produtos e serviços com qualidade, ou especialmente mediante ações que busquem a melhora da sociedade em que atuam. Neste sentido, Donaire (1999, p. 20) afirma que a responsabilidade da corporação para com a empresa extrapola a geração de bens e serviços, incluindo a “proteção ambiental, projetos filantrópicos e educacionais, planejamento da comunidade, equidade nas oportunidades de emprego, serviços sociais em geral, de conformidade com o interesse público”. 23 Para Cirino (2007), a problemática socioambiental é uma das grandes ameaças à sociedade contemporânea, cenário que transformou significativamente as bases das empresas: Todas as fases da atividade econômica passaram a ser permeadas por outras expectativas, isto é, por outros agentes e considerações. Essa é a nova configuração que se impõe às empresas: ética e responsabilidade para com a sociedade e o meio ambiente. Um novo modelo de empresa está sendo exigido tanto por grupos sociais de pressão, quanto pelo próprio consumidor. Diante dessas mudanças, cresce o número de empresas que se voltam à chamada responsabilidade social. (CIRINO, 2007, p. 3) Donaire (1999) salienta as transformações às quais as empresas foram submetidas nas últimas décadas, visto que até um passado muito recente eram vistas apenas como instituições econômicas com compromissos voltados a resolver apenas os problemas econômicos, quando se viram obrigadas a desempenhar novos papéis resultantes das mutações do ambiente onde atuam. O autor prossegue afirmando que as organizações estão se voltando a problemas muito além da questão econômica, abraçando preocupações de caráter social e gerando novas expectativas na sociedade, afetando profundamente seu modo de atuação, o que acaba por criar novas diretrizes e limitaçõespara sua operação. Ainda consoante ao entendimento de Donaire (1999), essa nova abordagem é resultante da mudança de mentalidade, do econômico puro e simples para o social, de modo a valorizar aspectos que visem a dignidade humana: Portanto, muitas das decisões internas da organização hoje requerem considerações explicitas das influências provindas do ambiente externo, e seu contexto inclui considerações de caráter social e político que se somam às tradicionais considerações econômicas. Hoje, a sociedade tem preocupações ecológicas, de segurança, de proteção e defesa do consumidor, de defesa dos grupos minoritários, de qualidade dos produtos etc., que não existiam de forma tão pronunciada nas últimas décadas. Isso tem pressionado as organizações a incorporar esses valores em seus procedimentos administrativos e operacionais. (DONAIRE, 1999, p. 16) Responsabilidade social, portanto, não é apenas a função ou obrigações que a legislação impõe. Em face dessa realidade, além da competência técnica e administrativa, as empresas devem desenvolver a capacidade de entendimento do contexto social em que estão inseridas, buscando a habilidade de se moldar as mudanças constantes no ambiente político, econômico e social. Não obstante, a 24 própria sobrevivência das organizações depende de sua atuação responsável, atendendo às expectativas da sociedade. Nesta conjuntura, o lucro por si só não pode (ou não deveria) ser a maior preocupação das empresas. Donaire (1999) entende que a lucratividade em relação à responsabilidade social é observada no longo prazo: Nesse sentido, a maximização do lucro deve ser vista em um contexto de longo prazo, pois, se é verdade que em curto prazo o comprometimento com problemas sociais pode resultar num lucro menor, também pode se transformar em condições mais favoráveis no futuro para a continuidade da lucratividade e da sobrevivência da empresa. Na verdade, não pode haver nenhuma esperança de existir uma organização viável economicamente em uma sociedade deteriorada socialmente. (DONAIRE, 1999, p. 22) Uma empresa é socialmente responsável quando extrapola a obrigação de respeitar as leis, pagar tributos e observar as condições adequadas de salubridade para os trabalhadores. Enquanto a obrigação social constitui-se nas ações empresariais em prol do social, tendo em vista uma base legal, a responsabilidade social implica no fato de que a empresa deve considerar os aspectos financeiros e sociais nas suas decisões estratégicas, porém, devendo ir além dos limites impostos pela legislação. 2.2 SUSTENTABILIDADE 2.2.1 Desenvolvimento sustentável A proteção ao meio ambiente é um preceito constitucional enquadrado na categoria de bens coletivos, visto que os efeitos de sua degradação tem reflexo coletivo. Responsabilidade ambiental pode ser entendida como um conjunto de costumes, ações e boas práticas visando o respeito ao meio ambiente e o desenvolvimento sustentável. Santos Júnior e Bassoli (2009) destacam a interação entre o desenvolvimento econômico e ambiental: 25 Não se pode relacionar a regulação da atividade econômica e a defesa do meio ambiente sem lançar mão do princípio do desenvolvimento sustentável. Deve-se buscar a compatibilização entre desenvolvimento e crescimento econômico com preservação ambiental e, consequentemente, com desenvolvimento social e humano, todos albergados pelo desenvolvimento nacional a que se refere o Art. 3º, inciso II, da Lei Maior, que estatui os objetivos da República (SANTOS JUNIOR; BASSOLI, 2009, p. 06). O conceito de sustentabilidade está ligado ao uso da natureza sem comprometer a satisfação das necessidades das futuras gerações, porém, o atual modelo de desenvolvimento está calcado na utilização intensa desses recursos sem levar em conta a capacidade de regeneração natural. O art. 3º da Política Nacional do Meio Ambiente3 define que, “(...) meio ambiente (...) é o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”. É consenso que a qualidade ambiental reflete a qualidade de vida, e o uso desenfreado dos recursos naturais impacta diretamente os ciclos naturais, refletindo negativamente sobre seus integrantes. Wanderley Júnior et al. (2007, p. 1277) asseveram que, “não obstante o dever de preservação e conservação do meio ambiente ecologicamente equilibrado, atualmente estamos vivendo uma intensa crise ambiental (...) que configura-se, essencialmente, no esgotamento dos modelos desenvolvimentistas levados a efeito nas últimas décadas”. Os autores sustentam que, superar esta crise não implica em apenas promover um desenvolvimento sustentável na questão financeira, mas acima de tudo gerar uma mudança efetiva da atitude da sociedade como um todo em relação aos seus hábitos. Cada vez mais os governos procuram estimular o desenvolvimento econômico, aliando este à defesa dos recursos naturais visto que não são dois polos opostos, mas conceitos interdependentes e complementares em razão de que o crescimento da economia sem detrimento da qualidade do meio ambiente é o cerne do desenvolvimento sustentável. A preocupação com a preservação ambiental é um tópico de extrema relevância para todas as esferas econômicas, não só em face das exigências legais e normatizações, mas pelas pressões mercadológicas advindas do consumidor, que entende o impacto que a atividade humana causa no ambiente, e a 3 Política Nacional do Meio Ambiente: Lei Federal 6938 de 31 de agosto de 1981 26 cada dia exige mais critério por parte das organizações, tal qual observa Monteiro (2012): Na sociedade contemporânea, o problema ecológico assumiu uma presença marcante na vida diária das pessoas, consumidores e empresas. Investir na economia verde e sustentável passou a ter um papel importante nas estratégias e no planejamento estratégico das organizações, como prioridade na busca de uma dimensão socioambiental do desenvolvimento. O tema economia verde remete a um conceito conciliador, que aponta para as oportunidades de negócios que se abrem em virtude das questões climáticas, em vez de pontuar as dificuldades e o custo que a transição pode acarretar, e busca estratégias capazes de responder simultaneamente às urgências sociais e ambientais. (MONTEIRO, 2012, p. 2) Ressalta-se que qualquer empresa mercantil tem como objetivo principal a obtenção de lucros, porém, deve observar sua função social, da qual faz parte preservar o bem comum que é o meio ambiente. No mundo onde o consumidor, cada vez mais informado, passa a exigir um comportamento responsável das empresas, uma mentalidade sustentável nos negócios transforma-se em uma grande vantagem competitiva, assim como ressalta Viegas (2008): O homem pratica grande parte de seus atos através do uso de seus bens (envolve direito de propriedade), no exercício de atividade econômica (...). Se assim de fato ocorre, toda relação privada tendente à busca de desenvolvimento econômico há de ser socialmente sustentável, ou seja, só se admite a realização de atividades humanas com responsabilidade social, sendo lógico concluir que compreende a proteção ambiental, já que o meio ambiente ecologicamente equilibrado interessa finalisticamente a todos. (VIEGAS, 2008, p. 122) Este modelo de desenvolvimento com responsabilidade, incentivado nas mudanças sociais e tecnológicas entende que o formato tradicional que ignora os impactos de sua atividade é insustentável e impraticável em médio e longo prazo, tendo em vista que os passivos ambientais são problemas interligados e interdependentes, exigindo da sociedade e principalmente das empresas uma mudança radical de conceitos e comportamentos. Barbieri (2011) assegura que o desenvolvimento sustentável derivado chamado “pacto intergeracional”, calcado na preocupação constante com o gerenciamento e a preservação dos recursos naturais, focado no atendimento às demandas básicas de todos os humanos e na manutenção da qualidade de vida das futuras gerações. 27 O conceito de desenvolvimento sustentável já se transformou em consenso na comunidade internacional, sendo estudado e debatido em diversas conferências de âmbito global. O grande questionamento surge em como aplica-lo no cotidiano empresarial, objetivando a necessidade de mudança de paradigmas sem perda de produtividade. 2.2.2 Gestão ambiental A gestão ou administração ambiental está atrelada ao desenvolvimento sustentável, consistindo em todas as diretrizes, normatizações e atividades administrativas e operacionais de planejamento, direção, controle e gerenciamento de recursos visando alcançar efeitos positivos sobre o meio ambiente, reduzindo danos e abolindo práticas danosas. A Conferência de Estocolmo de 19724 definiu que “desenvolvimento sustentável é aquele que atende as necessidades do presente sem comprometer a possibilidade das gerações futuras de atenderem as suas próprias necessidades”, ficando fundamentadas as relações entre o homem e a natureza, nas quais o desenvolvimento e política ambiental são partes de um mesmo processo. Para Barbieri (2011), as principais metas de políticas ambientais e desenvolvimentistas advindas desses conceitos são os seguintes: a) retomar o crescimento como condição necessária para erradicar a pobreza; b) mudar a qualidade do crescimento para torná-lo mais justo, equitativo e menos intensivo em matérias primas e energia; c) atender as necessidades humanas essenciais de emprego, alimentação, energia, água e saneamento; d) manter um nível populacional sustentável; e) conservar e melhorar a base de recursos; f) reorientar a tecnologia e administrar os riscos; e g) incluir o meio ambiente e a economia no processo decisório. (BARBIERI, 2011, p. 36) Já, Donaire (1999) comenta que atitudes de preservação ambiental não são apenas uma exigência da legislação, passível de multas, sanções e penalidades, tratando-se, entretanto, de um panorama de ameaças e oportunidades, no qual suas implicações resultam em posições na concorrência e a própria permanência ou 4 Conferência de Estocolmo de 1972. Disponível em: <http://goo.gl/5EwGNG> Acesso em: 19/03/2015 28 saída do mercado, significando que o respeito ao meio ambiente e suas questões resulta no sucesso da empresa, e, caso contrário, pode conduzir ao fracasso. Ainda, Donaire (1999, p. 19) salienta que além das habilidades técnicas, administrativas e interpessoais, o administrador moderno tem obrigação de “desenvolver habilidades que se evidenciem importantes para o entendimento do contexto social e político do ambiente externo que envolve a tarefa de administrar”. De outra forma Dias (2011, p. 104) conceitua gestão ambiental como “o conjunto de responsabilidades organizacionais, procedimentos, processos e meios que se adotam para implantação de uma política ambiental em determinada empresa ou unidade produtiva”, ou seja, é a sistematização de processos de gestão voltados ao meio ambiente, quando uma organização deseja alcançar seus objetivos dentro das normas legais e sociais. O desenvolvimento sustentável é apoiado em três alicerces: econômico, social e ambiental, de forma a empresa necessita ser economicamente viável, dar condições de trabalho aos empregados de diferentes culturas e, principalmente, zelar pela eficiência e consciência ecológica de sua produção. 2.2.2.1 Política nacional do meio ambiente Apesar dos graves problemas com poluição e desmatamento historicamente enfrentados pelo Brasil, o país é um dos que possui, há mais tempo, uma legislação ambiental consolidada, antecessora inclusive dos países desenvolvidos como Canadá, Japão, Alemanha e França. A Política Nacional do Meio Ambiente foi criada no ano de 1981 com a publicação da Lei Federal 6.938, estabelecendo o SISNAMA (Sistema Nacional do Meio Ambiente), objetivando a criação e manutenção de padrões e métodos que possibilitem a sustentabilidade mediante mecanismos e ferramentas adequadas a proteção do meio ambiente. O Artigo 2º desta Lei institui que a Política Nacional do Meio Ambiente objetiva a “preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento socioeconômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana (...)”. 29 Para efeito deste estudo, vale destacar os seguintes trechos da Politica Nacional de Meio Ambiente: Art 9º - São instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente: (...) V - os incentivos à produção e instalação de equipamentos e a criação ou absorção de tecnologia, voltados para a melhoria da qualidade ambiental; (...) Art. 13º - O Poder Executivo incentivará as atividades voltadas ao meio ambiente, visando: I - ao desenvolvimento, no País, de pesquisas e processos tecnológicos destinados a reduzir a degradação da qualidade ambiental; (...) III - a outras iniciativas que propiciem a racionalização do uso de recursos ambientais. (BRASIL, Lei Federal nº 6938 de 1981) Esta lei formalizou uma Política Nacional, unificando e integrando diversas políticas regionais, estaduais e municipais, obrigando os entes da federação a se voltarem para a temática ambiental, seguindo diretrizes em comum. 2.2.2.2 Normatização ISO 14001 e implantação de um sistema de gestão ambiental Criada em 1947, a International Organization for Standardization (ISO)5, é uma organização internacional criada com o objetivo de instituir e divulgar padrões de normatização mundiais, a fim de facilitar o comércio internacional e o intercâmbio de conhecimento e tecnologias. A norma ISO 14001 consiste em uma série de regras, princípios e regulamento aplicáveis às organizações com o objetivo de alcançar um desempenho ambiental satisfatório e responsável. Foi desenvolvida de modo a ser utilizada em todos os tipos e portes de organizações, em qualquer contexto geográfico, cultural e social, tendo como finalidade específica sustentar a proteção ao meio ambiente em consonância às necessidades socioeconômicas. Além dos ganhos óbvios na qualidade de vida das comunidades em que a empresa está inserida e o cumprimento de sua função social, a adoção da ISO 14001 coloca a organização em outro patamar aos olhos do mercado, visto que esta certificação é indispensável à exportação para diversos países da União Europeia e América do Norte, bem como é possível conseguir taxas de financiamentos mais 5 Certificação ISO. Disponível em: <http://www.iso.org/iso/home.html> Acesso em: 27/03/2015 30 brandas em instituições financeiras. O Banco Itaú, por exemplo, destina uma linha de crédito especial para empresas certificadas: Ao considerar as questões sociais e ambientais em nossas decisões, aprimoramos os processos de gestão de risco. E, ao mesmo tempo, identificamos oportunidades para inovar os negócios, buscando uma relação equilibrada e benéfica para o banco, seus clientes e a sociedade. Por isso, definimos como um dos focos de nossa estratégia para alcançar a performance sustentável (BANCO ITAU S/A, 2014)6. A adoção da ISO 140017 implica no desenvolvimento de um Sistema de Gestão Ambiental que, conforme explanado anteriormente, pode ser definido como uma série de métodos e processos que objetivam resolver, mitigar ou prevenir problemas relacionados ao meio ambiente. Para sua efetiva implantação, a empresa deverá, em linhas gerais: - Estabelecer políticas ambientais claras e objetivas; - Identificar os aspectos ambientais de sua atividade para gradar os impactosambientais por ela gerados; - Respeitar a legislação aplicável; - Definir prioridades, estabelecendo objetivos e metas ambientais; - Estruturar a empresa de forma que esses objetivos e metas possam ser implementados; - Efetuar acompanhamento constante de sua política ambiental, avaliando e corrigindo conforme a necessidade; e - Ser capaz de adaptar-se às mudanças. Tendo esses princípios em evidência, devem-se instituir processos mais complexos que visem reduzir e controlar os danos ao meio ambiente, principalmente no que diz respeito à emissão de poluentes, mas também adotar práticas administrativas simples como reduzir o consumo de materiais, reciclar e, principalmente, manter o aprimoramento contínuo destes processos. Vale frisar que o respeito à legislação ambiental é fator determinante, visto que a preservação é o objetivo da normatização. 6 Banco Itaú. Disponível em: <http://goo.gl/17e0Cl> Acesso em: 20/03/2015 7 Certificação ISO 14001. Disponível em: <http://goo.gl/UvsuKx> Acesso em: 27/03/2015 31 Segundo o Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia – INMETRO8, responsável pela edição de normas técnicas no Brasil, o primeiro passo para a obtenção da certificação ABNT NBR ISO 14001 é o contato com um dos Organismos de Certificação de Sistemas de Gestão Ambiental acreditados pela Coordenação Geral de Acreditação do Inmetro (CGCRE), cuja lista dos Organismos de Certificação encontra-se disponível no site oficial do órgão9. 2.3 CRÉDITOS DE CARBONO 2.3.1 Efeito estufa e aquecimento global Dentre os grandes problemas ambientais da atualidade, talvez o mais debatido e o que mais gera dados preocupantes seja o chamado efeito estufa10, que é um fenômeno natural onde compostos químicos como o gás carbônico (CO2), metano (CH4) e mesmo o vapor d'água existentes na atmosfera agem como uma barreirado planeta. Esse processo retém o calor próximo da superfície para estabilizar a temperatura numa média global de 15°C, evitando que a energia solar concentrada pela terra durante o dia seja perdida e remetida de volta ao espaço, regulando os processos naturais que possibilitam a existência da vida no planeta. Todavia, com a forte intervenção humana sobre a natureza, principalmente com o lançamento de substâncias como o gás carbônico (CO²), óxido nitroso (N²O), o metano (CH4), o clorofluorcarboneto (CFC), os Hidrofluorcarbonetos (HFCs) e o Hexafluoreto de enxofre (SF6), causado pela destruição da cobertura vegetal, queimadas e, sobretudo, pela utilização de combustíveis fósseis (tanto em automóveis como nos processos produtivos), o fenômeno natural do Efeito Estufa é amplificado, causando sérios desequilíbrios no clima. 8 Implementação ISO 14001. Disponível em: <http://goo.gl/ECkSJM> Acesso em: 27/03/2015 9 INMETRO. Disponível em: <http://goo.gl/U5thr0> Acesso em: 27/03/2015 10 Efeito estufa. Disponível em: <http://goo.gl/UkIIHR> Acesso em: 10/02/2015 32 Segundo o Relatório Científico do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês)11, a concentração dos gases que amplificam o efeito estufa chegaram aos níveis mais altos dos últimos 800 mil anos, sendo que a temperatura média na superfície da Terra e dos oceanos aumentou 0,85ºC entre 1880 e 2012. Ainda, de acordo com o relatório, caso os níveis de emissão de gases continuem nos níveis atuais, o futuro reserva um aumento gradativo de pelo menos 4ºC nos próximos 70 anos, o que poderá provocar secas em áreas antes férteis, inundações, aumento do nível do mar e extinção de espécies, bem como os potenciais conflitos provenientes do esgotamento de recursos naturais12. 2.3.2 Mercado de carbono O mercado de créditos de carbono nasceu com a instituição da Convenção- Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança Climática13 (UNFCCC, em inglês), assinada na cidade de Nova York (EUA) no ano de 1992. Ratificada em 1997, na cidade de Quioto, no Japão, mediante o Protocolo de Quioto, decidiu-se que os países subscritores precisariam comprometer-se de forma incisiva e enérgica na limitação e diminuição de emissão dos gases prejudiciais, abrindo caminho para que essa redução pudesse ter valor econômico. Além do CO², a redução no lançamento de outros gases que impactam o clima também pode ser transformada em créditos de carbono, chamados de “carbono equivalente”. Os protocolos internacionais quantificam o que os países signatários (em especial os mais desenvolvidos e industrializados) podem emitir em termos de gases de efeito estufa, e aqueles que não conseguem atingir as metas de reduções tornam-se compradores de créditos de carbono, inclusive de empresas, o que coloca em vantagem os países que possuem recursos naturais preservados, principalmente as florestas. O Protocolo instituiu três mecanismos que são: Comércio de Emissões, Implementação Conjunta e o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo. Os dois 11 IPCC. Disponível em: <http://www.ipcc.ch/> Acesso em: 10/02/2015 12 Impactos Ambientais. Disponível em: <http://goo.gl/ynD5zj> Acesso em: 11/01/2015 13 UNFCC. Disponível em: <http://goo.gl/XqLdxY> Acesso em: 11/01/2015 33 primeiros são exclusivos dos países submetidos a metas obrigatórias, grupo o qual o Brasil não faz parte. Os países em desenvolvimento são submetidos ao Mecanismo de Desenvolvimento Limpo – MDL, a fim de obter as Reduções Certificadas de Emissões (RCEs, ou CERs, em inglês) sendo este um balizador para a regularização de empresas mercantis que almejam comercializar os créditos de carbono14. Um projeto MDL precisa ser registrado na ONU – Organização das Nações Unidas, e avaliado por comissões internacionais, seguindo os seguintes parâmetros técnicos15: a) Documentação do projeto, contendo informações técnicas, financeiras e ambientais, bem como a metodologia aplicada. O documento precisa ser validado pela Entidade Operacional Designada (EOD); b) Encaminhamento para a Autoridade Nacional Designada (AND), representada no Brasil pela Comissão Interministerial de Mudanças Globais do Clima; c) Registro no Comitê executivo do MDL, após aprovação pela AND. Salienta-se que este documento é imprescindível para execução do projeto e posterior comercialização dos créditos de carbono; d) Após os registros iniciais, é realizada a elaboração de um plano de monitoramento com a emissão de relatório contendo as informações do cálculo da redução de emissão; e) Com o projeto em andamento, o EOD verifica regularmente o cumprimento das metas estipuladas; f) No final do processo, o projeto é submetido a auditoria para a certificação final. g) O EOD determina Quantas RCEs (Redução Certificada de Emissão) serão conferidas ao projeto para posterior emissão pelo MDL, o que finalmente autoriza a comercialização dos créditos de carbono com os países desenvolvidos. Segundo o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia – IPAM, o Protocolo de Quioto refere-se ao “Mercado Regulado”, também chamado Compliance, onde os países possuem metas de reduções obrigatórias a serem 14 Reduções certificadas. Disponível em: <http://goo.gl/jO4QqI> Acesso em: 11/01/2015 15 Projetos MDL. Disponível em: <http://goo.gl/96BvAs> Acesso em: 20/05/2015 34 cumpridas, conforme seu grau de industrialização. Existe, entretanto, o chamado “Mercado Voluntário”, onde empresas, ONGs (organizações não-governamentais), instituições, governos, ou mesmo cidadãos tomam a iniciativa de reduzir suas emissões voluntariamente. Os créditos de carbono (VERs - Verified Emission Reduction) podem ser originados em qualquer lugar do mundo e são auditados por entidades independentes do sistema das Nações Unidas. Dentre algumas características dosMercados Voluntários, pode-se destacar16: - Créditos não valem como redução de metas dos países; - A operação está sujeita a menos burocracia; - Fazem parte projetos com estruturas não necessariamente reconhecidas pelo mercado regulado, como o REDD17 (Redução das Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal); Igualmente, outra forma de financiar projetos de redução de emissões ou de sequestro de carbono são os “Fundos Voluntários”, cujas principais características podem ser assim elencadas: - Não fazem parte do mecanismo de mercado (não geram crédito de carbono); - O valor da doação não pode ser descontado da meta de redução dos países doadores; - Podem entrar projetos com estruturas não reconhecidas pelo mercado regulado, como o REDD; 2.4 PRINCÍPIOS AMBIENTAIS BÁSICOS No entendimento de Miranda (2009, p. 28) princípios “servem como vetores para a interpretação normativa”, tendo por finalidade proporcionar segurança jurídica e base interpretativa para o direito. De acordo com o autor, os princípios tem como finalidade “proporcionar a segurança jurídica, pois uma vez cristalizados tornam-se 16 Mercados voluntários. Disponível em: <www.ipam.org.br> Acesso em: 27/03/2015 17 REDD. Disponível em: <http://goo.gl/om0aHE> Acesso em: 29/03/2015 35 parâmetros na aplicação da norma ao caso concreto”. Conforme já explanado no item 1 deste estudo, a proteção a vida e a dignidade humana são princípios básicos da Constituição, a qual elenca o meio ambiente como um bem comum à toda coletividade, e sua preservação uma obrigação conjunta. Para tanto, o Estado deve lançar mão de todas as ferramentas legais necessárias para sua preservação e, levando em conta o atual estágio de desenvolvimento, a manutenção das áreas naturais remanescentes. Os princípios ambientais básicos são fundamentados no direito ao meio ambiente sadio e na proteção à vida, saúde e dignidade humana. Com tal amparo, existe a possibilidade de compensação pela conservação ou não utilização de alguns recursos naturais produtivos, objetivando a utilização sustentável da natureza, conceito que vai ao encontro dos ensinamentos de Reali (2006): Quando se pretende estimular a adoção de comportamento adequado ao meio ambiente, (...), se aplica a exacerbação tributária, que tem dupla finalidade: induzir à mudança de comportamento e compensar as externalidades negativas (...). No caminho inverso e como estímulo às iniciativas ambientais positivas, cabe a utilização dos incentivos tributários de caráter desoneratório, como a isenção tributária ou a redução do quantum a ser pago. (REALI, 2006, p. 125) Na esfera ambiental prevenção e precaução são conceitos essenciais, uma vez que prejuízos ambientais são irreversíveis e irreparáveis, sendo praticamente impossível reestabelecer uma área degradada em iguais condições a anterior. Por esse motivo adotam-se tais princípios como o objetivo fundamental do direito ambiental, afirmação sustentada por Sebastião (2006): A precaução e a prevenção devem reger as decisões estatais e individuais relativas ao meio ambiente na medida em que, em alguns casos, é impossível a remoção da poluição e dos danos (...). Além disso, por vezes, mesmo que a reconstituição natural seja materialmente possível, seria muito onerosa e não poderia ser exigida do poluidor. Tem-se, então, que na grande parte das vezes, remediar é sempre economicamente mais dispendioso do que prevenir (SEBASTIÃO, 2006, p. 207). Fiorillo (2005) trata ambos os conceitos como sinônimos, porém, diversos autores abordam a prevenção e a precaução como princípios distintos. Ambos são descritos no Art. 225, §1º, Inc. V da Constituição Federal, na Política Nacional do 36 Meio Ambiente18, na Convenção da Diversidade Biológica e a Convenção Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima e na Conferência da ONU sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada no Rio de Janeiro em 1992. 2.4.1 Da prevenção O Princípio da Prevenção é empregado como balizador das atividades de Licenciamento Ambiental pelos órgãos públicos, bem como na execução de Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e Relatório de Impacto Ambiental (RIMA). Antes da realização de qualquer atividade humana é impossível prever a extensão total dos danos ambientais, portanto, deve-se adotar a prevenção. Esta pode ser definida como “ato ou efeito de prevenir ou de se prevenir; precaução para evitar qualquer mal; evitação, impedimento; Prevenção de acidentes”19. Segundo o entendimento de Miranda (2009), este princípio é aplicado aos impactos ambientais já conhecidos ou antevistos, dos quais seja possível estabelecer as medidas necessárias para prever, evitar ou mitigar os danos ambientais. 2.4.2 Da precaução Formalmente, o Princípio da Precaução ambiental foi instituído como Princípio nº15 da Conferência ECO-RIO 92, para que “quando houver ameaça de danos sérios ou irreversíveis, a ausência de absoluta certeza cientifica não deve ser utilizada como razão para postergar medidas eficazes e economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental20”. O Princípio da Prevenção difere da Precaução pelo fato do primeiro ter como objetivo prevenir prejuízos quando as consequências da prática de determinados atos já conhecidos. Enquanto, o segundo é utilizado quando não se pode determinar, com certeza científica, quais as consequências ou eventuais prejuízos que um determinado ato trará ao meio ambiente. 18 Política Nacional do Meio Ambiente. Lei 6938/81, art. 4º, inciso I e IV 19 Prevenção de acidentes. Disponível em: <http://michaelis.uol.com.br> Acesso em: 30/03/2015 20 Relatório ECO Rio 92. Disponível em: <http://goo.gl/7e1ZWZ> Acesso em: 30/03/2015 37 A adoção do Princípio da Precaução estabelece que sejam tomadas medidas ambientais que visem impedir o início de atividades que incorram em riscos ambientais, mesmo que potenciais, tal qual o entendimento de Barbieri (2011): Precaução difere de prevenção. Prevenir (do latim præve ̆nio) significa antecipar soluções diante de algo que se sabe que irá ocorrer ou poderá́ ocorrer segundo alguma estimativa. Para isso é necessário ter algum conhecimento sobre o que se pretende prevenir, seus efeitos e modos de ocorrência (...). Precaução significa antecipar a cautela (do latim præcautio) diante da incerteza, de algo que não se conhece ou cujo conhecimento é insuficiente para estabelecer medidas de prevenção. (BARBIERI, 2011, p. 40) O Quadro 1 apresenta as diferenças entre os princípios da prevenção e da precaução. Quadro 1 - Princípios da prevenção e precaução Princípio da Prevenção Princípio da Precaução Certeza sobre prejuízos ambientais, atuais ou futuros. Incerteza científica sobre prejuízos ambientais futuros Atividade pode ser realizada ou autorizada, desde que tomadas as medidas mitigadoras e compensatórias Atividade não será realizada ou autorizada Fonte: Adaptado pelo autor, com base nos temas abordados no capítulo. 2.4.3 Do poluidor pagador A Política Nacional de Meio Ambiente oferece uma visão ampla do Princípio do Poluidor Pagador. O Art. 3º estabelece que poluidor é “a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental” que tenha dado causa a “alteração adversa das características do meio ambiente”. Já poluição é entendida como “degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população; criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; afetem desfavoravelmente a biota; afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente; lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos”.Toda a sociedade, aí incluso governos, empresas, entidades e população em geral, tem o dever de manter o meio ambiente em equilíbrio, porém, apenas o agente que desobedecer as regras vigentes deve ser nominalmente 38 responsabilizado. Não obstante o desenvolvimento da mentalidade de sustentabilidade tanto da sociedade quanto das empresas, o atual modelo de produção, a fiscalização deficiente por parte do Estado aliados a uma legislação ambiental vasta e restritiva, tende por induzir ações que impactam de forma negativa no meio ambiente. O Artigo 225, §3º da Constituição prevê, além das sanções penais e administrativas que podem se traduzir em multas, a responsabilidade civil e objetiva do autor bem como a obrigação de reparar os danos causados, cabendo ao poluidor se utilizar de todas as ferramentas (inclusive pecuniárias), necessárias à sua compensação, bem como garantir que estes não ocorram novamente. Fiorillo (2005) chama à atenção para que isso não se traduza em salvo-conduto para a degradação: Este princípio reclama atenção. Não traz como indicativo ‘pagar para poder poluir’, ‘poluir mediante pagamento’ ou ‘pagar para evitar a contaminação’. Não se pode buscar através dele formas de contornar a reparação do dano, estabelecendo-se uma liceidade para o ato poluidor, como se alguém pudesse afirmar: ‘poluo, mas pago’. O seu conteúdo é bastante distinto. (FIORILLO, 2005, p. 30) Sendo assim, o causador da degradação deve arcar com o ônus de reparar os danos causados, de modo a estabelecer o equilíbrio entre a atividade econômica e a preservação e assim garantido à sociedade o direito constitucional do meio ambiente ecologicamente equilibrado. Além disso, pode incorrer nas multas previstas principalmente pelo Decreto Federal 6514/200821, que fixa valores que variam de R$ 50,00 a R$ 50.000.000,00. Cabe ressaltar que este tipo de punição ocorre nas três esferas concomitantemente: Administrativa (mediante imposição de multa e outras penalidades previstas em lei), cível (que pode se traduzir, além de nova multa, na obrigação de reparação do dano) e criminal (processo por crime ambiental, inclusive com possibilidade de reclusão dos responsáveis). Ademais, os três entes da Federação (União, Estado e Municípios) tem a responsabilidade compartilhada de fiscalizar e punir os danos ambientais. 21 Decreto Federal 6514/2008. Disponível em: <http://goo.gl/yNMZlN> Acesso em: 27/03/2015 39 2.4.4 Do usuário pagador Ao contrário do Princípio do Poluidor Pagador que visa a reparação e punição, o Principio do Usuário Pagador imputa uma contrapartida financeira pelo direito de uso de um recurso, conforme o Inc. VII da Política Nacional do Meio Ambiente que indica que “à imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos”. A finalidade deste princípio é impedir que os não envolvidos em uma determinada atividade sejam onerados pelo uso de recursos ambientais, limitando esse ônus ao usuário efetivo. Adotar este princípio significa permitir que a natureza seja aproveitada economicamente, principalmente quando isso se traduza em benefício à sociedade e desde que observada a legislação pertinente. 2.4.5 Do protetor recebedor Este Princípio fundamenta o Pagamento por Serviços Ambientais (PSA), baseado na possibilidade de remuneração ao agente que mantém boas práticas ambientais, seja de forma direta ou por subsídios e incentivos fiscais. Ao contrário da compensação ambiental, que está relacionada à recuperação da degradação resultante de atividades que se utilizam de recursos naturais, a compensação por serviços ambientais não decorre de obrigação legal, mas sim da adoção voluntária de uma postura de responsabilidade ambiental, cuja “premiação” é um dever do Estado como forma de estimular sua continuidade, conforme observa Hüpffer et al. (2011): A adoção de conduta no sentido de promover os recursos naturais sem a prévia degradação pelo agente é observada pelo Direito como um plus, consistindo, precisamente, no objeto do PSA, já que o Direito irá determinar a remuneração (a ser implementada pelos sistemas da Economia e Política) o plus exercido voluntariamente pelo cidadão (HÜPFFER et al, 2011, p. 105) 40 O Código Florestal Brasileiro22 aborda este princípio, instituindo a possibilidade de pagamento para as atividades de conservação, que poderá ser na forma de subsídios, crédito com taxas menores em bancos públicos e outros incentivos: Art. 41. É o Poder Executivo federal autorizado a instituir, sem prejuízo do cumprimento da legislação ambiental, programa de apoio e incentivo à conservação do meio ambiente, bem como para adoção de tecnologias e boas práticas que conciliem a produtividade agropecuária e florestal, com redução dos impactos ambientais, como forma de promoção do desenvolvimento ecologicamente sustentável, observados sempre os critérios de progressividade, abrangendo as seguintes categorias e linhas de ação: I - pagamento ou incentivo a serviços ambientais como retribuição, monetária ou não, às atividades de conservação e melhoria dos ecossistemas e que gerem serviços ambientais, tais como, isolada ou cumulativamente: a) o sequestro, a conservação, a manutenção e o aumento do estoque e a diminuição do fluxo de carbono; b) a conservação da beleza cênica natural; c) a conservação da biodiversidade; d) a conservação das águas e dos serviços hídricos; e) a regulação do clima; f) a valorização cultural e do conhecimento tradicional ecossistêmico; g) a conservação e o melhoramento do solo; h) a manutenção de Áreas de Preservação Permanente, de Reserva Legal e de uso restrito (BRASIL, 2012) Hüpffer et al. (2011, p. 104) destacam que este princípio opera tendo em vista a percepção da ineficácia dos instrumentos de controle e normatização ambiental, quando se faz necessário “utilizar instrumentos econômicos para a efetivação dessa tutela”. Os autores entendem que “dinheiro resolve mais que leis e decretos; enfim, que mercado e economia se sobrepõem à política, à justiça e aos direitos”. Baseado neste princípio e nas previsões da legislação fica fundamentada a possibilidade de utilização da preservação ambiental como ferramenta de crescimento das empresas. 22 BRASIL. Lei Federal 12.651/2012. Disponível em: <http://goo.gl/WlK9BA> Acesso em: 01/04/2015 41 2.5 TRIBUTAÇÃO VOLTADA AO MEIO AMBIENTE 2.5.1 Tributação ambiental Os impostos no Brasil estão descritos no Art. 145 da Constituição Federal e previstos no Artigo 16 do Código Tributário Nacional – CTN, onde se conceitua que “imposto é tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica (...)”. Ou seja, o imposto é um tributo não vinculado a nenhuma contrapartida do governo, possuindo predicados basicamente fiscais. Por sua definição, os tributos no Brasil têm como característica principal a sua utilização no custeio da máquina pública, assim sendo, não existe “tributação ecológica” propriamente dita ou oficial, mas sim uma estrutura de minoração de alíquotas tributárias que visa premiar os contribuintes que adotam a preservação ambiental no seu processo produtivo. Em matéria de direito tributário, Barrichello e Araújo (2007 apud RANGEL, 2010) esclarecem que, o Estado se vale de dois grupos de instrumentos para interferência na economia na sociedade: “instrumentos de direção” e os “instrumentos de indução”. Os primeiros empregam normas que proíbem ou permitem determinados atos aplicando as penalidades previstas, enquanto nos instrumentos de indução, o estado direciona a economia e o funcionamento de mercadode forma a estimular ou desencorajar determinada conduta. Em relação á temática ambiental, esses instrumentos podem ser visualizados sob dois prismas: elevando-se a carga tributária no intuito de impedir condutas nocivas ao meio ambiente com finalidade de punição e, no sentido contrário, diminuindo a tributação como forma de incentivo às atitudes responsáveis e sustentáveis. Segundo Borges (2010), os instrumentos de indução não podem ser expressos na criação de novos tributos, mas sim mediante estímulos fiscais e econômicos: Há sim um mecanismo de concessão de benefícios fiscais e isenções tributárias a serem feitas através de lei específica, conforme estipula o art. 150, §6º da CF. Isto não implica qualquer criação de tributo com vistas a onerar a atividade produtiva, mas sim auxiliar àqueles que possuem cadeia produtiva com a preservação ambiental. (BORGES, 2010, p. 09) 42 Os benefícios fiscais servem de ferramenta para o poder público fomentar certos setores produtivos de maneira a estimular o emprego de tecnologias, métodos e processos, os quais, ao mesmo tempo em que impulsionam a produção, ajudam a melhorar a qualidade de vida da sociedade. Cada vez mais os governos procuram instigar o desenvolvimento econômico aliando este à defesa do meio ambiente, pois são polos que podem e devem caminhar juntos, ou seja, o binômio “desenvolvimento econômico/meio ambiente”, é o conceito de “desenvolvimento sustentável”. Miguel (2012) afirma, em relação a intervenção do estado na economia, que alguns tributos possuem essa finalidade distinta da simples arrecadação, possuindo, então, função de extrafiscalidade: Conforme restou verificado, o conceito de extrafiscalidade está relacionado às finalidades não meramente arrecadatórias ou fiscais dos tributos. O prefixo “extra” indica uma exceção ou transbordamento da função meramente fiscal ou abastecimento dos cofres estatais. Nesse sentido, a principal finalidade de alguns tributos não será a de instrumento de arrecadação de recursos para o custeio das despesas públicas, mas a de um instrumento de intervenção estatal no meio social, na economia privada ou mesmo no meio ambiente. (MIGUEL, 2012, p. 10) Em face da excessiva carga tributária a qual os brasileiros estão sujeitos, seria incoerente a criação de impostos específicos que visassem a preservação, principalmente, tendo em vista a necessidade urgente de uma reforma tributária, ainda mais quando se tem em mente que um dos preceitos da extrafiscalidade é premiar e incentivar a adoção de boas práticas. Tributação ambiental, em suma, é a utilização de instrumentos legais tributários já existentes com a intenção de custear os serviços públicos ambientais e nortear o comportamento dos contribuintes para a preservação dos recursos naturais. Além das taxas que são rotineiramente empregadas como manutenção das ações de preservação por parte do poder público, a chamada “tributação verde” é utilizada como forma de desestimular atividades potencialmente poluidoras ou degradantes da qualidade ambiental. Os impostos sobre a renda, importação e exportação, IPI, ICMS, IPVA e IPTU, dentre outros, podem ser usados como mecanismos de extrafiscalidade, que beneficiam tanto as empresas (principalmente na forma de diminuição da carga tributária) como a população em geral, que passa a dispor de um meio mais equilibrado através das ações socioambientais desempenhadas por essas empresas. 43 Carneiro (2003 apud RANGEL, 2010) enfatiza que os tributos ambientais são instrumentos que possibilitam a interação entre a política econômica e a ambiental, sendo esta espécie de tributo uma fonte de receitas que visa recuperar, conservar e melhorar a qualidade do meio ambiente e o controle da poluição, buscando a otimização do aproveitamento dos recursos naturais e promovendo a sustentabilidade. Este cenário confirma a função extrafiscal de algumas classes de impostos. 2.5.2 Princípios constitucionais da tributação Princípios são a base do ordenamento jurídico e, por essa razão, não podem existir leis ou normas que os contestem, servindo de base para toda a legislação brasileira. Os Princípios Tributários existem para proteger a sociedade contra eventuais abusos no poder de tributar exercido pelo governo, e estão dispostos à partir do Art. 150 da Constituição Federal, sendo os principais: a) Legalidade: Proíbe aos entes da federação exigir ou majorar tributos sem lei que autorize; b) Isonomia: Veda tratamento diferente a contribuintes que se encontram em situação equivalente, bem como qualquer distinção de profissão ou atuação; c) Irretroatividade: Proíbe à cobrança de tributos no exercício financeiro no qual houve a publicação da lei que o instituiu ou aumentou; d) Capacidade contributiva: Os tributos devem ser ajustados progressivamente de acordo com a capacidade econômica do contribuinte; e) Vedação do confisco: É proibido aos entes da federação utilizar-se da tributação como efeito de confisco, principalmente quando o contribuinte entender que um tributo é extremamente oneroso; f) Seletividade: Certos bens de maior utilidade social podem ser tributados com alíquotas diferenciadas em relação a outros bens, sendo a base da extrafiscalidade. 44 2.5.2.1 Da seletividade tributária A seletividade tributária é um mecanismo legal, ligado ao princípio da proporcionalidade, que permite modificar alíquotas de alguns tributos em consonância à capacidade de cada contribuinte. Mediante este princípio, certas categorias de bens de maior importância social, como medicamentos e alimentos, serão tributadas com alíquotas menores em relação a outros bens que não possuem esta característica. A seletividade tributária é uma das ferramentas de execução da extrafiscalidade, visto que escolhe os bens cujo consumo é mais ou menos essencial à sociedade para modificar sua tributação. No direito tributário brasileiro, a Constituição prevê nominalmente à aplicação dos preceitos da seletividade no Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI (artigo 153, § 3º, Inc. I), no Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS (artigo 155, § 2º, inc. III) e no Imposto sobre Propriedade Predial Urbana – IPTU (artigo 156,§ 1º, inc. II). Nota-se que o IPI e o ICMS seletivos são empregados como método de regulação econômica. Quando da incidência de alíquotas menores determinados pela essencialidade do bem, estes tem sua produção incentivada e, por consequência, mais facilidade de acesso por parte da população. 2.5.2.2 Da parafiscalidade Conforme já citado anteriormente, os tributos tem a função primordial de sustentar os cofres públicos com o objetivo de viabilizar a satisfação das necessidades da sociedade, assumindo, assim seu caráter de fiscalidade. Não obstante, existem tributos difusos a esse conceito, que não tem a finalidade de simples arrecadação, possuindo uma função parafiscal. Este termo foi utilizado primeiramente no mundo financeiro, no Inventário Schuman23, para nominar tributos que não se enquadravam em apenas uma categoria, sendo sua fiscalização delegada à entidades coligadas ao Estado. Etimologicamente, tem origem no grego “para”, que significa “ao lado, além”, acrescido do latim “fiscalis”, que quer dizer “relativo ao tesouro público”, e de 23Inventário Schumann. França, 1946 45 “fiscus”, “tesouro”24. Parafiscalidade, enfim, é um conceito que se diferencia da Fiscalidade e da Extrafiscalidade por não se associar à competência tributária, mas sim, à capacidade tributária ativa, da capacidade de fiscalização e arrecadação de tributos, ou seja, o tributo é parafiscal quando objetiva custear atividades que não são funções de competência direta do Estado, porém desenvolvidas em prol da sociedade por meio de entes específicos ligados ao Estado.
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