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Noções de Paleografia Uma Breve Introdução Fontes Primárias e Pesquisa Histórica Joaquim Roberto Fagundes 2011 Conceito e Correlações • É o estudo das maneiras de escrever e de sua evolução, incluindo os materiais nos quais e com os quais se escreve. (Flamarion, p. 48). • É a interpretação ampla de um documento escrito, desde o formato da letra até as idéias expressas e o seu relacionamento com contexto quando confrontada com outros documentos e métodos de análise da história. Deve-se sempre ser utilizado mais de uma fonte, principalmente para a checagem e comparação entre os dados de um assunto correlato. • Tem como base a Filologia. • Filologia: Conhecimento e interpretação dos testemunhos escritos; em outro sentido, estudo das formas lingüísticas e do seu uso (Flamarion, 48). • Ambas são consideradas ciências auxiliares da história. • Utilizada, no Brasil, para pesquisa em documentos do século XVI a XIX. • O aprofundamento da paleografia, em termos técnicos, ou seja a pura e simples leitura não tem sentido prático. Ela é válida se relacionada com a investigação histórica, entendendo o sentido do que se quis dizer. Papel e Escrita no Brasil – Tipo Pergaminho • Em documentos oficiais possui marca d’água. • Tinta ferro-gálica, com bico de pena e caneta tinteiro. – Tipos da Escrita • Século XVI – texto utilizado em Portugual, evoluída do latim. Traz diferenças significativas com a atual • Século XVII – Mudanças de significado e na maneira de escrever, com sons diferentes e significados diversos e mesclada com palavras de origem indígena • Séculos XVIII-XIX – Mudanças que se aproximam da escrita do século XX. • Século XX – mudanças ortográficas em diversos momentos Fases Gerais da Paleografia no Brasil • Século XVI – Herança latina presente • Século XVII-XVIII – pequenas mudanças • Século XIX – mudanças significativas • Século XX – mudanças e permanências Paleografia – Século XVI • Características Gerais – Leitura Díficil e menos usual – Herança Portuguesa – No Brasil existem poucos documentos desse período, encontrando-os apenas em arquivos portugueses. – Nomes próprios com estrutura arcaica – Letras Invertidas ou de cabeça para baixo– letra T – Sons e letras diferentes – U(letra) = V(som) – Palavras escrita de forma mais extensa – Til substitui a palavra ue – de que – Til susbstitui m – eram (herã) – Letra i escrita com Y ou letra J Paleografia – Séculos XVII -XIX Características Gerais Utilizada com maior freqüência por pesquisadores Maior parte dos documentos dessa fase Presença significativa de abreviaturas com letras subscritas Letras em duplicidade – Ex.: N – L – F Palavras com encontro de consoantes Palavras com som e escrita diferentes Existência de palavras arcaicas em desuso Palavras arcaicas com estrutura atual – nomes próprios e pessoais Caligrafia variante de acordo com cada escrivão – inexistência de um padrão permanente (daí a maior dificuldade) – varia de pessoa para pessoa Padrão monetário – Réis Palavras, em alguns casos, inacabadas ou com letra faltando Palavras unidas e letras maiúsculas em lugar de minúsculas – sons (S – ss R-rr) Em documentos pessoais, uso em profusão de abreviaturas e de frases padrão. Descuido com a caligrafia. Em documentos públicos: formas padrão para cada tipo de processo, que nada acrescentam em termos de informação para o historiador Presenças de sinais para identificação de assinatura. Assinaturas como arabescos Presença de nomes indígenas identificando lugares, vilas e pontos geográficos. Exemplos da Escrita Brasileira Século XVI Século XVIII Fonte: Conselho UltramarinoA Carta de Pero Vaz de Caminha – Leonardo Arroyo Exemplos da Escrita Brasileira Século XVIII Século XIX Exemplos da Escrita Brasileira – Século XVI A Carta de Pero Vaz de Caminha – Leonardo Arroyo Exemplos da Escrita Brasileira – Século XVI A Carta de Pero Vaz de Caminha – Leonardo Arroyo De belem noua (nova) Ano - 1500 Ano - 1500 Exemplos da Escrita Brasileira Padrão Monetário – Séculos XVII-XX – R$ (Réis) 110$000 Cento e dez mil réis $ 960 Novecentos e sessenta réis Inventário do Alferes José Monteiro Silva – 1827 - Museu Frei Galvão/Arquivo Memória de Guaratinguetá Ano - 1827 Ano - 1827 Exemplos da Escrita Brasileira Padrão Monetário – Séculos XVIII-XX – R$ (Réis) 1:319$921 Um conto trezentos e dezenove mil, novecentos e vinte um réis Inventário do Brigadeiro Luis Antônio – 1819 – Tribunal de Justiça de São Paulo Ano - 1819 Exemplos da Escrita Brasileira Palavras juntas – Século XVIII - 1778 deAlmada PortabandeiradaCompadeGarnados de /Almada/Porta/bandeira/da/Compa/de/Granadeiros Requerimento de Luiz Manuel de Andrade dirigido ao Conselho Ultramarino – 1778 – Santa Catarina Arquivo do Conselheiro Ultramarino - Portugal Exemplos da Escrita Brasileira – Séculos XVIII-XIX • Algumas Abreviaturas V.A. Vossa Alteza Formas de Tratamento Illmo. e Exmo. Sr. Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor Arquivo do Conselho Ultramarino Ano - 1806 Ano - 1778 Exemplos da Escrita Brasileira – Séculos XVIII • Algumas Abreviaturas Nomes Comuns Regimto = Regimento d.a = dita Arquivo do Conselho Ultramarino Ano - 1778 Ano - 1778 Exemplos da Escrita Brasileira – Séculos XVIII-XIX Algumas Abreviaturas Nomes Próprios J.e Gomez de Seqra. JOSÉ GOMES DE SIQUEIRA Pra. Pereira Arquivo do Conselho Ultramarino Museu H.P. Conselheiro Rodrigues Alves Ano - 1806 Ano - 1899 Exemplos da Escrita Brasileira – Séculos XIX Algumas Abreviaturas Meses do ano Casa da Cultura de Areias – Processo Cível 7bro Setembro Jro Janeiro Museu H.P. Conselheiro Rodrigues Alves Ano - 1827 Ano - 1899 Exemplos da Escrita Brasileira Palavras atualizadas em uso Forma antiga (Hum) Forma atual (Um) Forma antiga (Camera) Forma atual (Câmara) Forma antiga (Hé ou He) Forma atual (É) Forma antiga (Hontem) Forma atual (Ontem) Forma antiga (amo) Forma atual (amigo) Ano - 1827 Ano - 1778 Ano - 1778 Ano - 1899 Ano - 1899 Exemplos da Escrita Brasileira • Palavra inacabadas ou faltando letras Granados = Granadeiros Arquivo do Conselho Ultramarino Ano - 1778 Exemplos da Escrita Brasileira Palavras maísculas em lugar de mínusculas aSsignado (assinado) Arquivo do Conselho Ultramarino Ano - 1778 Exemplos da Escrita Brasileira Letras em duplicidade Letra F Appliçaõ (aplição) Letra L Excellentíssimo Letra T AttendendoAno - 1778 Ano - 1778 Ano - 1899 Arquivo do Conselho Ultramarino/Museu H.P. Conselheiro Rodrigues Alves Exemplos da Escrita Brasileira Palavras com som e escrita diferente e sinal em letra diferente aSsignado (assinado) Sitas (Citas = situadas) Letra F Affliçaõ (aflição) Ano - 1778 Ano - 1827 Ano - 1899 Arquivo do Conselho Ultramarino/Museu H.P. Conselheiro Rodrigues Alves Exemplos da Escrita Brasileira Palavras com encontros de consoantes – Ano 1786 Escriptura = Escritura Hypotheca = Escritura Museu Frei Galvão/Arquivo Memória de Guaratinguetá – Livro de Distribuição de Escrituras Exemplos da Escrita Brasileira Documento Público-Privado – Testamento - Texto Padrão Em Nome da Santissima Trindade Padre Filho, e Espirito Santo Trez Pessoas distintas, ehum só Deos Verdadeiro. Saibaõ quantos esta publica cedulla de testamento de Ultima Vontade Virem ou melhor lugar haja que sendo em o Anno do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de mil Oitocentos e dezanove annos, aos vinte quatro dias do Mez de Mayo do dito anno nesta Cidade de Saõ Paulo. Eu Brigadeiro Luiz Antonio de Souza, estando enfermo, porem em meo perfeito Juizo, que Deos foi Servido conçeder, equerendo precaver para amorte que a todos he natural, afim da salvação deminha alma, determino este meo testamento damaneira eforma seguinte. Inventário do Brigadeiro Luiz Antônio – Arquivo do Tribunal de Justiça de São Paulo Ano - 1819 Exemplos da Escrita Brasileira Documento Público - Assinaturas e sinaisProcesso de Medição de Terras - Vila de Cunha – 1815 - Museu Francisco Veloso - Cunha Sinal de quem não sabe escrever em fomato de cruz no meio do nome escrito Signal de = sinal de Nome abreviado - parte sem separação Joaqm JoseVasdaSa Joaquim José Vaz da Silva Arabescos – identificam a assinatura Mancha da tinta necessidade de distinguir Tendência de subir ou descer Ano - 1815 Exemplos da Escrita Brasileira Traslado de Documento Público É escrito de forma corrida, linha por linha, sem uma separação por tópicos ou assuntos. Geralmente são processos que foram em apelação para instâncias superiores, ficando uma cópia na vila onde foi redigido. Os tópicos, na maioria das vezes, são colocados na margem direita. Para quem trabalha com processos é necessário tomar um cuidado redobrado para encontrar as partes que interessam, eliminando-se as formas pétreas dos documentos processuais. Museu Frei Galvão – Arquivo Memória de Guaratinguetá Ano - 1916 Exemplos da Escrita Brasileira Leitura Prejudicada pela Tinta - 1815 Museu Francisco Veloso Exemplos da Escrita Brasileira Documento Pessoal Carta de Campos Salles a Rodrigues Alves Museu H.P. Conselheiro Rodrigues Alves Duplicidade de letras e abreviaturas Ano - 1899 Exemplos da Escrita Brasileira – Final do Século XIX – Início do XX Anotações Pessoais – Cadernos de Família – 1868 -1904 Museu H.P. Conselheiro Rodrigues Alves Exemplos da Escrita Brasileira Documento Público Assinaturas a Rogo de uma Alforriada Museu Frei Galvão/Arquivo Memória de Guaratinguetá – Inventários e Testamentos Ano - 1821 Exemplos da Escrita Brasileira Nomes Indígenas – derivações Jacuhy = Jacuí Itanhy = Itaim Taybathe = Taubaté Parahitinga = Paraitinga Sesmaria da Paraitinga - Vila de Cunha – 1650 - Museu Francisco Veloso - Cunha Ano - 1650 Elementos Identificadores do Documento Estampilhas – Documentos Oficiais Estampilhas em Réis – Utilizadas a partir da 2ª metade do século XIX – Pagamento de Impostos Fonte: História dos Tributos no Brasil Exemplos da Escrita Brasileira • Palavras arcaicas – Catre – cama rústica utilizada no século XVIII e primeiro quartel do século XIX – Bexigas – nome designativo da varíola – Hidropezia – Barriga d’água – Febre malina – Febre maligna – Exó – um tipo de enxada (séculos XVII-XVIII) – Ranger – Rangel (sobrenome escrito segundo a pronúncia) – Catrina – Catarina (século XVI – Portugal) – Tamboladeira – Uma espécie de fruteira – Boceta – pequena bolsa para carregar dinheiro Exemplos da Escrita Brasileira Texto Impresso – Século XVIII Cultura e Opulência do Brasil Antonil – 1711 • Leitura interessante para conhecer a escrita • e exercícios comparativos de aprendizagem Fonte: Banco Safra – Biblioteca Nacional Dificuldades • Além das características da escrita: – Conservação e leitura do documento prejudicadas por: • 1. Fungos • 2. Umidade • 3. Manuseio indevido • 4. Tinta ferruginosa • 5. Papirógrafos • 6. Mau acondicionamento Procedimentos Básicos • Utilização de luvas • Utilização de máscara • Não apoiar no documento • Não dobrar o volume ou a folha • Documentos encadernados amparados com apoio ou suporte adequado • Utilização da Lupa Transcrição Paleográfica • Para uso pessoal – Na medida em que se escreve vai atualizando a grafia. • Para uso técnico – Como está no documento respeitando a estrutura como um todo. • Para utilização em transcrições oficiais – uso da normatização de regras estabelecidas pela AAB e outras entidades congeneres, no Brasil e em Portugal. • Transcrição para trabalhos científicos – acompanhada de aspas. Transcrição Técnica Paleográfica 1. Grafia Palavras unidas indevidamente Os números Enganos, omissões e truncamentos Sinais especiais Abreviaturas Acentuação, pontuação, maiúsculas e minúsculas 2. Convenções (ou indicações de:) Acidentes nos manuscritos Palavras ilegíveis ou parcialmente ilegíveis Linhas danificadas (tinta, umidade, etc.) Autógrafos Notas marginais 3. Assinaturas Rubricas e sinais públicos 4. Documentos Mistos Caracteres impressos que aparecem em documentos recentes 5. Selos, Estampilhas etc. Selos, lacres, chancelas e outros 6. Referências Identificação do documento transcrito, localização, original ou não, folhas. 7. Apresentação Gráfica Como deve ser impresso o texto transcrito 8. Observações Texto preliminar e explicativo quando textos publicados Dicas Interessantes • O pulo do gato: é o olho acostumado através da prática que apura e traz a rapidez e o entendimento do documento da escrita e do sentido da idéia que se quis dizer • Comparar letras e palavras no mesmo texto ou em outras partes do documento, percebendo que seja da mesma pessoa. • Em documentos públicos é possível reconstituir texto inteiro quando ele é padrão. Repete-se as fórmulas. • Manter sempre atualizado, aumentando a bagagem cultural.