Trechos do conto Robbie, de Isaac Asimov. – Noventa e oito, noventa e nove, cem. Gloria tirou o bracinho roliço da frente dos olhos e hesitou um ...

Trechos do conto Robbie, de Isaac Asimov.

– Noventa e oito, noventa e nove, cem.

Gloria tirou o bracinho roliço da frente dos olhos e hesitou um pouco, franzindo o nariz e piscando com a claridade ofuscante do sol. Depois, tentando olhar ao mesmo tempo para todos os lados, afastou-se, com passos cautelosos, da árvore em que se tinha apoiado.

Esticou o pescoço para verificar as possibilidades de uma moita de folhagens à direita, para obter um melhor ângulo que lhe permitisse ver o que havia dentro de sua sombra. [...]

— Garanto que ele entrou em casa – murmurou, fazendo beicinho – Não sei quantas vezes já disse que assim não vale.

Apertando a boquinha com força e franzindo bem a testa, tomou, resoluta, a direção do sobrado situado no outro lado da entrada para carros.

Quando ouviu o barulho das folhagens, seguido pela batida nítida e ritmada dos pés metálicos de Robbie, era tarde demais. Virou-se e enxergou o triunfante companheiro saindo do esconderijo e correndo a toda a velocidade para a árvore combinada.

— Espera, Robbie! – gritou Glória, consternada. - Assim não vale, Robbie! Você prometeu que só correria quando eu te encontrasse.

Os pezinhos minúsculos não podiam competir de jeito nenhum com as enormes passadas de Robbie. De repente, a uns três metros da chegada, Robbie começou a andar em câmera lenta e Glória, com um ímpeto final de velocidade desesperada, passou ofegante na frente dele para encostar a mão na árvore.

[...]

- [...] agora é minha vez de me esconder, porque você tem perna mais comprida que eu e tinha prometido que só ia correr quando eu te encontrasse.

Robbie sacudiu a cabeça — um pequeno paralelepípedo arredondado nas beiras e nos cantos, preso a outro, parecido, mas bem maior, que lhe servia de tronco, por meio de uma haste curta, flexível e obediente, se virou, de frente para a árvore. Uma película fina e metálica desceu sobre os olhos brilhantes e do interior do corpo saiu um tique-taque lume e ressonante.

— Vê se não vai espiar, hein?... ou não vou contar direito até cem — avisou Gloria, correndo para o esconderijo.

Com regularidade uniforme, o tique-taque foi marcando os segundos. Ao chegar no centésimo, as pálpebras se abriram e o vermelho fulgurante dos olhos de Robbie vasculhou os arredores. Pousaram um instante numa ponta de tecido listrado que aparecia por trás de uma pedra. Deu alguns passos e convenceu‑se de que era Gloria, agachada no chão.

[...]

— Você espiou! — reclamou, o que era pura injustiça. — Mas não faz mal, cansei de brincar de esconder. Agora quero andar na garupa.

Mas Robbie, magoado com a acusação injusta, preferiu sentar, com todo cuidado, no chão e sacudir a cabeça pesada de um lado para outro.

Gloria logo mudou de atitude, passando a adular o amigo:

— Anda, Robbie. Eu não tava falando a sério quando disse que você tinha espiado. Me leva na garupa, tá?

Mas Robbie quis mostrar que dar o braço a torcer não era tão simples assim. Ficou, olhando, teimoso, para o céu e sacudiu a cabeça com maior ênfase ainda.

— Por favor, Robbie, me leva na garupa, seja bonzinho, sim?.

Abraçou-o  pelo pescoço com os braços rosados e apertou bem o corpo contra o companheiro. Depois, mudando um pouco de tática, se afastou.

- Se você não me levar, eu choro.

E preparou uma careta que prometia o pior.

O empedernido de Robbie nem ligou para a temível ameaça, sacudindo a cabeça pela terceira vez. Gloria viu que precisava jogar a última cartada.

— Se não levar — exclamou, feito manteiga derretida —, nunca mais que eu te conto uma história. Você vai só ver. Nunca mais...

Foi o que bastou para Robbie ceder, incondicionalmente, ao ultimato, concordando com a cabeça que o metal do pescoço chegou a estalar. Ergueu a menina do chão com cuidado, pegou e colocou‑a em cima dos ombros largos e achatados

[...].

1- Identifique as personagens nessa passagem do conto.

2- Na cena narrada no início da história, o que as personagens estão fazendo?

3- As ações narradas se passam em que momento do dia? Justifique com um trecho do texto.

4- O que pode ser surpreendente em relação à personagem Robbie? Cite características físicas e atitudes.

5- Em alguns trechos, é possível perceber que o narrador tem opiniões sobre os acontecimentos narrados. Assinale a alternativa que comprova essa afirmação.

a) “Você espiou! – reclamou, o que era pura injustiça.”

b) ” Os pezinhos minúsculos não podiam competir de jeito nenhum com as enormes passadas de Robbie.”

c) “Depois, mudando um pouco de tática, se afastou.”

d) “Com regularidade uniforme, o tique-taque foi marcando os segundos.”