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Com base nas reflexões produzidas, pode-se dizer que a guerra fiscal enfraquece a coletividade, mas não atinge necessariamente o governo federal. P...

Com base nas reflexões produzidas, pode-se dizer que a guerra fiscal enfraquece a coletividade, mas não atinge necessariamente o governo federal. Por essa razão, acredita-se que a reforma tributária voltada para a modificação do funcionamento do ICMS ainda não alcançou a agenda de prioridades do governo brasileiro nem está próxima de alcançar. A competição interestadual gera malefícios significativos, mas o Executivo federal tem conseguido se beneficiar da situação, pois o fenômeno acabou por deixar os Estados ainda mais dependentes dos recursos transferidos pela União. Com a multiplicação das contribuições sociais, que se constituem em tributos que não possuem parcela de sua arrecadação definida constitucionalmente a ser transferida para Estados e municípios e que passaram a ser as principais fontes de recursos da União nos últimos anos, o governo passou a deter grande poder de influência sobre os Estados. Em decorrência disso, os Estados precisam negociar com o governo federal a aprovação de medidas que garantam uma parcela maior dessas contribuições nos repasses realizados pela União aos entes federativos. A conseqüência disso foi o surgimento de repasses de contribuições sociais como moeda de troca do governo federal nas negociações com os governadores de Estado. Essa moeda, no entanto, tem sido utilizada pelo Executivo federal para se conseguir apoio para os projetos e programas de interesse político-partidário do governo federal e não para promover uma estrutura mais ordenada e mais propícia para o desenvolvimento do país. Com esses artifícios, aprofundou-se a dependência dos Estados em relação à União e o governo federal não tem estado suficientemente comprometido para se engajar na melhoria desse equilíbrio subótimo. Ao contrário, o governo federal passou a deter mais controle sobre os entes federativos, tornando mais interessante para governadores de Estado não fazer oposição ao governo federal e também não incentivar suas bancadas estaduais no Congresso Nacional contra o partido do presidente da República. Assim, o governo federal conseguiu um mecanismo de coordenação dos Estados favorável à sua atuação. Em decorrência disso, verifica-se em geral os governadores apoiando o governo federal para obterem as necessárias complementações às receitas de seus Estados e o governo federal não se engajando na promoção de mudanças na atual estrutura federativa, que boa parte dos governadores não deseja. O equilíbrio resultante daí não é o desejado socialmente, mas tem servido para acomodar os interesses da maior parte dos envolvidos. Ainda que a ordem federativa no Brasil continue instável e incompleta, conforme se constata com a ocorrência predatória da guerra fiscal, há um equilíbrio entre as partes e o todo (mesmo não sendo ele nem eficiente, nem duradouro), que produziu uma estrutura de organizações e indivíduos com interesses na manutenção dessa ordem, o que atrapalha a aprovação de medidas que aprimorem o sistema tributário no Brasil. Os atores envolvidos na tomada de decisão referente ao ICMS em geral, antes de se preocuparem com o desenvolvimento de suas regiões e com a provisão de bens públicos, preocupam-se com a geração de verbas e empregos a indivíduos que venham a garantir sua sobrevivência política no futuro. As decisões referentes ao ICMS têm sido tomadas por atores políticos mais preocupados com fatores que podem garantir sua permanência no poder do que em gerar mudanças estruturais e necessárias ao país, perpetuando deformações tributárias e afastando o sistema tributário brasileiro de um arcabouço institucional adequado para o crescimento e desenvolvimento econonômico. Concluiu-se, portanto, que o subsistema do ICMS é marcado por instituições que geram um equilíbrio pouco favorável para a cooperação dos atores, levando a uma situação para os Estados e o país como um todo aquém do desejável. Além das regras atuais serem ineficientes, elas cristalizaram uma estrutura de interesses difícil de ser revertida, que só se modifica lenta e incrementalmente. Os atores em interação no subsistema do ICMS possuem poucos incentivos para modificarem seus comportamentos e decisões nesse setor. Quanto à articulação dos atores, constatou-se que eles podem ser agrupados conforme diversos modelos de subsistemas de governo. Percebeu-se a existência de uma comunidade de política pública, com atores compartilhando conhecimento sobre a área em questão; de uma rede de política pública, ao se verificar a existência de atores que, além de conhecimento, ligam-se entre si em função dos interesses materiais que compartilham em relação ao ICMS; e de coalizões de defesa, nas quais alguns atores apresentam conhecimento, interesses comuns, bem como um discurso baseado no papel que deveria ter o governo central nesse subsistema. No tocante à dinâmica de atuação dos atores, concluiu-se que os Estados têm um grande destaque no subsistema, por serem eles os provocadores da guerra fiscal e as principais vozes nos processos de reforma tributária que trata o ICMS. No entanto, mesmo que detenham interesses comuns e crenças similares, podendo compor uma coalizão de defesa, eles não têm sido fortes o suficiente para definir de fato a política oficial do ICMS. Certamente alguns grupos de Estados conseguem em alguns momentos pressionar o subsistema de forma mais significativa que em outros. No entanto, nenhuma coalizão conseguiu dominar o subsistema do ICMS, pois o governo federal é certamente o ator que exerce a maior influência nesse contexto. Assim, pode-se dizer que as decisões resultantes da interação de atores no subsistema não é a ideal para nenhum dos grupos que nele se apresentam. A política ali gerada compõe-se da pressão que as diversas coalizões, redes e grupos exercem, mas compõe-se principalmente da decisão do Executivo federal de não atuar, de não se engajar de fato na defesa de mudanças e aprimoramentos no setor. Essa decisão do governo federal em relação ao subsistema do ICMS torna a política relativa à temática mais próxima dos interesses do Executivo federal do que dos interesses de quaisquer grupos de atores existentes. Por fim, deve-se dizer que os dados levantados e a análise realizada nesse trabalho reforçam a idéia de que a consideração dos traços básicos do subsistema do ICMS, ou seja, da forma na qual seus atores interagem, do funcionamento das instâncias nas quais se produzem as decisões referentes a esse imposto e das regras que modelam seus resultados, é fundamental para a compreensão do sistema tributário brasileiro e das probabilidade de se reformá-lo. Além disso, as conclusões trazidas por essa dissertação abrem espaço para outras pesquisas ao apontar a existência de redes e coalizões e a posição central do Executivo federal no subsistema de governo que envolve o Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços no Brasil, contribuindo também para a reflexão acerca do papel do Estado perante a competição tributária interestadual que tem ocorrido no país.

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2007_LuannaSant'AnnaRoncaratti
205 pág.

Teoria Geral do Processo Usp - PiracicabaUsp - Piracicaba

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