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Como Ler Livros de obras de referência, aliás. O autor ou compilador tem de saber qual tipo de informação os leitores vão buscar e organizar a obra...

Como Ler Livros de obras de referência, aliás. O autor ou compilador tem de saber qual tipo de informação os leitores vão buscar e organizar a obra de modo a satisfazer suas necessidades. Talvez nem sempre ele consiga prever essas necessidades e é por isso que a regra de que é preciso ler a introdução e o prefácio de um livro antes de ler o próprio livro aplica-se particularmente a esse caso. Não tente usar uma obra de referência antes de ler os conselhos do editor a respeito de como usá-la. Claro que nem todo tipo de questão pode ser respondido por obras de referência. Você não encontrará em nenhuma obra de referência as respostas para as três perguntas que Deus faz ao anjo no conto 'De que vivem os homens', de Tolstói: 'O que habita no homem?', 'O que não é dado ao homem?', e 'De que vivem os homens?'. Você também não encontrará as respostas para a pergunta que aparece no título de outro conto de Tolstói, 'De quanta terra precisa um homem?'. E há muitas questões desse tipo. As obras de referência só têm utilidade quando você sabe quais tipos de perguntas elas podem responder e quais não podem. Isso se resume em saber quais são as espécies de coisas a respeito das quais os homens concordam. Somente as coisas a respeito das quais os homens geral e convencionalmente concordam podem ser achadas em obras de referência. As opiniões sem base não têm lugar nelas, ainda que às vezes apareçam. Concordamos em que é possível saber quando um homem nasceu, quando morreu e conhecer fatos similares. Concordamos em que é possível definir palavras e coisas, e é possível ter uma ideia da história de quase qualquer coisa. Não concordamos a respeito de questões morais, nem de questões sobre o futuro, e desse modo não encontramos esse tipo de coisa em obras de referência. Em nossa época, presumimos que o mundo físico é organizável e assim quase tudo a seu respeito pode ser encontrado em obras de referência. Nem sempre foi assim; como resultado, a história das obras de referência tem um interesse peculiar, pois nos revela muito sobre as mudanças nas opiniões dos homens a respeito daquilo que se pode conhecer. Como se vê, acabamos de sugerir que há uma quarta exigência para o uso inteligente de obras de referência. Você tem de saber o que quer saber; tem de saber em qual obra de referência vai procurar; tem de saber como encontrar essa informação na obra de referência; e tem de saber que os autores ou compiladores da obra consideram que tal informação pode ser conhecida. Tudo isso indica que você precisa saber muito para que possa usar uma obra de referência. Tais obras são inúteis para aqueles que nada sabem. Elas não são guias para os desorientados. COMO USAR O DICIONÁRIO Todas essas considerações se aplicam ao dicionário, que é uma obra de referência. Mas o dicionário também convida a uma leitura por diversão. Ele desafia qualquer um a sentar-se com ele num momento de ócio. Há maneiras piores de gastar o tempo. Os dicionários estão repletos de conhecimentos obscuros e passagens espirituosas. Além disso, é claro, têm usos mais austeros. Para aproveitá-los ao máximo, é preciso saber como ler esse tipo particular de obra. A observação de Santayana sobre os gregos - de que eles foram o único povo na história da Europa que não estudou - tem duplo sentido. É claro que as massas não estudavam, mas nem mesmo os poucos eruditos - a classe ociosa - estudou no sentido de ter-se colocado aos pés de mestres estrangeiros. O estudo, nesse aspecto, começa com os romanos, que foram à escola dos pedagogos gregos e foram educados pelo contato com a cultura grega que tinham conquistado. Não surpreende, portanto, que os primeiros dicionários fossem glossários de palavras homéricas cujo objetivo era ajudar os romanos a ler a Ilíada, a Odisseia e outras obras gregas que usavam o vocabulário homérico 'arcaico'. Igualmente, muitos de nós hoje precisamos de um glossário para ler Shakespeare; ou, se não Shakespeare, Chaucer. Havia dicionários na Idade Média, mas eles eram comumente enciclopédias de conhecimentos sofisticados, compreendendo discussões dos termos técnicos mais importantes usados no discurso erudito. Havia dicionários bilíngues no Renascimento (tanto de grego quanto de latim), que eram necessários porque as obras que dominavam os estudos naquela época estavam escritas nas línguas antigas. Mesmo quando as línguas ditas vulgares - italiano, francês, inglês - foram gradualmente tomando o lugar do latim como línguas de cultura, a busca da cultura continuava a ser um privilégio de poucos. Nessas circunstâncias, os dicionários destinavam-se a um público limitado, sobretudo como apoio à leitura e à produção de literatura de valor. Vemos assim que os propósitos educativos dominaram a produção de dicionários desde o início, ainda que também houvesse interesse em preservar a pureza e a ordem do idioma. Em contraste com esse último objetivo, o Oxford English Dictionary (conhecido simplesmente como OED), iniciado em 1857, foi um novo começo, uma vez que não buscou prescrever usos, mas apresentar um registro histórico preciso de toda espécie de uso, dos piores aos melhores, tomados da escrita popular e da elegante. Mas esse conflito entre o lexicógrafo na posição de árbitro autonomeado e o lexicógrafo na posição de historiador pode ser considerado acessório, pois o dicionário, como quer que se organize, é antes de tudo um instrumento educativo. Esse fato é irrelevante para as regras do bom uso do dicionário como auxílio extrínseco à leitura. A primeira regra da leitura de qualquer livro é saber que tipo de livro ele é. Isso significa saber qual era a intenção do autor e que tipo de coisa você pode esperar encontrar em sua obra. Se você consultar um dicionário apenas como guia de ortografia ou de pronúncia, é assim que vai usá-lo, isto é, não vai usá-lo bem. Se perceber que ele contém muitas informações históricas, cristalizadas no crescimento e no desenvolvimento do idioma, você prestará atenção não apenas à variedade de sentidos listados para cada palavra, mas também à sua ordem e relação mútua. Acima de tudo, se você estiver interessado em aprofundar sua própria educação, usará um dicionário de acordo com seu objetivo primeiro, isto é, como auxílio à leitura de livros que seriam demasiadamente difíceis porque seu vocabulário inclui termos técnicos, arcaicos, alusões literárias e até palavras conhecidas usadas em sentidos obsoletos. Claro que há muitos problemas a serem resolvidos quanto à boa leitura de um livro, além daqueles relacionados ao vocabulário de um autor. E desaconselhamos sentar-se com o livro numa mão e o dicionário na outra, sobretudo na primeira leitura de uma obra difícil. Se você tiver de procurar muitas palavras no início, certamente vai perder de vista a unidade e a ordem do livro. A utilidade primária do dicionário aparece naquelas ocasiões em que você se defronta com um termo técnico ou uma palavra que lhe é inteiramente nova. Mesmo assim, não recomendaríamos procurá-las na sua primeira leitura de um bom livro, a menos que elas pareçam importantes para entender o sentido geral do que o autor quer dizer. Isso sugere outras prescrições negativas. Não há sujeito mais irritante do que aquele que pretende encerrar uma discussão sobre o comunismo, a justiça ou a liberdade fazendo uma citação do dicionário. É razoável respeitar os lexicógrafos como autoridades no uso das palavras, mas eles não são as fontes últimas da sabedoria. Outra regra negativa: não engula o dicionário. Não tente adquirir um vocabulário rico rapidamente pela memorização de uma longa lista de palavras cujos sentidos não se relacionam com nenhuma experiência efetiva. Em suma, não esqueça que o dicionário é um livro que fala de palavras, não de coisas. Se nos lembrarmos disso, poderemos tirar desse fato todas as regras para usar um dicionário de modo inteligente. Podemos encarar as palavras de quatro maneiras: 1. PALAVRAS SÃO COISAS FÍSICAS - palavras que podemos escrever, sons que podemos emitir. Deve haver, portanto, maneiras uniformes de escrevê-las e pronunciá-las, mesmo que a uniformidade seja frequentemente questionada pelas variantes. De todo modo, essa