Buscar

A lei de 7 partidas é common law ou civil law?

💡 3 Respostas

User badge image

Kalyne Bianca

Como já se sabe, o sistema processual civil deve dimensionar vários tipos de litigiosidades (individual, coletiva e serial) e não pode ficar arraigado à sua concepção clássica, para buscar tão somente dimensionar soluções técnicas para os conflitos privados e individuais (prioritariamente questões envolvendo a propriedade, relações contratuais, família e sucessões).[2]

Tal questão das litigiosidades deve ser colocada em debate no Brasil, no entanto, sem perder de foco de que cabe ao Poder Judiciário o julgamento de causas e não de teses. [3]

Desde já algum tempo as reformas têm se concentrado na tentativa de uniformização da jurisprudência a todo custo. O suposto é que seja possível estabelecer “standards interpretativos” a partir do julgamento de alguns casos: um Tribunal de maior hierarquia, diante da multiplicidade de casos, os julgaria abstraindo-se de suas especificidades e tomando-lhes apenas o “tema” a “tese” subjacente. Definida a tese, todos os demais casos serão julgados com base no que foi predeterminado; para isso, as especificidades destes novos casos também serão desconsideradas para que se concentre apenas na “tese” que lhes torna idênticos aos anteriores.[4]

Percebe-se que a padronização decisória poderia ser levada a cabo, atendidos alguns requisitos, até mesmo por um único Juízo (vide art. 285A, CPC), apesar da diminuição do vigor desta assertiva por recentes decisões do STJ[5]e pela tendência legislativa do projeto de lei 8046/2010 (art. 307).

Conhece-se a tendência mundial de convergência dos aludidos sistemas,[6] de modo a não se poder mais afirmar que um país seja puramente de common law ou de civil law, em face da adoção de códigos e leis nos primeiros (como, v.g., os estatutos do EUA e a CPR inglesa de 1998) como fonte importante na aplicação do direito, e da adoção da força persuasiva ou vinculante dos julgados (“precedentes”) nos segundos, como de algum modo vem ocorrendo em nosso país.

Existem inúmeros estudos nos últimos anos[7] que mostram essa tendência de junção das tradições já no século XX: na experiência continental européia tornou-se evidente a concessão de maior espaço ao direito jurisprudencial, e, em sentido inverso, uma orgia legislativa que ofertam formas legais às regras do common lawclássico.[8]

Nesses termos a temática se torna mais complexa, uma vez que não é mais possível simplificar a questão.

Fala-se muito na necessidade de garantia da igualdade, isto é, que se deve buscar o estabelecimento de uniformidade nas decisões porque, o fato de haver divergência sobre um mesmo “tema” viola a garantia constitucional de tratamento isonômico. Mas o que é igualdade? Sabemos que, há muito, igualdade deixou de ter apenas um conteúdo negativo (isonomia), como o era nos séculos XVIII e XIX e passou a incorporar também uma dimensão positiva (direito à diferença); até porque isonomia e diferença seriam co-originários na formação da igualdade..[9]

A tradição dos precedentes[10] dos países do common law pode ser bem aproveitada para este debate em relação à igualdade; para se evitar a antiga crítica realizada de que ela poderá ser vista como uma “fórmula da perpetuação do erro”.[11]

Como informa Whittaker, na tradição inglesa:

[…] o ponto de partida do Common Law significa que a natureza do material sobre o que se constróem muitas decisões judiciais inglesas difere radicalmente daqueles sistemas jurídicos cuja base é legislativa. Com efeito, o lugar de início não se acha num único texto – qualquer que seja sua extensão ou imprecisão – mas sim em diversos textos, isto é, na reconstrução de decisões que abarcam um período que com frequência remonta dois séculos passados e às vezes períodos maiores. Assim mesmo, a classe do texto de uma sentença inglesa se distingue fundamentalmente de todo texto legislativo, sendo aquele por regular de modo discursivo ou argumentativo, no qual o juiz ou os juízes sopesam as considerações em disputa nos casos prévios para alcançar sua decisão. Inclusive, se um juiz busca expor o Direito em um ou várias proposições, essas palavras, por si só, carecem de toda força, salvo (inter alia) em seu respectivo contexto jurídico e fático. Isto reafirma a ideia de que as resoluções anteriores não são simples toques num quadro pontual mais amplo (apesar de que um jurista inglês sempre deve retroceder para apreciar uma área do Direito), porque os textos das sentenças almejam por si mesmos sua relação com o que ocorreu antes e, em algumas oportunidades, o que pode acontecer posteriormente. Certamente, muito mais decisões recentes (“discursos”) dos membros da Câmara dos Lordes buscam delinear o modelo das proposições jurídicas que respeita o tipo de assunto submetido ao seu conhecimento, conferindo sentido às diversas decisões anteriores.[12] – Destacamos -(tradução livre)

Ademais, com Taruffo percebemos que “as opinions do common law são discursivas, personalizadas, abertas à discussão de valores e policies e justificadas por argumentações bem desenvolvidas”.[13]

Nesses termos, percebe-se que nem em países nos quais é tradicional o uso de precedentes pode haver sua utilização mecânica sem a reconstrução do histórico de aplicação decisória e sem se discutir sua adaptabilidade, mesmo que se busque tal desiderato embasado em uma lógica tacanha da aplicação da igualdade.[14]

Sellers, ao proceder um importante relatório da utilização do precedente no sistema americano, informa com base no precedente Payne v. Tennessee (501 U.S. 808, 827-8, 111 S.Ct. 2597, 260 de 1991) que o:

Stare decisis é o caminho preferível, porque ele promove a imparcialidade e uma previsível e consistente construção de princípios jurídicos, fomenta a confiança nas decisões judiciais e contribui para a atual e percebida integridade do processo judicial. Aderir-se ao precedente é usualmente a política sábia, porque na maioria das questões é mais importante que a regra jurídica aplicável seja apenas estabelecida do que estabelecida corretamente. Entretanto, quando não se é viável controlar o rumo das decisões, ou a racionalização/fundamentação é mal feita, esta Corte nunca se sentiu obrigada a seguir o precedenteStare decisis não é um comando inexorável; é, sobretudo, um princípio político, e não uma fórmula mecânica de aderência à última decisão. – destacamos.[15]

Mostra-se, assim, evidente o não cabimento de aplicação mecânica do precedente nos Estados Unidos, ou seja, “reiterando que o stare decisis não é um ‘comando inexorável’ ou uma ‘fórmula mecânica de aderência à última decisão’, mas sim um ‘princípio político” útil, a Suprema Corte contribuiu com uma série de orientações para identificação daqueles casos em que a superação de precedentes seria apropriada’”.[16]

A defesa dessa “pseudo-igualdade” para aumentar a eficiência (quantitativa), para fomentar uma previsibilidade pelo engessamento dos posicionamentos (em face do modo superficial que o sistema brasileiro impõe a aplicação do direito aos juízes), para favorecer uma concepção hierárquica (e não funcional da divisão das competências do Poder judiciário – com quebra da independência interna) e desestimular o acesso à justiça (que é fruto de uma luta histórica e se tornou um problema funcional, pela ausência de uma efetiva reforma do judiciário e de um aparato adequado), deve ser tematizada com muita cautela.

0
Dislike0
User badge image

Andre Smaira

Para responder essa pergunta devemos colocar em prática nosso conhecimento sobre Direito.
O Direito é um conjunto de normas de conduta social imposto coercitivamente pelo Estado para conferir segurança ao cidadão e às suas relações, assim como ao seu patrimônio, seguindo os critérios da justiça, da moral e da ética. Ou seja, trata-se de um instrumento que conserva e regula as estruturas sociais através de um ordenamento jurídico, de forma que, caso o indivíduo faça algo que vá contra o disposto em lei, este deverá responder ao Estado, único que detém o jus puniendi (direito de punir), e que poderá, compelir o agente a responder civil ou penalmente de acordo com o estipulado em lei, visando evitar conflitos e promover a justiça.
Nesse contexto, a Lei das Sete Partidas trata-se de uma legislação desenvolvida no Reino de Castela buscando uniformizar as regras jurídicas do reino. Logo, elas são mais próximas da Civil Law.
0
Dislike0

✏️ Responder

SetasNegritoItálicoSublinhadoTachadoCitaçãoCódigoLista numeradaLista com marcadoresSubscritoSobrescritoDiminuir recuoAumentar recuoCor da fonteCor de fundoAlinhamentoLimparInserir linkImagemFórmula

Para escrever sua resposta aqui, entre ou crie uma conta

User badge image

Outros materiais