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ACESSO À JUSTIÇA E O DIREITO AO MÉTODO ADEQUADO DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS
O acesso à justiça é uma possibilidade que os indivíduos têm para manter a paz social. Ocorre que, nem sempre, a justiça foi alcançada da forma processual como se conhece hoje. Sobre o assunto, observa-se:
O processo pode não ser a única solução para resolver um conflito entre as pessoas. Estas, no início da civilização, faziam justiça pelas próprias mãos. E a solução era temerária, pois não havia necessária proporção entre a ofensa e a reação. Daí o progresso da chamada lei de talião, a trazer proporcionalidade: olho por olho, dente por dente. (NALINI, 2017, p. 28).
Posteriormente, as sociedades passaram a fazer uso do processo como meio de solução de conflitos. Nesse modelo, o Estado, representado por um terceiro imparcial, passou a intervir nos desentendimentos das partes (NALINI, 2017, p. 28).
Ressalta-se, entretanto, que o acesso à justiça vai muito além da jurisdição. Esta é apenas uma das formas de se alcançar a paz social. Destarte, a jurisdição é uma das formas que o Estado dispõe para que os indivíduos alcancem a solução dos conflitos. Seguindo essa linha de soluções não-jurisdicionais, os doutrinadores nos ensinam:
Abrem-se os olhos agora, todavia, para todas essas modalidades de soluções não-jurisdicionais dos conflitos, tratadas como meios alternativos de pacificação social. Vai ganhando corpo a consciência de que, se o que importa é pacificar, torna-se irrelevante que a pacificação venha por obra do Estado ou por outros meios, desde que eficientes. Por outro lado, cresce também a percepção de que o Estado tem falhado muito na sua missão pacificadora, que ele tenta realizar mediante o exercício da jurisdição e através das formas do processo civil, penal ou trabalhista (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 2010, p. 31/32).
Atualmente, o direito processual passa por uma mudança considerável. Entende-se que as respostas judiciais não estavam alcançando as soluções adequadas para os conflitos. Diante dessa realidade, novas alternativas estão sendo oferecidas aos jurisdicionados. Nesse sentido, analisa-se:
Por isso cresce a preocupação e o interesse por adoção de alternativas ao processo convencional. O caos reinante impõe busca dessas opções e a menção mais frequente é a adoção de métodos alternativos como a conciliação, mediação e arbitragem. São respostas mais atraentes para o mercado, pois a longa duração do processo, o seu custo global em valores tangíveis e intangíveis e a álea natural que o sistema envolve despertou alguns nichos da sociedade para a busca de meios mais racionais de se resolver uma questão concreta (NALINI, 2017, p. 29).
Nesse contexto, o direito das partes não está mais restrito às decisões do Estado. Busca-se, hoje, soluções mais céleres e adequadas para o caso concreto, evitando, assim, que as partes fiquem limitadas às intervenções estatais.
Diante dessa necessidade, o Código de Processo Civil de 2015 promoveu importantes alterações para que os conflitos sejam tratados de maneira adequada. Segundo Fredie Didier Jr. e Hermes Zaneti Jr. (2016, p. 303), “[...] Aos olhos do CPC não há superioridade de justiça estatal em relação aos demais meios de solução de controvérsias”.
Em seu artigo 334, o Novo Código de Processo Civil prevê os requisitos da audiência de conciliação ou de mediação. Dessa forma, o Código busca que, antes do processo ir para sua fase litigiosa, as partes tentem resolver os conflitos consensualmente. Acerca do assunto, João Luiz Lessa Neto ensina: 
O CPC adota o modelo multiportas de processo civil. Cada demanda deve ser submetida à técnica ou método mais adequado para a solução e devem ser adotados todos os esforços para que as partes cheguem a uma solução consensual do conflito (NETO, 2017, s.p).
Assim como a conciliação, a mediação tem ganhado espaço no atual cenário jurídico. É também uma forma de solução por autocomposição, e possibilita outra forma das partes alcançarem seus interesses perante conflitos.
Além dessas, utiliza-se muito a arbitragem como modalidade de solução. José Renato Nalini faz uma breve comparação entre a arbitragem e a mediação, privilegiando o uso desta em detrimento daquela. Nesse sentido:
A arbitragem é outra modalidade alternativa de grande utilização, principalmente em temas cuja expertise é bastante sofisticada. Existe há muito tempo no sistema, tanto que já integra o processo civil brasileiro. Seu uso, nos Estados Unidos, foi considerado menos favorável do que a mediação, embora também positivo. Em cotejo com a mediação, a arbitragem perde, porque a mediação: a) leva menos tempo; b) custa significativamente menos; c) propicia uma experiência mais satisfatória, de acordo com os partícipes (NALINI, 2017, p. 30).
Para o autor supracitado, o diálogo deve ter vez nas tomadas de decisões. Dessa forma:
O primordial, na adoção das alternativas, é edificar um ambiente em que o diálogo não seja substituído pela intervenção obrigatória, automática e excessivamente técnica do Estado. Isso não ajuda a construir uma cidadania ativa, proativa, protagonista, participativa. Existe um horizonte longínquo, mas muito desejável: a implementação da Democracia Participativa. Esta não virá se as pessoas continuarem tuteladas pela assistência judicial, que despreza a orientação jurídica, o aconselhamento, para automático e indesejável ingresso no sistema judicial (NALINI, 2017, p. 31).
Restabelecer o diálogo entre as partes é uma das vantagens que as sessões de mediação e de conciliação proporcionam. Afinal, resolver os litígios de maneira consensual faz com que a parte exponha seus interesses, e seja compreendida mais facilmente pela parte contrária. Sobre o assunto, José Renato Nalini comenta:
A vantagem mais significativa dos métodos alternativos é o potencial de efetivamente resolver problemas. A remoção do ritualismo e do formalismo exagerado, do procedimentalismo estéril, da burocracia ínsita ao sistema judiciário, oferece o ambiente de coloquialismo em que as partes chegam mais facilmente a fazer concessões e a assumir compromissos, mantida a qualidade de relacionamento entre elas. Não é desprezível o fato de se manter um relacionamento saudável entre os envolvidos, mesmo depois de resolvida a pendência que os levou ao litígio e à tentativa de sua resolução (NALINI, 2017, p. 32).
Assim sendo, não devemos pensar que a importância do judiciário diminuirá. A perspectiva é que os conflitos sejam tratados pelos meios adequados, e tenham, assim, soluções mais céleres e eficientes. Vejamos como é organizado o sistema Multiportas no Brasil:
Essa estrutura idealizada é composta pelo Conselho Nacional de Justiça, que fica responsável, no âmbito nacional, por implementar o programa com a participação de rede constituída por todos os órgãos do Poder Judiciário e por entidades públicas e privadas parceiras, inclusive universidades e instituições de ensino, pelos Núcleos Permanentes de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos (NUPEMECs), que tratam dessa Política Judiciária no âmbito dos Tribunais Estaduais e Federais, e pelos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSCs), responsáveis pela execução da Política Judiciária de tratamento adequado de conflitos (NAVARRO, Trícia, 2018, p. 336/337).
Desafogar o judiciário é uma necessidade, mas o cenário é desanimador. Atualmente temos cerca de 76,7 milhões de processos em tramitação, e um crescimento do estoque acumulado de 31, 2% nos últimos 7 anos, conforme informações colhidas em 2017 no relatório Justiça em Números do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Segundo Nalini (2017, p. 34), “Reservar o juiz para as novas questões, para as graves questões, para solucionar reais problemas, não a reiteração de pleitos idênticos e já solucionados, é disso que o Brasil está a necessitar”.
Diante do exposto, entende-se que o objetivo da Justiça Multiportas (Multi-Door Justice) é dar meios de soluções adequadas aos conflitos. Dessa forma a justiça atenderá mais as necessidades dos conflitantes,e tende a ser alcançada mais facilmente.

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