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ELETROTERAPIA FACIAL E CORPORAL AVANÇADA Paula Andreotti Ultracavitação Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Fundamentar a técnica de ultracavitação plana e focada. Explicar os efeitos fisiológicos da ultracavitação plana e focada. Identificar as contraindicações e os riscos da ultracavitação. Introdução Neste capítulo, estudaremos sobre a terapia que envolve a ultracavitação plana e focada, bem como elucidaremos seus fundamentos, entendendo os efeitos fisiológicos que contribuem para os tratamentos estéticos, além das contraindicações da terapia com ultracavitação, a fim de garantir o conhecimento máximo do procedimento e, assim, trabalhar com uma técnica que traga máxima eficácia e segurança. No mercado há diversos equipamentos de ultracavitação que se diferenciam por padrões tecnológicos. A técnica se baseia no ultrassom terapêutico, cuja base é a formação de uma onda mecânica formada pelo efeito piezoelétrico em uma frequência muito alta. Tal onda, em contato com o tecido, não apenas atravessa as interfaces gerando efeito mecânico e térmico fundamentados em princípios físicos (intensidade, potência, impedância, absorção), mas também causa efeitos fisiológicos que contribuem para os tratamentos estéticos. Fundamentos da técnica de ultracavitação plana e focada Um som é caracterizado por vibrações mecânicas ou ondas mecânicas. O ouvido humano é capaz de detectar sons cuja frequência esteja entre 16 Hz e 21 kHz, aproximadamente; ondas sonoras acima dessa frequência são inaudíveis ao ouvido humano e chamadas de ultrassom. As ondas ultrassônicas possuem uma frequência que varia de 20.000 a 20.000.000 ciclos emitidos em 1 segundo (1 ciclo = 1 Hz), a qual se propaga como uma onda de pressão, causando agitação das moléculas por onde se propagam, seja esse meio líquido, sólido ou gasoso. Essas ondas são geradas por transdutores feitos de materiais piezoelétricos naturais, como o quartzo, ou cerâmica sintética, como titanato zirconato de chumbo (PZT), os quais podem ser polarizados em processo de carga. Esses transdutores transformam energia elétrica em mecânica, gerando a vibração do cristal (quartzo ou PZT), o que resulta em efeito piezoelétrico. A ultracavitação conta com os mesmos princípios do ultrassom terapêutico convencional, porém as ondas são emitidas de maneira diferenciada, ou seja, produzindo um altíssimo nível de onda ultrassônica, e sua frequência pode va- riar entre 27 kHz a 3 MHz. O termo ultracavitação ainda é pouco padronizado, podendo ser encontradas, no mercado, outras nomenclaturas que caracterizam o seu objetivo. Além disso, podem se diferenciar com algumas características técnicas como: frequências (kHz ou MHz), potência (W), focalizado ou plano. Sendo assim, podemos definir ultracavitação como uma forma diferenciada de ultrassom terapêutico, que produz energia ultrassônica de alta potência (igual ou maior a 3 w/cm2), gerando alto nível de cavitação instável ou efeito térmico lesivo a uma profundidade definida. A cavitação é um fenômeno que ocorre em qualquer aplicação de ultrassom, pois as ondas liberadas pelo gerador de ultrassom fazem com que as moléculas e células oscilem de maneira cíclica e proporcional à intensidade de saída do gerador de onda. Essas oscilações geram a formação de bolhas gasosas nos líquidos por onde as ondas se propagam. Essas bolhas podem apenas oscilar de um lado ao outro, aumentar e diminuir de volume e permanecer intactas, caso em que será uma cavitação do tipo estável (efeito terapêutico comum do ultrassom convencional); já quando essas bolhas se alteram em volume e velocidade de maneira violenta, elas implodem gerando um colapso e levando ao aumento da temperatura e da pressão interna, o que chamamos de cavitação instável, como se pode ver na Figura 1. Ultracavitação2 Figura 1. Exemplo de ocorrência de cavitação instável. Fonte: Adaptada de Wonwoo (2014, documento on-line). A ultracavitação focalizada, de alta intensidade, também conhecida como HIFU (high intensity focused ultrasound), é caracterizada quando se utiliza um padrão convergente de emissão de ondas sonoras, no qual a energia ul- trassônica se concentra de forma pontual, gerando um calor intenso na região tratada e, consequentemente, alto poder destrutivo. Essa focalização do feixe pode ocorrer de várias formas de acordo com o material utilizado: material piezoelétrico côncavo, por focalização eletrônica, com lentes acústicas em formato côncavo ou cerâmica piezoelétrica cilíndrica utilizando um refletor parabólico para produzir o feixe focalizado. A ultracavitação plana ocorre quando a emissão de ondas sonoras não obedece ao padrão focalizado, mas apresenta um nível de intensidade alto, podendo ser de frequências altas (MHz) ou frequências baixas (kHz). A ultracavitação com frequência alta 3 Mhz apresenta uma potência alta também, em razão de a área efetiva de radiação ser maior, o que permite trabalhar com intensidades mais altas por área. A cavitação de alta frequên- cia permite uma penetração de onda menor, atingindo tecidos a níveis mais superficiais, sendo, porém, com sua alta potência, capaz de gerar a cavitação instável, o que leva à lesão da membrana do adipócito. Já a ultracavitação de baixa frequência entre 28 a 80 KHz permite uma penetração maior da onda sonora, sendo assim é indicada para regiões que apresentem pregas cutâneas acima de 2,5 cm, a fim de que não corra risco de atingir tecidos mais profundos. Veja um exemplo dos dois processos na Figura 2. 3Ultracavitação Figura 2. Diferenças entre o transdutor e o transdutor focalizado. Fonte: Adaptada de Lipocavitação ([2015], p. 6). Biofísica A propagação das ondas sonoras promove um efeito de vibração das moléculas alterando o meio por onde se propaga, além disso sua propagação depende de características particulares de absorção. A velocidade com que essa onda se propaga no meio vai depender da densidade, pois as ondas se propagam em maior velocidade onde as moléculas do meio encontram-se mais próximas e em uma velocidade menor onde as moléculas encontram-se mais dispersas. Isso acontece em razão da transferência de energia que ocorre quando a onda se propaga e empurra a energia de uma molécula a outra; essa energia sonora é convertida em energia térmica. A impedância acústica está relacionada à resistência que o meio oferece à propagação da onda, que vai se diferenciar com características de cada tecido, ou seja, quando a onda ultrassônica atravessa tecidos diferentes, ela pode ser refletida, transmitida ou refratada, e isso depende da característica de cada tecido. Será transmitida para o outro tecido quando não houver diferença de impedância entre os dois tecidos; durante a refração, a onda, ao passar para outro tecido que apresente impedância acústica diferente, muda sua direção, alterando sua velocidade, mas mantendo a mesma frequência. Na reflexão, a onda volta ao meio de origem com a mesma velocidade e frequência, isso faz com que a transmissão da onda também diminua. Para diminuir a reflexão, é importante que o transdutor esteja bem acoplado ao tecido. A absorção dessa onda ocorre pela retenção de energia (calor) nos tecidos; conforme essa onda atravessa as interfaces dos tecidos, ela vai sendo absorvida e sua intensidade vai diminuindo para os tecidos mais profundos. Além disso, a absorção da onda também sofre influência da quantidade de proteínas, ou seja, quanto mais proteína e menor quantidade de água, maior será a absorção, e, quanto Ultracavitação4 menor a quantidade de proteína, menor será a absorção. A frequência da onda também é fator determinante da profundidade que a onda alcançará, assim, quanto maior a frequência, menor é a profundidade de penetração das ondassonoras, e, quanto menor a frequência, maior será a profundidade de penetração da onda. Efeitos fisiológicos da ultracavitação plana e focada O mercado tecnológico disponibiliza diversos tipos de equipamentos com padrões distintos, os quais se enquadram como geradores de ondas ultras- sônicas. Sabe-se que a onda ultrassônica pode ser emitida de forma pulsada ou contínua, e ambas geram efeitos fi siológicos ao atravessar as interfaces do tecido. Esses efeitos são térmicos e mecânicos; na emissão contínua da onda, pode-se verifi car o efeito térmico sobrepondo o efeito mecânico, e, na emissão pulsada, o efeito mecânico sobrepõem o térmico, mas não é só isso que classifi ca seus efeitos fi siológicos, pois os efeitos gerados também podem ser potencializados de acordo com a energia média de pico (wats), a intensidade média por região (wats/cm2), o tamanho da área efetiva de radiação (ERA), a energia aplicada (J/cm2), se ele é focalizado ou plano. A ultracavitação é considerada um recurso de alta tecnologia não invasivo utilizado para redução de gordura por meio do seu mecanismo de ação. Con- siste em um aparelho de emissão de ondas ultrassônicas de alta frequência cuja vibração, ao atravessar as interfaces do tecido, faz com que se formem microbolhas que se expandem e comprimem (cavitação) em razão das altera- ções de pressão nos fluidos tecidual. Essas microbolhas sofreram rompimento devido à alta frequência, e esse rompimento no tecido subcutâneo fará com que a membrana dos adipócitos se fragmente, promovendo o extravasamento da gordura. Esse rompimento pode ocorrer por alguns efeitos: Efeito mecânico: gerado pela cavitação, promove a ruptura da mem- brana comum com o uso de equipamentos de baixa frequência plano. Efeito térmico: conversão da energia mecânica em energia térmica, promovendo um aumento da temperatura, comum nos equipamentos de alta frequência focalizados, também conhecidos como HIFU. Efeito químico: divisão de macromoléculas, formação de radicais livres e destruição do adipócito. Estimulação da apoptose: causada pela fragmentação do DNA da célula, que leva ao aumento da enzima caspase. 5Ultracavitação Estudos realizados utilizando a ultracavitação plana em modelos animais demonstraram lipólise seletiva da célula de gordura sem causar danos em tecidos como vasos sanguíneos, vasos linfáticos, músculos e nervos perifé- ricos. A princípio, há uma alteração relacionada ao metabolismo da gordura. Em razão do efeito térmico e mecânico gerado pelas ondas ultrassônicas tanto do ultrassom focalizado como do ultrassom plano de alta frequência, é possível verificar a presença mínima de um processo inflamatório. Em análise histológica, constatou-se a presença de macrófagos, linfócitos, células plasmáticas e poucos neutrófilos, o que identifica a fagocitose dos fragmentos celulares. A ruptura do adipócito causado pelo efeito de cavitação permite o vazamento de gotículas de triglicerídeos no espaço intersticial, ocorrendo, ainda, após a lesão na membrana adipocitária, um estímulo de adipocinas e citocinas com aumento do fator de necrose tumoral (TNF-alfa), que é produzido pelos adipócitos em resposta ao processo inflamatório transitório causado pelos seus efeitos, uma vez que o TNF-alfa vai induzir a chegada não apenas dos macrófagos para a fagocitose do local, como também da interleucina, que desencadeia a cascata lipolítica transformando o triglicerídeo em ácido graxo e glicerol. O ácido graxo então será transportado ao fígado e, após metabolizado, será eliminado em forma de energia, o que significa que os resíduos são eliminados de maneira fisiológica sem que causem aumento do perfil lipídico do sangue. Tanto os equipamentos de ultracavitação focalizados como o planos, quando de alta frequência, podem desencadear esses efeitos fisiológicos; já com os equipa- mentos de baixa frequência plano, é possível verificar a fragmentação da membrana celular e a ativação da enzima caspase, levando à apoptose da célula de gordura. Já na ultracavitação focalizada (HIFU), além de provocar o rompimento da membrana do adipócito, seu efeito térmico também é capaz de produzir uma desnaturação do colágeno, levando à formação de colágeno novo e à contração geral das fibras da pele e do septo interlobular na gordura. Nos equipamentos de baixa frequência plano (37,2–42,2 kHz), essa alteração só pode ser vista no tecido gorduroso sem o estímulo de neocolagênese. Apoptose é o processo de morte programada da célula, ou seja, autodestruição celular que ocorre de maneira ordenada e com características fisiológicas. No caso da ultracavitação, a lesão causada na membrana do adipócito desencadeia a liberação da enzima caspase, que leva ao processo de apoptose da célula atingida. Ultracavitação6 O efeito piezoelétrico foi descoberto em 1880 por Pierre e Jacques Currie, e consiste em um fenômeno físico de certos materiais capazes de transformar energia mecânica em energia elétrica e vice-versa. Contraindicações e riscos da ultracavitação Apesar de nenhum tratamento estético substituir um estilo de vida saudável, a ultracavitação é indicada para gordura localizada, ou seja, em regiões em que a gordura resiste a atividades físicas e dietas, podendo ser indicada também como complemento da lipoaspiração. No fi bro edema geloide, é indicada em casos em que o acúmulo de gordura seja identifi cado na área tratada. Porém, como todos os recursos aplicados, a ultracavitação pode apresentar contraindicações específicas que podem estar ligadas a seu mecanismo de ação, entre elas: doenças hepáticas — em razão do metabolismo fisiológico da gordura durante o processo de lipólise, o que pode acarretar uma sobrecarga no fígado podendo causar complicações; dislipidemia — embora os estudos realizados confirmem a ausência de alteração nos níveis séricos de lipídeos no sangue, é necessário agir com cautela para que se evite a piora da doença já existente, considerando que há uma degradação dos triglicerídeos após a aplicação do recurso; gestante — quando aplicado em abdome gravídico, pode causar lesões em razão do efeito de cavitação ou má formação fetal; neoplasias e metástase — para evitar agravamento do quadro; lesões na pele (inflamação ou dermatites) — em razão do desconforto térmico que pode ser causado em locais em que a pele não está íntegra; insuficiência renal — durante o metabolismo de gordura, a eliminação do glicerol pode acarretar uma sobrecarga renal; doenças metabólicas — podem influenciar de maneira direta no me- tabolismo da gordura; patologias auditivas — podem levar ao desconforto auditivo prin- cipalmente nos equipamentos de baixa frequência que causam um zumbido no ouvido. 7Ultracavitação Muitas empresas ressaltam a importância das contraindicações absolutas, mas vale lembrar que outras podem ser consideradas relativas, como: sobre área cardíaca, sobre próteses metálicas, áreas de testículos ou gônadas, infarto agudo do miocárdio recente, angina instável, epífase óssea em adolescentes. A ultracavitação tanto focalizada como plana pode ser considerada uma técnica segura desde que preconizados os cuidados durante a aplicação e o conhecimento de todo mecanismo de ação. Os equipamentos que causam os efeitos térmicos podem apresentar desconforto ao cliente, por isso é impor- tante respeitar o limiar de sensibilidade de cada um para que não se cause nenhum tipo de queimadura na pele. É importante também utilizar o meio de acoplamento, gel de contato, suficiente para diminuir qualquer desconforto durante a aplicação, além disso o transdutor deve estar em contato total com a região aplicada. Apesar de estudos comprovarem que não há um aumento significativo de níveis séricos de lipídeos no sangue, há um processo de degradação dos triglicerídeosquando submetidos à ultracavitação focalizada. Além disso, a via de metabolização fisiológica é o fígado, sendo assim é importante, quando for realizada a aplicação do equipamento, que a cliente siga com uma alimentação hipocalórica. LIPOCAVITAÇÃO focalizada: Sonofocus. São Paulo: IBRAMED, [2015]. Disponível em: <http://www.ibramed.com.br/public/img/uploads/page/1449862925-1426625956So- nofocus2015.pdf>. Acesso em: 27 set. 2018. WONWOO, C. Ultrasound Study: Ultrasound Cavitation. D&PS: Magazine for Dermatolo- gists & Plastic Surgeons, Seoul, 13 fev. 2014. Disponível em: <http://idnps.com/basics/ ultrasound-study/3-1-ultrasound-cavitation/>. Acesso em: 27 set. 2018. Leituras recomendadas BRITO, L. P. et al. Efeito do ultrassom focalizado (HIFU) no tecido adiposo abdominal. Revista Amazônia Science & Health, Gurupi, v. 3, n. 3, p. 17-25, jul./set. 2015. Disponível em: <http://ojs.unirg.edu.br/index.php/2/article/view/966/375>. Acesso em: 27 set. 2018. CARDOSO, S. K.; PEREIRA, V. C. G.; MACEDO, A. C. B. de. Efeito imediato da ultracavitação na gordura localizada. Revista Inspirar: movimento & saúde, [S. l.], v. 9, n. 2, p. 43-49, abr./maio/jun. 2016. 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