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HIV/aids - Imunopatogênese e Evolução da doença

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HIV E AIDS
Camila Rocha Almeida
IMUNOPATOGÊNESE DA INFECÇÃO
A integração do genoma viral nas células infectadas, principalmente das células T, é a causa das
principais alterações na expressão de genes das células hospedeiras, levando a destruição destas e
de células não infectadas. A maioria das infecções pelo HIV-1 ocorre por meio das mucosas do
trato genital ou retal durante a relação sexual. 
Nas primeiras horas após a infecção pela via sexual, o HIV e células infectadas atravessam a barreira
da mucosa, permitindo que o vírus se estabeleça no local de entrada e continue infectando
linfócitos T-CD4+, além de macrófagos e células dendríticas. Após a transmissão do vírus, há um
período de aproximadamente dez dias, denominado fase eclipse, antes que o RNA viral seja
detectável no plasma.
A homogeneidade do vírus indica que o estabelecimento da infecção é resultado de um único foco
de linfócitos T-CD4+ infectados da mucosa. A resposta imunológica inata que se estabelece no
foco da infecção atrai uma quantidade adicional de células T, o que, por sua vez, aumenta a
replicação viral. A partir dessa pequena população de células infectadas, o vírus é disseminado
inicialmente para os linfonodos locais e depois sistemicamente, em número suficiente para
estabelecer e manter a produção de vírus nos tecidos linfóides, além de estabelecer um
reservatório viral latente, principalmente em linfócitos T-CD4+ de memória. 
A replicação viral ativa e a livre circulação do vírus na corrente sanguínea causam a formação de
um pico de viremia por volta de 21 a 28 dias após a exposição ao HIV, que está associada a um
declínio acentuado no número de linfócitos T-CD4+.
Na fase de expansão e disseminação sistêmica, há a indução da resposta imunológica, mas esta é
tardia e insuficiente em magnitude para erradicar a infecção. A ativação imune, por outro lado,
produz uma quantidade adicional de linfócitos T-CD4+ ativados que servem de alvo para novas
infecções. Ao mesmo tempo, o número crescente de linfócitos T-CD8+ exerce um controle parcial
da infecção, mas não suficiente para impedir, na ausência de terapia, a lenta e progressiva depleção
de linfócitos T-CD4+ e a eventual progressão para a síndrome da imunodeficiência adquirida.
A ativação de linfócitos T-CD8+ específicos contra o HIV ocorre normalmente antes da
soroconversão. O aparecimento de uma resposta imune celular HIV-específica e a subsequente
síntese de anticorpos anti-HIV levam a uma queda da carga viral plasmática (viremia) – até um
nível (set point) que é específico de cada indivíduo – e à cronicidade da infecção pelo HIV.
A resposta imune mediada por células é mais importante do que a resposta imune humoral no
controle da replicação viral durante a infecção aguda, mas os anticorpos têm um papel relevante
na redução da disseminação do HIV na fase crônica da infecção. Pacientes infectados pelo HIV
apresentam ativação policlonal de linfócitos B, com surgimento de hipergamaglobulinemia e
imunocomplexos circulantes, porém com prejuízo na função das células B em promover resposta
humoral adequada contra antígenos. 
HIV E AIDS
Camila Rocha Almeida
IMUNOPATOGÊNESE DA INFECÇÃO
Como em qualquer outra infecção viral, a primeira classe de anticorpo produzida durante uma
resposta imune primária é a imunoglobulina M (IgM). Devido à persistência do HIV, nosso
organismo é continuamente exposto aos mesmos antígenos e a produção inicial de IgM é
substituída pela produção de imunoglobulina G (IgG). A IgG anti-HIV atinge níveis séricos
elevados e persiste por anos, enquanto os níveis séricos de IgM tendem a desaparecer com o
tempo ou apresentar padrão de intermitência.
A correlação entre a progressão da doença e a subsequente perda da função imune Th1-específica
pode ser exemplificada pelos tipos de infecção que os pacientes apresentarão em ordem
sequencial. A maioria das infecções oportunistas são do tipo intracelular, para as quais as células
Th1 e suas citocinas são a barreira de defesa mais importante
É possível que existam dois caminhos para matar as células CD4+: um envolvendo apoptose das
células do tipo Th1 mais suscetíveis; e outro com morte em decorrência da infecção das células do
tipo Th2 remanescentes. Pode-se supor que a morte das células do tipo Th1 afeta a habilidade de
sobrevivência das células Th2, embora não se saiba por qual mecanismo.
A função de células CD8+ com atividade citotóxica e especificidade para o HIV é cada vez mais
exaltada como fundamental para o retardo na progressão para AIDS e como um marcador positivo
de resposta aos antirretrovirais. A infecção dos T CD4+ leva à destruição das CD8+, pela falta de
auxílio para manutenção da resposta imune e por um mecanismo ativo via indução de apoptose.
A interação entre gp120 do HIV e CD4 interrompe a atividade de ligação do NF-AT e da proteína
NF-kB, reduzindo a proliferação e a produção de citocinas. Devido à diminuição do limiar
necessário para a morte celular induzida, a resposta ao antígeno fica seriamente comprometida
porque as células T de memória transformam-se em alvos particularmente suscetíveis à apoptose
em indivíduos infectados pelo HIV. 
Sabe-se que a molécula TNF-related apoptosis-inducing ligand (TRAIL) participa ativamente na
morte de células T CD4+ em pacientes infectados pelo HIV. Os níveis do receptor solúvel TNF
(sTNFr) e do antagonista do receptor IL-1 (IL-1ra) são elevados em pacientes com AIDS, o que pode
contribuir para o aumento da apoptose. A exposição ao HIV, esteja ele na sua forma infectante ou
não, induz a produção de TRAIL por monócitos e por algumas células dendríticas, sugerindo mais
um mecanismo de patogênese do HIV, desta feita localizado na sinapse imunológica. Com a
progressão da doença, os órgãos linfóides originalmente aumentados atrofiam-se pela destruição
das FCD e consequente liberação na circulação das partículas de HIV capturadas.
HIV E AIDS
Camila Rocha Almeida
EVOLUÇÃO DA DOENÇA
A primeira fase da infecção (infecção aguda) é o período do surgimento de sinais e sintomas
inespecíficos da doença, que ocorrem entre a primeira e terceira semana após a infecção. Ocorre
quando o vírus está sendo replicado intensivamente nos tecidos linfóides. Durante essa fase, tem-
se CV-HIV elevada e níveis decrescentes de linfócitos, em especial os LT-CD4+, uma vez que estes
são recrutados para a reprodução viral. O indivíduo, nesse período, torna-se altamente infectante.
A sorologia para a infecção pelo HIV pode variar bastante nessa fase, dependendo do ensaio
utilizado. Em média, a janela diagnóstica dos imunoensaios de quarta geração é de
aproximadamente 15 dias. O diagnóstico da infecção aguda pelo HIV pode ser realizado mediante a
detecção da CV-HIV. 
Como em outras infecções virais agudas, a infecção pelo HIV é acompanhada por um conjunto de
manifestações clínicas, denominado Síndrome Retroviral Aguda (SRA). Os principais achados
clínicos são febre, cefaléia, astenia, adenopatia, faringite, exantema e mialgia. Pode cursar com
sudorese e linfadenomegalia, comprometendo principalmente as cadeias cervicais anterior e
posterior, submandibular, occipital e axilar. Podem ocorrer, ainda, esplenomegalia, letargia, astenia
e depressão. Sintomas digestivos, como náuseas, vômitos, diarreia, perda de peso e úlceras orais
podem estar presentes, mas o comprometimento do fígado e do pâncreas é raro na SRA. Cefaleia e
dor ocular são as manifestações neurológicas mais comuns, mas pode ocorrer raramente quadro
de meningite asséptica, neurite periférica sensitiva ou motora, paralisia do nervo facial ou
síndrome de Guillan-Barré. A SRA é autolimitada e a maior parte dos sinais e sintomas desaparece
em três a quatro semanas. Linfadenopatia, letargia e astenia podem persistir por vários meses. A
presença de manifestações clínicas mais intensas e prolongadas (por período superior a 14 dias)
pode estar associada à progressão mais rápida da doença.
A fase de latência clínica caracteriza-se por ser em geral assintomática, com duração de anos. É
possível encontrar linfadenomegaliae alterações inespecíficas em exames laboratoriais, de pouca
importância clínica, como plaquetopenia, anemia (normocrômica e normocítica) e leucopenia.
Enquanto a contagem de LT-CD4+ permanece acima de 350 céls/mm³, os episódios infecciosos
mais frequentes são geralmente bacterianos, como as infecções respiratórias ou mesmo TB. Com a
progressão da infecção, começam a ser observadas apresentações atípicas das infecções, resposta
tardia à antibioticoterapia e/ou reativação de infecções antigas. Além disso, podem surgir sinais e
sintomas como febre baixa, perda de peso, sudorese noturna e fadiga, além de diarreia, cefaleia,
leucoplasia e candidíase orais. As manifestações de imunodeficiência moderada podem surgir
nessa fase.
A fase de infecção sintomática caracteriza-se pela imunodeficiência grave e de difícil recuperação,
em decorrência da elevação da viremia, geralmente com a contagem de T CD4+ abaixo de 200
células/mL. À medida que a infecção progride, sintomas constitucionais (febre baixa, perda
ponderal, sudorese noturna, fadiga), diarreia crônica, cefaleia, alterações neurológicas, infecções
bacterianas (pneumonia, sinusite, bronquite) e lesões orais, como a leucoplasia oral pilosa,
tornam-se mais frequentes, além do herpes-zoster.
HIV E AIDS
Camila Rocha Almeida
EVOLUÇÃO DA DOENÇA
A candidíase oral é um marcador clínico precoce de imunodepressão grave, e foi associada ao
subsequente desenvolvimento de pneumonia por Pneumocystis jiroveci. Diarreia crônica e febre
de origem indeterminada, bem como a leucoplasia oral pilosa, também são preditores de evolução
para AIDS.
A Síndrome da Imunodeficiência Adquirida em si é caracterizada por intensa supressão no sistema
imunológico do indivíduo, com o surgimento de infecções oportunistas e neoplasias. A progressão
da infecção é marcada por febre baixa, sudorese noturna e diarreia crônica. As infecções
oportunistas mais comuns pneumocistose, tuberculose pulmonar atípica ou disseminada,
neurotoxoplasmose, retinite por citomegalovírus, meningite criptocócica; já as neoplasias mais
comuns são Sarcoma de Kaposi e, nas mulheres jovens, câncer de colo uterino. Nessas situações, a
contagem de LT-CD4+ situa-se abaixo de 200 céls/mm³, na maioria das vezes. Além das infecções e
das manifestações não infecciosas, o HIV pode causar doenças por dano direto a certos órgãos ou
por processos inflamatórios, tais como miocardiopatia, nefropatia e neuropatias, que podem estar
presentes durante toda a evolução da infecção pelo HIV. 
Em relação à contagem do CD4, observou-se que quando está abaixo de 350, começam a aparecer
infecções bacterianas e micobacterianas do trato respiratório (sinusite, pneumonia, tuberculose
pulmonar); e quando está entre 200-300, as mesmas manifestações supracitadas começam a se
manifestar de forma atípica.

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