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ÍNDICE 1. HORIZONTES INTRODUTÓRIOS 1.1. O que é a Exegese? 1.2. Algumas definições de Exegese 1.3. Algumas particularidades entre Exegese e Hermenêutica 2. A AUTORIDADE DA BÍBLIA 2.1. O livro que interpreta a si mesmo 2.2. A rejeição às Escrituras 3. O LIBERALISMO TEOLÓGICO E SEU VENENO 3.1. O que é o liberalismo teológico? 3.2. As carências do liberalismo teológico 3.3. Os filhotes da teologia liberal 4. METODOLOGIA EXEGÉTICA 4.1. A análise do contexto geral 4.2. Recomendações 5. ANÁLISE DO TEXTO GERAL 6. A questão da originalidade 7. Crítica textual 8. CONTEXTO HISTÓRICO E GÊNEROS LITERÁRIOS 8.1. O contexto histórico particular 8.2. O gênero literário 9. ANÁLISE ESTRUTURAL DO TEXTO 9.1. O exercício da análise 9.2. Análise temática 10. ANÁLISE SEMÂNTICA E VARIANTES TEXTUAIS 10.1. A análise semântica 10.2. Classificação das variantes textuais 10.3. Contexto bíblico-teológico 11. OUTRAS ANÁLISES 11.1. Análise léxica 11.2. Análise morfológica 11.3. Análise estilística 11.4. Análise sintática 11.5. Análise literária 11.6. Análise teológica 12. ESBOÇO EXEGÉTICO 12.1. O que é 12.2. O processo de produção do Esboço Exegético 12.3. Esboço Exegético 12.4. Ideia Exegética 13. A EXEGESE DAS NARRATIVAS 13.1. Elementos principais de uma narrativa 13.2. Perigos na interpretação de narrativas 13.3. O que observar na interpretação de narrativas? 14. EXERCÍCIOS EXEGÉTICOS: MATEUS, O EVANGELHO DO REI 14.1. Evangelho segundo Mateus: uma visão panorâmica 14.2. Mateus é o evangelho do reino 14.3. Mateus é o evangelho das santas rupturas 14.4. Mateus é o evangelho da resistência 14.5. Mateus é o evangelhos da simplicidade 15. EXERCÍCIOS EXEGÉTICOS: UMA PERSPECTIVA MISSIOLÓGICA EM ROMANOS 15.1. Perícope 15.2. As perguntas de Paulo 16. EXERCÍCIOS EXEGÉTICOS: A PERSPECTIVA MINISTERIAL EM 2TM 2:15 17. EXERCÍCIOS EXEGÉTICOS: GÁLATAS 5:19-22 17.1. Delimitando o tema 17.2. O conceito bíblico de paz 17.3. A paz nos relacionamentos 17.4. As origens da paz 17.5. A paz nas esferas da vida 17.6. Conclusão HORIZONTES INTRODUTÓRIOS E o anjo do Senhor falou a Filipe, dizendo: Levanta-te, e vai para o lado do sul, ao caminho que desce de Jerusalém para Gaza, que está deserta. E levantou-se, e foi; e eis que um homem etíope, eunuco, mordomo-mor de Candace, rainha dos etíopes, o qual era superintendente de todos os seus tesouros, e tinha ido a Jerusalém para adoração, Regressava e, assentado no seu carro, lia o profeta Isaías. E disse o Espírito a Filipe: Chega-te, e ajunta-te a esse carro. E, correndo Filipe, ouviu que lia o profeta Isaías, e disse: Entendes tu o que lês? E ele disse: Como poderei entender, se alguém não me ensinar? E rogou a Filipe que subisse e com ele se assentasse. Atos 8:26-31 O que é a Exegese? O trecho de Atos revela-nos muito acerca do que significa o estudo da Palavra. De fato, a própria exegese pode ser sumarizada no questionamento de Filipe ao etíope: Entendes o que lês? Aqui é possível perceber a função do intérprete das Escrituras e sua analogia para com a função da Igreja em relação ao mundo. Sem o auxílio das verdades da Palavra de Deus, como os homens conseguiriam decifrar as realidades que se apresentam na vida? De fato, como poderão entender sem alguém que os explique? A exegese é uma matéria dinâmica que se vê em estado de constante mutação. Há sempre novos textos que auxiliam a compreensão dos materiais originais, de forma que a mentalidade inquisitiva deve estar sempre presente naquele que se dispõe a ser um estudante das Escrituras. É interessante ressaltar que, no texto, Felipe começa a explicar ao eunuco os conteúdos do livro a partir da perspectiva de Cristo. O etíope questiona-o acerca das verdades presentes no texto, e Filipe explica-as de forma que as perguntas transcendem a mera curiosidade, adquirindo caráter de formação para a vida. Essa transformação se torna evidenciada pelo fato de o eunuco, agora consciente daquilo que lia, busca o sacramento do batismo, isto é, uma nova vida em Cristo. Esse trecho é capaz de nos revelar que a verdadeira exegese deve mudar radicalmente a vida daqueles que ouvem as verdades do texto. O caminho mais curto para entender a Bíblia é aceitar o fato de que deus está falando em cada linha. Donald Grey Barnhouse A Bíblia Sagrada não é um livro de propriedade do leitor, mas sim uma obra escrita e inspirada totalmente por Deus e pelo Espírito Santo. Para se empreender uma verdadeira viagem pela Bíblia, precisamos do auxílio do próprio Espírito: o autor e legítimo dono da ideia. De fato, o mais sublime emprego da mentalidade humana não pode nutrir esperanças de compreender as majestosas e excelentes verdades contidas no texto sagrado. Estudar hermenêutica e exegese - matérias gêmeas e complementares - é comprometer-se com um mergulho na profundidade bíblica. Não se trata apenas de mero exercício teológico, recurso pedagógico ou malabarismo didático e semântico, mas profundo amor pelo texto. Inserir conteúdo no texto não é o papel da exegese. De fato, a partícula grega “ex” significa “para fora de”. Dessa forma, seu contrário seria a eisegese, formada pela partícula “eis” - “para dentro de”. A Bíblia não é uma espécie de livro de receitas da celestialidade, mas um manual de conduta do cristão que deve nortear sua vida e seus sonhos. Vivemos numa época de distância do alto conceito de Deus, de forma que, sem a Bíblia, o desespero eclesiástico inventará outras palavras para substituir a Palavra. Isso ocorre por causa do relativismo: a morte das verdades fundamentais. O relativismo tem sua origem em Peter Ustinov, que afirmava que “a verdade é como um lustre: todos na sala podem vê-lo, mas cada qual de um ângulo diferente”. Acontece que Ustinov não percebeu uma coisa: não importa o ângulo, o lustre permanece o mesmo. Disse-lhe Jesus: Eu sou o caminho, e a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai, senão por mim. João 14:6 A pessoa central da Bíblia Sagrada é o próprio Cristo. De fato, os puritanos costumavam afirmar que se você rasgasse a Bíblia de Gênesis a Apocalipse, o sangue de Cristo escorreria por entre as páginas. Semelhantemente, Lutero afirmou que assim como se vai a um berço para encontrar um bebê, vai-se à Bíblia para se encontrar Cristo. No texto, Filipe diz ao eunuco que Cristo é o foco de tudo, evidenciando um paralelo com João, que afirma que Cristo é o caminho para Deus. Apenas quem anda pela Palavra é capaz de andar em Cristo, isto é, mergulhar verdadeiramente no texto. Em suma, uma espiritualidade sem Bíblia será automaticamente uma espiritualidade sem Jesus. A qualificação mais importante exigida do leitor da Bíblia não é erudição, mas, sim, rendição; não perícia, mas disposição de ser guiado pelo Espírito de Deus. Martin Anstey Dwight L. Moody afirma que “É melhor você ter zelo sem conhecimento que ter todo o conhecimento, mas não ter zelo”. M. lloyd Jones acrescenta à ideia ao dizer que a relação entre erudição e espiritualidade “é como conjugar luz e calor”: a chama do espírito arde no peito, enquanto a luz do conhecimento brilha na mente. A receita da exegese é, em suma, manter o coração nas Escrituras, a cabeça no Céu e os pés no chão. Algumas definições de Exegese Exegese é, pois, o trabalho de explicação e interpretação de um ou mais textos bíblicos (WEGNER, 2009, p. 11). Uma explicação que procura fazer uso de vários recursos e instrumentos científicos para entender o texto das Sagradas Escrituras (Aurélio Buarque de Holanda Ferreira in WEGNER, 2009, p. 11). Exposição de uma palavra, sentença, parágrafo, ou de um livro inteiro, levando ao significado verdadeiro e exato do texto (GRASSMICK, 2009, p. 10) A hermenêutica bíblica designa mais particularmente os princípios que regem a interpretação dos textos; a exegese descreve mais especificamente as etapas ou os passos que cabe dar em sua interpretação(WEGNER, 2009, p. 11). No sentido amplo, exegese é o cuidadoso, estudo metodologicamente autoconsciente de um texto, empreendido com a finalidade de produzir uma interpretação acurada e útil do mesmo. Falando de forma mais estrita, o termo exegese é frequentemente usado para denotar o esforço de estabelecer o sentido filológico e histórico de um texto bíblico (o que significou), em contraste com seu sentido aplicativo (o que significa) (SOULEN; SOULEN, 2001, p. 57). Uma exegese é um estudo analítico completo de uma passagem bíblica, feito de tal forma que se chega à sua interpretação útil. Uma exegese é uma tarefa teológica, mas não mística. Existem certas regras e padrões sobre como fazê-la, embora os resultados possam variar em aparência, uma vez que as próprias passagens bíblicas variam bastante entre si (STUART, 2008, p. 23). Algumas particularidades entre Exegese e Hermenêutica A hermenêutica e a exegese possuem uma intensa simetria, trabalhando juntas em forte relação. A hermenêutica é guiada pelo princípio de que “a Bíblia interpreta a si mesma”, e possui cinco regras em sua metodologia: ● Sempre tome as palavras em seu sentido usual e comum; ● Sempre tome as palavras no conjunto da frase; ● Sempre consulte o contexto; ● Sempre leve em consideração o objetivo do autor e do livro em questão; ● Sempre consulte passagens paralelas; A exegese é uma espécie de irmã gêmea da hermenêutica. O prefixo “Ex” - para fora de - refere-se à ideia de que o intérprete está tentando derivar seu entendimento pessoal a partir do texto, em vez de ler seu significado real. Juntamente com a hermenêutica, a exegese é o estudo do significado das palavras à luz do texto, tempo e lugar onde originalmente foram escritas. Em suma, hermenêutica é pensar no texto, o texto e com o texto. Essa é uma definição conservadora mas, no mundo de ideias conturbadas em que vivemos, extremamente terapêutica. Muitos teólogos de diferentes confissões se posicionam ao lado de pensadores pós modernos, rechaçando essa posição. O processo de leitura e interpretação de um texto, entretanto, é cíclico: todo leitor se aproxima do texto com pressuposições ou preconceitos. Essas bases são guias no caminho do texto, mas não podem impedi-lo texto de falar por si. A AUTORIDADE DA BÍBLIA O vento assopra onde quer, e ouves a sua voz, mas não sabes de onde vem, nem para onde vai; assim é todo aquele que é nascido do Espírito. João 3:8 O livro que interpreta a si mesmo Não se pode fazer exegese sem antes conscientizar-se da autoridade suprema da Bíblia Sagrada. A Bíblia não apenas contém a palavra de Deus: ela é a palavra de Deus. É essencial que isso fique cravado em nossa mentalidade. A autoridade do texto bíblico é central para qualquer perspectiva exegética, de forma que a visão cristã tradicional admite que a Bíblia foi, em toda a sua totalidade, escrita debaixo da autoridade do Deus trino, e que portanto não possui erros. Deus é o autor supremo das Escrituras. Sua revelação pretende guiar-nos a um relacionamento íntimo com Ele, de forma que devemos buscar ser espirituais para que possamos compreender as Escrituras em seu sentido supremo e autêntico. A Bíblia é a única regra suficiente, certa e infalível de conhecimento para a fé, obediência e salvação. Sua autoridade, razão pela qual deve ser crida e obedecida, não depende do testemunho de qualquer homem ou igreja, mas provém inteiramente de Deus, sendo Ele mesmo o autor bem como a própria verdade. A regra infalível de interpretação das Escrituras é a própria Escritura. Portanto, sempre que houver dúvida quanto ao verdadeiro e pleno sentido de qualquer passagem (sentido este que não é múltiplo, mas um único), essa passagem deve ser examinada em confrontação com outras passagens, que falem mais claramente. Confissão de Fé Batista de 1689 A rejeição às Escrituras Um movimento devastador que tem se infiltrado na igreja é o Liberalismo Teológico, juntamente com seu derivado, o humanismo. Graças à influência maligna desses irmãos gêmeos, a autoridade das Escrituras vem sendo rejeitada e substituída por um falso evangelho centrado no homem. O humanismo de hoje tem sido um veneno terrível no meio das igrejas. Ele perverte a mensagem da Bíblia ao roubar a centralidade do texto sagrado: um dos pilares da Reforma Protestante. Boa parte da pregação e adoração presentes na igreja de hoje são dominadas por temas humanos, enquanto as poderosas verdades bíblicas estão fugindo dos púlpitos modernos. A ira de Deus, a depravação da humanidade, a Queda, a necessidade de salvação, o poder do Evangelho e muitos outros ensinamentos bíblicos foram substituídos por temas como como sucesso pessoal, prosperidade do crente, hedonismo e misticismos. Apenas a exegese bíblica feita com profundidade e seriedade pode agir como remédio para eliminar a tolice das igrejas modernas. Nossa condição espiritual está intimamente relacionada à nossa precisão de exegese Bíblica. O estado espiritual do intérprete é um indicador muito preciso de sua capacidade para interpretar a palavra de Deus, de forma que sua pureza exegética é medida a partir de como ele encara o texto. Conjuro-te, pois, diante de Deus, e do Senhor Jesus Cristo, que há de julgar os vivos e os mortos, na sua vinda e no seu reino, Que pregues a palavra, instes a tempo e fora de tempo, redarguas, repreendas, exortes, com toda a longanimidade e doutrina. Porque virá tempo em que não suportarão a sã doutrina; mas, tendo comichão nos ouvidos, amontoarão para si doutores conforme as suas próprias concupiscências; 2 Timóteo 4:1-3 Quando a hermenêutica cristã tem como fundamento a intervenção livre e sobrenatural de Deus na história - conforme foi-nos revelado nas Escrituras Sagradas - sempre terá como resultado um vibrante cristianismo bíblico. A iluminação do Espírito Santo é essencial para que se encontre o significado espiritual do texto. Aquilo que é espiritual não é sempre místico, fantasmagórico ou etéreo, mas algo que se percebe no humano cheio do Espírito Santo. Em suma, é a quebra de um automatismo de morte: O Espírito Santo exerce um papel essencial não apenas na revelação da verdade, mas também em sua interpretação, e mais especificamente na “correta exegese da Escritura Sagrada.” Bruce K. Waltke No artigo “Espiritualidade e Espiritualidades”, o reverendo Ricardo Barbosa apresenta um desafio teológico para os envolvidos na ciência da interpretação bíblica. Segundo o reverendo, “Precisamos de uma teologia que nos desperte para um relacionamento pessoal e verdadeiro com Deus. Noutras palavras, uma teologia que nos aponte o caminho da oração, que seja mais pessoal e afetiva, e não apenas acadêmica. É lamentável constatar que muitos estudantes que entram para um seminário motivados por um profundo amor por Deus e desejo de servi-lo, depois de quatro ou cinco anos de estudo, saem orando menos, afetivamente mais atrofiados e mais limitados relacionalmente. Uma teologia que não nos motive para a oração, certamente não cumpre com seu papel.” É impossível que haja uma correta interpretação da palavra de Deus sem a presença do ministério do Espírito Santo, que testifica a verdade de que somos filhos de Deus, que renova as nossas mentes para que possamos entender as coisas de Deus e que transforma nossos corações para que possamos aprender a fazer apenas o que é agradável ao Pai. Nossa tarefa, portanto, será de estudar o registro da revelação de Deus conforme se encontra nas Escrituras, compreendendo espiritualmente todo seu contexto dentro de uma determinada proposta, que é a exegese histórico-gramatical. O LIBERALISMO TEOLÓGICO E SEU VENENO Maravilho-me de que tão depressa passásseis daquele que vos chamou à graça de Cristo para outro evangelho; O qual não é outro, mas há alguns que vos inquietam e querem transtornar o evangelho de Cristo. Mas, ainda que nós mesmos ou um anjo do céu vos anuncieoutro evangelho além do que já vos tenho anunciado, seja anátema. Assim, como já vo-lo dissemos, agora de novo também vo-lo digo. Se alguém vos anunciar outro evangelho além do que já recebestes, seja anátema. Porque, persuado eu agora a homens ou a Deus? ou procuro agradar a homens? Se estivesse ainda agradando aos homens, não seria servo de Cristo. Gálatas 1:6-10 O que é o liberalismo teológico? O liberalismo é uma doutrina extremamente perigosa, principalmente quando se trata da igreja atual. A igreja evangélica brasileira é extremamente múltipla, plural, eclética e influenciável. Tal combinação de fatores apresenta um lado positivo, mas também proporciona uma ausência de aprofundamento, enraizamento, lucidez e solidez. Em muitos aspectos, nossa denominação torna-se infantil, culminando em uma vulnerabilidade frente às ciladas teológicas. O ambiente eclesiástico brasileiro ainda é fortemente marcado por uma flagrante fragilidade teológica. O pífio conhecimento das línguas originais, o raso exercício de exegese, o sofrível desenvolvimento de uma filosofia e teologia, bem como a facilidade do acesso ao púlpito não permite um aprofundamento digno e crítico. Uma das marcas da chamada igreja brasileira é o crescente número de pessoas que são contra alguma coisa, mas que nem sequer compreendem o que de fato devem defender. Numa igreja influenciável, a sedução do conhecimento pode ser fatal. Não se nega que a teologia liberal talvez possa até mesmo ter coisas boas, mas pisar num campo minado é aceitar o risco de paralisia. Paracelso, médico e físico do século XVI, afirmava que a diferença entre o remédio e o veneno. O liberalismo teológico é uma enfermidade no corpo de cristo, a doença da noiva. É a teologia dos odres envelhecidos, dos amigos de Jó. Os adeptos dessa teologia sofrem de paralisia emocional, isso é, a síndrome da razão solitária. A expressão "liberalismo teológico" é um nome que damos ao movimento cuja produção se deu entre o final do século XVIII e o início do século XX. Sua origem foi bastante marcada pela influência iluminista e pela relativização da autoridade da Bíblia e dos milagres. Esta é a excelência do conhecimento teológico: ele nos dá tal visão de cristo que nos faz participantes de sua natureza. O verdadeiro conhecimento teológico traz o homem para fora do amor por si mesmo. Quanto mais ele sabe, mais ele se envergonha de sua própria ignorância. Tão doce é o conhecimento espiritual que quanto mais um santo conhece, mais sede ele tem de conhecer. O verdadeiro conhecimento não serve apenas para melhorar a visão que temos de Cristo, serve também para aprimorar nossos passos em segui-lo. Thomas Watson As carências do liberalismo teológico A teologia liberal mina sutilmente algumas áreas da espiritualidade, e os efeitos dessa erosão silenciosa na influenciável igreja brasileira são devastadores. Apesar de seu status de teologia, há várias lacunas em seu corpo de ideias: ● Piedade: a teologia liberal entende a piedade como um exercício frustrado ou mera emoção. Pro teólogo liberal, oração, jejum e contemplação de Deus são resquícios de um fanatismo ultrapassado. Eles entendem isso como fundamentalismo que deve ser ignorado, de forma que não oram e não possuem vida com Deus. Para eles, Deus é mais um conceito que uma pessoa. ● Fervor espiritual: a teologia liberal acredita que fervor espiritual é o exagero das emoções. Acreditamos na ação do Espírito Santo porque sabemos que nem todo espírito é santo, nem todo fervor é espiritual e nem toda teologia é bíblica. Uma teologia sem o santo fervor espiritual tende a se tornar um cientificismo doentio. ● Envolvimento missionário: ao longo da história, onde o liberalismo chegou, matou a igreja. Uma das principais características da teologia liberal é sua esterilidade. O teólogo liberal provoca a morte da ortodoxia e o esvaziamento da ortopraxia. ● Diálogo honesto com os pobres: um flerte com a teologia da libertação, acontece uma espécie de endeusamento da miséria. O teólogo liberal se comporta como o que o escritor Rodrigo Constantino apelidou de “esquerda caviar”, que se importa com os pobres mas apenas de maneira acadêmica. É muito raro encontrar um missionário em situação de risco que professe a doutrina liberal. ● Honestidade acadêmica: o liberal torce o textos e contextos, tanto quanto acusa. Relativizam a verdade e ridicularizam quem pensa diferente: é a tática de desqualificar quem fala, mas não as ideias que defendem. ● Humildade: não há humildade nesse meio: são chatos e amam discursos para eliminar e destruir os outros. Adoram debates, mas não para chegar à verdade: discutem pelo prazer de destruir os outros. O teólogo liberal é marcado pelo orgulho do conhecimento, uma postura que leva à presunção, um vírus comum nos seminaristas. Um interesse puramente acadêmico no conhecimento faz dele um fim em si mesmo, e o objetivo e finalidade da teologia não é conhecer um conjunto de ideias ou conceitos sobre Deus, mas conhecer a Deus, a Sagrada Pessoa. Os filhotes da teologia liberal ● Teologia do processo: nasceu da teologia liberal e é o eterno panteísmo. Em linhas gerais, acredita na mutabilidade de Deus e no processo evolutivo que define como categoria absoluta o fluxo do tempo. Seus principais representantes são Alfred North Whitehead, Charles Hartshorne e John Cobb. Essa teologia exagera a ênfase na imanência. ● Teísmo aberto: descendente direto da teologia do processo, essa é a teologia do deus fracassado, impotente diante do dilema do mal. Acredita que Deus não sabe a totalidade das coisas, sendo constantemente surpreendido por elas. Essa teologia americana prática e simples é superficial, um radicalismo polarizado que ignora a dialética hebraica e desconhece a realidade profunda do mistério. ● Relativismo: a morte das verdades fundamentais. Essa fragmentação ético- doutrinária tende a dissociar a ética da experiência religiosa. O liberalismo tem uma agenda inclusivista e ecumênica, que faz constantes concessões aos valores dúbios da sociedade secular. Essa mentalidade é diretamente responsável pela aceleração da erosão da mentalidade cristã. ● Racionalismo: acredita que os credos primitivos são arcaicos e sem relevância no mundo moderno. Colocam sempre a razão acima da Revelação e das emoções. De tudo isso devemos extrair que qualquer olhar para o liberalismo teológico deve servir de canal para uma séria reflexão: Nosso envolvimento com a teologia tem nos tornado mais parecidos com Jesus? Precisamos de um resgate da teologia séria, mais bíblica, cristocêntrica e expositiva; Uma pneumatologia lúcida e menos emocionalista, caricaturado e superficial; Uma eclesiologia missiológica, menos intramuros e disposta a quebrar a hegemonia cientificista. Em suma, precisamos transformar nosso momento histórico sem sermos moldados por ele. METODOLOGÍA EXEGÉTICA Desde o início de nossos estudos, você deve ter em mãos pelo menos duas versões bíblicas e uma versão de texto em grego ( no caso do Novo Testamento ) ou hebraico ( no caso do Antigo Testamento Recomendações ➔ https://www.laparola.net/greco/ ➔ http://www.perseus.tufts.edu/hopper/ ➔ Almeida Revista e Atualizada (ARA) ➔ Nova Versão Internacional (NVI) ➔ Bíblia Brasileira de Estudos ➔ Bíblia de Estudos de Genebra ➔ Bíblia Trinitariana ➔ Bíblia de Jerusalém ➔ Paráfrases bíblicas, a exemplo de “A Mensagem” A análise do contexto geral Discernir o contexto de um texto bíblico é de suma importância para sua interpretação. Assim, é altamente recomendável que se faça a leitura do texto integral. À medida em que se lê, deve-se anotar ideias que surgem e palavras que não se compreende: a exegese é um exercício de calma. A primeira coisa a se fazer ao estudar uma passagem bíblica é procurar pelos contextos: o imediato interior, o imediato posterior e o contexto amplo. Não entender essadivisão pode deixar o leitor numa posição vulnerável à criação de pretextos, isto é, algo que o texto em si jamais disse. Sempre estabeleça os limites da passagem a ser estudada. A ciência bíblica denomina um texto completo como perícope. Quando se delimita a perícope, grande parte do trabalho já está no caminho correto. A ponte para as divisões naturais do texto são os parágrafos e as sentenças. Indique os conectivos dos parágrafos e mostre como eles podem auxiliar na compreensão do pensamento do autor da epístola. A exemplo de Mc 14:66-72, Marcos descreve a negação a partir da citação do próprio autor da negação. O contexto imediatamente anterior é a finalização de Jesus perante o sinédrio, enquanto que o contexto imediatamente posterior é Jesus diante de Pilatos. Após delinear a perícope, percebe-se as divisões naturais dos versículos, bem como pontos importantes nas passagens paralelas. Esse exercício é trabalhoso, mas apaixonante. “E, estando Pedro embaixo, no átrio, chegou uma das criadas do sumo sacerdote;” Esse verso começa com o gerúndio, o que significa um conectivo de ligação com o anterior. Pedro está num lugar e em uma atitude, deve-se conhecer o porquê dessas verdades. “E, vendo a Pedro, que se estava aquentando, olhou para ele, e disse: Tu também estavas com Jesus, o Nazareno.” O próprio contexto do versículo anterior revela-nos que a frase vem de uma criada. “Mas ele negou-o, dizendo: Não o conheço, nem sei o que dizes. E saiu fora ao alpendre, e o galo cantou. E a criada, vendo-o outra vez, começou a dizer aos que ali estavam: Este é um dos tais. Mas ele o negou outra vez. E pouco depois os que ali estavam disseram outra vez a Pedro: Verdadeiramente tu és um deles, porque és também galileu, e tua fala é semelhante.” O conhecimento da cultura bíblica, que pode ser obtido com comentários teológicos e bíblicos, revela que há um modo de falar específico dos galileus, até mesmo com erros de pronúncia. O sotaque galileu denunciava. “E ele começou a praguejar, e a jurar: Não conheço esse homem de quem falais. E o galo cantou segunda vez. E Pedro lembrou-se da palavra que Jesus lhe tinha dito: Antes que o galo cante duas vezes, três vezes me negarás. E, retirando-se dali, chorou.” Depois de delimitar o texto, leia-o em voz alta em atitude de oração e comparando com versões diferentes para obter uma maior compreensão. Na bíblia não há informações por acaso, apenas não se pode tentar forçar o texto para criar um universo de coisas a partir de informações pequenas. Deve-se iniciar a leitura com as tradições mais literais e diretas. Depois, passa-se às contemporâneas, e complementa-se com as paráfrases. Assim há uma progressão do pensamento do texto. Anote as peculiaridades do texto: palavras repetidas, contrastes, sequências, conclusões, perguntas e teses. Deve-se também fazer uma descrição sumarizada da mensagem do texto escolhido. Preste atenção nas palavras chave do texto: localize os principais blocos de argumentos e perceba como eles se encaixam num todo coerente. Nossa busca é para determinar a intenção original do autor. Cada texto onde haja uma análise profunda e exegética revelará esses pormenores que evidenciam o sentido real do texto para aplicação na igreja. É preciso diferenciar os temas incidentais e centrais para a análise. ANÁLISE DO TEXTO ORIGINAL A questão da originalidade Nos dias atuais não existe nenhum manuscrito original dos livros do Antigo ou do Novo Testamento. O que existe são cópias, entre as quais constam muitas diferenças, que são chamadas de variantes. Como o processo de cópia no princípio era totalmente manual, não é de estranhar que haja estas diferenças. Na maioria dos casos os erros eram involuntários por parte dos copistas. Às vezes liam errado o texto, outras vezes não compreendiam o texto lido ou ainda esqueciam algo entre o momento da audição e do registro. Além destes erros involuntários, pode- se perceber algumas tentativas de correção de erros em cópias anteriores. No Antigo Testamento, a quantidade de variantes não é muito grande, devido ao trabalho minucioso dos escribas e posteriormente dos massoretas. Já quanto ao Novo Testamento, a quantidade de variações nos manuscritos gregos é muito grande. Isto deu-se porque nos primeiros séculos a igreja sofreu grande perseguição, sendo que as cópias tinham de ser feitas por escribas amadores. A maior parte dos manuscritos que restaram são cópias do período medieval. A leitura dos ditos originais é possível, entretanto, por meio de uma transliteração ou de um conhecimento acerca da língua original. Esse trabalho, entretanto, não deve ser sempre usado no púlpito, pois pode-se cair em dois erros: a interpretação incorreta e a arrogância. Crítica textual Os estudiosos bíblicos desenvolveram através dos anos, certos critérios, buscando refazer os caminhos que um texto tomou até chegar a suas mãos. Este estudo é chamado de crítica textual. “A crítica textual não se interessa pelo sentido do texto, não é análise literária do texto ou coisa semelhante. Apenas procura verificar a confiabilidade das cópias do texto que chegaram até nós e reconstituir o texto na sua forma mais confiável” . Você deve aprender alguns conceitos básicos sobre a crítica textual, para conseguir classificar as variantes textuais do parágrafo ou perícope que você escolheu para estudar. Sem dúvida, esta é uma das partes mais complicadas de sua tarefa exegética. É requerido de você, não só o conhecimento da linguagem, mas também informações sobre os manuscritos (tipos e versões), características literárias e teológicas de cada escritor, bem como as tendências que os copistas assumiam no seu encargo na transmissão do texto bíblico Em seguida, aperfeiçoe a perícope que você irá analisar. Busque as definições dos termos principais do texto. Conte com a ajuda de um bom dicionário hebraico ou grego. Busque o significado dessas palavras dentro do contexto da passagem analisada. Analise o contexto profundamente e determine o melhor significado exegético da palavra dentro da passagem. Isole as palavras e cláusulas que requeiram decisões gramaticais entre duas ou mais opções. Isole as palavras que necessitam de um estudo especial, faça uma lista provisória das dificuldades exegéticas encontradas no texto. Determine o significado exato de cada palavra básica, com sua origem, seu desenvolvimento, seu uso e seu significado bíblico e cultural e seu uso pelo autor e no restante do testemunho bíblico. Para tanto, você deve buscar as informações no dicionário de teologia do antigo testamento. Deve-se manter o máximo de atenção possível no que as palavras empregadas no texto estão dizendo para que não haja uma interpretação incorreta da perícope. Manter uma fidelidade exegética é estar na profundidade da verdade. CONTEXTO HISTÓRICO E GÊNEROS LITERÁRIOS O contexto histórico particular Deve-se lembrar que todos os livros da Bíblia foram escritos em contextos históricos específicos, e dentre as perguntas mais importantes que necessitamos fazer, estão às perguntas de contexto histórico. Em que circunstâncias foram escritos tais livros? Eles respondem questionamentos anteriores? Foram escritos para orientar problemas específicos, válidos somente para o primeiro século ou trazem princípios gerais, aplicáveis à Igreja evangélica do século XXI? Seja cuidadoso na busca das melhores fontes sobre o “mundo” bíblico. Para isto busque informações na literatura especializada. (Introduções ao Antigo Testamento e ao Novo Testamento, Dicionários Bíblicos, notas explicativas de Bíblias de Estudo e comentários bíblicos exegéticos). Busque ajuda no material de referência para saber a aplicação original de determinada passagem. Esteja atento com os estudos sociológicos e culturais. Avalie o significado destes dados para o entendimento da passagem. Entenda os detalhes relacionados com aaudiência primitiva. O gênero literário Na teoria da literatura e na crítica bíblica, são assim denominados os conjuntos da literatura que apresentam homogeneidade de estilo, de formas, de técnicas (poesia ou prosa), de procedimentos narrativos, de finalidade, etc. A identificação do gênero é indispensável para colher-se a intenção do autor e a relação entre a expressão literal e o seu conteúdo. Entre os vários tipos literários encontrados no Antigo Testamento, temos: 1. Prosa. Entre os tipos de prosa estão os contratos (Gn 21:22-32), discursos (Jr. 7:1-8:3), cartas (1 Rs 21:8-10), listas (1Sm 8:16-18), prescrições de culto (Lv 1-7), narrações históricas (Jz 8.4-21), relatórios (1Rs 14:25,28), autobiografia (Ed 7.12-9.5), relatos e narrativas de sonhos e de visões (Is 6), autobiografias proféticas (Is 49:1,5-6). 2. Lei. Há várias coleções de leis. A mais importante é o decálogo (Êx. 22:1-17; Dt. 5:6-21), o livro da aliança (Êx. 20:22-23:33), o código da santidade (Lv 17- 26) e o livro de Deuteronômio moldado em forma de sermões. 3. Poesia. Entre os escritos poéticos temos os cânticos reais (Sl 2), hinos (Sl 98), cânticos ocasionais (Sl 93), sentenças de julgamento (Is 41.21-28), lamentações nacionais (Sl 44), cânticos coletivos de confiança (Sl 125), lamentações individuais (Sl 3), cânticos coletivos de agradecimento (Sl 107), cânticos de sabedoria (Pv 8.1-36). 4. Os gêneros literários do Novo Testamento são: evangelhos, narrativas históricas (Atos dos Apóstolos), parábolas, sermões, hinos, epístolas, profecias, literatura apocalíptica (Apocalipse de João). ANÁLISE ESTRUTURAL DO TEXTO O exercício da análise O exercício das análises requer treino, técnica e tempo. É impossível realizar boas análises de forma negligente, muito rápida ou recheada de suposições ou clichês. Não se vai fazer tudo isso toda a vez que vai pregar, mas para as futuras pregações é bom que seja reservado um espaço de estudo. Esses passos da análise estrutural exigem rigor e atenção da sua parte. É fundamental que se entenda que uma análise exegética mais profunda demanda atenção do que se lê e do que se escolhe para auxiliar a leitura. A análise estrutural busca o entendimento do texto bíblico entre as relações gramaticais e sintáticas, e contribui para compreensão da intenção original do autor. Análise temática O exegeta busca neste passo a forma e a ordem do material descrito pelo autor do texto bíblico e como ele desenvolveu seu argumento na perícope escolhida. Pode ser que, às vezes, a idéia expressa pelo autor não é tão clara e óbvia. Seus argumentos podem estar escondidos na estrutura do texto. O melhor exemplo desta dificuldade é a argumentação que utiliza a estrutura temática conhecida como Quiasmo. O quiasmo acontece quando a segunda linha da frase repete a primeira, mas numa ordem invertida. A palavra vem do grego “χιάζω” e significa “a ação de dispor em cruz” (Sl 51:1). Os exemplos do Antigo Testamento são apropriados pois os quiasmos são especialmente comuns na literatura judaica, embora possa ser encontrados em diversos escritos da era helenística. É importante notar que quiasmos ajudam o intérprete a delinear unidades de pensamento. Identificar um quiasmo pode mostrar ao intérprete onde um ensino ou argumento se inicia e onde termina. Pode mostrar ao estudante da escritura exatamente qual unidade deveria ser o tópico para a interpretação. Por que quiasmo consiste de paralelismo invertido, é vital, em termos de interpretação, encontrar e comparar os elementos paralelos. Se o escritor intende um relacionamento entre duas partes de um quiasmo, o intérprete precisa definir esse relacionamento e mostrar como ele ajuda a determinar o sentido da passagem. Portanto, você deve estar atento para os seguintes fatores: 1. Comparação ou contraste. Onde duas ou mais idéias que são desenvolvidas no texto, alternando os argumentos, de acordo com a similaridade ou ampliando os diferentes argumentos. 2. Repetição de palavras. Note bem os termos especiais e construções gramaticais que se repetem no texto, eles são muito importantes. 3. Progressão. Um claro movimento em direção a um alvo através de uma seqüência lógica de idéias. O ponto culminante desta progressão é o clímax. 4. Generalização. Onde o autor constrói o seu argumento, vindo de idéias particulares para explicar a idéia geral. 5. Causa e efeito. Preste atenção na argumentação que é orientada pelas causas de uma ação ou atitude indo para os efeitos produzidos por essas atitudes. 6. Clímax. Preste atenção para os argumentos de conclusão, onde as palavras são colocadas com cuidado. ANÁLISE SEMÂNTICA E VARIANTES TEXTUAIS A análise semântica O exegeta busca neste passo o entendimento do sentido do texto através da sua sintaxe. Você deve estar atento para os seguintes fatores: ● Sinônimos. São palavras que têm o mesmo significado, geralmente utilizadas para variar o uso dos termos no texto, porém, podem ser usadas para enfatizar um argumento. ● Campos semânticos. São palavras que mesmo não sendo sinônimas estão relacionadas. ● Antônimos. São palavras que têm significados opostos. São muito utilizadas para fortalecer as argumentações e defesas de doutrinas. ● Termos cognatos. Aqui não se tratam de sinônimos, mas de termos que tem o mesmo significado e são usadas alternadamente como parte da argumentação. ● Frequência das palavras. Quanto mais a palavra aparecer no texto, maior será a probabilidade dela ser um termo importante para o entendimento da intenção do autor. ● Reversões. Atenção com as frases ou termos que substituem outros com idéias contrárias. Classificação das variantes textuais Para a reconstituição do texto original as variantes textuais devem ser julgadas dentro de três critérios: o critério das evidências externas, o critério da probabilidade intrínseca e o critério da probabilidade de transcrição. ● O critério das evidências externas. As evidências externas são os manuscritos mais antigos e confiáveis atestados por diversos testemunhos, tais como, as citações da Septuaginta e dos Manuscritos do Mar Morto, antigas versões, outras famílias de manuscritos, citações dos Pais da Igreja e a distribuição geográfica dos textos. ● O critério probabilidade intrínseca. Este critério está baseado no estilo e vocabulário do autor através do livro. Você também deve prestar bastante atenção no contexto imediato anterior e posterior, na teologia conhecida do livro, nas passagens paralelas em outros livros. ● O critério da probabilidade de transcrição. Ao analisar as variantes pela forma como eram transmitidos os textos antigos, chega-se aos seguintes critérios: ○ A leitura mais difícil deve ser preferida, porque a tendência dos copistas era de facilitar a leitura. ○ A diferença nas passagens paralelas, porque a tendência dos copistas era de harmonizar as passagens paralelas. ○ A leitura mais curta sempre é preferível, porque a tendência dos copistas era de acrescentar detalhes. ○ Deve-se escolher a variante que melhor se harmonize com o livro em questão. ○ Escolha a leitura que melhor explique a origem das outras variantes textuais. Contexto bíblico-teológico Analise a passagem relacionando-a com o restante da Escritura. A maior dificuldade que temos com a mensagem bíblica é a intertextualidade, isto é, relação entre a mensagem do Antigo Testamento e o Novo Testamento. Temos que tomar cuidado especialmente com a aplicação do Antigo Testamento, lembre-se, ele foi concedido, prioritariamente, para Israel e não para nós. Portanto, preste atenção ao uso que o Novo Testamento faz do Antigo. O Antigo Testamento deve ser interpretado à luz do Novo Testamento. Isso é exigido tanto por razões literárias como por razões teológicas. O Antigo Testamento não pode ser compreendido sem o Novo Testamento. Este princípio foi chamado pelos reformadores de analogiada fé. Se, aparentemente, uma passagem difícil e obscura permite interpretações estranhas à teologia evangélica, e ela entra em conflito com a outra passagem mais clara e de fácil entendimento, então a interpretação mais coerente deve ser adotada. Analise a passagem relacionando-a também com teologia bíblica. O termo é definido pelo Baker's Evangelical Dictionary of Biblical Theology como: O estudo da Bíblia que procura descobrir o que os autores bíblicos, sob a direção divina, creram, descreveram e ensinaram no contexto de sua própria época. A Teologia Bíblica é uma tentativa de articular a teologia que a Bíblia contém através do modo como os seus autores escreveram em seus próprios contextos. As Escrituras vieram à existência no decurso de muitos séculos, através de diferentes autores, contextos sociais e lugares geográficos. Elas foram escritas em três diferentes línguas e numerosas formas (gêneros) literárias. Portanto, exige-se um estudo analítico que conduza a um entendimento sintético para se alcançar seus temas sobrepostos e suas unidades subjacentes. A teologia bíblica trabalha para chegar a uma visão geral sintética coerente, sem negar a natureza fragmentária da luz que a Bíblia lança sobre certos assuntos e sem menosprezar tensões que possam existir à medida que diferentes temas se sobreponham (tais como a misericórdia e o juízo de Deus e lei e graça). A Bíblia tem uma mensagem unificada e completa. Mesmo tendo dezenas de autores que levaram milhares de anos para terminar sua obra. Existe um tema central (do alemão Mitte) unificador da teologia bíblica que une as diversas partes do texto, apresentando uma idéia teológica geral. Esse Mitte estende-se do Antigo Testamento para o Novo Testamento. Herman Northrop Frye, pesquisador e crítico literário, apresenta uma visão interessante sobre a mensagem unificada da Bíblia. Em 1982 ele publicou The Great Code, onde ele apresenta sua visão sobre o texto bíblico, e declara que existe uma coerência das narrativas bíblicas como um todo. Usando uma ilustração interessante, o U-Shaped plot, acrescentando ao conceito teatral da “trama”. Ele segue os seguintes conceitos literários: A trama começa com a Criação em Gênesis e uma família harmoniosa e vivendo em paz no Jardim do Éden. Logo em seguida, vem a Queda e uma sucessão de histórias de triunfo e fracasso. E conclui com a volta da harmonia inicial na cidade eterna de Jerusalém e o fim no livro do Apocalipse. Deste U-Shaped plot maior, derivam-se vários outros, menores. São histórias de queda e ascensão submetidas à história maior. Por exemplo, as histórias de José, Rute, Moisés, Davi, Jó, Paulo e Pedro. Onde elas exercem a função de “tipificar” ou prefigurar o todo. Frye descobre uma espécie de tipologia que sempre retorna durante toda narrativa. Estas imagens específicas repetem-se em todo Antigo e Novo Testamento. Por exemplo, a imagem da árvore, da montanha, do oceano, da torre, do jardim, da ovelha e do pastor. Elas sempre se repetem em eventos que tem grande valor simbólico. Dentre outros temas principais sugeridos, há um que me parece ser o melhor. É o que procura estudar as Escrituras à luz de três conceitos básicos: Reino, Pacto e Mediador. De acordo com esses conceitos, o Reino apresenta a idéia de um Senhor soberano que domina do seu trono sobre todas as coisas. O Pacto é o instrumento de administração desse Reino, estabelecido com o homem pelo Senhor, de forma unilateral, na criação. Ele trata do relacionamento do homem com o universo (mandato cultural), do relacionamento do homem com os demais seres humanos (mandato social) e do relacionamento do homem com Deus (mandato espiritual). O Mediador é o agente na administração do Pacto. Amplie seu conhecimento com o uso dos comentários bíblicos. Investigue o que outros exegetas disserem sobre essa passagem e compare suas conclusões com as encontradas. Os comentários bíblicos devem ser consultados depois que você fez todo trabalho. Avalie bem o comentário que você irá consultar. Dê preferência aos títulos de orientação evangélica conservadora, que defendem a metodología exegética histórico gramatical. Eles devem analisar a Escritura com seriedade acadêmica, erudição, conhecimento profundo das línguas originais, mas com devoção, espiritualidade e compromisso com aplicação da mensagem. OUTRAS ANÁLISES Análise léxica A análise léxica (ou lexicográfica) preocupa-se com o uso e o significado de uma determinada palavra no livro em que está sendo usada, em toda a Bíblia e, se possível, também fora dela. Preocupa-se também com o uso de palavras raras, bem como palavras repetidas. Gordon Fee lembra que em qualquer texto literário as palavras são o material básico de construção para se comunicar o significado. Deve-se recordar também que as palavras funcionam dentro de um contexto. Portanto, mesmo que a palavra possa ter um amplo significado, a tarefa da análise léxica na exegese é entender, com a precisão que for possível, o que o autor queria comunicar com o uso de certa palavra em determinado contexto. Martínez concorda, afirmando que o hebraico do Antigo Testamento e o grego do Novo Testamento não são alheios à evolução semântica. Isso obriga o intérprete a considerar o usus loquendi, isto é, o significado que normalmente tinha uma palavra na linguagem comum, numa determinada época. A importância deste estudo é evitar alguns erros elementares que por vezes têm ocorrido nas interpretações. Assim seria possível evitar, por exemplo, que em inúmeros estudos e pregações as alfarrobas de Lc 15.16 fossem transformadas em “lavagem” (água com restos de comida para porcos), enquanto constituem apenas o fruto da alfarrobeira (bagas pretas e amargas que os porcos arrancavam de arbustos baixos - alfarrobeira selvagem que cresce nas pastagens do Oriente Médio). Alguns passos para a análise léxica podem ser os seguintes: a. Definir os termos e conceitos principais dentro do texto em questão. Reconhecer as palavras, mesmo que já conhecidas, que contenham conteúdo teológico; anotar as palavras que pareçam ser ambíguas e verificar as palavras que se repetem na mesma perícope. b. Estabelecer o campo de significados destas palavras. Verificar a história da palavra e seu desenvolvimento (com o auxílio de léxicos e dicionários); procurar o significado do termo no ambiente greco-romano e judeu contemporâneo; descobrir como a palavra é utilizada no restante da Bíblia ou, pelo menos, no mesmo Testamento e determinar como o autor usa a mesma palavra no restante dos seus escritos. c. Analisar o contexto com cuidado para determinar o significado mais provável na perícope em estudo. Verificar se o contexto ajuda a limitar as opções de significado e se o autor usa a palavra em conjunção ou contraste com outras palavras. Análise morfológica A morfologia trata da flexão das palavras, ou seja, de como elas são formadas ou conjugadas. É evidente que a maneira como as palavras são formadas reflete seu significado. Tanto no grego como no hebraico, o sentido das palavras também é modificado por meio de suas flexões. Assim, os substantivos que nomeiam algo podem estar no singular ou plural, apresentam um gênero e podem aparecer em diferentes graus (aumentativo, diminutivo). Os pronomes substituem um substantivo ou fazem referência a algo já citado. Os adjetivos modificam ou qualificam um substantivo. As preposições indicam a relação que as palavras têm umas com as outras. As conjunções indicam as relações de uma frase com a outra. Os verbos designam uma ação ou estado de alguma coisa, e apresentam uma infinidade de variações (de tempo, de voz, de modo). Os advérbios modificam ou caracterizam um verbo. E as interjeições exprimem estados de emoção. Considerar todas estas possibilidades é a tarefa da análise morfológica, que por alguns autores é também chamada de análise gramatical. Müller afirma: Em suma, procura-seentender as palavras na sua relação com as palavras mais próximas, compreender o significado das frases e da sua relação umas com as outras, para que se chegue à compreensão de todo o parágrafo ou período estudado. Análise estilística A análise estilística se preocupa com a maneira pela qual o autor procurou dar maior expressividade, maior colorido, maior vivacidade ao seu texto. Estudar o estilo de um autor equivale estudar as chamadas “figuras”. Silva alista alguns dos estilos mais utilizados: a. Polissíndeto e Assíndeto: o polissíndeto é o uso exagerado da conjunção grega kai (e). Com isto o texto adquire continuidade, vivacidade e fluidez. Por outro lado, o assíndeto é a ausência de conjunções, assim cada expressão mantém sua própria independência e significação (Mc 4.35-31 e Ef 4.11). b. Poliptoto: é a repetição da mesma palavra com diferentes flexões, sendo muito comum com verbos, nomes, pronomes e adjetivos. Tal figura tem uma função enfática (Mc 4.41). c. Pleonasmo: designa o emprego de termos desnecessários, com finalidade enfática. Não acrescenta nada de novo, mas quer chamar a atenção do leitor (Mc 4.37; 1Jo 1.1). d. Merismo: esta figura exprime a totalidade, mencionando as partes, geralmente os extremos (Mc 4.41b - vento e mar: dois elementos do caos primordial. Jesus não apenas acalmou uma brisa um pouco mais forte e conduziu uma travessia no mar da Galileia, mas mostrou seu poder sobre a totalidade do universo criado). e. Dualidade: consiste em unir duas expressões com funções semelhantes (dupla indicação temporal, duplo imperativo, dupla afirmação, etc.). Muitas vezes a segunda esclarece a primeira, ou dela fornece detalhes (Mc 4.35,38,39,40). f. Quiasmo: consiste em organizar o texto em dois períodos consecutivos, de modo que no segundo período reapareçam os mesmos elementos do primeiro, mas em ordem inversa. Neste texto (Mc 4.37-39) pode-se ver a seguinte estrutura: A - Tempestade - lançava-se contra o barco B - Jesus - estava dormindo C - Discípulos - despertam Jesus B’ - Jesus - levantou-se e repreendeu A’ - Tempestade - cessou g. Paralelismo: ocorre quando os elementos se repetem na mesma ordem. O mesmo texto (Mc 4.37-39) mostra esta estrutura: A - Atividade - da tempestade B - Inatividade - de Jesus A’ - Atividade - de Jesus B’ - Inatividade - da tempestade h. Hipérbole: um exagero considerável, que visa causar impressão no leitor (Mc 4.37c). Análise sintática A análise sintática é a parte da gramática que estuda a disposição das palavras na frase e a das frases no discurso, bem como a relação lógica das frases entre si. Analisa, portanto, as diversas classes de palavras (sujeitos, verbos, adjetivos, advérbios, conjunções, orações subordinadas, frases, proposições, etc.) e as conexões entre elas. Duas obras que podem auxiliar na análise sintática de um texto são Fundamentos para exegese do Antigo Testamento: manual de sintaxe hebraica e Fundamentos para a exegese do Novo Testamento: manual de sintaxe grega, ambas de Carlos Osvaldo Pinto. Nestas obras, o autor discute a sintaxe de cada classe de palavras, bem como faz uma proposta de diagramação sintática. Outro autor que expõe uma forma de análise sintática em forma de diagramação, para o grego, é William Sanford Lasor, em sua Gramática sintática do grego do Novo Testamento. Lasor afirma que “não há nada melhor para ajudar a perceber a estrutura e o sentido de uma passagem do que a diagramação das orações”. A seguir, propõe-se um pequeno diagrama, a modo de exemplo. O texto de João diz: “Não se turbe o vosso coração; credes em Deus, crede também em mim. Na casa de meu Pai há muitas moradas...”. O diagrama esclarece que o mandamento dado inicialmente (de que o coração não deve se perturbar), pode ser cumprido pela ordem dupla de crer (em Deus e em Cristo), motivado pela garantia dada logo a seguir (as muitas moradas que estão na casa do Pai). Análise literária A forma de um texto geralmente diz muito sobre a sua interpretação. Uma parábola deve ser lida de forma diferente do trecho de uma carta. Este por sua vez é diferente de uma profecia, de um salmo, de um provérbio, de uma lei ou de uma história de milagre. O estudo de várias formas literárias que se encontram na Bíblia ajuda muito aqui. O texto, então, deve ser interpretado levando-se em conta a sua forma literária. Roy Zuck alista diferentes tipos de gêneros literários: A. Jurídica: o Pentateuco é o exemplo clássico (Ex 20-40; Lv; Nm 5,6,15,18,19ss; Dt). Dentro da literatura jurídica encontra-se: a. Lei Apodítica: não são leis completas necessariamente (Não matarás); b. Lei Casuística: leis específicas, apresentadas por uma condição (se). (Ex 23.1ss). B. Narrativa: é uma história relatada com o objetivo de transmitir uma mensagem por meio de pessoas, problemas e circunstâncias. Não são biografias completas, mas material cuidadosamente selecionado (Ex: 2 Sm e 1/2 Cr). Geralmente apresentam um problema, trazem as implicações e no clímax uma solução e terminam com o problema resolvido. Há seis tipos de narrativas: a. Tragédia: história da decadência de um indivíduo, do apogeu ao desastre (Sansão, Saul, Salomão). b. Épico: uma série de episódios centralizados numa pessoa ou num grupo (peregrinação dos israelitas no deserto). c. Romance: aborda a relação romântica entre um homem e uma mulher (Rute e Cantares). d. Heróico: história tecida em torno da vida e dos feitos de um herói ou protagonista (Abraão, Davi, Gideão, Daniel, Paulo). e. Sátira: exposição das falhas ou loucuras humanas por meio de ridicularização ou da crítica. (Jonas, Filho Pródigo). Geralmente terminam de forma abrupta, sem que o problema seja resolvido. f. Polêmica: ataca agressivamente ou contesta idéias de terceiros (contenda de Elias com os profetas de Baal; pragas contra os deuses do Egito). C. Poesia: Jó, Salmos, Provérbios, Eclesiastes, Cantares, Cântico de Ana, Cântico de Maria, Palavras de Zacarias, etc. Geralmente são uma rima (paralelismo) de idéias (enquanto no ocidente rima é de sons). Alguns tipos de poesia: a. Lamentação coletiva: Sl 12,44,80,137. b. Lamentação individual: Sl 3,22,31,39,139. c. Louvor coletivo: Sl 65,67,75,107,124,136. d. Louvor Individual: Sl 18,30,32,34. e. Hinos de louvor: Sl 66,100,111,114,149. OBS: há ainda os salmos de Sião, de sabedoria, de confiança, messiânicos, de peregrinação, imprecatórios, etc. Os salmos devem ser vistos como uma orientação para a adoração, ensino para um relacionamento honesto com Deus e para incentivar a refletir sobre o que Deus tem feito pelo ser humano. Em outras palavras, não servem como doutrina. D. Literatura Sapiencial: toda a literatura sapiencial é poética, mas nem toda literatura poética é sapiencial. Há dois tipos: a. Proverbial: verdades gerais fundamentadas na larga experiência e na observação. Em geral mostram-se verdadeiros. São diretrizes e não garantias; preceitos e não promessas. Podem haver exceções. (Provérbios). b. Reflexiva: compreende discussões sobre os mistérios da vida (Jó, Ec). E. Evangelhos: são narrativas históricas, mas não apenas para registrar informações biográficas, pois também apresentam doutrinas. Seu objetivo é explicar e louvar a Pessoa e a Obra de Jesus Cristo (Mt, Mc, Lc, Jo). F. Discurso Lógico: é a literatura epistolar (Rm a Jd). Geralmente começam citando o autor, o destinatário, a saudação, e alguns agradecimentos. Não são cartas comuns, pois transmitem mensagens de Deus. São endereçadas a grupos ou a indivíduos. Há dois tipos: a. Discurso expositivo: explica determinadas verdades ou doutrinas apoiadas na lógica. b. Discurso exortativo: exorta a seguir determinados comportamentos ou à aquisição de certas características em face das verdades expostas no texto. G. Literatura Profética: consiste em textos que trazem predições feitas na época de sua redação incluindo determinações paraque os ouvintes modifiquem suas vidas em função das predições. Um tipo especial é a literatura apocalíptica (com ênfase no fim dos tempos). A atenção ao gênero literário impede de transformar uma passagem no que ela não é, tanto para mais quanto para menos. A observação da qualidade literária da Bíblia ajuda a destacar sua beleza artística e a mostrar ao intérprete um retrato mais fiel das Escrituras e o modo como o conteúdo é transmitido. Análise teológica A Bíblia é a fonte de conhecimentos teológicos. Esses conhecimentos podem ser encontrados de forma explícita ou implícita. Assim sendo, poucas vezes são encontrados registrados de uma forma sistemática. É tarefa do intérprete sistematizar a doutrina bíblica. Na Bíblia pode-se encontrar: a. afirmações doutrinárias claras (por exemplo: Jo 4.24 = “Deus é espírito”); b. afirmações doutrinárias indiretas (por exemplo: a eternidade do Filho de Deus não é provada, mas pressuposta em Jo 1.1); c. palavras e frases doutrinárias (por exemplo: redenção, carne, reino de Deus, o Senhor dos senhores, a santificação do Espírito, etc.); d. textos doutrinários mais extensos (por exemplo: Rm 3.21 a 5.21 = justificação; Rm 8.14-39 = glorificação; etc.); Neste passo, o intérprete deve identificar se no texto em estudo há algum tema teológico que pode ou precisa ser analisado à luz da teologia sistemática. Neste caso, deve-se recorrer a um manual de Teologia e verificar o que o mesmo pode esclarecer sobre o texto, bem como se outras passagens sobre o mesmo tema teológico possam lançar luz sobre a perícope em estudo. ESBOÇO EXEGÉTICO O que é O esboço exegético é a descrição de forma resumida e organizada através de sentenças completas (com sujeito, verbo e complemento), conforme a estrutura do texto, de todo esforço exegético empreendido visando promover clareza acerca do conteúdo do texto e facilitar a exposição dos resultados da exegese. O esboço exegético não deverá ser confundido com o esboço homilético, embora deva ser encarado como um primeiro estágio deste. O esboço exegético é mais acadêmico e preocupa-se em descrever o que o texto está dizendo para que o próprio exegeta possa entendê-lo melhor. O esboço homilético soa mais popular e preocupa-se em descrever o que o texto está dizendo de forma que os ouvintes possam entendê-lo melhor. Assim, enquanto o esboço exegético auxilia o exegeta, o esboço homilético auxilia o ouvinte ou leitor. Outra questão importante é que o esboço exegético deve refletir as descobertas feitas na Análise Estrutural, sendo o resultado dela. Para isso, um diagrama do texto deve ser feito para auxiliar na percepção das relações sintáticas e na descoberta das orações principais do texto em estudo. Defina "externamente" o fluxo de pensamento do autor, marcando os pontos literários de conexão e como estes relacionam a passagem a seu contexto. Isto é, o parágrafo em estudo está ligado a quê? De onde ele partiu? Defina "internamente" o fluxo de pensamento do autor, assinalando os conectivos e os inter-relacionamentos das orações no parágrafo em estudo. O conjunto de sentenças criadas no esboço exegético deverá ser expresso em apenas uma sentença que condense a idéia de todas. A isso chamamos “Idéia Exegética” O processo de produção do Esboço Exegético 1. Uma vez escolhido o texto bíblico, é preciso estudá-lo intensamente, fazendo um diagrama, observando e destacando a classificação sintática e relações semânticas; 2. Descubra o sujeito e verbo principal das cláusulas independentes. A idéia do texto focaliza neste verbo. Geralmente se você tirar esse verbo a frase não faz sentido. 3. Aliste os indicadores de função e analise qual a ligação destes com o verbo principal. Após, ao lado de cada indicador de função, formule uma afirmação de "sujeito-complemento". Deve tentar subordinar a afirmação à frase ou item a que está subordinado no diagrama. Para fazer estas afirmações, deve usar as perguntas interrogativas e afirmações que seguem: ● Quem? ”Aquele que . . ." ● O Quê? "O conteúdo de . . " ● Quando? "O tempo em que . . ." ● Onde? "O lugar em que . . ." ● Por quê? "A razão por que . . .” ● Para quê? "O propósito . . ." "O resultado de . . ." ● Como? "A maneira pela qual . . ." "O meio por qual . . ." 4. Depois de alistar todas as afirmações do texto, ajunte-as em unidades de pensamento semelhantes para produzir um esboço com subordinação. 5. Faça uma avaliação do fluxo do argumento, e aquilo que sobressai como “idéia chave” no texto. Qual a ênfase do autor neste texto? Qual dos pontos principais parece carregar o peso do argumento? Este ponto provavelmente será a ênfase da idéia exegética. 6. Formule uma idéia exegética do texto, enfatizando o argumento principal, ao mesmo tempo em que resume os outros pontos principais. Exemplo: Que os homens nos considerem como ministros de Cristo, e despenseiros dos mistérios de Deus. Além disso requer-se dos despenseiros que cada um se ache fiel. Todavia, a mim mui pouco se me dá de ser julgado por vós, ou por algum juízo humano; nem eu tampouco a mim mesmo me julgo. Porque em nada me sinto culpado; mas nem por isso me considero justificado, pois quem me julga é o Senhor. Portanto, nada julgueis antes de tempo, até que o Senhor venha, o qual também trará à luz as coisas ocultas das trevas, e manifestará os desígnios dos corações; e então cada um receberá de Deus o louvor. 1 Coríntios 4:1-5 Esboço Exegético a. Paulo exorta os Coríntios que a maneira como os mensageiros do evangelho devem ser considerados é como servos de Cristo e fiéis mordomos da mensagem de salvação (4.1-2) b. Paulo declara aos Coríntios que não se julgava capaz de julgar a si mesmo, pois uma consciência limpa não necessariamente garante inocência e seu verdadeiro Juiz é o Senhor. (4.3-4) c. Paulo exorta os Coríntios a pararem de julgar antes do tempo porque o verdadeiro Juiz julgará completamente e com exatidão e distribuirá galardões divinos e apropriados. (4.5) Ideia Exegética “A maneira pela qual os mensageiros de Cristo devem ser avaliados é como servos responsáveis e fiéis ao seu Mestre, porque há somente um Juiz capaz de fazer um julgamento exato e final.” A EXEGESE DAS NARRATIVAS A maior parte da Bíblia é constituída de narrativas. Em torno de 40% do Antigo Testamento é composto por histórias e sabemos que o AT representa ¾ da Bíblia como um todo. Os atos e a pessoa de Deus são revelados nas Escrituras por meio de narrações, contos, dramatizações e biografias históricas. No Novo Testamento temos porções dos Evangelhos e o Livro de Atos como um todo, nos quais a narrativa é o veículo de transmissão e preservação da mensagem divina. No caso do Livro de Atos, a dificuldade hermenêutica basicamente está em encontrar uma forma equilibrada de percepção entre o registro histórico e exemplar da Igreja do primeiro século e os princípios que deverão ser aplicados à Igreja nos dias atuais. A exegese de Atos pode ser afetada basicamente por 2 tipos de preocupação: 1. Histórica (o que realmente estava acontecendo na vida da Igreja primitiva?); 2. Teológica/hermenêutica (o que tudo isso significou e o que significa para nós hoje?). Elementos principais de uma narrativa: É sempre bom ter em mente que as narrativas bíblicas narram o que aconteceu, não o que deveria ter acontecido. Nem sempre os exemplos são bons ou dignos de imitação porque reproduzem situações reais e não posições ideais. Ainda assim, é difícil pensar em uma narrativa bíblica como sendo apenas uma crônica do passado, um simples registro de fatos para as próximas gerações. Mais que isso, as situações reais (negativas, positivas ou neutras) devem ter sido preservadas com o propósito de ensinar algo. Assim, via-de-regra temos em uma narrativa: 1. Cenário: trata-se da situação em que a narrativa está ocorrendo. Qual o lugar? Quando isso ocorreu? Hádetalhes quanto ao local, tempo, condições climáticas, eventos que estejam acontecendo? 2. Componentes: trata-se das pessoas envolvidas na narrativa. Quantas são? Quem são? O que estão fazendo? Quem fala, quem responde? Quem age, quem reage? Há conflitos entre quantas partes? 3. É preciso atentar-se para 3 aspectos nos componentes de uma narrativa: a. Transformação de Caráter b. Lição principal do personagem c. Qual a prova que o (s) personagem (s) enfrenta (m)? 4. Crises: trata-se do conteúdo da narrativa, ou seja, o que os componentes (personagens) estão fazendo neste cenário? Qual é o diálogo? O que estão resolvendo? Pelo que estão passando? Qual é o ponto mais crítico da história, qual o clímax? Perigos na interpretação de narrativas Não há dúvidas de que o grande desafio ao estudar as narrativas bíblicas é entender a mensagem que a história pretende ensinar, ou seja, qual o significado eterno do registro histórico que foi feito? É preciso muita atenção para fugir de dois perigos principais ao fazer uma exegese de uma narrativa: 1. Alegorizar ou espiritualizar a história; 2. Recontá-la como apenas um fato histórico sem pretensões didático- pedagógicas (cf. 2 Tm. 3:16,17; Rm. 15:14; 1Co. 10:1-13). O que observar na interpretação de narrativas? 1. Atentar-se ao contexto, às pessoas, e aos eventos; 2. Atentar-se aos comentários do autor e ao diálogo (cf. Jo. 20:30,31; Jo. 9:35- 41); 3. Atentar-se a contrastes, repetições e outras leis de estrutura (Mt 26.6-13 e 26.14-16); 4. Atentar-se a atmosfera em que a história se dá; 5. Prestar atenção ao clímax (cf. Rute, Ester, Jonas, Mc. 4); 6. Submeter a narrativa ao propósito geral do autor naquele livro; 7. Observar as reações da audiência original. EXERCÍCIOS EXEGÉTICOS: MATEUS, O EVANGELHO DO REI Evangelho segundo Mateus: uma visão panorâmica O Evangelho segundo escreveu Mateus trata de modo único e a história, teologia e o mistério de Jesus Cristo, o Messias. Não é sem motivo que seu evangelho é estudado nos ambientes acadêmicos como “O Evangelho do Rei”. O nome “Mateus” vem do hebraico Matityahu (ַּמִּתְתָיהו), “dádiva de Javé” ou “presente de Jeová”. Ele aparece nas quatro listas de 12 apóstolos presentes no texto bíblico (Mt 10:3, Mc 3:18, Lc 6:15, Et 1:13). Ao escrever acerca de si mesmo, apresenta-nos uma informação extremamente importante para a análise exegética histórica do texto: Filipe e Bartolomeu; Tomé e Mateus, o publicano; Tiago, filho de Alfeu, e Lebeu, apelidado Tadeu; Mateus 10:3 Um publicano era um cobrador de impostos a serviço de Roma. Eram extremamente mal vistos, pois tinha-se a ideia de que atuavam como traidores da pátria e oportunistas do jogo financeiro dos romanos. Tanto Marcos quanto Lucas chamam Mateus de Levi (Mt 9:9, Mc 2:14, Lc 5:27), provavelmente também escolherem esse título para evitar impor-lhe a alcunha de publicano. Provavelmente o Evangelho segundo Marcos foi o primeiro texto a ser escrito, de forma que certamente serviu de roteiro para a redação do livro de Mateus. Juntamente com o livro de Lucas, esses três títulos compõem o conjunto conhecido como “evangelhos sinóticos”. A mensagem central do evangelho de Mateus está registrada nos trechos de Mt 3:2 e Mt 4:17, quando Jesus afirma que “é chegado o reino dos céus”.A mensagem central do evangelho do rei é essa: é chegado o Reino dos Céus. Na situação de judeu, o autor busca evitar o uso do nome “Deus” em sinal de respeito. Seu livro foi escrito provavelmente entre os anos 65 a 70 d.C., essa imprecisão se dá por uma série de informações textuais que impedem uma exatidão maior. O livro de Mateus trabalha com 3 dimensões fundamentais: ● Histórica: a história do homem Jesus, filho de Maria e José (Mt 1:16). É interessante notar que nas genealogias de judeus o nome de mulheres não era incluso. A presente em Mateus, entretanto, apresenta cinco, sendo quatro estrangeiras e uma prostituta. Percebe-se na genealogia do Cristo parentes proeminentes e com pecados monstruosos. É maravilhoso como o Jesus que nasce dessa genealogia pecaminosa é o Redentor do mundo. ● Teológica: Mateus fala do mistério do Cristo, o filho de Deus que estabelece Seu Reino (Mt 16:16). ● Prática: o autor trabalha a memória desse Jesus vivo que caminha conosco até a consumação dos séculos (Mt 28:20) e os desdobramentos práticos que ela acarreta. O que Mateus faz é mais que uma biografia com detalhes triviais ou mirabolantes, mas uma teologia do Reino, mostrando claramente que Jesus é o Rei e o Messias que deveríamos esperar. Do ponto de vista judaico, Mateus compra uma briga imensa ao afirmar que Jesus era o Messias esperado que cumpriu as profecias. Mateus é o evangelho do reino 1. Mateus insiste em provar que Jesus é o Messias, o Rei prometido que estabelece com sua chegada o Reino dos Céus; 2. Mateus está sempre preocupado com as conexões entre o passado profético de Jesus e o cumprimento exato das profecias messiânicas nEle; 3. O termo “cumprisse”, bem como suas diversas variações, é muito característico do estilo de Mateus (Ex: Mt 1:22); 4. Para Mateus, Jesus não é um caso isolado de seu tempo, mas tem conexões históricas profundas. O autor olha para Jesus contando a história de nossa redenção. O evangelho segundo Mateus defende pelo menos seis verdades fundamentais que deixam claro que Jesus Cristo é o Messias e o Rei esperado: 1. Jesus cumpriu as Escrituras; 2. Jesus é o Rei prometido; 3. Jesus estabeleceu o Reino; 4. Os seguidores de Jesus têm uma missão; 5. Os seguidores de Jesus não devem esperar facilidades; 6. Jesus voltará; Na mentalidade de Mateus, o perdão não é uma atitude magnânima e superior de alguém que não pecou e que, portanto, consegue compreender e relevar os pecados dos outros. Mateus encontra uma necessidade recíproca do perdão: eu preciso perdoar porque fui perdoado. Mateus é o evangelho das santas rupturas Provavelmente a comunidade para qual Mateus escreveu era formada, em sua maioria, por cristãos judeus. Sua audiência tinha espírito conservador e tradicionalista: estavam dispostos a abraçar a boa nova do Reino, mas sem abrir mão do passado, das velhas teologias e dos odres envelhecidos (Mr 9:17). Eles não conseguiam entender as exigências radicais do Reino (Mt 19:29). Para Mateus, era necessário que houvesse uma santa ruptura, um abrir mão da zona de conforto para pisar nos desertos onde o Rei pisa. Eles não compreendiam que deixar a família, os bens, a tradição e o orgulho não significa abandonar as pessoas, mas as falsas seguranças, sejam elas oriundas de pessoas ou do tradicionalismo. (Mt 5:21). Jesus afirmou que o Reino dos Céus é semelhante a um homem sábio, que retira de seu tesouro coisas novas e coisas velhas (Mt 13:53). Num olhar exegético, Ele abre o baú da vida e percebe o que precisa ser substituído e o que precisa ser limpo e conservado. Mateus também coloca em parceria o sermão da montanha (Mt 5-7) e o discurso escatológico (Mt 24-25). Esse é o jeito dele de expor o novo e sua revolução ao lado do velho e suas consequências. Mateus é o evangelho da resistência Mateus é uma narrativa que resistia contra as estruturas dominantes que assolavam os pequenos: Roma, a lei e as autoridades religiosas. Essa não é uma resistência armada e alimentada pela cultura da violência, pois isso seria capitular diante do império e do poder do mundo da época. O autor pratica uma resistência alimentada pela esperança que não humilha ou descarta ninguém. Para Mateus, descrever Jesus é fazer uma pedagogia libertadora, ele conscientiza as pessoas de que são amadas por Deus, não pela capacidade pessoal ou posição social, mas pelo alcance supremo do amor do Pai (Mt 6:26, 18:10- 14). Mateus também enxerga Jesus pelas leis do profetismo crítico. O messias denuncia os males e as distorções do sistema religioso e o status quo dominante de Roma. O profetismo de Jesusnão é apenas um positivismo esperançoso de um futuro distante e alienado: é uma proposta de reconstrução. O mal é presente no texto de Mateus, e não apenas numa aparição curta como a de um figurante. Temos escândalos (Mt 18:7), falsos profetas (Mt 7:15), operadores da iniquidade (Mt 7:23), maus (Mt 21:33-46), o homem que não trazia a veste nupcial (Mt 22:1-14), trevas e o ranger de dentes (Mt 8:12), o servo mal (Mt 24:45-50), o homem que escondeu o talento (Mt 25:14-30) o trigo e o joio numa correlação de conivência absurda (Mt 13:24-30) e os justos e injustos (Mt 5:45). Mateus é o evangelho da simplicidade O livro de Mateus é uma perspectiva a partir dos pequeninos. Ele apresenta o Jesus que anda, come, dorme e vive com eles. Esse é o texto de quem trabalha com a mão na massa: o semeador que não escolhe o melhor terreno mas corre os riscos da missão (Mt 13:1-9), o camponês que planta o grão de mostrada na terra (Mt 13:31- 32), A mulher que põe o fermento na massa (Mt 13:33-35), o agricultor que descobre o tesouro escondido (Mt 13:44), o comerciante que negocia tudo por uma pedra preciosa (Mt 13:45-46), os pescadores e suas pescas imprevisíveis (Mt 13:47-50). A teologia de Mateus é rural e cheira a terra, chuva e chão batido. É o Reino que não busca visibilidade, a semente que cai na terra, morre e ninguém vê. O Reino está na linguagem da sutileza, não no abuso das extravagâncias. O autor mescla profecias e milagres, ensinos e críticas, discurso e prática, teologia e serviço. O Reino de Deus é vida enraizada, não alienada do mundo, pois a semente de mostarda que cresce vira casa para as aves e os forasteiros. De fato, o próprio Mateus viveu o alcance do perdão e da salvação em Cristo. Era publicano, amigo de pecadores e traidor da pátria, mas foi chamado para andar e viver com o Messias, o Salvador do mundo. Esse evangelho ainda hoje tem aplicabilidade para nós, servos do Messias, pois ainda precisamos continuar pregando o Reino, vivendo o Reino e atingindo as pessoas que o Reino atingia com o ministério querigmático. Devemos pregar proclamando as verdades do Reino, percebendo as sutilezas do mal e aprendendo de uma vez por todas que a grande comissão está baseado no “Estarei convosco todos os dias”. EXERCÍCIOS EXEGÉTICOS: UMA PERSPECTIVA MISSIOLÓGICA EM ROMANOS Perícope: Rm 10:1-15 Nesse texto Paulo faz uma leitura hermenêutica e exegética de Isaías que desafiava a mentalidade judaica acostumada ao legalismo mosaico. A carta aos romanos é a rainha das epístolas. Ela prega a maturidade missionária, um alcance novo a partir de um novo olhar e de uma novidade de vida: um novo princípio celestial que agora nos habita e que nos rege com uma nova maneira de ser. Toda vez que Paulo usa a expressão “novo”, fala de algo que nunca perde o encanto. Para ele, essa não é uma novidade descartável. Paulo faz uma teologia cristocêntrica, oposta à visão legalista judaica (Rm 1:18). A mente de Paulo nos auxilia na compreensão de uma soteriologia mais sólida e embasada. É imprescindível que trabalhemos para um resgate das doutrinas fundamentais de nossa fé, dentre elas a muito esquecida doutrina da depravação total do homem. Deus nos criou para manifestar Sua glória e dar-nos vida eterna em comunhão com Ele. Nossa desobediência interveio, entretanto, e nos colocou em estado de condenação. Viemos a esse mundo alienados de Deus e em estado de rebelião. De fato, as consequências catastróficas do pecado são tais que não somos capazes de restaurar os laços quebrados da nossa união com o Pai. é por isso que somente à luz do que Deus fez é que vemos a completa enormidade de nossa perda. A restauração da comunhão com Deus depende inteiramente de Jesus Cristo, o verdadeiro Deus e Homem, porque Ele é o único mediador entre Deus e os homens (1Tm 2:5) e também porque abaixo do céu não existe nenhum outro nome como o dEle (At 4:12, Jo 14:6). Além de muito solene, a palavra salvação é muito ampla, abarcando salvação da culpa do pecado na justificação, seu poder na santificação e também sua presença na glorificação. As perguntas de Paulo O texto de Paulo também faz algumas perguntas interessantes: 1. Como invocarão aquele em quem não creram? 2. Como crerão naquele de quem não ouviram falar? 3. Como ouvirão se não há quem pregue? 4. Como pregarão se não forem enviados? Paulo usa seis verbos nessa passagem: salvar, invocar, crer, ouvir, pregar e enviar. Se invertermos a ordem dos verbos, podemos compreender o sentido do argumento paulino: É Cristo quem envia seus arautos, que pregam e, porque pregam, as pessoas ouvem e creem. Os crentes então invocam, e os que invocam são salvos. E disse-lhes: Ide por todo omundo, pregai o evangelho a toda criatura. Marcos 16:15 Que pregues a palavra, instes a tempo e fora de tempo, redarguas, repreendas, exortes, com toda a longanimidade e doutrina. Porque virá tempo em que não suportarão a sã doutrina; mas, tendo comichão nos ouvidos, amontoarão para si doutores conforme as suas próprias concupiscências; E desviarão os ouvidos da verdade, voltando às fábulas. 2 Timóteo 4:2-4 Quando faz-se exegese com perspectiva missiológica, não se deve perder de vista que falar de missiologia e não praticar a missão é hipocrisia. Para que façamos uma exegese honesta, precisamos, acima de qualquer coisa, que essa exegese tenha a ver com nossa proposta de vida. EXERCÍCIOS EXEGÉTICOS: A PERSPECTIVA MINISTERIAL EM 2TM 2:15 Sabemos que a segunda carta a Timóteo foi um dos últimos escritos de Paulo, pois após esse texto acontece o evento de seu martírio. Aqui há uma união do melhor que o apóstolo tem a oferecer. Paulo abre a carta com as saudações e passa para reflexões e exortações. Ele também encoraja à fidelidade e adverte contra o problema dos falsos mestres. Prossegue tratando de assuntos concernentes aos últimos dias, encerrando com a informação de sua morte iminente e suas últimas saudações. O capítulo 2 fala dos combates e sofrimentos do corpo de Cristo. Aqui, Paulo adverte a Timóteo acerca de assuntos fundamentais, como a postura que um homem de Deus deve ter para com Ele. Nesse contexto, é importante analisarmos semanticamente algumas palavras e expressões empregadas pelo autor: Aprovado: no grego, o termo original é δόκιμον, um termo forte, preciso e devastador. Era usado na economia para verificar a validade de uma moeda e, com o tempo, tornou-se um provérbio. Aqui, Paulo diz a Timóteo que sua postura deve carregar a certeza de que uma apresentação a Deus te fará passar pelos testes dEle. "Fomos carimbados por Deus, somos moedas extraviadas do Seu tesouro. Por nosso erro, foi apagado o que em nós fora impresso. Veio Aquele que restituiria a imagem, já que Ele próprio a tinha criado. Ele também busca a Sua moeda, assim como César busca a dele. Por isso diz: 'devolvei a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus'. A César, as moedas. A Deus, a vós mesmos" Agostinho Paulo apresenta uma frase desafiadora: “que não tem do que se envergonhar”. A vergonha é um sentimento devastador, sendo um dos primeiros sentimento que o pecado trouxe em sua bagagem maldita no Éden. Não ter do que se envergonhar significa uma ficha limpa e verdadeira, sem hipocrisia. Há ainda mais uma expressão: “que maneja bem a palavra da verdade”. Traduzir essa expressão ao pé da letra resulta em um “cortar reto” ou “ὀρθοτομοῦντα”. Isso significa dizer não à tortuosidade e aos desvios, atalhos e inovações que tanto descaracterizam o evangelho. Cortar reto é manusear com temor e tremor a santa Palavra de Deus. Cortar reto é manter-se fiel e firme. Não se pode deixar que a palavra de Deus seja entortada pelo pregador: quem corta reto vence a tentação do verbalismo hipócrita. Antes subjugo o meu corpo, e o reduzo à servidão, para que, pregando aos outros, eu mesmo não venha de alguma maneira a ficar reprovado. 1 Coríntios 9:27
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