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TUTORIA P4/M2Pr5_ COMPLICAÇÕES DA GRAVIDEZ

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TUTORIA P4 | PROBLEMA 10: COMPLICAÇÕES DA GRAVIDEZ
Duda, Lib, Lulu, May e Rena
Fisiopatologia, quadro clínico e fatores de risco eclâmpsia e pré-eclâmpsia
Fonte: Obstetrícia de Williams, 25ª edição.
TERMINOLOGIA
Para atualizar e codificar a terminologia e classificação dos distúrbios hipertensivos na gestação, uma Task Force
do American College of Obstetricians and Gynecologists (2013) forneceu recomendações baseadas em evidências
para a prática clínica. A classificação básica prévia foi mantida, e ela descreve quatro tipos de doença hipertensiva:
1.Síndrome de pré-eclâmpsia e eclâmpsia
2.Hipertensão crônica de qualquer etiologia
3.Pré-eclâmpsia sobreposta à hipertensão crônica
4.Hipertensão gestacional – a evidência definitiva de síndrome de pré-eclâmpsia não se desenvolve, e a
hipertensão melhora em torno de 12 semanas após o parto.
É importante observar que essa classificação diferencia a síndrome de pré-eclâmpsia dos outros distúrbios
hipertensivos porque ela é potencialmente mais perigosa.
■ Hipertensão gestacional
O diagnóstico de hipertensão gestacional é feito em mulheres cuja pressão arterial alcança 140/90 mmHg ou mais
pela primeira vez depois da metade da gestação, porém nas quais a proteinúria não é identificada. Quase a metade
dessas mulheres subsequentemente desenvolve síndrome de pré-eclâmpsia. Ainda assim, quando a pressão arterial
aumenta de maneira considerável, é perigoso para a mãe e o feto ignorar essa elevação porque a proteinúria ainda
não se desenvolveu. Conforme enfatizado por Chesley (1985), 10% das convulsões eclâmpticas se desenvolvem
antes que a proteinúria seja identificada. Por fim, a hipertensão gestacional é reclassificada como hipertensão
transitória quando a evidência de pré-eclâmpsia não se desenvolve, voltando a pressão arterial ao normal em torno
de 12 semanas após o parto.
■ Síndrome de pré-eclâmpsia
A pré-eclâmpsia é mais bem descrita como uma síndrome específica da gestação que pode afetar praticamente
qualquer sistema de órgãos. Além disso, ela antecipa uma maior incidência de doença cardiovascular após a
gestação. Embora a pré-eclâmpsia seja muito mais que apenas a hipertensão gestacional com proteinúria, o
aparecimento de proteinúria ainda é um importante critério diagnóstico. A proteinúria é o marcador objetivo
substituto que define o amplo extravasamento endotelial sistêmico, o qual caracteriza a síndrome de pré-eclâmpsia.
Em algumas mulheres com síndrome de pré-eclâmpsia, não há proteinúria franca nem restrição do crescimento
fetal (Sibai, 2009). Por essa razão, a Task Force (2013) sugeriu outros critérios diagnósticos, que são mostrados na
Tabela 40-1. A evidência do envolvimento de múltiplos órgãos pode incluir trombocitopenia, disfunção renal,
necrose hepatocelular, perturbações do sistema nervoso central ou edema pulmonar.
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■ Indicadores de gravidade da pré-eclâmpsia
Os marcadores listados na Tabela 40-1 também são usados para classificar a gravidade da pré-eclâmpsia. Embora
muitos utilizem a dicotomia “leve” e “grave”, a Task Force (2013) desestimula o uso de “pré-eclâmpsia leve”. É
problemático que existam critérios para o diagnóstico de pré-eclâmpsia “grave”, mas a classificação padrão é
implícita ou especificamente denominada “leve”, “menos grave” ou “não grave” (Alexander, 2003; Lindheimer,
2008b). Não existem critérios comumente acordados para a pré-eclâmpsia “moderada”, uma suposta terceira
categoria. Nós utilizamos os critérios listados na Tabela 40-2, que são categorizados como “graves” versus “não
graves”.
Alguns sintomas são considerados perigosos. Cefaleia ou distúrbios visuais, como escotomas, podem preceder
a eclâmpsia, que é uma convulsão não atribuível a outras causas. As convulsões são generalizadas, podendo
aparecer antes, durante ou depois do trabalho de parto. Até 10% das mulheres só desenvolvem convulsões depois
de 48 horas após o parto (Sibai, 2005; Zwart, 2008). Outro sintoma, a dor epigástrica ou no quadrante superior
direito, frequentemente acompanha necrose hepatocelular, isquemia e edema que ostensivamente distende a cápsula
de Glisson. Essa dor característica é frequentemente acompanhada por níveis séricos elevados de transaminases
hepáticas. Por fim, a trombocitopenia também significa piora da pré-eclâmpsia. Ela representa a ativação e
agregação plaquetárias, além de hemólise microangiopática. Outros fatores indicativos de pré-eclâmpsia grave são
envolvimento renal ou cardíaco, bem como a evidente restrição do crescimento fetal e a doença de início precoce.
Quanto mais marcantes forem esses sinais e sintomas, menos provavelmente serão temporizados e mais
provável será a indicação do parto. A diferenciação entre pré-eclâmpsia e hipertensão gestacional grave e não
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grave pode ser enganosa porque o que pode ser uma doença aparentemente leve pode progredir com rapidez para
doença grave.
■ Pré-eclâmpsia sobreposta à hipertensão crônica
Independentemente de sua etiologia, todos os distúrbios hipertensivos crônicos predispõem à pré-eclâmpsia
sobreposta. A hipertensão crônica subjacente é diagnosticada em mulheres com pressão arterial > 140/90 mmHg
antes da gravidez ou antes de 20 semanas de gestação, ou ambas. Os distúrbios hipertensivos podem criar
problemas difíceis com o diagnóstico e o tratamento nas mulheres não observadas até depois da metade da
gestação. Isso ocorre porque a pressão arterial normalmente diminui durante o segundo trimestre e o início do
terceiro nas mulheres normotensas e cronicamente hipertensas (ver Fig. 40-1). Dessa maneira, uma mulher com
doença vascular crônica anteriormente não diagnosticada, observada pela primeira vez com 20 semanas,
frequentemente apresenta pressão arterial na faixa da normalidade. No entanto, durante o terceiro trimestre, quando
a pressão arterial volta a seu nível originalmente hipertenso, pode ser difícil determinar se a hipertensão é crônica
ou induzida pela gravidez. Até mesmo uma pesquisa cuidadosa para a evidência de lesão de órgão-alvo preexistente
pode em vão, pois muitas dessas mulheres têm doença leve e não têm evidência de hipertrofia ventricular,
alterações vasculares retinianas ou disfunção renal.
Em algumas mulheres com hipertensão crônica, a pressão arterial aumenta até níveis evidentemente anormais,
tipicamente depois de 24 semanas. Se a hipertensão de início recente ou basal em agravamento for acompanhada
por proteinúria de início recente ou outros achados listados na Tabela 40-1, então a pré-eclâmpsia sobreposta é
diagnosticada. Comparada com a pré-eclâmpsia “pura”, a pré-eclâmpsia sobreposta com frequência desenvolve-se
mais precocemente na gravidez. A doença sobreposta tende a ser mais grave e, com maior frequência, é
acompanhada por restrição do crescimento fetal. Os mesmos critérios demonstrados na Tabela 40-2 também são
utilizados para caracterizar a gravidade da pré-eclâmpsia sobreposta.
ETIOPATOGÊNESE
Qualquer teoria satisfatória relacionada à origem da pré-eclâmpsia deve considerar a observação de que os
distúrbios hipertensivos gestacionais são mais prováveis de se desenvolver nas mulheres:
•Expostas às vilosidades coriônicas pela primeira vez
•Expostas a uma superabundância de vilosidades coriônicas, como com gêmeos ou mola hidatidiforme
•Com condições preexistentes associadas a inflamação ou ativação de células endoteliais, como diabetes,
obesidade, doença cardiovascular ou renal, distúrbios imunológicos ou influências hereditárias
•Geneticamente predispostas ao desenvolvimento de hipertensão durante a gravidez
Um feto não constitui um requisito para a pré-eclâmpsia. Embora as vilosidadescoriônicas sejam essenciais,
elas não precisam estar localizadas dentro do útero. Por exemplo, pode ocorrer pré-eclâmpsia em caso de gestação
abdominal (Worley, 2008). Independentemente da etiologia precipitante, a cascata de eventos que conduz à
pré-eclâmpsia caracteriza-se por uma variedade de anormalidades que resultam em dano endotelial vascular
sistêmico e subsequente vasospasmo, transudação de plasma, bem como sequelas isquêmicas e trombóticas.
■ Expressão fenotípica da síndrome de pré-eclâmpsia
A síndrome de pré-eclâmpsia é amplamente variável em sua expressão fenotípica clínica. Existem pelo menos dois
subtipos principais, diferenciados caso o remodelamento das arteríolas espiraladas uterinas por invasão
trofoblástica endovascular seja ou não defeituoso. Esse conceito originou a teoria do “distúrbio de dois estágios” da
patogênese da pré-eclâmpsia. De acordo com Redman e colaboradores (2015a), o estágio 1 é causado pelo
remodelamento trofoblástico endovascular defeituoso que, a jusante, causa o estágio 2 da síndrome clínica. É
importante observar que o estágio 2 pode ser modificado por condições maternas preexistentes que também se
manifestam por meio de inflamação ou ativação de células endoteliais e são listadas no terceiro item citado
anteriormente.
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https://jigsaw.minhabiblioteca.com.br/books/9786558040064/epub/OEBPS/Text/chap40.xhtml#tab40-1
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Esse estadiamento é artificial e parece lógico que a pré-eclâmpsia apresente-se clinicamente como um espectro
de doença em agravamento. Além disso, está crescendo a evidência de que existem muitas “isoformas”, conforme
discutido adiante. Os exemplos incluem diferenças nas características maternas e fetais, achados placentários e
doença de início precoce versus tardio (Phillips, 2010; Valensise, 2008; van der Merwe, 2010).
■ Etiologia
Vários mecanismos foram propostos para explicar a causa da pré-eclâmpsia. Atualmente, os considerados
importantes são:
1.Implantação da placenta com invasão trofoblástica anormal dos vasos uterinos
2.Má adaptação da tolerância imunológica entre os tecidos materno, paterno (placentário) e fetal
3.Má adaptação materna às alterações cardiovasculares ou inflamatórias da gravidez normal
4.Fatores genéticos, como genes predisponentes herdados, além de influências epigenéticas
Invasão trofoblástica anormal
Conforme discutido no Capítulo 5, a implantação normal se caracteriza por remodelamento extenso das arteríolas
espiraladas dentro da decídua basal (Fig. 40-2). Os trofoblastos endovasculares substituem os revestimentos
muscular e endotelial vasculares para aumentar o diâmetro vascular (Zhou, 1997). As veias são invadidas apenas
superficialmente.
Em alguns casos de pré-eclâmpsia, porém, a invasão trofoblástica pode ser incompleta. Com isso, os vasos
deciduais, mas não os vasos miometriais, tornam-se revestidos com trofoblastos endovasculares. As arteríolas
miometriais mais profundas, então, não perdem seu revestimento endotelial e tecido musculoelástico, sendo o seu
diâmetro externo médio apenas metade daquele dos vasos nas placentas normais (Fisher, 2015). Em geral, a
magnitude da invasão trofoblástica defeituosa correlaciona-se à gravidade do distúrbio hipertensivo (Madazli,
2000). É importante observar que isso é mais frequente nas mulheres com pré-eclâmpsia de início precoce
(Khodzhaeva, 2016). McMahon e colaboradores (2014) concluíram que níveis menores de fatores de crescimento
antiangiogênico solúvel podem estar envolvidos no remodelamento endovascular defeituoso.
Conforme estudos placentários com microscopia eletrônica, as alterações precoces da pré-eclâmpsia incluem o
dano endotelial, insudação dos constituintes plasmáticos nas paredes vasculares, proliferação das células
miointimais e necrose medial (De Wolf, 1980). Hertig (1945) referiu-se ao acúmulo lipídico nas células
miointimais e macrófagos como aterose. Esses achados são mais comuns em placentas de mulheres diagnosticadas
com pré-eclâmpsia antes de 34 semanas (Nelson, 2014b). A aterose vascular placentária aguda também pode
identificar um grupo de mulheres com maior risco para aterosclerose e doença cardiovascular mais tarde (Staff,
2015). Na gestação, é provável que o lúmen das arteríolas espiraladas anormalmente estreito prejudique o fluxo
sanguíneo placentário. A perfusão diminuída e um ambiente hipóxico acabam levando à liberação de
micropartículas ou debris placentários.
Nesse ponto, essas alterações incitam uma resposta inflamatória sistêmica, que é o estágio 2 da síndrome de
pré-eclâmpsia (Lee, 2012; Redman, 2012). Supõe-se que a placentação defeituosa provoque o desenvolvimento de
hipertensão gestacional, síndrome de pré-eclâmpsia, parto pré-termo, restrição de crescimento fetal e/ou
descolamento prematuro da placenta em mulheres suscetíveis (Brosens, 2011; Labarrere, 2017; Nelson, 2014b).
Fatores imunológicos
A tolerância imune materna aos antígenos derivados da placenta e do feto é discutida no Capítulo 5. A perda dessa
tolerância é outra teoria citada para a pré-eclâmpsia (Erlebacher, 2013). Certamente, as alterações histológicas na
interface materno-placentária são sugestivas da rejeição aguda do enxerto.
Também existem dados por inferência que sugerem que a pré-eclâmpsia é um distúrbio imunomediado. Por
exemplo, o risco de pré-eclâmpsia é muito aumentado nas circunstâncias em que a formação de anticorpos de
bloqueio para os locais antigênicos placentários pode estar comprometida. Nesse cenário, a primeira gravidez pode
comportar um risco mais elevado. A desregulação da tolerância também pode explicar um maior risco quando a
carga antigênica paterna se mostra aumentada, isto é, com dois conjuntos de cromossomos paternos – uma “dose
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dupla”. Por exemplo, as mulheres com gravidez molar apresentam alta incidência de pré-eclâmpsia de início
precoce. Da mesma forma, as mulheres com um feto com trissomia do 13 apresentam incidência de 30 a 40% de
pré-eclâmpsia. Essas mulheres têm níveis séricos elevados de fatores antiangiogênicos. O gene para um desses
fatores, tirosina-cinase 1 tipo fms solúvel, está localizado no cromossomo 13 (Bdolah, 2006). Em contrapartida, as
mulheres anteriormente expostas aos antígenos paternos, como uma gravidez anterior com o mesmo parceiro, são
“imunizadas” contra a pré-eclâmpsia. Esse fenômeno não fica aparente nas mulheres com um abortamento anterior
(Strickland, 1986). As mulheres multíparas que engravidam de um novo parceiro exibem maior risco de
pré-eclâmpsia (Mostello, 2002).
Redman e colaboradores (2015a) revisaram o possível papel da má adaptação imune na fisiopatologia da
pré-eclâmpsia. Nas mulheres destinadas à pré-eclâmpsia, os trofoblastos extravilosos no início da gestação
expressam quantidades reduzidas de antígeno leucocitário humano G não clássico imunossupressor (HLA G). As
mulheres negras com maior frequência têm o alelo do gene 1597ΔC que predispõe ainda mais à pré-eclâmpsia
(Loisel, 2013). Essas mudanças podem contribuir para a vascularização placentária deficiente no estágio 1 da
síndrome de pré-eclâmpsia. Conforme discutido no Capítulo 4, durante a gravidez normal, os linfócitos T helper
(Th) são produzidos de tal maneira que a atividade do tipo 2 fica aumentada em relação à do tipo 1, o que se
denomina viés do tipo 2 (Redman, 2012, 2015a). As células Th2 promovem a imunidade humoral, ao passo que as
células Th1 promovem a secreção de citocinas inflamatórias. Começando precocementeno segundo trimestre em
mulheres que desenvolvem pré-eclâmpsia, a ação de Th1 aumenta.
Ativação das células endoteliais
Acredita-se que as alterações inflamatórias sejam uma continuação das alterações do estágio 1. Em resposta à
isquemia ou a outras causas incitantes, são liberados fatores placentários que começam uma cascata benigna de
eventos (Davidge, 2015). Assim, acredita-se que fatores antiangiogênicos e metabólicos, além de outros
mediadores de leucócitos inflamatórios provoquem lesão de células endoteliais sistêmicas, o que é usado aqui como
sinônimo de disfunção ou ativação das células endoteliais.
A disfunção da célula endotelial pode resultar de um estado ativado extremo de leucócitos na circulação
materna (Faas, 2000; Gervasi, 2001). Brevemente, as citocinas, como o fator α de necrose tumoral (TNF-α) e as
interleucinas, podem contribuir para o estresse oxidativo associado à pré-eclâmpsia. Isso é caracterizado por
espécies reativas de oxigênio e radicais livres que levam à formação de peróxidos de lipídeo autopropagados
(Manten, 2005). Esses peróxidos, por sua vez, geram radicais altamente tóxicos que lesionam as células endoteliais
vasculares sistêmicas, modificam sua produção de óxido nítrico e interferem no equilíbrio de prostaglandinas. As
outras consequências do estresse oxidativo são a produção dos macrófagos espumosos repletos de lipídeos
observados na aterose placentária, a ativação da coagulação microvascular sistêmica manifestada por
trombocitopenia e a maior permeabilidade capilar sistêmica manifestada por edema e proteinúria.
Fatores genéticos
A pré-eclâmpsia parece ser um distúrbio poligênico e multifatorial. Em um estudo de quase 1,2 milhões de
nascimentos na Suécia, foi encontrada uma associação genética entre hipertensão gestacional e pré-eclâmpsia
(Nilsson, 2004). Ward e Taylor (2015) citam um risco incidente para a pré-eclâmpsia de 20 a 40% em relação às
filhas de mães pré-eclâmpticas, 11 a 37% para as irmãs de mulheres pré-eclâmpticas e 22 a 47% em gêmeos. Os
fatores de etnia e raça são importantes, como evidenciado pela alta incidência de pré-eclâmpsia em mulheres
afro-americanas. Pode ser que as mulheres latino-americanas tenham uma incidência mais baixa em virtude das
interações de genes de ameríndios e da raça branca (Shahabi, 2013).
Provavelmente, essa predisposição hereditária resulta de interações de literalmente centenas de genes herdados,
tanto maternos quanto paternos, que controlam a enorme quantidade de funções enzimáticas e metabólicas por
todos os sistemas orgânicos (Triche, 2014). Os fatores derivados do plasma podem induzir alguns desses genes na
pré-eclâmpsia (Mackenzie, 2012). Assim, a manifestação clínica em uma determinada mulher com a síndrome da
pré-eclâmpsia ocupará um espectro. Nesse sentido, a expressão fenotípica irá diferir entre genótipos similares,
dependendo das interações com os componentes ambientais (Yang, 2013).
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Centenas de genes foram estudados quanto a sua possível associação com a pré-eclâmpsia (Buurma, 2013;
Sakowicz, 2016; Ward, 2015). Vários desses genes que podem apresentar uma associação significativa positiva
com a pré-eclâmpsia são listados na Tabela 40-4. Porém, em razão da complexa expressão fenotípica da
pré-eclâmpsia, há dúvidas sobre se qualquer um dos candidatos isoladamente será considerado responsável. De
fato, Majander e colaboradores (2013) ligaram a predisposição à pré-eclâmpsia até mesmo a genes fetais no
cromossomo 18.
■ Patogênese
Vasospasmo
O conceito de vasospasmo na pré-eclâmpsia tem avançado por 1 século (Volhard, 1918). A ativação endotelial
sistêmica causa vasospasmo que eleva a resistência até produzir hipertensão subsequente. Nesse momento, a lesão
celular endotelial sistêmica causa extravasamento intersticial, por meio do qual os constituintes sanguíneos, como
as plaquetas e o fibrinogênio, são depositados em nível subendotelial. As proteínas da junção endotelial também
são alteradas, e a região subendotelial das artérias de resistência sofrem alterações ultraestruturais (Suzuki, 2003;
Wang, 2002). O circuito venoso, muito maior, também está envolvido.
Com o fluxo sanguíneo reduzido devido à má distribuição por vasospasmo e extravasamento intersticial, a
isquemia dos tecidos adjacentes pode levar a necrose, hemorragia e outros distúrbios de órgãos-alvo característicos
da síndrome. Uma importante correlação clínica é o volume sanguíneo acentuadamente atenuado observado em
mulheres com pré-eclâmpsia grave (Zeeman, 2009).
Lesão de célula endotelial
A lesão de células endoteliais sistêmicas é atualmente uma peça central na patogênese da pré-eclâmpsia (Davidge,
2015). Nesse esquema, fatores proteicos, provavelmente de origem placentária, são secretados para dentro da
circulação materna, provocando ativação e disfunção do endotélio vascular sistêmico. Acredita-se que a
pré-eclâmpsia resulte dessas alterações disseminadas da célula endotelial.
O endotélio intacto tem propriedades anticoagulantes. Além disso, as células endoteliais sistêmicas, por meio
da liberação de óxido nítrico, atenuam a resposta da musculatura lisa vascular aos agonistas. As células endoteliais
lesionadas ou ativadas podem produzir menos óxido nítrico e secretar substâncias que promovem a coagulação,
bem como aumentam a sensibilidade aos vasopressores. Evidências adicionais da ativação endotelial incluem as
características alterações na morfologia endotelial do capilar glomerular, aumento da permeabilidade capilar e
concentrações sanguíneas elevadas das substâncias associadas à ativação endotelial. Parece provável que múltiplos
fatores no plasma de mulheres pré-eclâmpticas se combinem para ter esses efeitos vasoativos (Myers, 2007; Walsh,
2009).
Respostas pressoras aumentadas
Conforme discutido no Capítulo 4, as mulheres grávidas normalmente desenvolvem refratariedade aos
vasopressores administrados (Abdul-Karim, 1961). No entanto, as mulheres com pré-eclâmpsia precoce apresentam
maior reatividade vascular à norepinefrina e à angiotensina II (Raab, 1956; Talledo, 1968). Além disso, a maior
sensibilidade à angiotensina II precede o início da hipertensão gestacional (Gant, 1974). De maneira paradoxal, as
mulheres que desenvolvem pré-eclâmpsia antes do termo têm menores níveis circulantes de angiotensina II (Chase,
2017).
Várias prostaglandinas são tidas como centrais à fisiopatologia da síndrome de pré-eclâmpsia.
Especificamente, a resposta pressora atenuada, observada na gravidez normal, deve-se, pelo menos em parte, à
menor responsividade vascular mediada pela síntese da prostaglandina endotelial. Por exemplo, comparada com a
gravidez normal, a produção de prostaciclina endotelial (PGI2) diminui na pré-eclâmpsia. Essa ação parece ser
mediada pela fosfolipase A2 (Davidge, 2015). Ao mesmo tempo, há aumento na secreção de tromboxano A2
pelas plaquetas e a razão de prostaciclina/tromboxano A2 diminui. O resultado global favorece a maior
sensibilidade à angiotensina II e, por fim, à vasoconstrição (Spitz, 1988). Essas mudanças já estão aparentes com
22 semanas nas mulheres que posteriormente desenvolvem pré-eclâmpsia (Chavarria, 2003).
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O óxido nítrico é um potente vasodilatador sintetizado a partir da l-arginina pelas células endoteliais. A
inibição da síntese do óxido nítrico aumenta a pressão arterial média, diminui a frequência cardíaca e reverte a
refratariedade induzida pela gravidez aos vasopressores. Nos seres humanos, é provável que o óxido nítrico seja o
composto que mantém o estado vasodilatado de baixa pressão normal, característico da perfusão fetoplacentária
(Myatt, 1992; Weiner, 1992).Os efeitos da produção de óxido nítrico na pré-eclâmpsia são incertos. Parece que a
síndrome está associada à menor expressão da óxido nítrico-sintase endotelial, resultando, assim, em menor
atividade do óxido nítrico (Davidge, 2015).
As endotelinas são peptídeos de 21 aminoácidos e potentes vasoconstritores. A endotelina-1 (ET-1) é a
isoforma primária produzida pelo endotélio humano (Karumanchi, 2016b). Os níveis de ET-1 plasmáticos são
maiores nas mulheres grávidas normotensas, mas as mulheres com pré-eclâmpsia apresentam níveis ainda mais
elevados (Ajne, 2003). De acordo com Taylor e Roberts (1999), a placenta não é a fonte das maiores concentrações
de ET-1; elas provavelmente originam-se da ativação endotelial sistêmica. É interessante observar que o tratamento
das mulheres pré-eclâmpticas com sulfato de magnésio diminui as concentrações de ET-1 (Sagsoz, 2003). Além
disso, em estudos com animais, a sildenafila reduz as concentrações de ET-1 (Gillis, 2016).
Proteínas angiogênicas e antiangiogênicas
A vasculogênese placentária fica evidente em torno de 21 dias após a concepção. A lista de substâncias pró e
antiangiogênicas envolvidas no desenvolvimento vascular placentário é extensa, e as famílias do fator de
crescimento do endotélio vascular (VEGF) e da angiopoietina são as mais estudadas. O desequilíbrio angiogênico
descreve as quantidades excessivas de fatores antiangiogênicos que, supostamente, são estimulados pela hipoxia em
agravamento na interface uteroplacentária. O tecido trofoblástico das mulheres que tendem a desenvolver
pré-eclâmpsia produz excessivamente pelo menos dois peptídeos antiangiogênicos que entram na circulação
materna (Karumanchi, 2016a).
Primeiro, a tirosina-cinase 1 tipo fms solúvel (sFlt-1) é um receptor de VEGF. Conforme mostrado na Figura
40-3, os maiores níveis de sFlt-1 maternos inativam e diminuem as concentrações do fator de crescimento
placentário (PIGF) e VEGF livres circulantes que levam à disfunção endotelial (Maynard, 2003). É importante
observar que os níveis de sFlt-1 começam a aumentar no soro materno meses antes de a pré-eclâmpsia ficar
evidente (Fig. 40-4). Esses altos níveis no segundo trimestre estão associados a uma duplicação do risco de
pré-eclâmpsia (Haggerty, 2012). Essa divergência do nível normal parece ocorrer ainda mais cedo com a
pré-eclâmpsia de início precoce (Vatten, 2012). Esses fatores também estão ativos nas gestações complicadas por
restrição do crescimento fetal (Herraiz, 2012).
Um segundo peptídeo antiangiogênico, a endoglina solúvel (sEng), inibe várias isoformas do fator de
crescimento transformador beta (TGF-β) de se ligarem aos receptores endoteliais (Fig. 40-3). A endoglina é um
desses receptores. A redução da ligação da endoglina diminui a vasodilatação endotelial dependente de óxido
nítrico. Os níveis séricos de sEng também começam a aumentar meses antes do desenvolvimento da pré-eclâmpsia
clínica (Hagerty, 2012). É interessante observar que a metformina reduz a secreção antiangiogênica em tecidos
humanos (Brownfoot, 2016).
Em uma revisão sistemática, a elevação dos níveis de sFlt-1 e a diminuição das concentrações de PIGF no
terceiro trimestre se correlacionam ao desenvolvimento de pré-eclâmpsia após 25 semanas de gestação (Widmer,
2007). Subsequentemente, Haggerty e colaboradores (2012) relataram que a duplicação das expressões de sFlt-1 e
sEnd aumentava o risco de pré-eclâmpsia em 39 e 74%, respectivamente. A causa da excessiva produção
placentária de proteínas antiangiogênicas permanece um enigma. Há uma diferença racial e étnica em sua secreção
(Yang, 2016). As formas solúveis não se mostram maiores na circulação fetal ou no líquido amniótico em mulheres
pré-eclâmpticas, com seus níveis desaparecendo no sangue materno depois do parto (Staff, 2007).
A pesquisa clínica tem como objetivo empregar as proteínas antiangiogênicas na previsão e no diagnóstico da
pré-eclâmpsia. Um relato preliminar descreveu a aférese terapêutica para reduzir os níveis de sFlt-1 (Thadhani,
2016).
FISIOPATOLOGIA
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Duda, Lib, Lulu, May e Rena
A evidência da manifestação de pré-eclâmpsia começa precocemente na gravidez com alterações fisiopatológicas
ocultas que ganham impulso ao longo da gestação e, mais adiante, ficam clinicamente aparentes. A menos que
ocorra o parto, essas alterações acabam levando ao envolvimento de múltiplos órgãos com um espectro clínico que
varia desde achados escassos até uma deterioração expressiva. Conforme discutido, acredita-se que tais
manifestações sejam uma consequência de vasospasmo, disfunção endotelial e isquemia. Embora as muitas
consequências maternas da pré-eclâmpsia geralmente sejam descritas em relação a cada sistema orgânico, elas com
frequência são múltiplas e se sobrepõem.
■ Sistema cardiovascular
Os distúrbios cardiovasculares são comuns na síndrome de pré-eclâmpsia. Eles estão relacionados com: (1)
aumento na sobrecarga cardíaca causada pela hipertensão, (2) pré-carga cardíaca, que é reduzida pela diminuição
patológica da expansão volêmica durante a gravidez e é aumentada pelas soluções de cristaloide intravenoso ou
oncóticas, e (3) ativação endotelial com extravasamento interendotelial do líquido intravascular no espaço
extracelular e, importante salientar, nos pulmões.
■ Alterações hemodinâmicas e função cardíaca
As alterações cardiovasculares dos distúrbios hipertensivos relacionados com gravidez variam de acordo com
diversos modificadores. Esses fatores incluem a gravidade da pré-eclâmpsia, a gravidade da hipertensão, a presença
de doença crônica subjacente e a parte do espectro clínico em que isso é estudado. Em algumas mulheres, essas
mudanças cardiovasculares podem preceder a hipertensão (De Paco, 2008; Easterling, 1990; Khalil, 2012;
Melchiorre, 2013). Todavia, com o início clínico da pré-eclâmpsia, o débito cardíaco declina, devido, em parte, ao
aumento da resistência periférica. Ao avaliar a função cardíaca na pré-eclâmpsia, deve-se considerar as medidas
ecocardiográficas da função miocárdica e a função ventricular clinicamente relevante.
Função miocárdica
Entre as mulheres com pré-eclâmpsia, exames ecocardiográficos seriados documentam disfunção diastólica em 40
a 45% (Guirguis, 2015; Melchiorre, 2012). Com essa disfunção, os ventrículos não relaxam de forma adequada e
não conseguem se encher adequadamente. Em algumas dessas mulheres, as diferenças funcionais persistem por até
4 anos após o parto (Evans, 2011; Orabona, 2017). A disfunção diastólica deriva do remodelamento ventricular,
sendo considerada uma resposta adaptativa para manter a contratilidade normal apesar do aumento da pós-carga da
pré-eclâmpsia. Altos níveis de proteínas antiangiogênicas também podem contribuir para isso (Shahul, 2016). Nas
mulheres saudáveis em outros aspectos, essas mudanças são, em geral, clinicamente irrelevantes. Contudo, quando
combinadas com disfunção ventricular subjacente – por exemplo, hipertrofia ventricular concêntrica proveniente da
hipertensão crônica – a disfunção diastólica adicional pode causar edema pulmonar cardiogênico (Wardhana,
2017). Isso é discutido com mais detalhes nos Capítulos 47 e 49.
Função ventricular
Apesar da frequência relativamente alta de disfunção diastólica na pré-eclâmpsia, a função cardíaca clínica é
adequada na maioria das mulheres afetadas (Hibbard, 2015). Em algumas mulheres com pré-eclâmpsia, os níveis
de troponina cardíaca estão um pouco elevados, e os níveis do pró-peptídeo natriurético cerebral (Nt pro-BNP)
aminoterminal estão elevados na pré-eclâmpsia grave (Pergialiotis, 2016; Zachary, 2017). É importante salientar
que tantoas gestantes normais quanto aquelas com síndrome de pré-eclâmpsia podem ter uma função ventricular
normal ou ligeiramente hiperdinâmica (Fig. 40-5). Assim, ambas têm débito cardíaco adequado para as pressões de
enchimento do ventrículo esquerdo. As pressões de enchimento dependem do volume de líquidos intravenosos.
Assim, a hidratação agressiva resulta em função ventricular visivelmente hiperdinâmica. Isso é acompanhado por
elevação das pressões de oclusão da artéria pulmonar, podendo ocorrer edema pulmonar apesar de função
ventricular normal. Isso ocorre devido a um vazamento endotelial-epitelial nos alvéolos, sendo acrescido de uma
pressão oncótica reduzida por uma concentração sérica reduzida de albumina. Em resumo, a administração
agressiva de líquido para mulheres normais em outros aspectos com pré-eclâmpsia grave eleva de forma substancial
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as pressões de enchimento do lado esquerdo e aumenta um débito cardíaco fisiologicamente normal a níveis
hiperdinâmicos.
■ Volume sanguíneo
A hemoconcentração é um marco da eclâmpsia. Este conceito foi precisamente quantificado por Zeeman e
colaboradores (2009), que expandiram as observações prévias de Pritchard e colaboradores (1984). Eles
demonstraram em mulheres eclâmpticas que a expansão do volume sanguíneo gestacional esperada é gravemente
reduzida (Fig. 40-6). As mulheres de tamanho médio têm um volume sanguíneo de 3.000 mL, e, durante as últimas
semanas de uma gravidez normal, ele alcança uma média de 4.500 mL. No entanto, com a eclâmpsia, perde-se
grande parte ou a totalidade do excesso normal previsto de 1.500 mL. Essa hemoconcentração resulta de
vasospasmo generalizado que sucede à ativação endotelial e ao extravasamento do plasma para dentro do espaço
intersticial. Nas mulheres com pré-eclâmpsia, e dependendo de sua gravidade, a hemoconcentração geralmente não
é tão acentuada.
Essas alterações têm consequências clínicas substanciais. É importante observar que as mulheres com
hemoconcentração grave são muito sensíveis a uma perda sanguínea no parto que, de outro modo, seria considerada
normal. O vasospasmo e o extravasamento endotelial do plasma persistem por um intervalo de tempo variável
depois do parto, à medida que o endotélio sofre reparação. Quando isso acontece, a vasoconstrição sofre reversão,
e, conforme o volume sanguíneo aumenta, o hematócrito comumente diminui. É importante observar que uma
causa substancial dessa queda no hematócrito, porém, costuma ser a perda de sangue ocorrida no parto. A anemia
pode ser também, em parte, o resultado da maior destruição dos eritrócitos, como descrito a seguir.
■ Trombocitopenia materna
A contagem de plaquetas é rotineiramente feita nas mulheres com qualquer forma de hipertensão gestacional. As
concentrações diminuídas de plaquetas na eclâmpsia foram descritas há mais de 100 anos. A frequência e a
intensidade da trombocitopenia variam e são dependentes da gravidade e da duração da síndrome de pré-eclâmpsia
(Heilmann, 2007; Hupuczi, 2007). A trombocitopenia franca, definida por uma contagem de plaquetas <
100.000/μL, indica doença grave (ver Tab. 40-2). Em geral, quanto menor for a contagem de plaquetas, maiores
serão as taxas de morbidade e mortalidade maternas e fetais (Leduc, 1992). Na maioria dos casos, o parto é
aconselhável porque a trombocitopenia comumente continua a se agravar. Depois do parto, a contagem de
plaquetas pode continuar a diminuir até o primeiro dia. Em seguida, costuma aumentar de forma progressiva até
alcançar um nível normal em 3 a 5 dias. Conforme discutido adiante, em alguns casos com a síndrome HELLP, a
contagem de plaquetas continua a cair depois do parto. Se as contagens não se estabilizarem em até 48 a 72 horas, a
pré-eclâmpsia pode ser incorretamente atribuída a uma das microangiopatias trombóticas discutidas no Capítulo
56.
Várias outras alterações plaquetárias são atribuídas à síndrome de pré-eclâmpsia. Elas foram revisadas por
Kenny e colaboradores (2015) e incluem ativação plaquetária com α-desgranulação aumentada que produz
β-tromboglobulina, fator 4 e aumento da depuração. Paradoxalmente, na maioria dos estudos, a agregação
plaquetária in vitro mostra-se diminuída na comparação com o aumento normal característico da gravidez. Isso
provavelmente se deve à “exaustão” plaquetária após a ativação in vivo. Embora a causa seja desconhecida, os
processos imunológicos ou apenas o depósito de plaquetas nos locais da lesão endotelial podem estar implicados.
Os níveis de imunoglobulinas ligadas às plaquetas e ligáveis às plaquetas circulantes mostram-se aumentados, o
que sugere alterações da superfície das plaquetas.
Plaquetas anormalmente baixas não ocorrem no feto ou no recém-nascido em mulheres pré-eclâmpticas, apesar
da trombocitopenia materna grave (Kenny, 2015; Pritchard, 1987). Assim, a trombocitopenia materna em mulheres
hipertensas não é uma indicação fetal para a cesariana.
■ Hemólise
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A pré-eclâmpsia grave é frequentemente acompanhada por hemólise, visto que se manifesta por níveis elevados
de lactato-desidrogenase sérica e níveis diminuídos de haptoglobina. As outras evidências advêm da
esquizocitose, esferocitose e reticulocitose no sangue periférico (Cunningham, 1985; Pritchard, 1954, 1976). Esses
desarranjos resultam, em parte, da hemólise microangiopática causada por ruptura endotelial com adesão
plaquetária e deposição de fibrina. Cunningham e colaboradores (1995) postularam que a morfologia eritrocitária
era parcialmente causada por alterações nos lipídeos séricos. Além disso, é encontrada uma redução substancial
no conteúdo de ácidos graxos de cadeia longa nos eritrócitos de mulheres pré-eclâmpticas (Mackay, 2012).
Após relatos iniciais de hemólise e trombocitopenia na pré-eclâmpsia grave, também foram descritos níveis
séricos anormalmente elevados de transaminases hepáticas indicativos de necrose hepatocelular (Chesley,
1978). Weinstein (1982) referiu-se a essa combinação de eventos como síndrome HELLP, sendo a denominação
hoje usada mundialmente. Além disso, as facetas da síndrome HELLP são incluídas nos critérios que diferenciam a
pré-eclâmpsia grave da não grave (ver Tab. 40-2). A síndrome HELLP é discutida em mais detalhes adiante.
■ Alterações de coagulação
Alterações sutis compatíveis com a coagulação intravascular e, com menor frequência, a destruição de eritrócitos,
são comumente encontradas com a pré-eclâmpsia e, principalmente, com a eclâmpsia (Cunningham, 2015; Kenny,
2015). Algumas dessas alterações consistem no maior consumo do fator VIII, maiores níveis de fibrinopeptídeos A
e B, bem como dos D-dímeros, e nos menores níveis de proteínas reguladoras, antitrombina III e proteínas C e S.
Os distúrbios de coagulação em geral são leves e raramente têm relevância clínica (Kenny, 2015; Pritchard, 1984).
A menos que exista descolamento prematuro de placenta associado, os níveis de fibrinogênio no plasma não
diferem acentuadamente dos níveis encontrados na gravidez normal. Os produtos de degradação da fibrina, como
os D-dímeros, estão apenas minimamente elevados. À medida que a pré-eclâmpsia se agrava, pioram também os
achados anormais com tromboelastografia (Pisani-Conway, 2013). Apesar dessas alterações, a avaliação
laboratorial rotineira da coagulação,verificando tempo de protrombina (TP), tempo de tromboplastina parcial
ativado (TTPa) e nível de fibrinogênio do plasma, é desnecessária no manejo dos distúrbios hipertensivos
associados à gravidez.
■ Alterações endócrinas e hormonais
Os níveis plasmáticos de renina, angiotensina II, angiotensina 1 a 7, aldosterona, desoxicorticosterona e peptídeo
natriurético atrial (ANP) mostram-se substancialmente maiores durante a gravidez normal. O ANP é liberado com
o estiramento das paredes do átrio em consequência da expansão do volume sanguíneo e responde à contratilidade
cardíaca (Cap. 4). Os níveis séricos de ANP aumentam na gravidez e sua secreção aumenta ainda mais em
mulheres com pré-eclâmpsia (Luft, 2009). Os níveis de seu precursor – pró-peptídeo natriurético atrial – também
estão aumentados na pré-eclâmpsia (Sugulle, 2012). Os níveis de vasopressina são semelhantes nas mulheres que
não estão grávidas, nas gestantes normais e nas mulheres com pré-eclâmpsia, ainda as duas últimas tenham
depuração metabólica aumentada (Dürr, 1999).
■ Alterações hidreletrolíticas
Nas mulheres com pré-eclâmpsia grave, o volume de líquido extracelular, manifestado como edema, costuma ser
muito maior que o das mulheres gestantes normais. Conforme discutido, o mecanismo responsável pela retenção
hídrica patológica é a lesão endotelial (Davidge, 2015). Além de edema generalizado e proteinúria, essas mulheres
têm redução da pressão oncótica plasmática. Essa redução cria um desequilíbrio de filtração e desloca ainda mais o
líquido intravascular para dentro do interstício adjacente. As concentrações eletrolíticas não diferem de modo
apreciável nas mulheres com pré-eclâmpsia em comparação com as gestantes normais.
Após uma convulsão eclâmptica, o pH e a concentração de bicarbonato no soro diminuem devido à acidose
láctica e à perda respiratória compensatória de dióxido de carbono. A intensidade da acidose relaciona-se com a
quantidade de ácido láctico produzida – acidose metabólica – e a velocidade com que o dióxido de carbono é
expirado – acidose respiratória.
■ Rins
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Durante a gravidez normal, o fluxo sanguíneo renal e a taxa de filtração glomerular são apreciavelmente maiores
(Cap. 4). Na pré-eclâmpsia, ocorrem várias alterações anatômicas e fisiopatológicas reversíveis. De importância
clínica, a perfusão renal e filtração glomerular ficam reduzidas. Os níveis muito menores que os valores não
gravídicos normais são raros, sendo consequência da doença grave. Grande parte da diminuição na filtração
glomerular advém da maior resistência arteriolar aferente renal, a qual pode se mostrar elevada em até cinco vezes
(Conrad, 2015; Cornelis, 2011). As alterações morfológicas caracterizam-se por endoteliose glomerular, a qual
bloqueia a barreira que permite a filtração. A filtração diminuída faz com que os valores da creatinina sérica se
elevem até os observados em mulheres não grávidas, isto é, 1 mg/mL, mas, por vezes, ainda maiores (Lindheimer,
2008a). Os valores anormais em geral começam a normalizar em 10 dias ou mais após o parto (Cornelis, 2011;
Spaan, 2012a).
Na maioria das mulheres pré-eclâmpticas, a concentração de sódio na urina fica elevada. A osmolalidade
urinária aumenta, a razão creatinina urinária/plasmática está elevada e a fração de excreção de sódio está baixa,
indicando que um mecanismo pré-renal está envolvido. A infusão de cristaloide contendo sódio aumenta a pressão
de enchimento ventricular esquerdo, e, embora a oligúria melhore temporariamente, as infusões rápidas podem
provocar edema de pulmão clinicamente aparente. A terapia intensiva com líquidos intravenosos não está indicada
como “tratamento” para mulheres pré-eclâmpticas com oligúria a menos que o débito urinário esteja diminuído por
hemorragia ou perda de líquidos por vômitos ou febre.
A concentração plasmática de ácido úrico em geral fica elevada na pré-eclâmpsia. A elevação excede aquela
atribuível à redução na taxa de filtração glomerular e também se deve à maior reabsorção tubular (Chesley, 1945).
Ao mesmo tempo, a pré-eclâmpsia está associada à menor excreção urinária de cálcio, talvez por causa da maior
reabsorção tubular (Taufield, 1987).
Proteinúria
Como mostrado na Tabela 40-1, a detecção de proteinúria ajuda a estabelecer o diagnóstico de pré-eclâmpsia. A
excreção anormal de proteína é empiricamente definida por excreção na urina de 24 horas que excede 300 mg,
relação proteína:creatinina urinária de 0,3 ou mais ou persistência de 30 mg/dL (1+ na fita) de proteína em amostras
aleatórias de urina. Embora o agravamento ou a proteinúria na faixa nefrótica tenham sido considerados pela
maioria um sinal de doença grave, pode não ser o caso (Airoldi, 2007). Certamente, esse conceito não foi aceito
pela Task Force de 2013.
Um problema é que o método ideal de estabelecimento de níveis anormais, seja de proteína ou de albumina na
urina, ainda deve ser definido. Para uma amostra quantitativa de 24 horas, o limiar de “consenso” usado é de ≥ 300
mg/24 h (American College of Obstetricians and Gynecologists, 2013). O uso de um limiar de excreção urinária de
proteínas de 165 mg em amostra de 12 horas tem eficácia equivalente (Stout, 2015; Tun, 2012).
A determinação da razão proteína:creatinina urinária pode suplantar a incômoda quantificação de 24 horas
(Kyle, 2008; Morris, 2012). Chen e colaboradores (2008) mostraram que amostras de urina cateterizada e de coleta
limpa têm boa correlação. Em uma revisão sistemática, as razões proteína:creatinina urinária aleatórias abaixo de
130 a 150 mg/g, isto é, 0,13 a 0,15, indicam que é baixa a probabilidade de proteinúria que exceda 300 mg/dia
(Papanna, 2008). As razões < 0,08 ou > 1,19 têm valores preditivos negativos ou positivos de 86 e 96%,
respectivamente (Stout, 2013). Porém, as razões no intervalo médio, isto é, 300 mg/g ou 0,3, apresentam
sensibilidade e especificidade diminuídas. Assim, muitos recomendam que, com os valores no intervalo médio, a
excreção de proteína em uma amostra de 24 horas seja quantificada.
No caso de avaliação com fita reagente, as determinações dependem da concentração urinária, sendo notórias
por gerar resultados falso-positivos e falso-negativos. Assim, a avaliação pode mostrar um valor de 1+ ou 2+ com
base em amostras de urina concentrada de mulheres que excretam < 300 mg/dia.
É importante observar que a proteinúria pode se desenvolver tardiamente, e algumas mulheres podem dar à luz
– ou ter convulsão eclâmptica – antes que ela apareça. Por exemplo, 10 a 15% das mulheres com síndrome HELLP
não tinham proteinúria na apresentação (Sibai, 2004). Em um outro relato, 17% das mulheres eclâmpticas não
apresentavam proteinúria no momento das convulsões (Zwart, 2008).
Alterações anatômicas
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Duda, Lib, Lulu, May e Rena
Sheehan e Lynch (1973) encontraram frequentemente alterações identificáveis no rim, na necrópsia por
microscopia óptica e eletrônica de mulheres eclâmpticas. Os glomérulos mostram-se aumentados em
aproximadamente 20%, não têm sangue e as alças capilares encontram-se variavelmente dilatadas e contraídas. As
células endoteliais mostram-se edemaciadas, o que foi denominado endoteliose capilar glomerular (Spargo, 1959).
Com frequência, as referidas células ficam tão edemaciadas que bloqueiam total ou parcialmente o lúmen capilar
(Fig. 40-7) (Hecht, 2017). Observam-se depósitos subendoteliais homogêneos de proteínas e material semelhante a
fibrina.
O edema endotelial pode resultar da “abstinência” de proteínas angiogênicas causada pela formação de
complexos de proteínas angiogênicaslivres com um receptor de proteína antiangiogênica circulante livre (ver Fig.
40-3). A proteína angiogênica é crucial para a saúde do podócito, e sua inativação pelos receptores
antiangiogênicos leva à disfunção do podócito e ao edema endotelial (Conrad, 2015; Karumanchi, 2009). Além
disso, a eclâmpsia caracteriza-se por maior excreção desses podócitos epiteliais (Wagner, 2012; White, 2014).
Lesão renal aguda
Embora graus discretos de lesão renal aguda sejam encontrados, a necrose tubular aguda clinicamente aparente é
quase invariavelmente induzida por hemorragia comórbida com hipovolemia e hipotensão (Cap. 41). Isso costuma
ser causado por sangramento obstétrico grave – especialmente o descolamento prematuro da placenta – combinado
com a reposição inadequada de sangue. Drakeley e colaboradores (2002) descreveram 72 mulheres com
pré-eclâmpsia e insuficiência renal. Metade apresentavam a síndrome HELLP e um terço exibiram descolamento
prematuro de placenta. Em uma revisão de 183 mulheres com a síndrome HELLP, 5% tinham lesão renal (Haddad,
2000). Entre aquelas com lesão renal, metade apresentava descolamento prematuro da placenta e a maioria tinha
hemorragia pós-parto. Por fim, raramente ocorre necrose cortical renal irreversível (Cap. 53).
■ Fígado
As lesões hepáticas características da eclâmpsia são regiões de hemorragia periportal na periferia hepática (Hecht,
2017). Porém, é incomum haver lesões tão extensas quanto aquelas mostradas na Figura 40-8. Sheehan e Lynch
(1973) descreveram que algum grau de infarto hepático acompanhava a hemorragia em quase metade das mulheres
que morreram com eclâmpsia. Esses achados corresponderam a relatos durante a década de 1960 que descreveram
níveis séricos elevados de transaminases hepáticas. Juntamente com as observações iniciais por Pritchard e
colaboradores (1954), que descreveram a hemólise e trombocitopenia com a eclâmpsia, esse conjunto de hemólise,
necrose hepatocelular e trombocitopenia foi posteriormente denominado síndrome HELLP.
O envolvimento hepático na pré-eclâmpsia pode apresentar clinicamente pelo menos três manifestações.
Primeiro, a dor é considerada um sinal de doença grave. Ela se manifesta normalmente por sensibilidade e dor
mesoepigástrica ou no quadrante superior direito moderada a intensa. Essas mulheres costumam ter elevação dos
níveis séricos de aspartato-transaminase (AST) ou alanina-transaminase (ALT). Contudo, em alguns casos, a
quantidade de tecido hepático envolvida no infarto pode ser surpreendentemente extensa, embora ainda
clinicamente insignificante (Nelson, 2017). Em nossas experiências, o infarto pode ser agravado pela hipotensão
decorrente da hemorragia obstétrica, podendo resultar em insuficiência hepática, também chamada de choque
hepático (Alexander, 2009; Yoshihara, 2016).
Segundo, as elevações dos níveis séricos de AST e ALT são marcadores de pré-eclâmpsia grave. Os valores
raramente excedem 500 U/L, mas níveis maiores que 2.000 U/L foram relatados (Cap. 55). Em geral, as
concentrações séricas seguem inversamente os níveis de plaquetas, normalizando-se ambos com frequência em 3
dias depois do parto.
Como terceira apresentação, um infarto hemorrágico pode estender-se para formar um hematoma hepático.
Este, por sua vez, pode se estender até formar um hematoma subcapsular que pode se romper. A tomografia
computadorizada (TC) ou a ressonância magnética (RM) ajudam muito no diagnóstico (Fig. 40-9). Os hematomas
não rompidos são provavelmente mais comuns do que suspeitados do ponto de vista clínico, sendo mais prováveis
com a síndrome HELLP. Embora fosse antes considerado como uma condição cirúrgica, o manejo atual de um
hematoma hepático geralmente consiste em observação a menos que haja sangramento continuado. Contudo, em
alguns casos, a imediata intervenção cirúrgica ou a embolização angiográfica podem salvar a vida da paciente. Em
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uma revisão de 180 casos de hematoma ou ruptura hepática, 94% das grávidas afetadas tinham síndrome HELLP, e
em 90% do total de casos a cápsula tinha rompido (Vigil-De Gracia, 2012). A taxa de mortalidade materna foi de
22% e a taxa de mortalidade perinatal foi de 31%. Em casos raros, é necessário transplante de fígado (Hunter, 1995;
Wicke, 2004).
O fígado gorduroso agudo da gravidez é, por vezes, confundido com pré-eclâmpsia (Nelson, 2013; Sibai,
2007a). Ele também tem um início tardio na gravidez, havendo, com frequência, hipertensão associada, níveis
elevados de creatinina e transaminase sérica, além de trombocitopenia. Porém, a marca registrada do fígado
gorduro agudo é a disfunção hepática significativa, e a Tabela 55-1 salienta essas diferenças clínicas.
Por fim, não há dados convincentes que liguem o envolvimento pancreático com a síndrome de pré-eclâmpsia
(Sheehan, 1973). Assim, relatos de casos ocasionais de pancreatite hemorrágica concomitante provavelmente não
estão relacionados (Lynch, 2015; Swank, 2012). Em nossas experiências no Parkland Hospital, os níveis de amilase
raramente estão elevados nas mulheres com pré-eclâmpsia (Nelson, 2014a).
Síndrome HELLP
Não há uma definição universalmente aceita da síndrome HELLP, e, assim, sua incidência varia de acordo com o
pesquisador. No estudo previamente citado de 183 mulheres com síndrome HELLP, 40% tiveram desfechos
adversos, e duas mães morreram (Haddad, 2000). As outras complicações consistiram em pré-eclâmpsia, 6%,
descolamento prematuro de placenta, 10%, lesão renal aguda, 5%, e edema pulmonar, 10%. AVC, hematoma
hepático, coagulopatia, síndrome da disfunção respiratória aguda e sepse foram outras complicações graves.
As mulheres com pré-eclâmpsia e síndrome HELLP tipicamente apresentam piores desfechos que as mulheres
pré-eclâmpticas sem os sintomas de HELLP (Kozic, 2011; Martin, 2012, 2013). Em uma revisão de 693 mulheres
com síndrome HELLP, 10% tinham eclâmpsia concomitante (Keiser, 2011). Sep e colaboradores (2009)
descreveram um risco muito maior de complicações nas mulheres com síndrome HELLP em comparação com
aquelas portadoras de “pré-eclâmpsia isolada”. Estas incluíram eclâmpsia, 15 versus 4%, nascimento pré-termo, 93
versus 78%, e taxa de mortalidade perinatal, 9 versus 4%, respectivamente. Por causa dessas acentuadas diferenças
clínicas, foi postulado que a síndrome HELLP tem uma patogênese distinta (Reimer, 2013; Vaught, 2016).
■ Cérebro
Cefaleia e sintomas visuais são comuns com a pré-eclâmpsia grave, e a associação com convulsões define a
eclâmpsia. As primeiras descrições anatômicas do envolvimento cerebral originam-se de amostras de necrópsia,
mas TC e RM, bem como exames com Doppler, acrescentaram muitas informações novas e importantes.
Lesões neuroanatômicas
Segundo as descrições anatômicas iniciais, a patologia cerebral contribuía apenas para cerca de um terço dos casos
fatais, como o caso mostrado na Figura 40-10. De fato, a maioria das mortes aconteceram por edema pulmonar, e
as lesões cerebrais foram coincidentes. Assim, embora a hemorragia intracerebral macroscópica tenha sido notada
em até 60% das mulheres eclâmpticas, ela foi fatal em apenas metade delas (Melrose, 1984; Richards, 1988;
Sheehan, 1973). Conforme demonstrado na Figura 40-11, outras lesões principais na necrópsia de mulhereseclâmpticas foram as hemorragias petequiais corticais e subcorticais. As lesões vasculares microscópicas clássicas
consistem em necrose fibrinoide da parede arterial, bem como microinfartos e hemorragias perivasculares. Outras
lesões importantes frequentemente descritas incluem edema subcortical, múltiplas áreas não hemorrágicas de
“amolecimento” por todo o cérebro e áreas hemorrágicas na substância branca (Hecht, 2017). Também pode haver
hemorragia nos gânglios da base ou na ponte, algumas vezes com ruptura para dentro dos ventrículos.
Fisiopatologia cerebrovascular
Os achados clínicos, patológicos e de neuroimagem levaram a duas teorias gerais para explicar as anormalidades
cerebrais associadas à eclâmpsia. A disfunção da célula endotelial que caracteriza a pré-eclâmpsia provavelmente
desempenha um papel primordial em ambas. A primeira teoria sugere que, em resposta à hipertensão grave e
aguda, a super-regulação vascular cerebral leva ao vasospasmo (Trommer, 1988). Nesse esquema, formula-se a
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https://jigsaw.minhabiblioteca.com.br/books/9786558040064/epub/OEBPS/Text/chap40.xhtml#fig40-10
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hipótese de que o menor fluxo sanguíneo cerebral resulte em isquemia, edema citotóxico e, mais adiante, infarto
tecidual. Há poucas evidências objetivas sustentando este mecanismo.
A segunda teoria é que as súbitas elevações na pressão arterial sistêmica excedem a capacidade autorreguladora
cerebrovascular normal (Hauser, 1988; Schwartz, 2000). Desenvolvem-se regiões de vasodilatação e
vasoconstrição forçada, principalmente nas zonas limítrofes arteriais. No nível capilar, o distúrbio da pressão
capilar final provoca aumento da pressão hidrostática, hiperperfusão, bem como extravasamento de plasma e
eritrócitos por meio de aberturas nas junções compactas endoteliais. Isso leva a edema vasogênico. A recente
descrição de uma vasculatura linfática no sistema nervoso central confere credibilidade a essa teoria (Louveau,
2015).
O mecanismo mais provável é uma combinação das duas teorias. Assim, um vazamento celular interendotelial
associado à pré-eclâmpsia se desenvolve em níveis da pressão arterial (hidráulico) muito mais baixos do que
aqueles que geralmente causam edema vasogênico e está combinado a uma perda de autorregulação do limite
superior (Fugate, 2015; Zeeman, 2009). Nos exames de imagem, isso se manifesta como síndrome da encefalopatia
reversível posterior (Fig. 40-12) (Fugate, 2015; Hinchey, 1996). As lesões dessa síndrome envolvem
principalmente a parte posterior do encéfalo – córtex occipital e parietal. Porém, em pelo menos um terço dos
casos, outras áreas são envolvidas (Edlow, 2013; Zeeman, 2004a).
Fluxo sanguíneo cerebral
A autorregulação é o mecanismo pelo qual o fluxo sanguíneo cerebral permanece relativamente constante apesar
das alterações na pressão de perfusão cerebral. Deve-se lembrar que a pressão de perfusão cerebral é a diferença
entre a pressão arterial média e a pressão intracraniana. Nas mulheres não grávidas, essa autorregulação protege o
cérebro da hiperfusão quando as pressões arteriais médias aumentam para até 160 mmHg. Pressões altas como
essas só são observadas em algumas poucas mulheres com eclâmpsia. Dessa maneira, para explicar as convulsões
eclâmpticas, foi desenvolvida a teoria de que a autorregulação deve ser alterada pela gravidez. Estudos de Cipolla e
colaboradores (2007, 2009, 2015) mostraram de forma convincente que a autorregulação não se modifica durante a
gravidez em roedores. Porém, alguns pesquisadores forneceram evidência de comprometimento da autorregulação
em mulheres com pré-eclâmpsia (Janzarik, 2014; van Veen, 2013).
Zeeman e colaboradores (2003) mostraram que o fluxo sanguíneo cerebral durante os dois primeiros trimestres
da gravidez normal é similar aos valores fora da gestação. Contudo, durante o último trimestre, o fluxo diminui de
forma significativa em 20%. Esse grupo também encontrou maior fluxo sanguíneo cerebral nesse trimestre nos
casos de eclâmpsia grave em comparação com o mesmo período em mulheres gestantes normotensas (Zeeman,
2004b). Tomados em conjunto, esses achados sugerem que a eclâmpsia ocorre quando a hiperperfusão cerebral
força o líquido capilar no sentido intersticial por causa do dano endotelial. Esse vazamento leva ao edema
perivascular característico da síndrome de pré-eclâmpsia.
Manifestações neurológicas
Várias manifestações neurológicas caracterizam a síndrome da pré-eclâmpsia. Todas indicam envolvimento grave e
requerem atenção imediata.
Acredita-se que a cefaleia e os escotomas se originem da hiperperfusão cerebrovascular que tem uma
predileção pelos lobos occipitais. Até 75% das mulheres apresentam cefaleia, e 20 a 30% exibem alterações visuais
que antecedem as convulsões eclâmpticas (Sibai, 2005; Zwart, 2008). A cefaleia pode ser leve a grave e
intermitente a constante. Em nossas experiências, elas são singulares pelo fato de que, em geral, não respondem à
analgesia tradicional, mas frequentemente melhoram após a infusão de sulfato de magnésio.
As convulsões são diagnósticas de eclâmpsia. Elas são causadas pela excessiva liberação de neurotransmissores
excitatórios, principalmente glutamato, despolarização massiva dos neurônios em rede e surtos de potenciais de
ação (Meldrum, 2002). As evidências clínicas e experimentais sugerem que as convulsões estendidas podem
provocar lesão cerebral significativa e, posteriormente, disfunção cerebral.
A cegueira é rara com a pré-eclâmpsia isolada, mas ela complica as convulsões eclâmpticas em até 15% das
mulheres (Cunningham, 1995). A cegueira pode se desenvolver em até 7 dias ou mais após o parto (Chambers,
2004). Existem pelo menos dois tipos de cegueira, conforme discutido adiante.
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O edema cerebral generalizado pode ocorrer e geralmente se manifesta por alterações no estado mental que
variam de confusão a coma. Essa situação é particularmente perigosa porque o resultado pode ser uma herniação
transtentorial.
Por fim, as mulheres com eclâmpsia mostraram algum declínio cognitivo quando estudadas 5 a 10 anos após
uma gravidez eclâmptica. Isso é discutido com mais detalhes na última seção.
Exames de neuroimagem
Com a TC, as lesões hipodensas localizadas na junção das substâncias cinzenta e branca, principalmente nos lobos
parieto-occipitais, são encontradas na eclâmpsia. Essas lesões também podem ser observadas nos lobos frontal e
temporal inferior, gânglios da base e tálamo (Brown, 1988). Essas áreas hipodensas correspondem a hemorragias
petequiais e edema local. O edema dos lobos occipitais ou o edema cerebral difuso podem criar sintomas como
cegueira, letargia e confusão (Cunningham, 2000). O edema generalizado pode mostrar-se como acentuada
compressão ou mesmo obliteração dos ventrículos cerebrais. Tais mulheres podem desenvolver sinais de herniação
transtentorial iminente com risco de morte.
Várias imagens de RM são usadas para estudar as mulheres eclâmpticas. Os achados comuns são lesões
hiperintensas em T2 (síndrome de encefalopatia posterior reversível [PRES, posterior reversible encephalopathy
syndrome]) nas regiões subcortical e cortical dos lobos parietal e occipital (ver Fig. 40-12). Além disso, gânglios da
base, tronco encefálico e cerebelo são comumente envolvidos (Brewer, 2013; Zeeman, 2004a). Novamente, essas
lesões representam edema cerebral focal. Embora essas lesões PRES sejam quase universais nas mulheres com
eclâmpsia, sua incidência nas mulheres com pré-eclâmpsia é de cerca de 20% (Mayama, 2016). Essas lesões mais
provavelmente são encontradas em mulheres que apresentam doença grave e que têm sintomas neurológicos.Embora costumem ser reversíveis, 25% dessas lesões hiperintensas representam infartos cerebrais que exibem
achados persistentes (Loureiro, 2003; Zeeman, 2004a).
Alterações visuais e cegueira
Escotomas, visão embaçada ou diplopia são comuns com a pré-eclâmpsia grave e eclâmpsia. Elas geralmente
melhoram com a terapia de sulfato de magnésio e/ou diminuição da pressão arterial. A cegueira é menos comum,
em geral é reversível e pode surgir a partir de três áreas potenciais. Estas são o córtex visual do lobo occipital, os
núcleos geniculados laterais e a retina. Na retina, as lesões patológicas podem ser isquemia, infarto ou
descolamento (Handor, 2014; Roos, 2012).
A cegueira occipital é também chamada amaurose, do grego diminuição. Nos exames de imagem, as mulheres
afetadas apresentam evidência de extenso edema vasogênico do lobo occipital. Entre 15 mulheres tratadas no
Parkland Hospital, a cegueira durou de 4 horas a 8 dias, mas melhorou por completo em todos os casos
(Cunningham, 1995). Raramente, os infartos cerebrais extensos podem resultar em defeitos visuais totais ou
parciais.
A cegueira proveniente de lesões na retina é causada por descolamento seroso de retina ou, raramente, pelo
infarto da retina, que é chamado retinopatia de Purtscher (Fig. 40-13). O descolamento seroso da retina em geral é
unilateral e raramente causa perda total da visão. Na verdade, o descolamento seroso da retina assintomático é
relativamente comum na pré-eclâmpsia (Saito, 1998). Na maioria dos casos de cegueira associada a eclâmpsia, a
acuidade visual subsequente melhora. Porém, se a cegueira for causada por oclusão de artéria da retina, a visão
pode ser permanentemente prejudicada (Lara-Torre, 2002; Moseman, 2002; Roos, 2012).
Edema cerebral
As manifestações clínicas sugestivas do edema cerebral disseminado são preocupantes. Durante um período de 13
anos, 10 das 175 mulheres (6%) com eclâmpsia no Parkland Hospital foram diagnosticadas com edema cerebral
sintomático (Cunningham, 2000). Os sintomas variaram de letargia, confusão e visão embaçada a obnubilação e
coma. Na maioria dos casos, os sintomas aparecem e diminuem. Geralmente, as alterações do estado mental
correlacionam-se ao grau de envolvimento observado com os exames de TC e RM. Essas mulheres são
extremamente suscetíveis a súbitas e graves elevações da pressão arterial, que podem piorar agudamente o já
disseminado edema vasogênico. Assim, é fundamental o controle cuidadoso da pressão arterial. Das 10 mulheres
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com edema generalizado, três mostravam-se comatosas e tinham achados de imagem de herniação transtentorial
iminente, da qual uma delas morreu. Deve-se considerar o tratamento com manitol ou dexametasona.
■ Perfusão uteroplacentária
A perfusão uteroplacentária comprometida é quase certamente um importante responsável pelas maiores taxas de
morbidade e mortalidade vistas na pré-eclâmpsia (Harmon, 2015). Os defeitos na invasão trofoblástica
endovascular na pré-eclâmpsia foram discutidos anteriormente. Dessa maneira, a medição dos fluxos sanguíneos
placentário, interviloso e uterino provavelmente pode fornecer informações. As tentativas de avaliá-los em seres
humanos foram dificultadas por vários obstáculos que incluem a falta de acessibilidade da placenta, complexidade
de seu efluente venoso e necessidade de técnicas com radioisótopos ou invasivas inadequadas à pesquisa em seres
humanos.
A medição da velocidade do fluxo sanguíneo da artéria uterina foi utilizada para estimar a resistência ao fluxo
sanguíneo uteroplacentário (Cap. 17). Estima-se a resistência vascular comparando as formas de onda da
velocidade arterial sistólica e diastólica. Ao término da placentação, a impedância do fluxo arterial da artéria
uterina é acentuadamente diminuída, mas, com a placentação anormal, a resistência anormalmente alta persiste
(Everett, 2012; Ghidini, 2008; Napolitano, 2012). Estudos iniciais foram feitos para medir as razões das
velocidades de pico sistólica/diastólica a partir das artérias uterina e umbilical nas gestações pré-eclâmpticas. Em
alguns casos, mas certamente não em todos, havia maior resistência (Fleischer, 1986; Trudinger, 1990).
Outra forma de onda Doppler – “incisura” da artéria uterina – foi associada a maiores riscos de pré-eclâmpsia
ou restrição do crescimento fetal (Groom, 2009). No estudo da MFMU Network relatado por Myatt e colaboradores
(2012a), contudo, a incisura tinha um valor preditivo baixo, exceto na doença grave de início precoce.
A resistência nas artérias espiraladas uterinas também foi medida. A impedância era mais elevada nos vasos
periféricos que nos centrais, o que foi denominado distribuição “semelhante a anel” (Matijevic, 1999). Os valores
médios de resistência foram mais elevados em todas as mulheres com pré-eclâmpsia em comparação com as
controles normotensas. Um estudo utilizou a RM e outras técnicas para avaliar a perfusão placentária ex vivo nas
artérias miometriais removidas de mulheres com pré-eclâmpsia ou restrição do crescimento fetal (Ong, 2003). Em
ambas as patologias, as artérias do miométrio exibiam resposta vasodilatadora dependente do endotélio. Além
disso, outras condições de gravidez também estão associadas ao aumento da resistência (Urban, 2007). Um efeito
adverso importante, a restrição de crescimento fetal, é abordada no Capítulo 44.
de Almeida Pimenta e colaboradores (2014) avaliaram a vascularidade placentária usando um histograma de
power Doppler tridimensional e descreveram um índice de vascularização placentária. Esse índice estava
diminuído nas mulheres com qualquer distúrbio hipertensivo associados à gravidez – 11,1% comparados a 15,2%
em controles normais.
Apesar desses achados, a evidência de circulação uteroplacentária comprometida é encontrada em apenas uma
minoria das mulheres que desenvolvem pré-eclâmpsia. Na realidade, quando a pré-eclâmpsia ocorre durante o
terceiro trimestre, apenas um terço das mulheres com doença grave apresentam velocimetria da artéria uterina
anormal (Li, 2005). Em um estudo de 50 mulheres com síndrome HELLP, apenas um terço tinham formas de onda
anormais da artéria uterina (Bush, 2001). Em geral, a extensão das formas de onda anormais correlaciona-se com a
gravidade do envolvimento fetal (Ghidini, 2008; Groom, 2009).
ECLÂMPSIA
A pré-eclâmpsia complicada por convulsões tônico-clônicas generalizadas aumenta consideravelmente o risco para
a mãe e o feto. Em um relato anterior, Mattar e Sibai (2000) descreveram os resultados em 399 mulheres
consecutivas com eclâmpsia desde 1977 até 1998. As principais complicações maternas foram descolamento
prematuro de placenta, 10%, déficits neurológicos, 7%, pneumonia por aspiração, 7%, edema pulmonar, 5%,
parada cardiopulmonar, 4%, e insuficiência renal aguda, 4%. Além disso, 1% dessas mulheres morreram. Vários
relatos subsequentes também descreveram taxas excessivas de morbidade e mortalidade maternas com a eclâmpsia,
que também incluíram síndrome HELLP, embolia pulmonar e AVC (Andersgaard, 2006; Knight, 2007). Nos Países
https://jigsaw.minhabiblioteca.com.br/books/9786558040064/epub/OEBPS/Text/chap17.xhtml
https://jigsaw.minhabiblioteca.com.br/books/9786558040064/epub/OEBPS/Text/chap44.xhtml
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Baixos, houve três mortes maternas entre 222 mulheres eclâmpticas (Zwart, 2008). Dados da Irlanda e da Austrália
são semelhantes (O’Connor, 2013; Thornton, 2013). Em perspectiva, isso é um aumento de 1.000 vezes em relação
às taxas de morte materna para esses países.
Quase sem exceção, a pré-eclâmpsia precede o início das convulsões, porém isso às vezes passa despercebido.
A eclâmpsia é mais comum no último trimestre e torna-se cada vez mais frequente à medida que o termo se
aproxima.Nos últimos anos, a incidência de eclâmpsia pós-parto diminuiu, presumivelmente relacionado a melhor
acesso ao cuidado pré-natal, detecção mais precoce de pré-eclâmpsia anteparto e uso profilático de sulfato de
magnésio (Chames, 2002). Outros diagnósticos devem ser considerados nas mulheres com o início de convulsões
em mais de 48 horas de pós-parto ou naquelas com déficits neurológicos focais, coma prolongado ou eclâmpsia
atípica (Sibai, 2012).
■ Achados clínicos na eclâmpsia
As convulsões eclâmpticas podem ser violentas, e a mulher deve ser protegida, principalmente a sua via aérea. Os
movimentos musculares são tão vigorosos que a mulher pode ser arremessada para fora do leito, e, quando não
protegida, sua língua é mordida pela violenta ação da mandíbula (Fig. 40-16). Essa fase, em que os músculos se
contraem e relaxam de maneira alternada, pode durar aproximadamente 1 minuto. De modo gradual, os
movimentos musculares tornam-se menores e menos frequentes, com a mulher ficando, por fim, imóvel.
Depois de uma convulsão, a mulher se encontra em estado pós-ictal, mas, em algumas, há o estabelecimento de
coma de duração variável. Quando as convulsões são infrequentes, a mulher costuma recuperar algum grau de
consciência depois de cada crise. Quando desperta, pode se estabelecer um estado combativo semiconsciente. Nos
casos graves, o coma persiste de uma convulsão para outra, podendo resultar em morte. Em casos raros, uma única
convulsão pode ser seguida por coma, do qual a mulher pode nunca retornar. No entanto, como regra, a morte não
ocorre até depois de convulsões frequentes. Por fim, as convulsões podem raramente continuar sem diminuir –
estado de mal epiléptico –, requerendo sedação profunda e até mesmo anestesia geral para prevenir encefalopatia
anóxica.
A frequência respiratória depois de uma convulsão eclâmptica costuma aumentar, podendo atingir 50 ou mais
por minuto em resposta a hipercarbia, acidose láctica e hipoxia transitória. A cianose pode ser observada nos casos
graves. A febre alta é um sinal de gravidade, porque provavelmente resulta da hemorragia cerebrovascular.
A proteinúria está geralmente presente, conforme discutido anteriormente. O débito urinário pode diminuir de
maneira apreciável, e por vezes desenvolve-se anúria. Pode haver hemoglobinúria, mas a hemoglobinemia é rara.
Em geral, o edema facial e periférico é pronunciado, mas pode estar ausente (Fig. 40-17).
Da mesma forma que na pré-eclâmpsia grave, depois do parto um aumento no débito urinário costuma ser um
sinal precoce da melhora. No caso de disfunção renal, os níveis séricos de creatinina são monitorados de forma
seriada. A proteinúria e o edema costumam desaparecer 1 semana após o parto. Na maioria dos casos, a pressão
arterial volta ao normal em alguns dias a 2 semanas depois do parto (Berks, 2009). Como discutido adiante, a
hipertensão grave e persistente provavelmente é preditora de doença vascular crônica subjacente (Podymow, 2010).
Na eclâmpsia anteparto, o trabalho de parto pode começar de forma espontânea, logo depois que se estabelecem
as convulsões, podendo progredir com rapidez. Quando a convulsão acontece durante o trabalho de parto, as
contrações podem aumentar em frequência e intensidade, podendo a duração do trabalho de parto ser encurtada.
Por causa da hipoxemia e acidose láctica materna causadas pelas convulsões, comumente a bradicardia fetal surge
após uma convulsão (Fig. 40-18). A frequência cardíaca fetal geralmente melhora dentro de 2 a 10 minutos
(Ambia, 2018). Quando ela persiste por mais que 10 minutos, outra causa de bradicardia, como o descolamento
prematuro de placenta ou parto iminente, deve ser considerada.
O edema pulmonar pode ocorrer logo após as convulsões eclâmpticas ou até várias horas mais tarde. Ele
costuma ser causado por pneumonite por aspiração em decorrência da inalação de conteúdo gástrico durante o
vômito que, com frequência, acompanha as convulsões. Em algumas dessas mulheres, o edema pulmonar pode ser
causado por insuficiência ventricular por aumento da pós-carga resultante da hipertensão grave. O edema pulmonar
e a hipertensão podem piorar ainda mais devido à administração de líquidos intravenosos (Dennis, 2012b). Esse
edema pulmonar decorrente da insuficiência ventricular é mais comum nas mulheres com obesidade mórbida e
naquelas com hipertensão crônica anteriormente despercebida.
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Por vezes, a morte súbita acontece de forma sincrônica com uma convulsão eclâmptica ou logo depois dela. Em
tais casos, a morte resulta mais frequentemente de hemorragia cerebral massiva (ver Fig. 40-10). A hemiplegia
pode resultar de hemorragia subletal. As hemorragias cerebrais são mais prováveis em mulheres com mais idade
com hipertensão crônica subjacente.
Em cerca de 10% das mulheres eclâmpticas, algum grau de cegueira se segue a uma convulsão. As causas de
cegueira ou de comprometimento da visão foram discutidas anteriormente. A cegueira com pré-eclâmpsia grave
sem convulsões geralmente se deve ao descolamento de retina (Vigil-De Gracia, 2011). Em contrapartida, a
cegueira com eclâmpsia tipicamente decorre de edema do lobo occipital (Cunningham, 1995). Em ambos os casos,
contudo, o prognóstico para a volta da função normal é bom, e geralmente se completa em 1 a 2 semanas de
pós-parto.
Até 5% das mulheres com eclâmpsia têm alteração da consciência significativa, incluindo coma persistente,
após uma convulsão. Isso se deve ao extenso edema cerebral, e a herniação transtentorial associada pode provocar
morte.
Raras vezes, a eclâmpsia é seguida por psicose e a mulher torna-se violenta. Isso pode durar vários dias a até 2
semanas. O prognóstico para o retorno à função normal é bom, desde que não haja doença mental prévia. Supõe-se
que seja similar à psicose pós-parto, discutida em detalhes no Capítulo 61. Os medicamentos antipsicóticos
mostraram-se efetivos nos poucos casos de psicose pós-eclâmpsia tratados no Parkland Hospital.
Geralmente, é mais provável que a eclâmpsia seja diagnosticada com frequência excessiva em vez de passar
despercebida. Epilepsia, encefalite, meningite, tumor cerebral, neurocisticercose, embolia de líquido amniótico,
cefalalgia pós-punção dural e ruptura de aneurisma cerebral durante o final da gravidez ou no puerpério podem
simular eclâmpsia. No entanto, até que essas outras causas sejam excluídas, todas as mulheres grávidas com
convulsões devem ser consideradas portadoras de eclâmpsia.
INCIDÊNCIA E FATORES DE RISCO
As mulheres jovens e nulíparas são particularmente vulneráveis a desenvolver pré-eclâmpsia, enquanto mulheres
mais velhas têm maior risco de hipertensão crônica com pré-eclâmpsia sobreposta. Da mesma forma, a incidência é
acentuadamente influenciada pela raça e etnia, bem como pela predisposição genética. Em um estudo da
Maternal-Fetal Medicine Units (MFMU) Network, a incidência de pré-eclâmpsia foi de 5% em mulheres brancas,
9% em hispânicas e 11% em afro-americanas (Myatt, 2012a,b). Além disso, as mulheres negras têm maior
morbidade (Shahul, 2015). Em diversos estudos mundiais revistos por Staff e colaboradores (2015), a incidência de
pré-eclâmpsia nas populações nulíparas variou de 3 a 10%. A incidência de pré-eclâmpsia em multíparas também
varia de 1,4 a 4% (Fisher, 2015).
Bartsch e colaboradores (2016) extraíram dados de mais de 25 milhões de gestações e calcularam os riscos
relativos dos vários fatores de risco mostrados na Tabela 40-3. Outros incluem a síndrome metabólica e a
hiper-homocisteinemia (Karumanchi, 2016a; Masoudian, 2016; Scholten, 2013). As gestações com feto masculino
também têm risco discretamente elevado (Jaskolka, 2017). Embora o tabagismo durante a gravidez

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