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TRANSEXUALIDADE E O DIREITO DE MUDAR - MARIA BERENICE

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BEREKICE DIAS 
 
6:a edição reformulada da obra 
União hom- °afetiva: o preconceito e a justiça 
 
266 I nomoArErivi DAM II OS ~tinos In311 
Nesta hipótese impõe-se Ou a suspensão do inventílrio até ue seja declarada 
a existência da união ou a reserva de bens. Quer em uin caso, querem outro:cabe 
a concessão de medidas acautelatórias para tornar os bens indisponíveis 3. . 
Se o parceiro busca o reconhecimento da união como único herdeiro, fazendo' 
jus à integralidade do acervo sucessório, o inventário precisa ficar suspenso.. 
No entanto, havendo herdeiros necessários que ocupem posição prevalênte^ 
na ordem sucessória - descendentes ou ascendentes - basta a reserva de bens. O 
inventário pode prosseguir. Depois de julgada a demanda, são divididos os bens, 
reservados. E, caso o inventário já tenha acabado, os bens que haviam sido reser-
vados serão alvo de sobrepartilha.38 
Quando a ação de reconhecimento da união homoafetiva é proposta depois 
de ultimado o inventário, deve ser cumulada com ação de petição de herança. 
Acolhida a demanda, a partilha levada a efeito é desconstituída, para que seja 
contemplado o convivente. 
equilibrar o poder dos litigantes nas ações que visam reconhecer o estabelecimento das 
uniões estáveis hornoafetivas, cabe analisar o art. 100, I, do CPC conforme a Consti-
tuição Federal para que seja interpretado à luz do princípio da isonomia, aplicando-o 
também na fixação de competência das ações de reconhecimento de união estável entre 
pessoas do mesmo sexo. 5. Atualmente, tendo sido conferido às uniões homoafetivas 
os mesmos direitos dos relacionamentos heteroaferivos, também deve ser garantido aos 
envolvidos em relacionamentos familiares de pessoas do mesmo sexo, o foro privilegiado 
conferido à parte mais vulnerável financeira ou juridicamente nessas relações, quando, 
examinando cada caso concreto, de fato, verificar-se que a pretensão da parte menos 
favorecida ficará manifestamente prejudicada caso tenha que litigar em local diferente 
da sua residência. 6. Na hipótese, tendo em vista que o aludido consorte sobrevivente 
se mostrou vulnerável, financeira e juridicamente, mormente em caso de remessa dos 
autos à Comarca do interior do pais, levando-se em consideração ainda os princípios 
da celeridade e da economia processuais, haja vista que, as provas do relacionamento, 
aparentemente, deverão ser colhidas no Distrito Federal, local da última residência dos 
supostos companheiros, data venha o entendimento do eminente juiz de primeiro grau, 
a ação de reconhecimento de união estável homoafetiva post mortem deve permanecer 
no juízo de origem, privilegiando a regra do art. 100,1. do CPC, em ordem ao princípio 
constitucional da isonomia, a fim de garantir o equilíbrio entre as partes. 7. Recurso 
conhecido e provido. Decisão reformada. (TJ DF, Rec. 2013.00.2.019467-8, Ac. 748.333, 
P T. Civ., Rel. Des. Alfeu Machado, p. 15/01/2014). 
Ação declaratória e constitutiva incidental em autos de inventário. Pretensão de reco-
nhecimento da existência de união homoafetiva entre a autora e a inventariada. Pedido 
de antecipação da tutela para determinar a expedição de ofícios para bloqueio de bens e 
outras providências. Indeferimento pela julgadora singular. Recurso conhecido e pro-
vido em parte, para o parcial atendimento dos pleitos formulados pela autora (TJPR, AI 
.404.392-7, 1-1 C. Cív„ Rel: Des. Mário 'Rau, j. 01/08/2007). 
Maria Berêniee Dias; Manual das sucessões, .81 
15 
TRANSEXUALIDADE E O DIREITO DE MUDAR 
SumÁRio: 15.1 Feminino ou masculino? - 15.2 Pessoas trans - 15.3 Troca de 
sexo? - 15.4 Questões éticas e lega is - 15.5 A despatologização da identidade 
trans - 15.6 Alteração do nome e da identidade de gênero - 15.7 Nome social 
- 15.8 Um homem que todos veem e uma mulher que não existe - 15.9 Avan- 
ços e retrocessos - 15.10 Ação cabível e foro competente - 15.11 O direito ao 
sigilo - 15.12 A possibilidade de casar - 15.13 A omissão da verdade - 15.14 
O transexual casado- 15.15 Reflexos na prole. 
15.1 Feminino ou masculino? 
Menino ou menina? Homem ou mulher? Sempre é esta a primeira pergunta 
feita, seja quando do nascimento, seja depois de um exame de ultrassonografia. 
A identificação do indivíduo como pertencente a um ou a outro sexo é feita-
segundo o aspecto da genitália externa. De acordo com o tipo genital revelado 
aos olhos, será a criança considerada menino ou menina e assim será designada, 
no momento de ser efetuado seu registro de nascimento.' Mas essa constatação 
não ultrapassa as fronteiras de uma observação anatõmica.' A determinação 
da identidade sexual decorre de critério morfológico, e o papel do gênero se 
apresenta como expressão pública dessa identidade. O atestado de nascimento 
é, dessa forma, um registro do ingresso da pessoa no universo jurídico, disposto 
a conferir segurança e estabilidade nas relações jurídicas. O registro civil exerce; 
nesse plano, uma chancela normalmente imodificável, que marca o indivíduo 
em sua vida social'. É um sinal uniforme e monolítico, incapaz de compreendera 
pluralidade psicossomática das pessoas.' 
Existe a falsa crença de que o sexo civil ou jurídico deve espelhar e coincidir 
como sexo vivido socialmente pela pessoa e, por isso, não admite anibiguiáades.4 
: 
Elimar Szaniawski, Limites e possibilidades do direito de redesignação do estado sexual, 35. 
José Francisco Oliosi da Silveira, O transexualismo na justiça, 30. 
Luiz Edson Fachin, Aspectos jurídicos da união..., 47. 
El imar Szaniawski, Homossexualidade: um lugar na história..., 264. 
208 I 110MOAFETIVIDADE E OS DIREITOS 1,01,11 
O homem só pode ser assim denominado por possuir um pènls, e a mulher, uma 
vagina. Por isso, a sociedade adota o critério do sexo morfológico para a divisão 
da espécie humana nos polos homem e mulher. 
A Medicina admite ser o sexo uma conjugação de elementos que devem 
manter harmonia entre si, sendo eles o elemento biológico, o psicológico e o 
comportamento] do indivíduo. Logo, para o diagnóstico completo e exato da 
sexualidade, importante atentar ao aspecto plurivetorial: o sexo biológico 
(formado pelo sexo morfológico, sexo genético e sexo endócrino), o sexo psíquico 
co sexo civil.' 
Para a Medicina Legal, não se pode mais considerar o conceito de sexo 
fora de uma apreciação plurivetorial, resultante de fatores genéticos, somáticos, 
psicológicos e sociais.° 
A Psicologia define a sexualidade humana como uma combinação de 
vários elementos: o sexo biológico (o sexo que se tem): as pessoas por quem se 
sente desejo (a orientação sexual); a identidade sexual (quem se acha que é); co 
comportamento ou papel sexual. Como os fatos acabam se impondo ao Direito, a 
rigidez do registro identificatório da sexualidade não pode deixar de curvar-se à 
pluralidade psicossomática do ser humano. 
15.2 Pessoas trans 
A expressão pessoa trans é a mais bem aceita na atualidade pelospesquisadores 
de género e sexualidade, por funcionar como um termo "guarda-chuva": 
Incluem-se ai travestis e transexuais, bem como todos aqueles cuja expressão de 
gênero esteja de algum modo em trânsito, ou seja, diverso do sexo anatõmico. 
Tradicionalmente sempre se definiu o transexual como a pessoa que 
sofre uma dissociação entre o sexo físico e o sexo psíquico, dissociação definida 
tecnicamente como disforia de gênero. Em face da certeza de ter nascido no corpo 
errado, tem ojeriza a seu órgão sexual biológico, desejando realizar urna cirurgia de 
mudança de sexo — cirurgia de transgenitalização — e não querendo que as pessoas 
saibam que se trata de um transexual. Contudo, atualmente, muitos transexuais não 
desejam realizar a cirurgia, ainda que não sintam prazer sexual não sentem repulsa 
por seus órgãos genitais.' 
Não há como confundir transexuais com travestis e intersexuais. As travestis, 
ainda qu e tenham uma iden tidade com osexo opos to— do masculino para o feminino 
Márcia Maria Menin, Um novo nome, uma nova identidade sexual..., 17. 
Antonio Chaves, Direito à vida eao próprio corpo, 33. 
Paulo Roberto lotti Vecchiatti, Manual da homoafetividade, 83. 
ittmwatintannott 110 ntaatmou mutwitt 1 2i.+9 
e adquiram todas as cartum ertsticas femininas, mantêm a funeionalidade ,tios 
órgãos sexuais. Os intersexuais, que eram-chamados de hertnafroditas,- 
com características genitais de mais deuni sexo. 	 . 
A tranSexualidade é uma divergência entre o estado psicológico de'gêner4..-:-
características físicas e morfológicas perfeitas que associam o indivíduo ao gêneitei 
oposto .8 Caracteriza-se por um forte conflito entre o corpo e a identidade degênet6 
e compreende um arraigado desejo de adequar— hormonal ou cirurgicamente 
corpo ao gênero almejado.° Existe uma ruptura entre o corpo e a mente, o transexual 
sente-se como se tivesse nascido no corpo errado, como se esse corpo fosse um 
castigo ou mesmo uma patologia congênita. O transexual se considera pertencente 
ao sexo oposto, entalhado com o aparelho sexual errado, o qual quer ardentemente' 
erradicar. Enquanto o homossexual aceita seu sexo biológico, o transexual rejeita 
seu próprio sexo anatõmico. O transexual masculino tem ego corporal e psíquico 
femininos. Com o transexual feminino, ocorre o contrário.' 
A definição de sexo como um atributo de ordem cromossennica imutável 
ou corno a presença ou não de cena genitália — fere a autonomia do transexual 
afronta odirei to à intimidade que integra os direitos da personalidade, cuja tutela 
é uma função inderrogável do Estado. É o direito à intimidade que possibilita 
que o indivíduo, em prol da construção de sua identidade sexual, disponha até 
certo ponto de seu próprio corpo, em conformidade com sua intimidade, isto 
é, a vida que escolheu para si, sua vida construída voluntariamente. As pessoas 
transexuais e travestis têm sua sexualidade constitucionalmente tutelada, pois 
gozam do direito à identidade, à dignidade (CF 1.0 111), à igualdade (CF 5.0 I), 
cidadania (CF 1 .0 11) e à privacidade (CF 5.0 X). Mais que colocá-las à prova sobiè 
a posse ou não de genitália tida como adequada, o Estado tem o dever de protegé-
Ias contra os outros e mesmo contra a própria ingerência. 
As pessoas trans sofreram marginalizações múltiplas, sem recursos e 
tampouco familiaridade com instituições civis, e restam mais uma vez à margeni 
do Estado. Muitos abandonam a escola, não frequentam hospitais, não fazem 
carteira de identidade e evitam se socorrer dos órgãos públicos pelo medo de Serem 
tratados com desrespeito à sua identidade e expressão de gênero. Preconceitás, 
discriminações e violências homofóbicas se agravam sensivelmente em relaçãó 
a travestis e transexuais. Sem poderem se conformar à "pedagogia do armário", 
ficam sujeitos às piores formas de desprezo, abuso e violência. Seus direito S são 
sistematicamente negados e violados, sob a indiferença geral. 
Leandro Lopes Pontes Paraense, Direito à identidade sexual..., 148. 
Tereza Rodrigues Vieira, Transexualidade, 412. 
Tereza Rodrigues Vieira, Nome e sexo..., 221. 
Marco Aurélio Máximo Prado e Rogério Diniilútegieira,Homofobia, hierarquização e 
humilhação social, 61. 
110M0Allil IVIDADE OS Dtnertosi.ram 
São as maiores-vítimas 'do ballying homofóbico. 	'do acolhimento 
;letivo, em face das -suas experiências de expulsão e abandono per parte cid' 
ámiliares -aniigos, as travestis são alvo de violência per parte de vizinhok-
:onlpecidos;deScenhecidos einstituições. Com suas basesemocionais fragilizadas- , 
ravestis e transexuais na escola têm que encontrar forças para lidar como estigma 
t a discriminação sistemática e ostensiva. Expostas a experiências de chacota,e 
iumilhação e a contínuos processos de exclusão, segregação e guetização, são 
trrastadas por uma rede de exclusão." 
Desfeita a correlação presumida entre sexo e gênero, necessário- o 
tconhecimento identitário do cidadão por meio do ajuste do nome ao gênero 
:orrespenden te. A escolh a ea determinação d e um nomepressu põ em co n fonn idade 
;exo-genérica, ou seja, de que a criança que nasceu com sexo feminino terá uni. 
;ênero feminino pelo qual será reconhecida socialmente. A partir do instante em 
lue essa pressuposição não se concretiza, imperativo que se reajuste o nome à real 
dentidade de gênero. 
A necessidade de propor urna ação em juízo para a mudança registrai do. 
leme atinge a parcela mais vulnerável da população LGBTI, não somente por sua 
liversa condição sexo-genérica, mas também por sua situação socioeconômica. 
)everia ser suficiente que o pedido de troca do nome e da identidade de gênero 
'osse feita em sede administrativa, perante simples requerimento junto ao 
:anon° do Registro Civil onde reside. 
O Estatuto da Diversidade Sexual garante um maior número de direitos às 
Pessoas trans (arts. 33 a 45). 
Assegura acesso à hormonioterapia e outras técnicas não irreversíveis a partir 
los 14 anos de idade, desde que haja indicação terapêutica (art. 37), sendo que as 
rurgias de redesignação sexual podem ser levadas a efeito ao ser atingida a idade 
le 18 anos (art. 38). 
É garantida a retificação do nome e da identidade sexual, independentemente 
ie realização da cirurgia de transgenitalização (art. 39). O pedido de retificação é 
:^cito diretamente junto ao registro civil sem a necessidade de ação judicial (art. 40). 
A. dispensa do serviço militar também depende de simples requerimento (art. 42). 
É proibido o oferecimento de tratamento de. reversão da orientação sexual 
ali identidade de gênero, bem corno fazer promessas de cura (art. 53). 
assegurado direito ao nome Sociái - desde 	ensino fundamental à 
tniversidade, mediante simples requerimento do próprio aluno, não havendo 
TRANSEXUALIDADU II O DIREITO MI MUDAR 	271 
necessidade de o pedido..ser feito bu ratificado peloá' pais owresponsáveris se á 
estudante,fer Menor de idade Ou incapaz. Este direito é garantido em tádos ;:ps 
assentamentos acadêmicos e nas listas de freqtiên cia,(art: 65). 
OEstatutotambémgaranteousodasclependêneiaseinstalaçõescorres-pondentes 
à identidade de gênero em todos os espaços públicos e aberto ao público (art. 45). Do 
mesmo modo garante quotas para o acesso ao mercado de trabalho (art. 73). 
15.3 Troca- de sexo? 
Apesar de dizer com um punhado de direitos fundamentais ligados à própria 
personalidade do indivíduo, os aspectos legais da identidade de gênero ainda 
carecem de regulamentação. A concepção do masculino e do feminino não são 
determinadas pelo corpo biologico.'2 A incoincidência entre o sexo anatômico 
e o psicológico gera problemas de diversas ordens. Além de profundo conflito 
individual, há repercussões nas áreas médica e jurídica, pois o transexual tem 
a sensação de que a biologia se equivocou com relação a ele.° Ainda que reúna 
em seu corpo todos os caracteres orgânicos de um dos sexos, seu psiquismo 
pende, irresistivelmente, ao sexo oposto. Mesmo sendo aparentemente "normal", - 
nutre profundo inconformismo com o seu sexo biológico. O intenso desejo de 
modificá-lo leva à busca de adequar a externalidade à sua alma. O processo de 
redesignação começa com o vestir-se como o outro sexo, passa por tratamento 
hormonal e terapêutico e ultima com a realização de inúmeras cirurgias. Não é um 
processo passageiro. É a busca consistente de integração física, emocional, social, 
espiritual e sexual, conquistada com muito esforço e sacrifícios por pessoas que 
vivem infelizes e muitas vezes depressivas quanto ao próprio sexo.14 
A hormonioterapia e as cirurgias de redesignação buscam apenas corrigir o 
que é considerado um "defeito": ter alguém nascido homem num corpo de mulher 
ou ter nascido mulher num corpo de homem.L5 Não se pode aceitar que a pessoa 
transexual fique totalmente desprotegida, ridicularizada em seu sofrimento e 
à margem da sociedade, sem possibilitar-lhe a alteração de seu nome e de seu 
sexo em virtude de um preconceito e de uma fobia social que, ao negar proteção 
aos seus direitos fundamentais, visa a punir a .pessoa-transexual por algo de que 
ela não tem culpa, poralgo que não é mera Opção, mas necessidade psicológica 
imutáve1.16 
Daniel Dall'Igna Ecker, Felipe Luckmann, Transexuais e travestis: gênero, censura e 
resistência. 
Silvia_ Morici, Homossexualidade: um lugar na história..., 169. 
Edvaldo Souza Couto, Transexualidade — O corpo em mutação, 20. 
Idem, 28: 
Silvia Vassilieff, Direito à adequação do nome ao novo estado pessoal..., 9. 
272 1 ticivammn vi !Mn A. h 05 biRRITOS traiu 
Quando a pessoa perde a-correspondência Mais comumente percdaida`entre 
carga cromossõmica-, genitálià e exteriorização de gênero, tal implica na unia 
alteração de sexo, em conformidade com as experiências vividas e a•exteriorização' 
de gênero. É incoerente e discriminatório pensar que a mesma inccinforrnidadé 
entre gênero e genitália seja vetada, sendo o transexual considerado uni homem 
falso. Todo indivíduo tem direito à proteção psicossomática da sua identidade 
sexual, adequando a identidade física à identidade psíquica. O sexo psíquico é 
imutável, ou seja, aquele sexo em que a pessoa sente verdadeiramente pertencer.-
Assim, deve o registro civil expressar esta adequação; pois a sexualidade e a 
identidade residem principalmente no cérebro." 
De um modo geral as "tentativas de psicoterapia aplicadas em transexuais 
são ineficazes, urna vez que ele não deseja adaptar seu sexo psíquico ao seu sexo 
biológico, mas o contrário. Também não darão certo terapias que objetivarem 
trazer equilíbrio emocional pela aceitação de sua condição pessoal." A proteção 
do transexual precisa resguardar o direito à intimidade, quando constatada sua 
situação e a dificuldade de vivenciá-la. Ele poderá, se assim o quiser, permanecer 
na ambiguidade de sua vida dupla, conflitiva e angustiante, conforme alerta Luiz 
Alberto David Araújo: Trata-se, então, de seu direito à intimidade, onde define sua 
orientação sexual. A opção por sua sexualidade é direito seu e encontra-se no campo 
do direito à intimidade.' 9 
Na Classificação Internacional das Doenças (CID-10), a transexualidade 
ainda é chamada de transexualismo (F64): Um desejo de viver e ser aceito corno um 
membro do sexo oposto, usualmente acompanhado por urna sensação de desconforto ou 
impropriedade dc seu próprio sexo anatômico e um desejo de submeter-se a tratamento 
honnonal e cirurgia para tornar seu corpo tão congruente quanto possível com o sexo 
preferido. 
O Manual Diagnóstico e Estatístico das Doenças Mentais (DSM-IV), que 
estabelece critérios de diagnóstico de transtornos mentais, assim descreve o que 
chama de Transtornos de Identidade de Gênero (COD. 302): A— Uma forte e 
persistente identificação com o gênero oposto (não um mero desejo de obter quaisquer . 
vantagensculturaisat ributdas aofato deserdo sexooposto);B—Desconfortopersistente 
com seu sexo ou sentimento de inadequação no papel de gênero deste sexo; C — A 
perturbação não é concomitante a unta condição intersexualfisica; D — A perturbação 
causa sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social ou 
ocupacional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. 
27. 	Tereza Rodriguez Vieira, Identidade Sexual: Aspectos éticos e jurídicos da adequação de 
prenome e sexo no registro civil, 187. 
; 	IA. Márcia Maria Menin, Um novo nome, uma nova identidade sexual..., 21. 
19. 	Luiz Alberto David Araújo, A proteção constitucional do transexual, 69. 
RANSMUA1,11)A1313 h O iSIREITO MUUAR I 27I 
Ainda que tais catálogos mantenham a identidade de gênero como transtorno 
mental não .se justifica continuar utilizando a expressão transeknalismo. 
linpositivo adotar o termo transexualidade para se começar areverter o perverso 
estigma de que são vítimas transexuais e travestis. 
A edição do DSM-V, que só chega ao Brasil em 2015, não mais classifica a 
transexualidade como transtorno mental ou transtorno de identidade de gênero. 
Passa a falar em disferia de gênero. 
Resolução do ConselhoFederalde Medicina20defineo transexualismo como: 
1) Desconforto com o sexo anatõmico natural; 2) Desejo expresso de eliminar 
os genitais, perder as características primárias e secundárias do próprio sexo e 
ganhar as do sexo oposto; 3) Permanência desses distúrbios de forma contínua e 
consistente por, rio mínimo, dois anos; 4) Ausência de outros transtornos mentais. 
Também os Princípios de Yogyakarta trazem o tema: compreende-se como 
identidade de gênero a profundamente sentida experiência interna e individual 
do gênero de cada pessoa, que pode ou não corresponder ao sexo atribuído no 
nascimento, incluindo o senso pessoal do corpo (que pode envolver, por livre 
escolha, modificação da aparência ou função corporal por meios médicos, 
cirúrgicos ou outros) e outras expressões de gênero, inclusive vestimenta, modo 
de falar e maneirismos. 
15.4 Questões éticas e legais 
Coma evolução das técnicas cirúrgicas, tornou-se p ossível muda r a morfologia 
sexual externa para encontrar a identificação da aparência com o gênero desejado. 
Os avanços no campo médico não foram acompanhados pela legislação, 
inexistindo qualquer previsão legal a esse respeito. A omissão regulamentadora 
acabou levando a classe médica a um problema ético-jurídico sobre a natureza das 
intervenções cirúrgicas e a possibilidade de sua realização. Mas os princípios da 
bioética não podem fazer com que a pessoa se torne refém do próprio corpo, ou 
melhor, que o corpo venha a ser um cativeiro para a pessoa." 
O IV Congresso Brasileiro de Medicina Legal, realizado em 1974, classificou 
corno mutuante, e não corretiva, a cirurgia para troca de sexo, concluindo que sua 
prática feria o Código de Ética Médica. 
Mereceu enorme destaque a condenação do cirurgião plástico Roberto 
Farina à pena de dois anos de reclusão pela, prática do delito de lesões corporais 
gravíssimos. Ele foi processado porque, em um Congresso de Urologia, realizado 
Resolução 1.955/2010, art. 3.° (íntegra no Anexo 111). 
Adriana Caldas Dabus Maluf, Novas modalidades de família..., 185. 
274 	itOMOAPIITIVIDADE E OS DIREITOS L.GBTI 
em 1975, exibiu o'filme de Uma-cirtitgia de .reversão e confessou que já a havi 
realizado em nove, pacientes.22 O lúcido parecer do jurista Heleno Cláucf 
Fragoso23 entendeu que. o réu atuou dentro dos limites do exercício regular d 
direito, não tendo praticado crime algum. Afirmou: a condenação revela a cargad 
reprovação moral própria do espírito conservador de certos magistrados. O extinto 
Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo, em 06/11/1979, acabou absolvend 
acusado, por decisão majoritária assim ementada: Não age dolosamente o 
médico que, através de cirurgia, faz a ablação de órgãos genitais externos de 
transexual, procurando curá-lo ou reduzir seu sofrimento físico ou mental 
Semelhante cirurgia não é vedada pela lei, nem pelo Código de Ética Médica." 
Afinal, não pode haver crime sem ofensa, lesão ou perigo concreto de lesão a uni 
bem jurídico. Faltaria lesividade para punir o médico que realizou a cirurgia." 
Não apenas pela lesão corporal, mas havia um impedimento formal para a• 
retirada de estruturas essenciais à função reprodutora. O Código de Ética Médica 
então em vigor (arts. 12 e 13) incluía tais procedimentos entre as práticas que 
ensejavam processos ético-disciplinares contra os médicos." O atual, não mais." 
Em face desta restrição, os interessados em se submeter à cirurgia passaram a 'sé 
socorrer da via judicial. Data do ano de 1980 o julgamento da Justiça gaúcha, 
deferindo pedido de alvará para a realização da cirurgia?' 
Depois de uma batalha judicial, o Ministério da Saúde ,29autorizou a realização 
do Processo Transexualizador no âmbito do Sistema Único de Saúde — SUS, que 
foi devidamente regulamentado." Com isso solucionou-se antigo problema 
referente aos altos custos de todo o procedimento transformatório. Esse tipo de 
cirurgia é procedimento ético, com o objetivo de ressocializar o indivíduo, visto. 
que a identidade de gênero, bem personalíssimo, encontrava-se comprometida." 
Aindaquesejapossívelarealizaçãodoprocedimentodereadequaçãodaidentidadede gênero pelo SUS, como são poucos os complexos hospitalares que dispõem deste 
serviço, longos são os prazos para ingressar no programa e para realizar a cirurgia. A 
Justiça Federal deferiu antecipação de tutela para que a União providenciasse, em 60 
Sentença publicada na Revista dos Tribunais, 363-372, v. 545. 
Heleno Cláudio Fragoso, Transexualismo..., 299-304. 
TACrimSP, AC 201.999, acórdão publicado na Revista dos Tribunais, 353-365, v. 545. 
Tereza Rodrigues Vieira e Roberta Martins Pires, Responsabilidade penal do cirurgião, 463. 
Jorge Paulete Vanrell, Sexologia forense, 71. 
CEM, de 13/04/2010E 
TJRS, AC 37.023, V C. Cív., Rel. Des. Gervásio Barcellos, j. 11/12/1980. 
Portaria 1.707/2008 (íntegra no Anexo III). 
Portaria 457/2008 (íntegra no Anexo 111). 	 . 
Adriana Dabus Maluf, Novas modalidades de família na pós-modernidade, 182. 
TRANSEXUALIDADII E ti D11011701/11 MUDAR 	-Z7541 — 
dias, o encaminhamento dó autor para-as consultas pré-operatórias; a culminar na 
realização cirúrgica de mudança de sexo, indicando o hospital ou equipe médica aos 
cuidados da qual deve o requerente permanecer.32 Tambérn.foi imposto ao Município 
encargo de fornecer os medicamentos para a realização da cirurgia." 
Resolução do Conselho Federal de Medicina34 retirou o caráter expe-
rimental da cirurgia de redesignação sexual de transexuais femininos do tipo 
tieocolpovulvoplastia (construção da vagina), podendo ser realizada em qualquer 
hospital público ou privado. Já quanto aos transexuais masculinos passou a con-
siderar que os procedimentos de retiradas de mamas, ovários e útero deixam de ser 
experimentais, podendo ser feitos em qualquer hospital público ou privado que 
sigam as recomendações do Conselho. Já o tratamento de neofaloplastia (cons-
trução do pênis), em face das limitações funcionais do órgão construído cirurgi- 
camente, permanece em caráter experimental. 
É autorizada a cirurgia de transgenitalização somente quando o paciente é 
considerado portador de desvio psicológico permanente de identidade sexual, 
com rejeição do fenótipo, com tendência à automutilação ou autoextermínio. 
O paciente deve, pelo período de dois anos, submeter-se a acompanhamento de 
equipe interdisciplinar formada por médico psiquiatra, cirurgião, psicólogo e 
assistente social. Somente após o diagnóstico médico de transgenitalismo é que a 
cirurgia pode ser realizada. Depois da realização da cirurgia, é importante que o 
paciente tenha acompanhamento terapêutico, visto que precisa reconhecer o novo 
corpo e questões específicas relativas às funções e comportamentos sexuais." 
Agravo de instrumento. Administrativo. SUS. Fornecimento de medicamento. Antecipa-
ção de tutela. 1. ti obrigação do Estado, no sentido genérico (União, Estados e Municípios) 
assegurar às pessoas desprovidas de recursos financeiros o acesso à medicação necessária 
para a cura de suas mazelas, em especial, as mais graves. 2. A saúde é direito inalienável 
e indisponível, sendo dever do Estado a concretização deste direito constitucionalmente 
tolerado. Considerando que o SUS é composto pela União, Estados e Municípios, resta 
caracterizada a solidariedade entre os três entes no polo passivo da demanda. 3. Além da 
perspectiva biomédica, a transexualidade possui a perspectiva social, fundada em direitos 
previstos na Carta Magna: o direito à saúde e o direito à autodeterminação da identidade 
sexual, este último informado pelos direitos fundamentais à liberdade, à igualdade. eà 
proteção da dignidade humana. (TRF 4 Região, A12008.04.00.011319-0/PR, 3" T., Rei: 
Des. Luiz Carlos de Castro Lugon, j. 14/05/2009). 
Mandado de Segurança. Medicamento. Portador do distúrbio do sexo"lisicol-ÓgIedi. 
Transexualismo. Necessita obter o medicamento prescrito por médico da Unicamp, 
para realização da cirurgia de mudança de sexo. Obrigação do Município em fomeCer 
medicamento. Segurança concedida. Recursos não providos. (TJSP,.AC,0040148,, 
58.2007.8.26.0309, Ac. 4979769,10" C. Dir. Pub., Rel. Des. Urbano Ruiz,j..21/02/2011). 
Resolução 1.955/2010 (íntegra no Anexo 111). 
TerezaRodrigues Vieira, Transexualidade, 415.. 
-27i5"- I 110M0A1 h I IVIOA IX I. OS Miolos tx,rsn 
Permanece o debate :em relação à exigência do praw de dois anos 
atendimento já que muitos trans, ao procurarem a transexualização já vive 
e são reconhecidos pelo sexo social há um tempo significativo. A necessidád 
do diagnóstico de um transtorno de identidade de gênero, como psicopatolog' 
psiquiatra, desconsidera o sofrimento psíquico e corporal independentemente d 
diagnóstico de doença. Assim, há a necessidade de possibilitar a transformação 
corporal dos caracteres sexuais secundários sem que seja necessária a realizaçãO 
da transgenitalização. A proibição de tais procedimentos condena as transexuais 
a se verem impedidas de manifestar livremente a expressão de sua personalidade, 
É estabelecida a idade de 21 anos para a cirurgia transgenital. Porém, corríd 
houve a redução da maioridade para os 18 anos, nada justifica a imposição deste 
limite etário. Mais adequado seria deixar à equipe médica o encargo de indicar o ... 
momento de sua realização. 
O Estatuto da Diversidade Sexual admite cirurgias de redesignação sexual à 
partir dos 18 anos de idade (art. 37). No entanto, havendo indicação terapêutica por 
equipe médica e multidisciplinar, é admitida a hormonioterapia e procedimentos 
complementares não cirúrgicos, de natureza reversível, a partir dos 14 anos (art. 38): 
15.5 A despatologização da identidade trans 
Há um movimento mundial buscando retirar o caráter patológico da transe-
xualidade. Tanto é assim que dia 20 de outubro é o Dia Internacional de Ação pela 
Despatologização Trans. Talvez melhor seria usar a expressão vivência sexual 
para transpor ideias de patologização. 
Em 2012 surgiu a Campanha Internacional Stop Trans Pathologization, pela 
retirada das identidades trans dos catálogos de doenças. A iniciativa é apoiada no 
Brasil pelo Conselho Federal de Psicologia que, já no ano de 1999, publicou Reso-
lução36 que normaliza a atuação dos psicólogos e proíbe tratamentos e promessas 
de cura da homossexualidade, já que não constitui nem doença, nem distúrbio e 
nem perversão. 
A décima revisão da Classificação Estatística Internacional de Doenças e 
Problemas Relacionados à Saúde," que retirou a homossexualidade da categoria 
das doenças, incluiu os transtornos da identidade sexual (F 64), dentre os quais 
se encontram o travestisrno e o transexualismo. As mais recentes versões do 
Manual Diagnóstico e Estatístico das Doenças Mentais 38 também patologizam 
' 'Resolução CFP 1/1999 (Integra no Anexo III). ' 
CID-10, Organização Mundial da Saúde, 1993. 
DSM - IV, APA, 1994; DSM-IV-TR, APA, 2000. 
ir 
TRANSCXUALIDADII Il. O 01i2EITO DE MUDAR I 277 
as manifestações de género que fogem ab binômio homem/mulher, classificando-
as dentro do diagnóstico amplo de transtorno da identidade de gênero-(F64.x). 
Á Resolução do Conselho Federal de Medicina" que regulamenta os proce-
dimentos de transgenitalização deixa evidente o caráter patológico do paciente ao 
exigir ausência de outros transtornos mentais. Também exige a constatação de 
desconforto com o sexo anatômico natural pelo prazo de dois anos. 
Deste modo,.ao contrário do que acontece com a maioria dos doentes que 
vão ao médico com sintomas desconhecidos em busca de um diagnóstico, os tran-
sexuais é que precisam convencer a equipe médica de seu intenso sofrimento e 
dá-necessidade de submeterem-se aos procedimentos hormonais e cirúrgicos. O 
paciente já se sente transexual; muitas vezes, desde muito jovem. Não busca um 
diagnostico conhecido, busca acesso ao resultado do diagnóstico: a cirurgia. Ele 
não vai ao médico para saber o que tem, vai para fazer o médico acreditar o que 
ele tem para pennitir=lhe o tratamento. Estabelece-se uma relação às avessas, um 
circulo vicioso: o paciente conta ao médico o que ele acha que o médico precisa 
ouvir. Em qualquer outra doença, o sofrimentopessoal não é elemento essencial, 
condição de para sua caracterização e posterior acesso ao tratamento. Isto é, uma 
pessoa com câncer não deve provar que o câncer a faz sofrer para ser tratada. 
Para os transexuais o discurso do sofrimento faz parte do diagnóstico, ex-
presso pelo desconforto e vontade de aniquilar os genitais, É o sofrer do cidadão 
que lhe assegura direitos, e não sua própria cidadania, sua autonomia, seu direito 
ao livre-desenvolvimento da personalidade. O cidadão transexual tem de, por dois 
anos, demonstrar descontentamento com o seu corpo e alegar que isso lhe causa 
sofrimento para ser considerado transexual, seja isso verdade ou não. A verdade, 
afinal, ele já traz consigo desde que se descobriu transexual. Mas para ter acesso à 
cirurgia, à saúde, precisa mostrar que somente ela fará cessar seu sofrimento, real, 
inventado ou exagerado: 
O sofrimento, no entanto, pode ser causado pelo próprio diagnóstico: obri-
gação de dois anos de tratamento, de subordinação da identidade subjetiva a uma 
autoridade médica, para:receber o diagnóstico esperado. Não basta a mera von-
tade de retirar os genitais. Essa vontade deve se consubstanciar em um descon-
forto recorrente, comduração mínima de dois anos. 
Significativa a instituição do chamado Processo Transexualizador pelo Sis, 
tema único de Saúde --SUS, mas o tratamento pelos serviços públicos de saúde 
não deve estar .c-ondicionadb um diagnóstico psiquiátrico. Diante do atual con, 
ceito de saúde,- que não.maià:significa ausência de doença, mas bem-estar bio-
-psíquico-social, é de se reconhecer o acesso à saúde como um direito de todas as 
Resoligão.CFM 1.955/20.10lart 3 ° 
278 	1tom0ÁrtliWitmlit: ur) nuterroS Gni 
pessoas; é também das:pessoas trans à assistência medica psteólógica: já se teeo 
rihece -que as sexualidades; os gêneros é os corpos gim não se encáixam Conceito 
convencional de masculino ou feminino, macho .ou fêmea, não mais podendo 
servir de base para uma classificação psicopatológica. A pluralidade das. idenW 
dades de gênero deve ser vista como manifestação da diversidade huniaria,- ei não 
transtorno mental. 
. 	A alegação que despatologizar a transexualidade criaria um problema para'a re- 
alização de tratamentos e cirurgias pelo SUS, não procede. Nem todos que recOtrem 
aos serviços de saúde, quer pública, quer privada, sofrem de algum mal ou distúitio, 
A-gravidez, por exemplo, não é uma doença, mas requer tratamento especial. Tam-
bém nas campanhas de vacinação, pessoas não doentes recorrem à saúde publica; 
Camisinhas e anticoncepcionais são fornecidos a pessoas saudáveis. 
Desde 2010, a 'França deixou de considerar a transexualidade como tranS, 
torno. Na Austrália, em 20] 1, um indivíduo foi considerado "sem sexo", por não 
se encaixar nas categorias de homem e mulher. Na América Latina, a Argentina 
deu o primeiro passo, e criou urna lei de reconhecimento à identidade do cidadão' 
transexual diretamente junto ao cartório civil pela simples afirmativa do requerente. 
A patologização das identidades trans fortalece estigmas, fomenta postiiL 
ras discriminatórias e contribui para a marginalizaçâo de transexuais, travestis, 
crossdressing e drag queens. Considerá-los como doentes mentais só traz mais Só; 
frimento a quem já é visto com tanta discriminação. Retirar o rótulo de "doente 
mental" significa proporcionar-lhes o direito de se apropriarem de sua verdadeira 
identidade. 
A "doença" trans é social. A ausência de reconhecimento destas pessoas 
como cidadãs, nada mais é do que negar-lhes o direito de existir, de amar, de de-
sejar e de ser feliz. 
15.6 Alteração do nomé e da identidade de gênero 
O nome é o identificador essencial da pessoa. É o que diz o Código Civil, art. : 
16: toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o sobrenome. 
A sociedade tem interesse em não confundir seus Membros entre si, e a esse inte-; 
t'eSse público se soma o int'eresse privado do ihdiViduo em se identificar e não ser 
confundido com outrem. Assim, o nome deve refletir o âmago da personalidade 
Individual, condizer com seu estado pessoal e social, bem como deve estar con 
sortcrom o seu psiquismo, sua honra, imagem pessoal e social, não podendo ser 
rid falto ou vexatório. 
40 	Sílvia Vassilieff, Direito à adequação do nome'áo novo estado pessoal..., 3. 
TRANSEXUALIDADE CO DIREITO DE-MUDAR I 279 
O nome é um direito de.personalidadePor exce1ência,4],Cumpre a função 
-de sinal distintivo, assentado na dignidade da pessoa humana, que não é apenas 
fundamento da República, como é também valor-fonte básico do próprio sistema 
eonstitucional de direitos fundamentais." 
Dado o desenvolvimento tecnológico e o dinamismo das relações sociais, Pa-
trícia Sanches afirma que o nome passou a operar função secundária. E questiona: 
Afinal, o que significa um nome para a identificação do indivíduo na modernidade? Em 
uni mundo onde a impressão digital, exame da íris ou biomet ria das mãos avançam 
como os mais seguros e eficazes meios para se identificar unia pessoa, a utilização de 
um nome com a imprescindibi 'idade de outrora se torna exagerada e sem propósito.'" 
Tanto o nome quanto o gênero sexual —que é a identificação através da desig-
nação do grupo social — não têm mais importância na identificação do indivíduo. 
O nome co gênero sexual cumprem duas funções: de representação, que é como o 
sujeito se reconhece e assim se apresenta ao meio social; e de identificação, como 
o meio social o reconhece. Convenção social determina que o prenome seja capaz 
de identificar o gênero sexual» 
Assim, incoerente e atentatório ao próprio fundamento que justifica e le-
gitima a incidência do nome sobre o cidadão que este seja uma imposição ou 
urna fonte geradora de discriminação, como no caso dos indivíduos transexuais 
e travestis." 
Após o processo de transformação a que se submetem os transexuais, para 
adaptar o sexo anatõmico à sua identidade psicossocial, questão de outra ordem 
se apresenta. Ninguém duvida ser aflitiva a situação de quem, com características 
de um gênero, tem documentação que o declara como pertencente ao sexo cor-
poral em que foi registrado. O nome deve existir para identificar a pessoa e não 
para expõ-la ao burlesco, como refere Tereza Rodrigues Vieira: Aliás, a ridicularia 
nos casos de transexualidade está patente na desconformidade da aparência física e 
psíquica do indivíduo com o exarado em sua documentação legal.46 
Um dos fundamentos para negar a mudança da identidade é de natureza 
registral, uma vez que o Código Civil"' proíbe vindicar estado contrário ao que 
Euclides de Oliveira, Direito ao nome, 71. 
Maria Celina Bodin de Moraes, Sobre o Nome da Pessoa Humana, 43. 
Patrícia Corréa Sanches, Mudança de nome e da identidade de género, 427. 
Idem, 428. 
Cláudio Ari Mello, Contribuição para urna teoria híbrida dos direitos de personalidade, 79. 
Tereza Rodrigues Vieira, Nome e sexo..., 48. 
CC, art. 1.604: Ninguém pode vindicar estado contrário ao que resulta do registro de 
nascimento, salvo provando-se erro ou falsidade do registro. 
 
 
 
14. 
 
 
 
11OMQÁtiv!1)AJ t OS DIRB1105 Idwri 
resulta do registro de nascitnento, alvo provando-se erro ou falsidade do registro 
Como .o registro .foi .levado a *efeito ;consignando-corretamente. ° sexo aparen a alegação é - de que não teria havido 'qualquer erro, o' que -sempre serviu 
justificativa ao indeferimento do pedido de retificação. " 
É alegado que o princípio da imutabilidade relativa do nome não chancel 
qualquer pretensão à mudança. Mas o tradicional princípio da indisponibilidael 
do estado das pessoas não pode ser um obstáculo à mudança de sexo no regis 
civil. Não se trata de desestruturar o sistema, mas de adequar a complexidad-
da ordem jurídica à complexidade da ordem natura I." Assim, há que se atenua 
certas exigências legais. A própria Lei dos Registros Públicos diz que o prenom 
é definitivo, mas pode ser substituído. Igualmente é admitida sua alteração, 
pedido do interessado,contanto que não prejudique o sobrenome da família 
Na busca da alteração, cabe ser invocado também o art. 6.° da Constituição 
Federal,5' que, entre os direitos sociais, assegura o direito à saúde, encargo (Me 
é imposto ao próprio Estado» Conforme a Organização Mundial da Salide 
OMS: Satide é o completo estado de hem-estar físico, psíquico e social. A falta de 
identidade do transexual provoca desajuste psicológico, não se podendo falar em 
bem-estar nem físico, nem psíquico e nem social. Assim, o direito à adequação do 
registro é uma garantia à saúde, e a negativa de modificação afronta imperativo 
constitucional, revelando severa violação aos direitos humanos. 
Nenhuma justificativa serve para negar a mudança, não se fazendo necessária 
sequer alteração de dispositivos legais para chancelar a pretensão.53 Os direitos de 
personalidade são direitos subjetivos num duplo sentido. Além de pertencerem á 
cada pessoa, também são direitos cujo conteúdo e respeito dependem, de maneira. 
importante, da vontade individual. Cabe a cada um definir sua personalidade. 
Imposta do exterior, a noção de personalidade perde seu sentido." 
Ana Paula Ariston Barion Peres, Transexualismo..., 170. 
Lei 6.015/73, art. 58:0 prenome será definitivo, admitindo-se, todavia, a sua substituição 
por apelidos públicos notórios. 
Lei 6.015/73, art. 56: O interessado, no primeiro ano após ter atingido a maioridade 
civil, poderá, pessoalmente ou por procurador bastante, alterar o nome, desde que não' 
prejudique os apelidos de família, averbando-se a alteração que será publicada pela 
imprensa. 
51. CE art. 6.°: São direitos sociais a educação, a saúde, a aiimentação, o trabalho, a mora- 
dia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a 
. assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. 
CE art. 196: A saúde é direito de todos e devei- do Estado (...). 
53., José-Francisco Oliosi da Silveira, O transexualismo na Justiça, 141. 
54. 	Tereza Rodrigues Vieira,.Transexualidade..., 414. 
, 
TRANsexuALamon 110 Datárro De MUDAR I 281 
t mesmo paradoxal que'a plasticidade do corpo,que enfrenta várias. inter-
venções cirúrgicas profundas e,arri:scadas, seja maior que aplasticidade do nome; 
convenção formal.-É mais fácil mudar toda a estrutura corporal de um sujeito, para 
emprestar-lhe contornos femininos ou masculinos, que simplesmente mudar seu 
nome, que está vinculado ao gênero, não ao sexo. 
O nome registrai do cidadão trans não remete à sua identidade, mas jus-
tamente afronta-a. A despeito de sua expressão de gênero, de sua vestimenta, a 
despeito das intervenções cirúrgicas, a falta de um nome correspondente ao gê-
nero sujeita transexuais e travestis a ter sua identidade constantemente revelada e 
violada, a ser humilhado e tratado pelo sexo que não o identifica. 
Além disso, há que ser respeitado o direito de as pessoas trans não realizarem 
as cirurgias de redesignação sexual. No entanto, a tendência da jurisprudência é 
negar a alteração do sexo quando não houve a mudança dos órgãos sexuais. Cla-
ramente trata-se de uma afronta da Justiça ao direito à identidade, à intimidade, à 
privacidade de quem quer simplesmente adequar-se à sua identidade social sem 
violar sua integridade física. Obrigar alguém a submeter-se a uma cirurgia para 
garantir-lhe o direito à identidade, além de violar o direito à liberdade de quem não 
quer submeter-se a delicado e arriscado procedimento cirúrgico, viola o próprio 
dever do Estado de proteger seus cidadãos. 
O nome é um direito, não uma via-crúcis. O direito ao nome decorre do 
direito fundamental à integridade moral que encerra a identidade pessoal, familiar 
e social, além de outros aspectos, como a liberdade civil, política e religiosa, a 
honra, a imagem, a intimidade, a identidade sexual etc." 
No entanto, é tudo tão demorado, que gera, durante anos, enormes sofri-
mentos a quem tem uma identidade registral diversa da sua identidade social. Vez 
por outra, quando a pessoa é há anos conhecida por seu nome social, a solução é 
requerer a adoção de apelido público e notório." 
Para evitar enormes constrangimentos, há quem utilize meios não legais na 
busca de uma nova identidade. Mas a Justiça não criminaliza quem procedeu a 
alteração registrai do nome sob o fundamento de que o Direito Penal deve ter por 
finalidade assegurar a coexistência livre, pacífica e feliz dos homens.57 Apesar de 
Cláudio Ari Mello, Contribuição para uma teoria ¡Onda dos direitos de personalidade, 70. 
Ação de Retificação de Registro Civil. Alteração de prenome. Possibilidade. Autorização 
em situações excepcionais. Apelido público e notório. Ocorrência no caso concreto. 
Recurso proVido. (TJSP, APL 0015086-39.2009.8.26.0602, 7 C. Dir. Priv., Rel. Luiz 
Antônio Çost,a, j.,31/08/2011). 
Processo penál:Ilabeas corpus. Transexualidade. Falsificação de certidão de nascimento. 
Princípiii da.ofensividade. 1. O sexo não é determinado tão somente, ou exclusivamen-
te., pela genitália ou demais características físicas exteriores. Aparentar mão é ser. 2. O 
282 	HOMOAPIMV113A1)1., ti OS 1)ittInTOSI-011T1 
a sentença ter absolvido quem utilizou o passapOrte de uma irmã, por inexigibi 
lidade de outra conduta, a:decisão do colegiado, apesar de reconhecer o acerto d 
tese da magistrada, acabou decidindo pela condenação, talvez por o criniejá esta 
prescrito.58 
transexual é um indivíduo que quer viver e ser respeitosamente aceito como pessoa 
do sexo oposto. Não se adapta à vida que leva, quer mudar de sexo, em face do terrfv.él—
conflito com sua identidade de gênero. 3. Temos, no transexual, ou "um homem pies 
num corpo de mulher", ou "urna mulher presa no corpo de homem", gerando problema 
psíquicos, sociais e jurídicos 4. Falsificar uma certidão de nascimento para fazer consta 
que um transexual é mulher e não homem, psicossexualmente feminino, o que veiaa 
ser reconhecido em sentença judicial, não pode constituir crime, pois, não alterowa 
verdade. Tanto assim que, no caso em estudo, o transexual foi submetido a cirargia,e 
ficou unia mulher, liberada do corpo de homem, e veio a casar-se com um homem. 5.Q 
agente procurou ajudar, sem burlar os fatos, um ser humano, procurando diminuir seus 
traumas e constrangimentos, fazendo-o feliz, ante a demora da solução judicial do pro-
blema. 6.0 Direito Penal deve ter por finalidade assegurara coexistência livre, pacífica e 
feliz dos homens. 7.0 Direito Penal só pode ser acionado quando o ato lesiona de forma 
efetiva, ou expõe a perigo, o bem jurídico tutelado pela norma penal. (TRF 1' Região, 
HC 2007.01.00.047822-3,3" T., Rel. Desig. Juiz Federal Tourinho Neto, j. 13/11/2007). 
58. TRF 3' Região — São Paulo — Penal. Uso de passaporte adulterado. Acusado transexual 
que utilizava passaporte em nome de sua irmã. Absolvição por ausência de culpabili-
dade. Acusado que se utilizava também de passaporte verdadeiro, com seu nome real: 
lnexigibilidade de conduta diversa afastada. Recurso provido. Prescrição retroativa. 
Extinção da punibilidade decretada de ofício. 1. Apelado denunciado por ter se utilizado 
de passaporte falso, em nome de sua irmã (Código Penal. art. 304) 2. Laudos médicos . 
juntados aos autos confirmando que o recorrido é pessoa de sexo genético masculino, 
mas com sexo morfológico-fenotípico feminino, já tendo se submetido à emasculação-. 
3. Advento de sentença absolutória, sob o fundamento de inexigibilidade de conduta 
diversa, já que seria constrangedor e humilhante ao apelado, que aparentava ser mulher, 
ostentar identificação masculina. 4. Acerto, em princípio, da tese absolutória adotada 
pela sentença. Contudo, no caso concreto, constata-se que o apelado fez uso, ern'mais. 
de uma oportunidade, de seu passaporte verdadeiro, com nome masculino: Percebe-se'', 
assim, que, para o recorrido, aparentar ser pessoa do sexo feminino e ostentar identi-
ficação masculina, ao contrário do que entendeu a r. Sentença, não era tão vexatório 
ou constrangedor. Se o apelado utilizou-sedo passaporte em nome de "Américo" para 
embarcar em voo com destino ao exterior, então era dele exigível que exibisse o mesmo 
passaporte ao reingressar em solo nacional e não outro, em nome de sua irmã. 5. Por 
outro lado, se a apresentação de docUmentos com nome masculino fosse realmente in-
sustentável, o apelado já cleveria ter promovido judicialmente a retificação de seu registro 
de nascimento, pois, segundo consta do histórico do laudo médico, o recorrido já havia 
se submetido à intervenção cirúrgica paramtidança de sexo há mais de três anos, lapso 
de tempo suficiente para judicialmente regularizar sua situação. 6. Recursoministerial 
a que se dá provimento; condenando-se o apelado nos exatos termos da denúncia. 7. 
Tomada a pena aplicada, constata-se que, entre a data da presente decisão condenatória 
até a data do despacho de recebimento da denúncia, já foi ultrapassado o lapso temporal 
TRANSEXUALIDADE E O DIRIRTO DE MUDAR I 283 
O Superior Tribunal de Justiça confere aos transexuais o direito à alte-ração 
clo'nome e identidade de gênero,59 e reiteradamente tem homologado sentenças 
estrangeiras que autorizaram a redesignação sexual em países outros.80 
15.7 Nome social 
Em face das enormes dificuldades de as pessoas trans obterem a alteração 
do nome e da identidade sexual, muitos Estados e instituições públicas e priva-
das vem implantando .a carteira social. Ainda que não seja uma solução ideal mi 
definitiva, já é um passo em direção à proteção da identidade de transexuais e 
travestis, historicamente marginalizados pela desvinculação entre seu gênero e 
seu sexo biológico. Por isso, o seu uso, sem a alteração do nome registrai, muda o 
reconhecimento social e estende o exercício da cidadania a grupos historicamente 
marginalizados, que se intimidam frente à possibilidade de ter seu nome registrai 
revelado e, com isso, sua identidade violada. 
Essa medida altera tão somente o reconhecimento social do primeiro nome 
dos indivíduos, que poderão ser referenciados pelo nome. que verdadeiramente 
lhes representa e lhes identifica. A solução é inclusiva e não marginalizadora das 
identidades múltiplas de uma sociedade plural. 
Em todos os atos de suas vidas, os indivíduos trans identificam-se pelo nome 
social. Quando há a necessidade da divulgação do nome registrai para fins de cor-
reta identificação, a prática mostra que transexuais e travestis o escondem com 
afinco, o que provoca desconcerto e mal-estar. 
A duplicidade de prenomes não gera insegurança jurídica não podendo ser-
vir como pretexto para impedir o exercício do direito à identidade. Para eventuais 
investigações, há várias formas de identificação, basta que as buscas necessárias 
se pautem pelo Registro Geral ou pelo Cadastro de Pessoas Físicas, não pelo nome 
registrai. 
de 04 anos, prevista no art. 109, V do C.P., pelo que, de ofício, com fundamento no art. 
61 do Código de Processo Penal, decreta-se extinta a punibilidade do delito tipificado 
no art. 304 do Código Penal, pela ocorrência dá prescrição da pretensão punitiva, na 
modalidade retroativa (art. 110, §§ 1.°e 2.° do Código Penal). (TRF Região,.ACr 3973, 
Proc. 94031010673, 5° T., Rel. Juiz Helio Nogueira, j. 21/08/2001). . 
STJ, REsp 678.933/RS, 3' T., Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direi to, j. 22/03/2007, STJ, 
REsp 1.008.398/SP, 3' T., Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 15/10/2009, STJ, REsp 737.993/ 
MG, 4' T., Rel:"Min. João Otávio de Noronha, j. 10/11/2009. 
STJ, SE 1.058-1T 2005/0067795-4, Rei; "Min. Barros Monteiro, j. 01108/2006; STI, SE 
2.149, 1T 2006/0186695-0, Rel. MM: Barros Monteiro, j. 04/12/2006,STJ, SE 2.732, 
iT 2007/0105198-0, Rel. MM. Cesar Asfor Rocha, j. 07/04/2009,. STJ,'SE 4.179,1T 
2008/0273512-0, Rel. MM. Cesar Asfor Rocha, j. 07/04/2009. 
"---ZW-1—JiZJA-1431 OS Dlitt1.1 larrt 
.Sempre que 'ouso de nome é obrigatório, ,não se exige que Naja o nome registrai' 
Portanto, não tá norma que vede expressamente a possibilidade do uso, com carát 
de atribuição de cidadania, do nome reconhecido e utilizado. É necessário um nom-
e o novo paradigma do Direito estabelece o nome como um elemento identificado 
real, não meramente formal, adormecido e odiado em uma folha do Registro Civil.° 
O Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão estabelece o uso do 
nome social adotado por travestis e transexuais servidores públicos, no âmbito 
Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional" e o Ministério 
da Educação assegura o direito à escolha de tratamento nominal nos atos e proe0 
diment os promovidos no âmbito do IVIinistério.63 
Do mesmo modo o Conselho Federal de Psicologia expediu Resolução" adini 
rindo a inclusão do nome social nas carteiras profissionais, junto com o nome registrá. 
Resolução Conjunta do Conselho Nacional de Política Criminal e Peniten; 
ciaria e o Conselho Nacional de Combate à Discriminação,6' assegura a travestis 
e transexuais o direito de serem chamados pelo nome social quando recolhidos 
em estabelecimentos prisionais. 
A Comissão da Diversidade Sexual do Conselho Federal da OAB encami- 
nhou ao Conselho Federal pedido para que na carteira profissional de advogados 
e estagiários conste exclusivamente o nome social. 
O Estatuto da Diversidade Sexual garante aos transexuais, travestis e inter-
sexuais, que possuem identidade de gênero distinta do sexo morfológico, o direito 
ao nome social, pelo qual são reconhecidos e identificados em sua comunidade 
(art. 44). Tal direito é garantido tanto para ser inscrito na Carteira de Trabalho 
(art. 72), como nas instituições de ensino, públicas ou privadas, por simples re-
querimento do aluno. Caso o aluno seja menor de idade ou incapaz, dispensável 
que o pedido seja feito ou ratificado pelos pais ou responsáveis (art. 65). 
15.8 Um homem que todos veem e uma mulher que não existe 
Isto ou: uma mulher que todos veem e um homem que não existe. Esta é a 
situação em que vivem todos os que nasceram com um corpo que não corresponde 
à sua identidade psíquica. 
Como o procedimento de redesignação é longo e poucos são os hospitais 
habilitadosa realizá-lo, o que impõesigni ficativo tempo de espera, tem sidoautorizada 
61, Adriana Caldas Dabus Maluf, Novas modalidades de família..., 190. 
Portaria 233/2010 (íntegra no Anexo 111). . 
Portaria 1.612/2011 (íntegra no Anexo III). 
Resolução 14/2011 (integra no Anexo III). 
: 65. Resolução 1/2014 (integra no Anexo 111). - 
TRANSEXUAUDADIE E O DIREITO DE MUDAR 1 285 
ii alteração do nome de transexuais mesmo que não tenha sido realizada a cirurgia de 
transgenitalizaçâo. Basta haver a identificação social com as características sexuais. 
É da Justiça gaúcha o precedente 66 que autorizou a alteração do registro civil de um 
Minsexual, mesmo sem ter ele se submetido à cirurgia de redesignação dos órgãos 
genitais. Porém, não foi determinada a troca da identidade de gênero. Esta restrição 
foi afastada em outro julgamento, que permitiu a troca não só do nome como do 
sexo, invocando um punhado de princípios constitucionais.'" 
Ainda que a parte manifeste não ter a intenção de se submeter à cirurgia 
genital, poucas decisões autorizam a dupla alteração. A primeira data do ano de 
2002. do TJSP." A mais recente é de justiça de Goiás." No entanto, a tendência é 
66 	Apelação cível. Registro civil. Alteração do registro de nascimento relativamente ao sexo. 
Transexualismo. Possibilidade, embora não tenha havido a realização de todas as etapas 
cirúrgicas, tendo em vista o USO concreto. Recurso provido (TJRS, AC 70011691185, 
8' C. Civ., Rel. Des. Alfredo Guilherme Englert. j. 15/09/2005). 
Alteração de registro civil. Transexualidade. Cirurgia de transgenitalização. 13 fato de o ape-
lante ainda não ter se submetido ã cirurgia para a alteração de sexo não pode constituir óbice 
ao deferimento do pedido de alteração de registro civil. O nome das pessoas, enquanto fator 
determinante da identificação e da vinculação de alguém a um determinado grupo familiar, 
aSSU m e fundamen tal importância individuale social. Paralelamente a essa conotação pública, 
não se pode olvidar que o nome encerra fatores outros, de ordem eminentemente pessoal, 
na qualidade de direito personalíssimo que constitui atributo da personalidade. Os direitos 
fundamentais visam à concretização do princípio da dignidade da pessoa humana, o qual 
atua como sendo uma qualidade inerente, indissociável, de todo e qualquer ser humano, 
relacionando-se intrinsecamente com a autonomia. razão e autodeterminação de cada indi-
víduo. Fechar os olhos a esta realidade, que é reconhecida pela própria medicina, implicaria 
infração ao principio da dignidade da pessoa humana, norma esculpida no incisollIdo art. I.° 
da CE que deve prevalecer sobre a regra da imutabilidade do prenome. Por maioria, proveram 
em parte (TJ RS, AC 70013909874,7" C. Civ., Rel. Des. Maria Berenice Dias, j. 05/04/2006). 
Retificação de registro civil. Assento de nascimento. Transexual. Alteração na indicação 
do sexo. Deferimento. Necessidade da cirurgia para a mudança de sexo reconhecida por 
acompanhamento médico multidisciplinar. Concordância do Estado com a cirurgia que 
não se compatibiliza com a manutenção do estado sexual originalmente inserto na certidão 
de nascimento. Negativa ao portador de disforia do género do direito à adequação do sexo 
morfológico e psicológico e à consequente redesignação do estado sexual e do prenome 
no assento de nascimento que acaba por afrontar a Lei Fundamental. Inexisténcia de 
interesse genérico de uma sociedade democrática em impedir a integração do transexual. 
Alteração que busca obter efetividade aos comandos previstos nos arts. 1.0,111, e 3.0, IV, da 
Constituição Federal. Recurso do Ministério Público negado, provido o do autor para o 
fim de acolher integralmente o pedido inicial, determinando a retificação de seu assento 
de nascimento não só no que diz respeito ao nome, mas também no que concerne 20 sexo. 
(TJSP, AC 209.101.4/0,1" C. Dir. Priv., Rel. Des..Elliot Akel, j. 09/04/2002). 
GO-Goiânia —Proc. 201203179418, sentença proferida pela Juiza de Direito Sirlei Martins 
da Costa, j. 16/10/2013 (íntegra no si te <wsVw.direitohomoafetivo.com.br>). 
286 I HOMOAVETIVIDADfi E OS DIREITOS LOUT1 
de possibilitar tão só a alteração do nome, não da identidade Séaltal Ésta solução, 
no entanto; cria uma situação para lá de 'insustentável.. Pratleatriente constrói 
um ser híbrido. Tem' o nome correspondente a um sexo, mas sua identidade é de 
outro. É como diz a música do Ney Matogrosso: sou masculino-e feminino 
A sociedade Consegue identificar o sexo de um indivíduo tão somente por suà . 
aparência e comportamento. Ou seja, o gênero sexual delineia-se por sua função 
social, mais pelo fenótipo cornportamental do que o aspecto da genitália. Assim, 
cabe questionar se é necessária a mudança no corpo para ensejar a mudança do 
sexo. Submeter alguém a urna série:de cirurgias para definir seu gênero sexual é 
totalmente desnecessário, restando tais hipóteses tão somente àquelas pessoas 
inconformadas com seu aspecto genital, que entra em contrariedade com seu 
sexo psicológico." 
Eprecisoatentarquehaumadistãnciaconsiderávelnosresultadosdascirurgias 
de redesignação sexual. Para as transexuais masculino/feminino, a construção de 
urna neovagina permite uma vida sexual ativa. No entanto, a situação inversa 
não alcança igual sucesso. Os transexuais feminino/masculino, ao decidirem 
se submeter à cirurgia de neofaloplastia, não têm qualquer certeza quanto ao 
procedimento em si e, especialmente, quanto ao resultado da intervenção. De 
outro lado, o uso de homionioterapia e a realização da mastectomia (retirada 
das mamas), asseguram resultados muito satisfatórios e acabam conferindo a 
identidade masculina desejada. Por isso poucos dão seguimento ao processo de 
readequação sexual, até porque a falta do órgão sexual masculino não significa 
ausência de masculinidade, porquanto a sexualidade não se limita à anatomia dos 
órgãos genitais, mas sim a um conjunto de outros fatores psicológicos, sociais e 
culturais. Tanto é assim que o Conselho Federal de Medicina somente admite 
em caráter experimental a neofaloplastia, ato cirúrgico para a formação de um 
pênis a partir do órgão sexual feminino. Este cuidado decorre da complexidade 
da cirurgia e das complicações que podem levar, em grande número dos casos, à 
necrose do neofalo e consequente perda do órgão sexual. Diz Gerald Ramsey:Não 
encontrei relatos de construções de neofalos etn que a função de ereção se parecesse 
com a função própria de um pênis congênito. Além dos riscos cirúrgicos normais, 
tais como os relacionados à anestesia e a infecções, o transexual confronta-se com 
Apelação eive]. Retificação de registro. Transexual não submetido à cirurgia de mudança 
de sexo. Sentença que determinou a alteração do nome do autor em seu registro, mas 
indeferiu a mudança de sexo-. Recurso.que pretende a alteração do género biológico 
constante no registro de masculino para feminino— impossibilidade—descompasso entre 
a verdade real e a verdade registrai. Principio da segurança jurídica. Sentença mantida. 
Recurso conhecido e improvido. À unanimidade. (USE, AC 2013223538, Ac. 161/2014, 
1 C. Civ., Rel. Des. Ruy Pinheiro da Silva; j. 13/01/2014). 
Patrícià Corrêa Sanches, Mudança de nome e da identidade de gênero, 437. 
TRANSIDWAEIDADE E O Dluárrone MUDA 
muitos oulTOS risco-5, Fístulas, estreitamentos, incontinência- tiritiolria e uri na resi4ità1 
são- cornpli cações comuns na nova- 'construção -uretral:,:Q uso -de• próteses;paja.--
micção traz um risco substancial de infecção e trauma, além de-sereni estetica.men- t 
insatisfatórias para a maioria dos transexuais.72 
A neofaloplastia é um procedimento com uma promessa- de êxito 
e reticente, que traz consigo uma quantia atemorizante de possíveis,,efat.4. 
colaterais, variando de infecções até a perda completa da estrutura -genital do 
indivíduo ou mesmo sua morte. Não é preciso que os transexuais.se sujeiteií',' 
procedimento de alto risco, e com potenciais sequelas graves à vida e à saúde, para - 
obter a adequação do registro civil. 
Deste modo, não há como exigir que todo transexual seja'subirietidCr:k 
cirurgia de transgenitalização para só então obter a alteração de seu regis-trOcivil.:. 
O principal mal-entendido entre o Judiciário e a Medicina é que a "ctira'Pata--6 
transexualismo" não se dá com a cirurgia de alteração do sexo. Caso reconhecido 
como um "distúrbio de personalidade", não desaparece com a genitália-renioVida; 
Esta é somente parte do tratamento de redesignação sexual. A cirurgia não pode se" -r 
critério para a alteração do registro civil. Ela é consequência da vontade, advinda 
da experiência pessoal de cada transexual, do nível do conhecimento rnédico,:da 
disposição em enfrentar uma cirurgia arriscada. Enfim, fatores de ordem péSSoal 
e tecnológica não podem ser um limitador à obtenção da tutela jurídica, sol; pena 
de afrontar-se o direito à saúde. 
Quando se trata de transexual masculino, para a concessão da alteração do - 
nome e da identidade sexual a tendência é a Justiça exigir prova da retirada dos, : 
órgãos reprodutores (histerectomia). Isto porque, o fato de alguém ter assiainido 
a identidade de um homem, não provoca a alteração de suas característieá 
genéticas femininas, podendo assim procriar. Existem alguns antecedentés 
adquiriram notoriedade e que foram divulgados na imprensa mundial" corno 
homem grávido". Há notícias de outros casos nos Estados Unidos,- iriglaterré 
Argentina. Apesar de alguma estranheza inicial, nada justifica impedir Rtie alguéni' 
tenha um filho pelo só fato de ter adotado identidade sexual masculina. 
Indispensável assegurar ao transexual o direito à sua real identiclade,, qual 
seja, a identidade vivida, que correspondente às suas emoções, à sua maneira 
de encarar o mundo, a seus projetos futuros. Esta é a identidade que merece-ser 
, 	• 	, 
reconhecida e protegida pelo Estado, respeitando-se a liberdade dealterarótiriáo 
os órgãos genitais.Considerado prevalecente o interesse privado,::o'res. Ultádoirá: 
único: g indiC4aCáio rregistro deverá ser compatível com a do seXO-de.-áPárêia 
clà.jiéssdá'" átó'é;b'desua escolha", como afirma Maria CeliriáSb.diii'áè. Moráésig 
". 
 
72. Geraid Rainsey, Transexuais..., 24. 
Aqui, .a-vontade individual será novamente mereectioM.kprivilegiada tuteia, a 
partir do momento em que se passou a considerar a noçA0 de saúde-corno o bem-
estar psicofísico e se.entendeu ser a síndrome transexual urna grave disfunção 
psicofísica." 
Não há como o Judiciário, em claro confronto com o direito à saúde, com a 
dignidade da pessoa humana, com o direito à intimidade e a promoção do bem 
comum, exigir que transexuais se submetam à cirurgia de transgenitalização para 
só então admitir a alteração de sua identidade sexual. A cirurgia não -pode ser 
requisito para a retificação de assento registral, eis que possui caráter secundário, 
complementar, visando a conformação das características anatõmicas ao sexo 
psicológico. Submeter-se ou não ao procedimento cirúrgico é opção do indivíduo 
e a exigência de tal procedimento; como requisito à retificação do nome, é postura 
incompatível da Justiça que tem o dever de promover o bem de todos. 
A sociedade consegue identificar o sexo de um indivíduo tão somente pela 
sua aparência e comportamento. Ninguém verifica seus órgãos sexuais para 
definir a que gênero pertente. Portanto, se insere a pessoa em determinado grupo 
social pelo que aparenta ser, como se comporta socialmente e não pela genitália 
que não está aparente. Deste modo é totalmente desnecessário submeter alguém 
à cirurgia para definir seu gênero sexual." 
Cabe atentar que travestis. do mesmo modo, não realizam cirurgias de 
redesignação genital. Nem por isso deixam de ter a identidade social feminina, 
ainda que mantendo íntegros e ativos os seus órgãos sexuais. O jeito tem sido 
buscar a substituição para adequá-lo a apelidos públicos. É gaúcha a primeira 
sentença que admitiu a troca do nome de uma travesti, sem, no entanto, deferir 
o pedido de alteração da identidade sexual." A outra decisão é do Estado do 
Maranhão." 
15.9 Avanços e retrocessos 
A tendência da jurisprudência, inclusive no Superior Tribunal de Justiça," é 
assegurar o direito à alteração do nome e da identidade de gênero somente quando 
vencidas todas as etapas da redesignação genital. 
- 
A primeira decisão que se tem notícia admitindo a modificação do tiottik 
e da identidade de gênero é do ano de 1989, sentença de um magistrado :4t; rH 
Pernambuco-78: 	 •,- 
Significativa a possibilidade assegurada a urna transexual de ser re.elíj 
a um presídio feminino ou em cela especial, conforme já assegurou a jtistras 
gaúcha." 
Para evitar idas e vindas que só geram inseguranças, imperios. 
normalização legal. Mas a via legislativa é lenta. Muitos projetos de lei estão 
"tramitando", se é que se pode assim chamar o verdadeiro engavetamento a 4t.tç-
todossão subm e ti d os por absoluto descaso do PoderLegislativo. Desde01/11/.201,2 
aguarda votação em plenário da Câmara Federal o PL 70/1995,8° que propõe a 
inclusão de um parágrafo ao art. 129 do Código penal, criando exdudente. de 
criminalidade à intervenção cirúrgica destinada a alterar o sexo dos transexUais'. 
O mesmo Projeto acrescenta os §§ 2.° e 3.° ao art. 58 da Lei 6.015/1973; a. Lei 
dos Registros Públicos, autorizando a mudança do prenome e a averbação da - 
identidade como transexual. Em conjunto tramitam vários outros projetos, qc 
a ele foram apensados: PL 5.872/2005 — Proíbe a mudança de prenome em casas 
de transexualismo; PL 2.976/2008 — Acrescenta o art. 58-A à Lei dos Registros 
Públicos, criando a possibilidade das pessoas que possuem orientação de gênero 
travesti, masculino ou feminino, utilizarem ao lado do nome e prenome oficial, 
um nome social; PL 1.281/2011 — Dispõe sobre a mudança de prenome da pessoã. 
transexual que realizar cirurgia para troca de sexo; PL 4.241/2012 — Dispõe sobre O 
direito à identidade de gênero e a chamada Lei João Nery, PL 5.002/2013 —Dispõé 
sobre o direito à identidade de gênero. alterando o art. 58 da Lei dos Regisirós 
Públicos. 
O Estatuto da Diversidade Sexual proíbe quaisquer referências à mudançá 
levada a efeito, a não ser a requerimento da parte ou por determinação judicial 
(art. 40, parágrafo único). Também é assegurada .a retificação em todos os 
outros registros e documentos, sem qualquer referência à causa da mudança 
(art. 41). 
288 	HOMOAKTWIDADV 11 t Dlitli1TO$1.411111 	 TRANSLXUAUDADE E O DIREITO DE MUDAR 
 
PE-Recife—Proc. 2098-2/89, Rel. Juiz de Direito José Fernandes de Lemos, j. 21104/1989 
(integra no si te <www.direitohomoafetivo.com.br>). 
Habeas corpus. Possibilidade de prisão. Paciente fez recentemente cirurgia ele trans-
genitatização (redesignação sexual). Necessidade de que, na hipótese de prisão, seja a 
pácien teencaminhada para penitenciária feminina ou em cela especial, mantidae_m loc.* 
próprio para pessoas do sexo feminino. Medida de cautela. Habeas eorpus parcialmente 
concedido. (TJRS, HC 70032179459, 8 C. Civ., Rel. Des. Claudir Fidélis FaccendaoW 
24/09/2009). 
A tramitação dos projetos de lei encontram-se no si te <WWW.direlt0h01110afetiVà:COM-br> 
Maria Cçlina Bodin de Morais, Danos a.pessoa humana, 123. . 
Patricia Corrêa Sanches, Mudança de nome e da icientidade.de ,genero, 437 
RS-Porto Alegre — Proc. 001/1.09.0240035-9, Juiz de Direito Antonio C. A. Nascimento 
e Silvad. 3071172010 (integra da sentença no.site.<www.direitohomoafetivo.coin.br>). 
MASão Luis, Proc. 35526-89.2011.8.100001, 8' Vara Cíveljuiz de Direito Luiz Gonzaga 
Almeida Pilho, j. 18/01/2012 (íntegra no site <www.direitohomoafetivo.com.br>). 
'17. As decisões se encontram disponíveis no site ssAvw.direitohomoafetivo.com.br>. 
290 I i inmoArnivi DAM. P OS DIREITOS iam.] 
15.10 Ação cabfv. el e foro competente 
Pela falta de regulamentação legal, sendo o estado da pessoa matéria 
disciplinadapornormas de ordempública, sua alteração.dep- endedeprocediniento 
judicial. Mas a inexistência de lei ou previsão administrativa sobre o procedimento 
retificativo enseja controvérsia sobre o foro competente para a demanda. Com 
frequência, as ações buscando a mudança do nome e da identificação do sexo to 
registro civil, são propostas nas Varas dos Registros Públicos.8' 
Soba alegação de que não se trata de erro no assentamento e de que a pretensão 
é de alteração do estado individual, há tribunais que se inclinam a reconhecer a 
competência das Varas de Família." 
Claro que o ideal é ser dispensada a intervenção do Poder Judiciário. Nada 
justifica impedir que a alteração seja levada a efeito mediante solicitação da parte 
diretamente junto ao Cartório do Registro Civil, da residência do requerente. Não 
necessita ser na Comarca em que ocorreu o registro de nascimento. 
Ao depoisbastaa si mplesafirrnativa do sob citanteque desejaprocederà retificação 
para adequar o nome e o sexo à sua identidade social. Sequer é necessária ajuntada de 
qualquer prova, quer da realização de cirurgia, quer atestado médico ou psicossocial. 
Em muitos países, corno Argentina, Austrália, Canadá, Dinamarca, Espanha Equador, 
Inglaterra e Noruega, a mudança de nome é levada a efeito administrativamente. 
15.11 O direito ao sigilo 
Nasdecisõesjudiciaisque au torizama alteração do registro civil do transexual, 
não existe uniformidad e sobre a divulgação da mudança levada a efeito. Há decisões 
Conflito negativo de competência. Ação de retificação de registro civil. Modificação de pre-
nome e sexo. Transexualismo. Mera adequação de sua orientação no plano social, eis que já 
vive publicamente corno mulher. Pedido estritamente registrai. Competência para processar 
e julgar do juiz da vara de registros públicos, acidentes do trabalho e precatórias cíveis da 
capital. Conflito procedente para declarar a competência do d. Juiz suscitado. (TJ PR, Conf. 
Comp. 381763-6, Ac. 54, 1.2 C. Cív, Rel. Des. Rafael Augusto Cacsetari, j.28/03/2007). 
Conflito negativo de competência. 5° Vara de Família de Cariacica. Vara da fazenda pública 
estadual, registros públicos e meio ambiente de Cariacica. Retificação de registro civil 
decorrente de cirurgia de mudança de sexo. Estado da pessoa. Conflito de competência 
julgado improcedente. 1. Compete ao juízo de família o processamento e julgamento 
das causas que envolvam retificação de registro civil relaciona a transexualidade. Afinal 
essa situação demanda a análise de um contexto muito mais amplo do que a simples 
aferição da-correção ou não do tegistro civil da pessoa natural:, já que diz respeito ao seu 
próprio estado. 2. Precedentes de aderentes tribunais da federação. 3. Conflito negativo 
de competência julgado improcedente para declarar o juízo da 5' Vara de Família de 
Vitória competente para o julgamento do processo 0011036-53.2013.8.0à.0b12. (TJES, 
CC 0027088-63.2013.8.08.0000, 1 C. Cív., Ra Des.Janete Vargas Simões, j. 11/03/2014). 
TRANSENUALIDADE O DIREjTO 1511 MODAR I 291 
que nada referem sobrepl pont0.83 Ou ti-as au torizama extração de certidão; sen dó 
que há juízes que determinam a publicação'decdital. Alguns julgamentos vetam 
a publicidade da mudança e determinam que a-averbação:permaneça éntsegredo 
de justiça, impedindo a extração de certidões revelando a situação anterior, talv6 
mediante requerimento do próprio interessado ou determinação ji.dicial. São 
gaúchas as decisões que melhor atendem ao direito do transexual dever respeitado 
direito à intimidade, um dos atributos do direito de personalidade. Além de 
impedirem a publicidade de qualquer referência à alteração do registro 'civil, 
proíbem extração de certidões referentes à situação anterior," bem como qualquer 
referência à alteração do registro civil." A tendência atual é determinar,a alteração 
83. 	Direito Civil. Registro público. Transexual submetido à cirurgia de redesignação Sexual, 
Alteração do prenome e do sexo. Decisão judicial. Averbação. Princípio da dignidade da 
pessoa humana. Recurso conhecido e não provido. Sentença mantida. 1.A interpretação 
conjugada dos arts. 55 e 58 da Lei n. 6.015/73, confere amparo legal para que transenutil 
operado obtenha autorização judicial para a alteração de seu prenome, substituindo.° 
por apelido público e notório pelo qual é conhecido no meio em que vive. 2. Conser-
var o "sexo masculino" no assento de nascimento do apelado, em favor da realidade 
biológica e em detrimento das realidades psicológica c social, bem como morfológica, 
pois a aparência do transexual redesignado (em tudo se assemelha ao sexo feminino), 
equivaleria a mantê-lo em estado de anomalia, deixando de reconhecer seu direito de 
viver dignamente. 3. Assim, tendo o apelado se submetido à cirurgia de redesignação 
sexual, existindo, portanto, motivo apto a ensejar a alteração para a mudança de sexo no 
registro civil, e a fim de que os assentos sejam capazes de cumprir sua verdadeira função, 
qual seja, a de dar publicidade aos fatos relevantes da vida social do indivíduo, forçosa , 
se mostra a admissibilidade de sua pretensão, devendo ser alterado seu assento de nas-
cimento a fim de que nele conste o sexo feminino, pelo qual é socialmente reconhecido. 
4. Recurso conhecido e não provido. Sentença mantida in totum, no sentido de retificar 
registro civil de nascimento de xxxx, para constar o nome xxxxxx e o sexo feminino, 
tudo conforme o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e da Lei de Registros Pet. 
blicos. (TJCE, Proc. 0030853-06.2010.8.06.0064, Rel. Maria Vilauba Fausto lopes,J. 
14/11/2012). 
Apelação cível. Transexualismo. Retificação de registro civil. Nome e sexo. Cerceamento 
do direito de defesa reconhecido. Procedimento cirúrgico de transgenitalização realizado. 
É possível a alteração do registro de nascimento relativamente ao sexo e ack nome em 
virtudeda realização da cirurgia de redesignação sexual. Vedação de extração &certidões 
referentes situação anterior do requerente. Apelo provido (TJ RS, AC 70013580055,8* ; 
C. Cív., Rel. Des. Claudir Fidelis Faccenda, j. 17/08/2006). • 
Apelação eiVel..Registro civil. Alteração. Prenome e gênero. Transexualismo: Proibição. 
de referência quanto à mudança. Possibilidade. Determinada a alteração-do régiStrócN 
de -nascimento em casos - de tiansexualidade, desde que demonstra-da á. éXistênefitélk 
alopatia, e imperiosa a proibição de referência no registro civil quantaà mudança—At 
de preservara intimidade do apelado. Negaram provimento (TJRS, AC .70021-1203221-
8" C. Civ., ReL, Des. Rui Portanova, j. 11/10/2007). 
certidões do registro não pódem ser dadas a terceiro-, salvo aái;róprionitéMáAdo....., oti-por requisição judicial'. 	• 	 . • • 
tITI.V,IIMI) 
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ressaniepte-Teço,rIle áfieici dó regiStaicriviféfiíe não seja feíta-élità14tier rfWi 7el-di•;Sittiaçãã e 
A necessidade de proteger o direito à identidade impõe tainhern tutela:: 
modificação levada a efeito quanto ao nome e ao sexo. Não basta siMiileSWeillíte 
proteger a identidade. Há que se tutelar também a modificação dos caracte4í? 
sexuais levada a efeito. A identidade do transgênero só será assegurada quáriliá3 representar de modo fiel a rea1idade.88 Despiciendo proceder à alteração regi St?" 
se restar desnudada a causa da alteração. Permanecerá limitado o seu direito de 
viver. Qualquer menção em documentos de ser o indivíduo um transexual atenta-
contra seu direito de personalidade, além de se estar criando a categoria de um, 
terceiro sexo.89 Essa é a única solução aceitável e que não afronta os direitos e as 
garantias individuais constitucionalmente assegurados. 
15.12 A possibilidade de casar 
Como qualquer pessoa, o transexual também tem vontade de casar e formar 
uma família, e não há na lei nenhum impedinien to ao casamento. Nada justifica 
SP-São Paulo— Proc. n. 0045549-04.2012.826.0005. Rel. Juiz de Direito Michel Chakur 
Parati, j: 10/05/2013 (íntegra no si te <v,r‘vvv.direitohomoafetivo.coni.br>). 
Alteração de registro civil. Transexual. RedeSignaçãO do generb nó registro civilinexisténcia 
no ordenamento jurídico de uma previSãO qiie torne o pedidci iriviável. Art. 	II I; art. 3.0, IV e art. 5.0, X da-CF/8$. Princípicis da dignidade da pessoa húniana édainVidlabilidade da 
- intimidade. Se não ciaste no ordenamentá jinidico qtia lquer vedação à alteração &registro 
de pessoa transexual, não há que se falar em impossibilidade jurídica dopédido;que é en, 
contra da n os princípios e valores que a Constituição da República sobreleva.•Seguindo-se os 
preceitos constitucionais, a dignidadedapéssoa humana, enquan toprincípio fundamental 
da república federa tivad o Bfasilxonstitui diretriz:que deve norteara alteração de registro 
civil de transexual:.A,Carta:Magna objetiva em-seu art..3.° promovei o,bem 'de todos sem 
qualqúer preconceito de sexo'e salientano.inc. x•de seivart. 5.? ser-invi °lavei a intimidade? 
a honra e a vida privadade'titriaPéSsog: Deve-sei destalórnia?adaptat atcleSWiaçãO sexual 
prenome à nova situação do cidadão., gptioelpio davet2acicladc que portela gregistro ptiblicoimpõe,,que:seja.feita. a anotação:asna:rum:geai de,quejSe-tratá clçavçfliação feita 
,.nPrdemjudJGiali.cijMG., AC 08167,62g9.:20978.13.0.647.,1W:.Cív.,.Re_40c.s4-Vanessa 
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ou o sexo pelo qual optou. Nem ó juiz e nem o legislador devem 'niers-yr?. 
à identidade pessoal. Integra o restrito campo do livre arbítrio der.todtkeqi 
indivíduo o direito de revelar ou ocultar seu sexo real, o sexo com o‘citiabeà 
de respeito

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