Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
1 Clínica Cirúrgica de Pequenos Animais Por: Tathiely Costa Hérnias Umbilicais e Abdominais Definições Hérnias abdominais externas •São defeitos na parede externa do abdome que permitem a protrusão do conteúdo abdominal •Podem envolver a parede abdominal em qualquer local diferente do umbigo, anel inguinal, canal femoral ou escroto Hérnias abdominais internas •São aquelas que ocorrem através de um anel de tecido confinado dentro do abdome ou do tórax (p. ex., hérnia diafragmática e hérnia de hiato) Hérnias umbilicais •Ocorrem através do anel umbilical. O conteúdo das hérnias verdadeiras geralmente está incluso em um saco peritoneal Hérnias falsas •Permitem a protrusão de órgãos fora de uma abertura abdominal normal, por isso, o conteúdo também está contido em um saco peritoneal Onfaloceles •São grandes defeitos de pele da linha média umbilical Considerações gerais e fisiopatologia clinicamente relevante •Hérnias abdominais geralmente ocorrem secundariamente a um trauma, como os acidentes veiculares ou as feridas por mordidas; entretanto, elas ocasionalmente ocorrem como lesões congênitas •Hérnias abdominais craniais congênitas (craniais ao umbigo) têm sido relatadas em associação a hérnias peritônio-pericárdicas em cães e gatos •As hérnias abdominais são hérnias falsas, pois elas não contêm um saco herniário. Quando associadas a traumas sem corte, elas surgem como resultado de ruptura da parede interna, a qual é causada por um aumento da pressão intra-abdominal enquanto os músculos abdominais são contraídos. Os locais mais comuns para hérnias abdominais traumáticas são a região pré-púbica e o flanco •Hérnias do ligamento púbico cranial frequentemente ocorrem em associação a fraturas púbicas •As hérnias paracostais podem permitir a migração do conteúdo abdominal ao longo da parede torácica. Em casos raros, o conteúdo abdominal entra no tórax através de defeitos nos músculos intercostais •Quase a metade dos animais que sofrem de hérnia abdominal traumática tem lesões simultâneas graves, incluindo ortopédicas (ex., pelve) e lesões dos tecidos moles; assim, um exame físico completo de todos os animais afetados deve ser executado 2 Clínica Cirúrgica de Pequenos Animais Por: Tathiely Costa •Hérnias umbilicais geralmente são congênitas, causadas por embriogênese defeituosa. Os vasos umbilicais, o ducto vitelínico e a haste do alantoide passam através do anel umbilical no feto, mas esta abertura se fecha no nascimento, deixando uma cicatriz umbilical •Se houver falha na contração da abertura ou se ela for muito larga ou inapropriadamente formada, resulta uma hérnia. Estas hérnias são cercadas por um saco peritoneal e são consideradas hérnias verdadeiras •A causa das hérnias umbilicais raramente é conhecida, mas acredita-se que a maioria seja hereditária. Muitos cães machos com hérnias umbilicais são criptorquidas •A onfalocele permite que os órgãos abdominais se protruam externamente (eviscerem). Os conteúdos abdominais inicialmente são cobertos por tecido amniótico, mas esta membrana de cobertura é facilmente rompida. A maioria dos neonatos acometidos morre ou sofre eutanásia ao nascer Diagnóstico Predisposição •A maioria dos animais com hérnia umbilical ou abdominal é jovem. Acredita-se que hérnias umbilicais são herdadas em algumas raças (p. ex., airedale, basenji, pequinês) •Hérnias abdominais ventrais craniais associadas a hérnias diafragmáticas peritoneopericárdicas podem ser herdáveis em cães da raça weimaraner Histórico •Um histórico de trauma é comum em hérnias abdominais. A hérnia inicialmente pode não ser notada, enquanto as injúrias mais óbvias ou danos que trazem risco de vida são tratados •As hérnias umbilicais mínimas frequentemente não são notadas até que o animal seja examinado para castração. Se ocorrer estrangulamento ou obstrução intestinal, o animal pode ser apresentado ao clínico para tratamento de vômito, dor abdominal, anorexia e/ou apatia Exame físico •O aumento de volume deve ser palpado com cuidado para discernir o conteúdo da hérnia (p. ex., intestino, bexiga, baço) e para localizar o defeito abdominal. Estes pacientes devem ser inteiramente examinados para determinar se há uma lesão concomitante torácica, abdominal ou anormalidades. •Muitas vezes, a ruptura do ligamento púbico cranial é difícil de ser palpada devido ao aumento de volume no subcutâneo e da dor •As hérnias umbilicais geralmente se manifestam como uma massa abdominal ventral macia na cicatriz umbilical. Palpações profundas do aumento de volume revelam o tamanho do anel umbilical e auxiliam na caracterização dos componentes da hérnia •O anel da hérnia não é palpável em alguns animais porque ele se fecha subsequentemente à herniação do ligamento falciforme ou omento. Ocasionalmente, o intestino ou outras estruturas abdominais podem ser palpados; o conteúdo hernial geralmente pode ser reduzido para a cavidade abdominal •Se o saco herniário estiver quente ou dolorido e os componentes estiverem irredutíveis, deve-se suspeitar de estrangulamento ou obstrução intestinal Obs.: Assegurar-se de avaliar os cães com hérnias congênitas para outros defeitos (p. ex., criptorquidismo em animais com hérnia umbilical, defeitos de septo ventricular e hérnias peritoniopericárdicas em animais com hérnia abdominal cranial) 3 Clínica Cirúrgica de Pequenos Animais Por: Tathiely Costa Diagnóstico por imagem •Radiografias devem ser realizadas em animais com hérnias abdominais. •Posicionamentos rotineiros dorsoventral e lateral podem mostrar uma lesão abdominal ou torácica associada (p. ex., fluido abdominal, hérnia diafragmática) •Radiografias abdominais podem auxiliar na confirmação da hérnia (i.e., alças intestinais no tecido subcutâneo e perda do contorno abdominal ventral) quando o defeito na parede abdominal não puder ser palpado devido ao aumento do volume ou à dor •Radiografias geralmente não são indicadas em pequenas hérnias umbilicais •Exame por ultrassom pode ser importante na definição dos componentes das hérnias Diagnóstico diferencial •A maioria das hérnias é diagnosticada no exame físico •Diagnósticos diferenciais para aumentos de volume abdominais incluem abscesso, celulite, hematoma ou seroma, e neoplasia Tratamento cirúrgico •A maioria das hérnias abdominais pode ser reparada suturando as extremidades do músculo rompido ou pela união das extremidades da parede abdominal rompida ao púbis, às costelas ou à fáscia adjacente. Uma malha sintética deve ser usada para reparar o defeito em casos raros •Algumas hérnias (p. ex., estrangulamento intestinal, obstrução urinária e trauma concomitante em órgão) requerem correções cirúrgicas emergenciais. Entretanto, a extensão da desvitalização muscular pode não ser aparente inicialmente e adiar a cirurgia em pacientes estáveis, até que o dano no músculo possa ser avaliado com exatidão •As complicações cirúrgicas mais comuns são a recidiva da hérnia e a infecção da ferida. Hérnias abdominais secundárias a feridas por mordida geralmente são contaminadas; são comuns a infecção da ferida e a deiscência da pele ou o reparo da hérnia (ou ambos). •As malhas não absorvíveis não devem ser utilizadas nestas hérnias e as feridas devem ser drenadas. O tratamento das feridas infeccionadas inclui cultura, drenagem, antibióticos e/ou lavagem •A laparotomia exploratória deve ser realizada por herniorrafia para diagnosticar lesões concomitantes em órgãos abdominais (p. ex., avulsão mesentérica, perfuração gástrica ou intestinal, herniação diafragmática e ruptura da bexiga) •Muitas hérnias umbilicais se resolvem espontaneamente em animais jovens, ou são pequenas e não são corrigidas até que o animalseja castrado. O fechamento espontâneo pode ocorrer até os seis meses de idade •O estrangulamento intestinal é mais provável que ocorra quando o defeito da hérnia está mais ou menos do tamanho do intestino e o saco herniário está grande •O estrangulamento com defeitos muito pequenos ou muito grandes é incomum. Se as vísceras abdominais na hérnia não puderem ser reduzidas, a cirurgia deve ser realizada assim que for possível Anatomia cirúrgica 4 Clínica Cirúrgica de Pequenos Animais Por: Tathiely Costa •A parede abdominal é composta de quatro camadas musculares (os músculos oblíquo externo e interno do abdome, o músculo reto do abdome e o músculo transverso do abdome) •As hérnias abdominais podem ocorrer nas inserções ou ligações destes músculos ou através do próprio ventre muscular •No cão, o ligamento púbico cranial (tendão pré-púbico) é uma faixa de fibras transversais que conectam os músculos abdominais ventrais à borda cranial do púbis •Em gatos, não existe tendão pré-púbico, em vez disso, os músculos abdominais se ligam diretamente com a cavidade pélvica Posicionamento •Para hérnias ventrais, o animal é colocado em decúbito dorsal e a área ao redor da hérnia é preparada para cirurgia asséptica •O reparo de rupturas do ligamento púbico cranial pode ser facilitado colocando-se o animal em decúbito dorsal com os membros posteriores flexionados e cranialmente distendidos Técnicas cirúrgicas Hérnias abdominais •Para a maioria das hérnias abdominais, realizar uma incisão abdominal mediana ventral para permitir que todo o abdome seja explorado. Avaliar a extensão da herniação visceral. Reduzir os componentes herniados e remover o tecido necrótico ou sem vitalidade em torno da hérnia •Fechar as camadas musculares da hérnia com suturas interrompidas simples ou contínuas simples •Se uma grande área de tecido sem vitalidade for removida, utilizar malha sintética, como Marlex® ou Prolene®, para fechar o defeito (não colocar malha não absorvível nos locais infectados). Dobrar as extremidades da malha por cima e suturar as extremidades dobradas para o tecido viável utilizando suturas interrompidas simples •Danos ao ligamento púbico cranial podem ser de difícil reparação. Se for necessário, perfurar o osso púbico para ancorar as suturas Hérnias paracostais •Fazer uma incisão mediana ou diretamente sobre a hérnia. Explorar a hérnia e suturar as extremidades rompidas dos músculos transverso, oblíquo interno e externo do abdome •Incorporar uma costela na sutura se o músculo tiver sido avulsionado do arco costal Hérnias (pré-púbicas) do ligamento púbico cranial •Em cães, fazer uma incisão ventral mediana na pele e identificar o tendão rompido e sua inserção púbica. Avaliar os anéis inguinais e a lacuna vascular; estas hérnias podem se estender até a região femoral como resultado de ruptura do ligamento inguinal •Em gatos, inspecione a crura do anel inguinal superficial e aponeurose do músculo oblíquo externo do abdome de danos. Reposicione a margem livre da parede abdominal ao ligamento púbico cranial com suturas interrompidas simples, Sultan (ponto em “X”) ou Wolff (colchoeiro horizontal e com fio 5 Clínica Cirúrgica de Pequenos Animais Por: Tathiely Costa monofilamentar não absorvível (p. ex., polibutester [Novafil®], polipropileno [Prolene®], náilon) ou material de sutura absorvível •Se uma hérnia inguinal ou femoral estiver presente, recolocar o tendão pré-púbico para o púbis, antes de reparar os outros defeitos •Como alternativa, suturar o tendão restante à fáscia do músculo e periósteo cobrindo o púbis ou ancorá-lo ao púbis por orifícios no osso púbico, através das quais as suturas podem ser fixadas •Se a hérnia se estender até a região femoral, pode ser necessário suturar a parede abdominal à fáscia medial dos músculos adutores. Quando o fizer, tomar cuidado para evitar danificar os vasos ou os nervos femorais •Um flap do músculo sartório cranial pode ser usado para reparar lesões do tendão pré- púbico. Separar a porção cranial do músculo de sua porção caudal e do músculo quadríceps femoral. Seccionar a porção cranial do músculo na sua inserção distal no aspecto medial da patela e elevar até ao nível do pedículo vascular proximal (Fig. 19-7) •Girar o flap 180 graus para o defeito e fixe- o usando sutura simples. Use o flap para correção de hérnia inguinal ou femoral concomitante Hérnias Umbilicais •Para hérnias umbilicais, palpar o anel herniário, reduzir o conteúdo abdominal, se possível, e incisar a pele acima do umbigo. Se a hérnia contiver apenas tecido adiposo ou omento, ligar o istmo herniário e retirar o saco e seu conteúdo. •Como alternativa, se as aderências não estiverem presentes, inverter o saco e seu conteúdo na cavidade abdominal. Não debridar as margens da ferida. Suturar as bordas do defeito com fio de sutura absorvível sintético monofilamentar (p. ex., polidioxanona [PDS®], poligliconato [Maxon®], poliglecaprone 25 [Monocryl®], glycomer 631 [Biosyn®]) em padrão simples interrompido •Se os componentes herniais não puderem ser reduzidos, realizar uma incisão elíptica em torno do aumento de volume para evitar danos aos componentes herniados. Incisar o saco herniário e recolocar os componentes na cavidade abdominal •Se os componentes forem irredutíveis ou se houver estrangulamento ou obstrução intestinal, estender o defeito abdominal na linha mediana. Explorar o abdome e inspecionar os intestinos para verificar a viabilidade antes de fechar o defeito. O reparo da hérnia umbilical raramente requer implantação de malha Avaliação é cuidados pós-operatórios •O cuidado no pós-operatório destes pacientes está relacionado com a presença de ferida concomitante ou doença •O paciente deve ser mantido em repouso e a ferida deve ser monitorada frequentemente em relação a infecção ou deiscência. Vômito, febre e/ou leucocitose podem indicar peritonite 6 Clínica Cirúrgica de Pequenos Animais Por: Tathiely Costa Prognóstico •O prognóstico geralmente é favorável, sendo a recidiva incomum. Quando ocorre a recidiva, ela geralmente é notada dentro de poucos dias após a cirurgia. Os resultados a longo prazo são excelentes para a maioria dos animais quando se utilizam técnicas apropriadas Fonte: FOSSUM, Theresa Welch. Cirurgia de pequenos animais. Elsevier Brasil, 2015.
Compartilhar