Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
FUNDAMENTOS DE ADMINISTRAÇÃO HOSPITALAR E SAÚDE Ligia Maria Fonseca Affonso Definições e estruturas de home care e day hospital Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Descrever a importância da estrutura de home care na atualidade. � Ilustrar o desenvolvimento do hospital tradicional para o day hospital. � Analisar a tendência na área da saúde para os novos serviços hospi- talares. Introdução São muitos os desafios a serem enfrentados no campo da saúde. Há o avanço significativo das doenças crônico-degenerativas; o envelheci- mento da população; a pressão pela incorporação de novas tecnologias; e os altos custos de procedimentos em saúde; entre outros aspectos que impactam diretamente as instituições prestadoras de serviços, como clínicas e hospitais. Nesse cenário é preciso buscar práticas que otimizem a utilização dos recursos e a redução dos custos de manutenção do cuidado. Neste capítulo, você vai conhecer a importância da estrutura de home care na atualidade; o desenvolvimento do hospital tradicional para o day hospital e a tendência na área da saúde para os novos serviços hospitalares. Home care Antes de falarmos sobre o significado de home care e de sua importância no contexto atual de saúde, vamos ver um breve resumo sobre sua existência. O cuidado domiciliar não é algo novo na medicina: referências antigas já descreviam cuidados domiciliares, começando por um médico chamado Imho- tep, no século XIII a.C, que atendia seus pacientes em suas casas ou em seu consultório. Outro registro diz respeito ao médico Asklépios, que, na Grécia Antiga, também atendia seus pacientes em suas casas, enquanto seus seguidores realizavam atendimento em templos, onde tinham disponíveis medicamentos e materiais especiais para a cura. No século V a.C, Hipócrates, em suas ob- servações, defendia a eficiência do atendimento domiciliar, pois acreditava que esse cuidado apresentava bons resultados. Outra prática domiciliar de que se tem conhecimento é a do médico homeopata Samuel Hanneman, que, no século XVII, visitava seus doentes, pois acreditava que o médico deveria lutar incansavelmente contra a enfermidade, independente do local onde esta se apresentasse (TAVOLARI; FERNANDES; MEDINA, 2000). Em 1850, a enfermeira Lilian Wald criou o programa Public Health Nurse, que promovia ações de saúde em domicílio para pacientes com doenças crôni- cas. Tempos depois, esse programa passou a receber financiamento das segu- radoras de saúde dos Estados Unidos (Medicare e Medicaid). A enfermeira se dedicava à prática de atendimento domiciliar e acreditava que a doença deveria ser vista também sob os aspectos social e econômico, ou seja, esses pacientes necessitavam permanecer por longo período no leito, o que os impossibilitava de exercer sua independência, e eles, por consequência, apresentavam, além da doença, problemas econômicos e sociais. Em 1898, algumas cidades e municípios passaram também a financiar os cuidados domiciliares de saúde (MONK-TUTOR, 1998). Em 1950 começaram a surgir alguns modelos de assistência domiciliar com a finalidade de dar cobertura onde as seguradoras não estavam preparadas para financiar. Anos mais tarde, mais precisamente em 1976, esses cuidados começam a ser organizados tendo como referência o Dispensário de Boston, hoje conhecido como o New England Medical Center (SILVA, 2000). Aqui no Brasil o primeiro sistema de cuidado domiciliar surge em 1967 no Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo, visando diminuir a quantidade de leitos ocupados. Assim, foi criado um tipo especial de cuidado domiciliar com serviços de baixa complexidade clínica. A partir daí começaram a surgir empresas privadas realizando esse serviço, e, entre os anos de 1994 e 1999, esse modelo se tornou moda, sendo fonte de lucro fácil. No entanto, a maioria não possuía estrutura correta e adequada para o atendimento, e essas empresas logo foram desqualificadas pelo mercado e pelo público-alvo. Definições e estruturas de home care e day hospital2 A complexidade da atenção à saúde se define de acordo com os procedimentos ado- tados para o cuidado à saúde. A baixa complexidade de um serviço significa que este demanda um rol de procedimentos mais simples e baratos e que conseguem atender a maior parte dos problemas comuns de saúde da população. A média complexidade demanda a disponibilidade de profissionais especializados e de recursos tecnológicos para serviços de diagnóstico e tratamento. A alta complexidade, por sua vez, demanda alta tecnologia e alto custo, para o atendimento qualificado em saúde (BRASIL, 2007). A Assistência Domiciliar à Saúde (ADS) refere-se a um conjunto de serviços que são oferecidos aos indivíduos que necessitam de cuidados de saúde que, ao invés de serem oferecidos em um hospital, são oferecidos em suas casas. Para a Organização Mundial da Saúde (OMS), a ADS é definida como a prestação de serviços de saúde que visam a promoção, restauração e ma- nutenção do conforto, da função e da saúde das pessoas com excelência, inclusive cuidados que propiciem uma morte digna. Esses serviços podem ser preventivos, terapêuticos, reabilitadores, paliativos e de acompanhamento por longo tempo, e podem ser prestados formal ou informalmente. Para o Ministério da Saúde (MS), a ADS é chamada de Atenção Domiciliar (AD) e definida como um conjunto de ações integradas em saúde que acontecem a domicílio, voltadas a toda a população, e que compreende a articulação de ações de vigilância à saúde e assistência domiciliar e internação domiciliar. Cabe destacar que, embora não exista uma definição formal sobre os termos assistência, atendimento e internação domiciliar, no contexto do Home Health Care eles são bem distintos (TAVOLARI; FERNANDES; MEDINA, 2000). � Assistência domiciliar: refere-se a qualquer ação de saúde realizada a domicílio, independente de grau de complexidade ou finalidade. Ou seja, pode ser uma simples orientação até um procedimento altamente complexo. � Atendimento domiciliar: refere-se à prestação de serviços de saúde domiciliares menos complexos e que podem envolver ou não a neces- sidade de multiprofissionais da saúde. Normalmente são pessoas com problemas agudos e impossibilitadas de se deslocaram até um centro de saúde. São serviços que podem ser comparados àqueles que ocorrem em um consultório clínico. 3Definições e estruturas de home care e day hospital � Internação domiciliar: diz respeito a um cuidado mais intensivo e que demanda atendimento multiprofissional. Nesses casos é necessário levar parte de uma estrutura hospitalar para a residência dos pacientes, que podem ser considerados doentes com complexidade moderada ou alta. São serviços que podem ser comparados àqueles que ocorrem em um hospital, para pessoas que possam ser mantidas em casa por equipe exclusiva para essa finalidade. Para o MS, a AD é uma modalidade de atenção à saúde prestada nos domicílios pertencente às Redes de Atenção à Saúde (RAS), e que tem por objetivo oferecer prevenção e tratamento de doenças; reabilitação; paliação e promoção à saúde, assegurando a continuidade dos cuidados. Já o Serviço de Atenção Domiciliar (SAD) refere-se aos cuidados complementares àqueles oferecidos na atenção básica e em serviços de urgência, em substituição à internação hospitalar. O SAD é quem gerencia e operacionaliza as Equipes Multiprofissionais de Atenção Domiciliar (EMAD) e as Equipes Multipro- fissionais de Apoio (EMAP) (BRASIL, 2016). Atenção Básica: considerada a porta de entrada do Sistema Único de Saúde (SUS), oferece um conjunto de ações de saúde a toda a população, como promoção e proteção da saúde; prevenção de agravos; diagnóstico; tratamento; reabilitação e manutenção da saúde por meio de tecnologias de baixa intensidade (BRASIL, 2007). No Brasil, no âmbito privado existem dois tipos de empresas de assistência domiciliar: as que prestamserviços separados, ou seja, só atendimento de enfermagem ou fisioterapia, por exemplo, e as que oferecem atendimento mul- tiprofissional, cuidando do paciente de forma integral e holística. Lembrando que, como já comentado anteriormente, esses serviços apresentam diferenças quanto ao grau de complexidade do atendimento prestado, que pode ser alto, médio ou baixo. Ou seja, uma pessoa que necessite apenas de um simples curativo pode ser atendida por empresas que prestam serviços segmentados e de baixa complexidade; da mesma forma, um paciente com doença crônica, por exemplo, deve, de preferência, ser atendido por uma empresa que ofereça assistência multiprofissional de média ou alta complexidade. Vale ressaltar que Definições e estruturas de home care e day hospital4 as empresas mais experientes nesse tipo de assistência contam com programas de cuidado seguros e avançados, como poucos no mundo: conseguem oferecer aos pacientes todo o cuidado que eles teriam nos melhores hospitais do país, com excelência técnica, segurança e qualidade. As empresas que se propõem a prestar a assistência domiciliar de forma responsável devem contar com uma estrutura adequada ao porte e tipo de atendimento deman- dado (TAVOLARI; FERNANDES; MEDINA, 2000). Outro ponto a ser destacado é que essas empresas prestadoras de assistência domiciliar possuem como clientes não só os pacientes e suas famílias, como também médicos, os financiadores da saúde e os hospitais. No entanto, desses clientes, os que mais são beneficiados pelos serviços de home care são os pacientes e seus familiares. O cuidado recebido em casa afasta o doente do ambiente frio de um hospital e de suas regras rígidas, como horário de refeições, de exames, de visitas, do banho, da visita do médico, etc.; o afasta também de um ambiente cercado pela doença, onde os sentimentos envolvidos são o medo, insegurança, a incerteza sobre o futuro e sobre a doença e o sentimento de impotência, agravado ainda pelas informações muitas vezes curtas e ininteligíveis sobre o estado de saúde do paciente. Ao receber esse cuidado em casa, os horários podem ser flexíveis e de- terminados em acordo com a família, visto que, nesse contexto, a equipe e o tratamento é que se adaptam ao estilo de vida, hábitos e costumes do paciente. As informações sobre o estado de saúde e o tratamento da doença são fornecidas de forma detalhada, de modo que todos compreendam e possam contribuir para a recuperação do doente. Ou seja, o ambiente de casa, além de ser mais acolhedor, reduz a insegurança, aumenta a esperança de cura do paciente, aproxima-o de seu meio social e contribui positivamente para o processo de cura (BRASIL, 2013). Um fator que impulsionou o crescimento do home care no Brasil e no mundo foi a redução dos custos em saúde que essa modalidade proporciona. Quando comparada ao tratamento hospitalar, a redução de custos chega a 52%, segundo os financiadores de saúde. Além disso, em casa não há necessidade 5Definições e estruturas de home care e day hospital de cobrança de taxas; há a possibilidade de uso do home care como ferramenta de marketing; os recursos podem ser otimizados e os clientes ficam mais satisfeitos do que em um hospital. Para os hospitais, os benefícios do home care traduzem-se no aumento da rotatividade de seus leitos, favorecendo pacientes com maior necessidade de internação e, como consequência, maior lucratividade (TAVOLARI; FERNANDES; MEDINA, 2000). Outros benefícios do home care são: a humanização do atendimento; a recuperação mais rápida do paciente; a redução do risco de infecção hospi- talar; a redução do custo por dia de internação; a prevenção e minimização de eventuais sequelas; a redução de internações por recaídas, entre outros. Podemos concluir que o atendimento domiciliar vem ganhando cada vez mais espaço por sua simplicidade e eficácia, desde que não comprometa a segurança do paciente. Para saber mais sobre a atenção domiciliar no âmbito do SUS, leia a Portaria nº. 825, de 25 de abril de 2016, acesse o link a seguir. https://qrgo.page.link/hsvM Hospital tradicional e day hospital O hospital, antes do século XVIII, era uma instituição de assistência aos pobres e também de separação e exclusão, pois sua função era recolhê-los para proteger os cidadãos de bem do perigo que representavam. Na verdade, o centro das atenções do hospital era o pobre que estava doente e morrendo e não o doente que necessitava de cura. A preocupação era dar a eles a assis- tência material e espiritual, ou seja, dar-lhes os últimos cuidados e o último sacramento. Dessa forma, o objetivo do hospital não era curar doenças e, sim, proteger a cidade de possíveis ameaças nocivas, que pobres e outros doentes poderiam trazer à população saudável. Era um tipo de hospitalização que não exercia práticas de cura, mas que impedia a instalação da desordem econômica e social. Pode-se dizer que a formação da medicina hospitalar se deve, por um lado, à disciplinarização do espaço hospitalar e, por outro, à transformação do saber e da prática médica (TEIXEIRA et al., [200-?]). Definições e estruturas de home care e day hospital6 Entre os séculos XVIII e XIX, os hospitais passaram por uma mudança, deixando de lado o caráter unicamente assistencialista e passando a ser uma instituição estruturada, inclusive com mudanças em seus sistemas de poder. O hospital, administrado por religiosos que buscavam garantir a existência da instituição, ou seja, manter a vida cotidiana do hospital, a salvação e a alimentação das pessoas internadas, contava agora com a presença de um médico, que era chamado sempre que necessário, em momentos de crise. Assim, o hospital passou a ser considerado um instrumento terapêutico, e o médico passa então a ser o principal responsável pela organização hospitalar. Com o avanço da medicina as instituições hospitalares também evoluíam. Começaram a surgir os grandes hospitais, mas ainda com fortes características religiosas e com a atenção e serviços de enfermagem. Essa situação começa a mudar no início do século XX, quando a assistência médico-hospitalar é vista com outros olhos e passa a incentivar a transformação dos hospitais em locais de cura e não mais de caridade. Os avanços da medicina, da tecnologia e da medicina científica impulsionaram essas transformações. As mudanças continuaram e os hospitais passaram a ser vistos como um negócio e conse- quentemente começaram a envolver práticas de controle de qualidade, exigindo uma gestão mais empresarial. Há então maior preocupação com a alocação de recursos materiais e humanos e a avaliação de sua capacidade técnica e utilização correta. Quanto maior eram os avanços tecnológicos e os avanços da medicina científica, maior era a revolução no papel dos hospitais e o aumento de sua complexidade, e isso não mudou, ou seja, hoje essas mudanças ocorrem cada vez mais rápido e são tão marcantes que vêm sendo consideradas como a mudança das mudanças (TEIXEIRA et al., [200-?]; GONÇALVES, 2006). O hospital é uma instituição que sofre influências políticas, econômicas, sociais, tecnológicas, culturais, demográficas e ecológicas, o que o faz operar em ambiente imprevisível e instável. Dessa forma, a flexibilidade, adaptabi- lidade e responsabilidade são as palavras-chave para que o hospital consiga atender às necessidades de prevenção, tratamento e recuperação dos pacientes e às necessidades do mercado. Nesse cenário, essas organizações não possuem controle sobre as condições necessárias para seu funcionamento e sobrevivência e dependem cada vez mais de recursos externos. Assim, devem estar atentas a todas as alterações desse ambiente, de modo a se preparar para as adaptações necessárias. No entanto, é preciso lembrar que o cenário interno também influencia diretamente no desempenho da organização. Essas mudanças e esse ambiente incerto acabam por interferir na assistência que o paciente espera receber, ou seja, sensibilizadopela doença que o atinge, o paciente espera encontrar pessoas e equipamentos em condições de lhe prestar todo cuidado 7Definições e estruturas de home care e day hospital de que necessita, e, por isso, o hospital deve estar organizado para assegurar a seus pacientes plenas condições de recuperação e cura. Para isso ele precisa adaptar-se continuamente para enfrentar os constantes avanços do conhecimento, da tecnologia médica e de equipamentos de última geração e sua instalação. Esse é um fator extremamente importante para a qualidade dos serviços prestados: os hospitais precisam de aparelhos cada vez mais sofisticados para atender o paciente de forma integral e expertise na instalação, operação e manutenção destes. Outro ponto de extrema importância diz respeito ao corpo clínico e adminis- trativo do hospital. Este emprega uma quantidade significativa de profissionais com diferentes formações, o que demanda conhecer e lidar com cada um. Os serviços de alta complexidade exigem alto grau de especialização. No entanto, além da titulação acadêmica exigida e da formação continuada, o hospital deve estar atento ao padrão de relacionamento que o médico e demais profissionais, principalmente os da assistência, conseguem estabelecer com os pacientes. Em uma condição de vulnerabilidade, os pacientes esperam encontrar na figura do médico e demais profissionais da assistência o conforto para seus medos e insegurança e para suas dúvidas quanto à doença e às chances de cura. O paciente precisa confiar nesses profissionais, pois esse é um fator que contribui para o processo de recuperação de sua saúde. Dessa forma, é preciso criar vínculo com o paciente, escutá-lo, olhar em seus olhos e respeitar sua condição. Outro aspecto do ambiente hospitalar é a grande divisão de trabalho exis- tente, e que requer diferentes habilidades técnicas, além da coordenação dessas atividades e dos sistemas administrativos. Acontecem nesse ambiente, simul- taneamente, serviços de hotelaria, farmácia, lavanderia, restaurante, centro de tratamento, laboratório e diagnóstico, entre outros, dando à organização um caráter dinâmico. Além da finalidade de assistência ao doente, o hospital abrange ainda as funções de ensino e pesquisa, fatores que merecem igual aten- ção do administrador. Assim, é possível verificar que administrar um hospital é algo cada vez mais desafiador e exige, além de formação específica, uma série de cuidados para a sobrevivência e modernização da organização e para o atendimento integral das necessidades dos pacientes (GONÇALVES, 2006). A nova necessidade de atendimento que vem se somando às atividades cotidianas do hospital é a cirurgia ambulatorial, também chamada de day hospital ou hospital-dia no Brasil, que pode ser realizada dentro ou fora do ambiente hospitalar e é voltada ao atendimento de lesões que necessitam de intervenção cirúrgica de menor porte, sem a necessidade de internação do doente. Ou seja, o day hospital consiste no atendimento cirúrgico médico- -hospitalar, com a utilização de todos os tipos de anestesia, cujos pacientes Definições e estruturas de home care e day hospital8 retornam para suas casas em até 12 horas de recuperação pós-operatória, ou seja, é o regime intermediário de assistência, entre a internação e o atendi- mento ambulatorial, cujos procedimentos clínicos, cirúrgicos, diagnósticos e terapêuticos são indicados a pacientes cuja permanência na unidade é reque- rida por um período máximo de 12 horas, sendo em alguns casos aceitável a permanência do paciente por até 24h. Para saber mais sobre o day hospital no âmbito do SUS acesse o link a seguir. https://qrgo.page.link/L1cT O maior interesse pela cirurgia ambulatorial teve início na década de 1960, impulsionado pelos avanços nas áreas de anestesia e cirurgia, que possibilitavam uma recuperação rápida e com menor índice de complicações do paciente pós- -cirurgia. Nos anos 1970, nos Estados Unidos, dois anestesistas inauguraram o Surgicenter, em Phoenix, com a finalidade de oferecer assistência cirúrgica de qualidade ao paciente cuja operação fosse complexa demais para um consultório, mas que não exigisse hospitalização. Esses anestesistas estabeleceram alguns conceitos e práticas que até hoje exercem influência no campo da cirurgia am- bulatorial, como os critérios de seleção dos pacientes; a adequação dos tipos de procedimentos anestésicos e as técnicas de cirurgia e outros conceitos relacionados à alta e ao acompanhamento do paciente (WATSON; SANGERMANO, 1997). Dentre as vantagens desse tipo de serviço podemos destacar (YAMASHITA, 1996): � diminuição do número de internações e consequentemente a redução do custo hospitalar; � menor ocupação de leitos hospitalares por pacientes que não possuem necessidade de internação por longo período, cedendo lugar àqueles pacientes com necessidades de internação prolongada; � redução do nível de ansiedade e estresse de um ambiente hospitalar, permitindo que o paciente retorne para o conforto de seu lar; � rápido retorno do paciente às suas atividades laborais e sociais; � diminuição do risco de infecção hospitalar. 9Definições e estruturas de home care e day hospital O objetivo do day hospital é realizar procedimentos cirúrgicos de pequeno e médio porte a nível ambulatorial, sem comprometer a integridade dos pa- cientes, seguindo as regras estabelecidas pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), que determina que o local possua condições higiênicas e sanitárias; instrumentos esterilizados; registro de todos os procedimentos realizados; condições adequadas para práticas anestésicas; suporte hospitalar caso seja necessária uma internação e assistência após a alta garantidos aos pacientes. No entanto, existem critérios para a seleção de pacientes para esse procedimento: não devem apresentar comprometimento sistêmico grave, por doenças ou por doença cirúrgica; pacientes que apresentem distúrbios sistêmicos moderados ou doenças gerais compensadas, mas que não necessitem de cuidados espe- ciais no pós-operatório, devendo estar acompanhados de um adulto, lúcido (YAMASHITA, 1996). Dessa forma, podemos concluir que a facilidade do procedimento, a recu- peração e liberação rápida do paciente, e principalmente a redução de custos são os aspectos que mais vêm impulsionando esse procedimento, no mundo e no Brasil. O Day Hospital é um centro especializado em cirurgias de pequeno e médio porte que não necessitam de longos períodos de internação. No Brasil, são muitas as clínicas especializadas; no entanto, o único day hospital com certificação ISO 9001 é o Campinas Day Hospital, criado em 1995 (CAMPINAS DAY HOSPITAL, 2019). Tendências na área da saúde para os novos serviços hospitalares As tendências na área da saúde são diversas e com certeza exercem impactos sobre os hospitais. Aspectos como demografia, perfil epidemiológico, recursos humanos, tecnologia, custos; oferta de leitos e outros aparecem em vários estudos sobre o tema. Cabe destacar que os aspectos apresentados a seguir são alguns dos elementos que compõem o cenário altamente complexo que envolve o setor da saúde (VECINA NETO; MALIK, 2007). Definições e estruturas de home care e day hospital10 Demografia: Em todos os cenários propostos por vários autores sobre o tema, o envelhecimento da população aparece como a principal tendência. Esse fato reflete no aumento da demanda por serviços de saúde por parte da população de 65 anos ou mais, ou seja, esse público tende a demandar quatro vezes mais internações que a média da população. Perfil epidemiológico: as doenças crônico-degenerativas e causas externas (doenças e agravos não transmissíveis); doenças como dengue, tuberculose e cólera (doenças re-emergentes); e as doenças infecto-contagiosas como a AIDS, hantaviroses e bactérias ultrarresistentes a antibióticos serão as principais causas de mortalidade, o que aumentará a demanda por serviços de saúde cada vez mais complexos.Os pacientes com doenças crônico-degenerativas terão maior necessidade de cuidados por períodos mais longos, e quanto mais acentuada forma a idade, maior será a necessidade de internação e recursos tecnológicos. Recursos humanos: a tendência é a diminuição do número de trabalhadores contratados como pessoa física, acarretada pelo aumento de cooperativas e outras empresas de prestação de serviços a clínicas e hospitais, e essa prestação de serviços sob diversas formas. Há tendência também na queda da qualidade na formação de profissionais da assistência, em decorrência da grande oferta de cursos existentes e da qualidade duvidosa de seus conhecimentos. Os hospitais deverão investir na retenção de seus talentos, pois más contratações geram, dentre tantos prejuízos, desperdício, retrabalho e redução na qualidade dos serviços de saúde prestados. Tecnologia: a busca por novos equipamentos, soluções para problemas de saúde e novas drogas continuará em ritmo crescente, com custos mais altos e maiores margens de lucro, maior capacidade de salvar vidas e aumentar a qualidade de vida, que somadas às tecnologias já existentes, terão demanda crescente. A incorporação dessas tecnologias em hospitais terá elevação crescente nos custos hospitalares e consequentemente no bolso dos pacientes. Custo: os custos de insumos diretos e indiretos envolvidos na assistência con- tinuam aumentando, o que eleva os preços do setor da saúde, sem contar com a inflação intrínseca do setor. A explicação é que os preços na saúde crescem mais que os da economia em geral, e isso pode ser acarretado pelo aumento da demanda pelos serviços que não são compatíveis com tal crescimento, pela pressão pela incorporação de novas tecnologias, etc. 11Definições e estruturas de home care e day hospital Oferta de leitos: a falta de planejamento urbano continuará a influenciar a disponibilidade de leitos nos hospitais do país. Apesar de os hospitais públicos e privados contarem com um número de leitos suficiente pra toda a população, estes são mal divididos por região. Apesar dos fatores apresentados acima, estudos apontam para uma redução da necessidade de leitos hospitalares no Brasil, mas referente ao setor privado e em algumas especialidades. Hoje existem várias ações que visam reduzir a utilização de leitos hospitalares, por iniciativa dos próprios hospitais. O fato é que as tecnologias atuais, ou seja, os medicamentos, anestesias, cirurgias, diagnósticos menos invasivos, equipamentos de última geração, etc., contri- buem para o tratamento e a rápida recuperação do paciente, diminuindo sua permanência nos leitos hospitalares, uma vez que recebem alta antes do tempo previsto incialmente. Dentre essas ações, podemos destacar os cuidados alter- nativos que atuam como serviços substitutivos e podem ou não ser realizados nos hospitais. Estamos falando da assistência domiciliar (home care) e do hospital-dia (day hospital) (VECINA NETO; MALIK, 2007). Você viu que a assistência domiciliar ou o home care tem por finalidade evitar a permanência prolongada do paciente em um hospital, prestando todos os cuidados de que ele necessita em sua residência ou nem chegando a interná- -lo. Quem determina os critérios para indicação da assistência domiciliar é a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Cabe destacar que, apesar de todos os benefícios que traz para o paciente, alguns financiadores da saúde ainda são resistentes a esse tipo de cuidado. Em relação aos custos, podemos dizer que, se comparados a uma internação hospitalar, podem ser reduzidos, mas isso depende da gravidade do caso. Há ainda que se considerar que, em caso de necessidade de uma assistência de maior complexidade, tanto o paciente que teve alta hospitalar para continuar o tratamento em casa quanto aquele que iniciou a assistência terapêutica em casa devem ser encaminhados para um serviço que disponha da infraestrutura necessária (VECINA NETO; MALIK, 2007). É importante ressaltar que o atendimento domiciliar está disponível para todo o tipo de público: jovens, adultos e idosos e crianças. O hospital-dia ou day hospital também evita a internação de pacientes que não necessitam estar em um hospital após procedimentos diagnósticos e terapêuticos como cirurgias ambulatoriais e quimioterapias, por exemplo, ou seja, esses procedimentos podem acontecer em nível ambulatorial, não sendo necessário o regime de internação do paciente. No entanto, se esses procedi- mentos acontecem em clínicas de Day Hospital, é importante poder contar com hospitais de referência, caso os procedimentos ambulatoriais ofereçam Definições e estruturas de home care e day hospital12 risco e complicações ao paciente. No caso do day hospital, muitas operadoras de planos de saúde são resistentes em remunerar eventos fora do ambiente hospitalar, considerando que são procedimentos dispensáveis. A utilização desses dois novos serviços hospitalares vem aumentando acentuadamente nos últimos anos no mundo, e a tendência é aumentar tam- bém no Brasil, impulsionada pelos avanços e inovações tecnológicas; pelo aumento da satisfação dos pacientes, visto o preparo dos profissionais na prestação desses serviços e os benefícios apresentados na recuperação do paciente; pela necessidade de redução de custos no setor da saúde, apoiados por políticas governamentais e de grupos privados que financiam a saúde; pela crescente necessidade de disponibilidade de leitos hospitalares; entre outros (GONÇALVES, 2006). Dessa forma, podemos concluir que os hospitais e todo o sistema de saúde estão inseridos em um ambiente altamente complexo, dinâmico e imprevisível, e recebem todo o tipo de influencias internas e externas. A flexibilidade e a capacidade de adaptação são as palavras-chave nesse contexto, contribuindo para que o hospital consiga atender às necessidades de prevenção, tratamento e recuperação dos pacientes, cada vez mais exigentes, e às necessidades do mercado, cada vez mais acirrado. Dessa forma, é preciso investir em novas possibilidades capazes de, ao mesmo tempo em que atendem os pacientes com qualidade, reduzir os custos dos serviços para que as organizações consigam sobreviver. O home care e o day hospital já são realidade no mundo e no Brasil, com forte tendência de crescimento. BRASIL. Conselho Nacional de Secretários de Saúde. Assistência de média e alta comple- xidade no SUS. Brasília, DF: CONASS, 2007. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/ bvs/publicacoes/colec_progestores_livro9.pdf. Acesso em: 8 abr. 2019. BRASIL. Portaria nº 825, de 25 de abril de 2016. Redefine a atenção domiciliar no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) e atualiza as equipes habilitadas. Brasília, DF, 2016. Dis- ponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2016/prt0825_25_04_2016. html. Acesso em: 8 abr. 2019. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção a Saúde. Departamento de Aten- ção Básica. Caderno de atenção domiciliar. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2013. v. 2. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/caderno_atencao_domi- ciliar_melhor_casa.pdf. Acesso em: 8 abr. 2019. 13Definições e estruturas de home care e day hospital CAMPINAS DAY HOSPITAL. Campinas Day Hospital completa 18 anos. Campinas, 2019. Disponível em: http://campinasdayhospital.hospedagemdesites.ws/noticia/2012/01/28/ campinas-day-hospital-completa-18-anos. Acesso em: 8 abr. 2019. GONÇALVES, E. L. Gestão hospitalar: administrando o hospital moderno. São Paulo: Saraiva, 2006. MONK-TUTOR, M. R. The U.S. home infusion market. American Journal of Health-System Pharmacy, v. 55, n. 19, p. 2019-2025, 1998. SILVA, F. S. Manual do home care. 2. ed. São Paulo: Rimed, 2000. TAVOLARI, C. E. L.; FERNANDES, F.; MEDINA, P. O desenvolvimento do home health care no Brasil. Revista de Administração em Saúde, v. 9, n. 3, p. 15-18, 2000. Disponível em: http://www.cqh.org.br/portal/pag/anexos/baixar.php?p_ndoc=246&p_nanexo=%20 29. Acesso em: 8 abr.2019. TEIXEIRA, J. M. de C. et al.. Planejamento estratégico e operacional em saúde. In: GES- TÃO hospitalar. [S. l.: s. n.], [200-?]. cap. 2. Disponível em: http://www.saude.sp.gov.br/ resources/ses/perfil/gestor/documentos-de-planejamento-em-saude/elaboracao-do- -plano-estadual-de-saude-2010-2015/textos-de-apoios/livro_gestao_hosp_cap2_pla- nej_estrat_e_operacional_em_saude.pdf. Acesso em: 8 abr. 2019. VECINA NETO, G.; MALIK, A. M. Tendências na assistência hospitalar. Ciência & Saúde Coletiva, v. 12, n. 4, p. 825-839, 2007. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/csc/ v12n4/02.pdf. Acesso em: 8 abr. 2019. WATSON, D. S.; SANGERMANO, C. A. Cirurgia ambulatorial. In: MEEKER, M. H.; ROTHROCK, J. C. Alexander: cuidados de enfermagem ao paciente cirúrgico. 10. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1997. YAMASHITA, A. M. Anestesia ambulatorial. In: ORTENZI, A. V.; TARDELLI, M. A. Anestesio- logia: SAESP. São Paulo: Atheneu, 1996. p. 631-639. Definições e estruturas de home care e day hospital14
Compartilhar