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Texto 1- Travessias no Estágio em Gestão de Escolas Enfase no Campo Pedagogico-3

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TRAVESSIAS NO ESTÁGIO EM GESTÃO DE ESCOLAS: ÊNFASE NO 
CAMPO PEDAGÓGICO 
 
Jerônimo Sartori - jetori55@yahoo.com.br 
Campus Erechim - UFFS 
 
Resumo: 
Este estudo discute o Estágio Curricular Supervisionado em “Gestão de Escolas”, suas 
concepções e desafios para implementar e desenvolver a gestão educacional na 
perspectiva dos princípios democráticos. Este estudo visa “socializar o processo 
vivenciado na relação direta com a orientação e o acompanhamento do estágio na área 
da gestão pedagógica e curricular na escola de educação básica”. A análise foi 
produzida a partir da experiência realizada no acompanhamento e orientação do estágio 
em “Gestão de Escolas”, bem como dos desafios encontrados nos relatórios 
sistematizados pelas estagiárias. Por tratar-se de um estudo descritivo-crítico, busquei a 
fundamentação teórica por meio de uma revisão de literatura da área de gestão 
educacional e de escolas, tomando também como base os documentos norteadores das 
políticas públicas do sistema educacional brasileiro e as Diretrizes Curriculares 
Nacionais do curso de Pedagogia. Os resultados apontam que o campo pedagógico-
curricular, fundamentalmente afeto ao trabalho dos coordenadores pedagógicos nas 
escolas, reveste-se do desafio de organizar e desenvolver programas de formação 
continuada, de revisar e implementar o Projeto Político-Pedagógico, de cuidar das 
relações entre professor-aluno. O trabalho no campo pedagógico na escola apresenta-se 
como um meio de desenvolver habilidades e competências essenciais ao 
desenvolvimento das práticas, que são inerentes ao ato de gerir a escola. O 
entendimento do estágio através da prática reflexiva, que articule o ensino e o campo de 
trabalho dos gestores, confere aos estagiários elementos significativos à compreensão 
dos processos e das relações de poder que se entrecruzam no cenário da escola. 
 
Palavras-chave: Pedagogia. Estágio curricular. Gestão escolar. 
 
Problematizando o tema estágio 
Numa tentativa modesta me arrisco a tecer algumas considerações sobre as 
travessias da gestão escolar, com enfoque nas especificidades do campo pedagógico. 
Para tanto, de forma breve, recupero a trajetória do curso de Pedagogia, regulamentado 
inicialmente pelo Decreto-Lei nº 1.190 de 1939 e, definindo-o como um curso de 
bacharelado, alinhado à época ao atendimento dos aspectos burocráticos e de ordem 
técnica. O referido Decreto explicita a exigência do diploma de Pedagogo para atuar 
como técnico em educação no Ministério da Educação, para desempenhar as funções de 
administração, planejamento curricular, assessoria aos professores, inspeção em escolas, 
avaliação de docentes e discentes, pesquisa no campo tecnológico da educação. 
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Fica explicito que o curso de Pedagogia fazia parte na época ao misto de 
bacharelado e licenciatura, alinhando-se ao chamado “esquema 3+1”. Neste esquema, o 
curso de Pedagogia formava bacharéis em três (3) anos, após este período o currículo 
era composto por disciplinas vinculadas à área de “Fundamentos da Educação”
 1
. Neste 
esquema era realizada a formação nas diversas áreas
2
. Desse modo, o entendimento era 
de que o bacharelado habilitava o pedagogo para atuar como técnico em educação, já a 
licenciatura habilitava o professor para ministrar aulas no Curso Normal - secundário. 
A promulgação da Lei nº 4.024/1961, por meio do Parecer nº 251/1962, manteve 
o “esquema 3+1” para o curso de Pedagogia que passa a ter status de licenciatura. O 
referido Parecer visava manter a unidade de conteúdo em todo o território nacional, para 
definir a especificidade do bacharelado em Pedagogia, com cinco disciplinas 
obrigatórias
3
 e duas opcionais
4
. Acrescentava o Parecer que para a docência na Escola 
Normal, o bacharel cursava: Psicologia da Educação, Elementos de Administração 
Escolar, Didática e Prática de Ensino sob a forma de Estágio Supervisionado. 
A Lei da Reforma Universitária nº 5.540/68, modifica o perfil do curso de 
Pedagogia, que de acordo com o Parecer nº 252/69 do CFE, oferecia as habilitações: 
Administração Escolar, Inspeção Escolar, Orientação Educacional e Supervisão Escolar. 
O Parecer nº 252/69 do CFE e a Res. nº 2/69, indicavam que o curso de Pedagogia 
deveria formar docentes para o curso Normal e especialistas
5
. 
Os especialistas tiveram presença marcante com o predomínio da tendência 
tecnicista nas décadas de 1970 e 1980, exercendo o papel de controladores da gestão da 
escola e da atuação dos docentes. Com o passar do tempo os sistemas estaduais 
demandaram formação em graduação superior para a docência nos anos iniciais da 
escolarização. Assim, no decorrer da década de 1980 o curso de Pedagogia passa a 
habilitar professores para o exercício da docência nos anos iniciais. 
Já na década de 1990 cresceu a criação de cursos de Pedagogia com habilitação 
em Educação Infantil, Educação Especial, Educação de Jovens e Adultos. O 
crescimento das demandas diante da pluralidade
6
 daqueles que chegam à escola traz 
novos desafios ao curso de Pedagogia, que são contemplados com o advento da LDB – 
Lei nº 9.3934/96 e das novas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) para o Curso de 
Graduação em Pedagogia (Res. CNE/CP nº 1, 15-5-2006). Com a implementação das 
novas DCNs, o curso de Pedagogia passa a formar o pedagogo para atuar na docência 
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dos anos iniciais do ensino fundamental, na educação infantil, na gestão e nos espaços 
escolares e não escolares, extinguindo-se as demais habilitações até então existentes. 
A contar de 2006 com o advento das novas DCNs para o curso de Pedagogia o 
campo da gestão permanece como atributo do pedagogo, algumas instituições ao 
reformularem seus PPCs trazem como necessidade a realização de estágio curricular 
obrigatório na área da gestão educacional e escolar. Desse modo, a instituição em que 
atuo fez esta opção – realizar estágio curricular no campo da gestão, com o qual estou 
envolvido como professor da disciplina de gestão, na preparação do projeto de estágio, 
na observação in loco no espaço campo de estágio, bem como na orientação e 
acompanhamento (supervisão) da prática de estágio nesta área – gestão escolar. 
Desse modo, o presente texto tem como objetivo “socializar o processo 
vivenciado na relação direta com a orientação e o acompanhamento do estágio na área 
da gestão pedagógica e curricular na escola”. O estudo apoia-se na concepção de que a 
“gestão educacional” que é entendida como a forma de organização e dinamização do 
trabalho pedagógico, tendo vista o seu planejamento, a sua execução e a sua avaliação. 
 
Metodologia do estudo 
Pensar na metodologia significa pensar no caminho a trilhar para a execução de 
um estudo. O foco desta reflexão é o processo vivenciado no estágio da “Gestão de 
Escolas” com ênfase no aspecto pedagógico-curricular
7
, analisado na perspectiva da 
abordagem de natureza qualitativa, tendo como material empírico os relatórios de 
estágio e os registros realizados no período de orientação, planejamento e intervenção 
na escola. A compreensão da problemática, então, parte da observação atenta e do 
diálogo estabelecido com os sujeitos envolvidos na relação universidade e escola. 
Nesse encadeamento, é essencial que se caracterize a comunidade escolar, 
especialmente, o contexto em que estão inseridos educador e educando, as relações que 
se estabelecem entre os diferentes sujeitos na instituição, não menos importante, a forma 
como é realizada a gestão da escola. Isso facilita a leitura e a interpretação dos dados e 
das informações que emergirem deste ambiente, principalmente da relação dos sujeitos 
entre si e deles com o contexto social, político, econômico, cultural. 
O contato diretocom a realidade e com a prática, possibilita construir um corpo 
de saberes que impulsionam o desenvolvimento da consciência crítica, a mudança da 
prática política e pedagógica na escola. É fundamental considerar o limite das próprias 
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potencialidades da prática gestora enlaçada aos fatores circundantes, que ora ampliam 
possibilidades aos avanços e ora obstaculizam, entravando a evolução de práticas 
inovadoras, de mudanças no que se refere à gestão da escola e do campo pedagógico. 
A reflexão sobre o material empírico teve como apoio os procedimentos da 
“análise de conteúdo” (BARDIN, 1977), em que as inferências teórico-práticas foram 
efetivadas com base nas categorias construídas por meio da leitura e releitura dos dados 
e das informações obtidas no processo de preparação (planejamento) e efetivação 
(intervenção) do estágio em Gestão de Escolas, realizado no semestre 2013/1, curso 
Pedagogia – licenciatura da Universidade Federal da Fronteira Sul. 
 
Referências à gestão educacional e à gesta da escola 
Referir acerca da “gestão educacional”, implica na apropriação de alguns 
conceitos relacionados ao tema. Ao ler Paro (1998), Libâneo; Oliveira; Toschi (2011) 
compreendo a “gestão educacional”, intimamente relacionada aos sistemas educacionais 
(federal, estadual, municipal), sendo que cada sistema tem seu papel, mas em suas 
diferenciadas incumbências, necessitam estar articulados entre si, haja vista que as 
normatizações, na maioria das vezes, emanam do macro-sistema educacional brasileiro. 
Já a “gestão escolar” está vinculada àquilo que faz parte da especificidade de 
cada unidade escolar, sempre respeitadas as normas comuns dos diferentes sistemas de 
ensino. Desse modo, em respeito à autonomia, cada escola precisa elaborar e executar 
seu próprio Projeto Político-Pedagógico (PPP), tendo em vista a administração dos 
recursos humanos, financeiros e materiais; o cuidado com o processo ensino-
aprendizagem do estudante; a integração família, escola e comunidade. 
Na atualidade, ressalto que os fazeres ligados à gestão educacional e da escola 
não se embasam apenas nos modos da prática da administração escolar burocrática e 
técnica, por muito tempo, denominada e orientada pela matriz da razão instrumental. 
Contemporaneamente, o termo gestão ganhou espaço significativo por abranger o 
sistema de ensino como um todo, isto é, a gestão administrativa, que envolve a parte 
financeira e os recursos humanos e a gestão pedagógica, que envolve o planejamento 
pedagógico e curricular da escola. Para Lück (1997, p. 13). 
 
O conceito de gestão está associado ao fortalecimento da democratização do 
processo pedagógico, à participação responsável de todos nas decisões 
necessárias e na sua efetivação mediante um compromisso coletivo com 
resultados educacionais cada vez mais efetivos e significativos. 
 
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Por meio desse conceito é possível notar a importância da gestão democrática 
nas instituições de ensino. Mas, para que isso se torne realidade é preciso que exista 
formação inicial e continuada de qualidade para todos os decentes; é papel da gestão da 
escola organizar e promover formação continuada qualificada aos seus professores. 
Afinal, são eles que atuam nos estabelecimentos de ensino, tornando concretas as 
propostas constantes no projeto político-pedagógico de cada estabelecimento de ensino. 
Enfatizo que os processos formativos não estão limitados à escola - ao ensino 
formal, contudo, ensino é educação, ou seja, a escola é parte integrante da sociedade. A 
despeito disso, o art. 2º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB – n. 9394/96), 
situa a educação como “dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de 
liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno 
desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua 
qualificação para o trabalho”. Este aspecto chama à responsabilidade o Estado em 
ofertar uma educação realmente qualificada, que conduza o indivíduo à emancipação. 
A escola na condição de instituição social e política é espaço institucionalizado 
para a construção da vivência coletiva, do exercício da democracia, é essencialmente o 
espaço para a apropriação do conhecimento sistematizado produzido pela humanidade. 
O desafio da escola reside, portanto, na identificação dos elementos culturais essenciais 
à formação humana. É fundamental pontuar que a escola como instituição social e 
política, não é neutra, sendo constantemente perpassada por todas as dimensões que 
definem os rumos da sociedade atual, a qual se orienta pela matriz da doutrina 
capitalista. Isso requer que a escola priorize a formação de sujeitos críticos que 
respondam aos desafios da contemporaneidade, sujeitos que através da apropriação do 
conhecimento sistematizado, consigam agir para transformar, situando-se como sujeitos 
do seu próprio processo de ensino-aprendizagem. 
Pensar o caráter político da escola passa pelo exercício efetivo da democracia, 
pela conquista da autonomia, pela gestão participativa e colegiada. Mas, como 
conquistar a autonomia da escola e a participação dos diferentes sujeitos? Não se trata 
de dar resposta, contudo, me arrisco a indicar um possível caminho para iniciar um 
processo democrático, que passa pela elaboração e execução do PPP da escola. Além de 
constituir a identidade da escola, o PPP é um documento fundamentalmente político; 
define a concepção de mundo, de educação e do cidadão que se quer formar, construído 
coletivamente com a participação de todos os segmentos da comunidade escolar. 
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A gestão democrática, então, representa o principal desafio aos sistemas de 
ensino e à escola. Para Veiga (1998), a gestão democrática necessita considerar os 
princípios legais sem, contudo, desmerecer o sentido político que define o cidadão que 
se quer formar e para que sociedade, bem como o sentido pedagógico que se vincula às 
intencionalidades e ao compromisso sociopolítico de transformar a sociedade. 
Ao tratar da educação escolar, é essencial caminhar no sentido de efetivar a 
gestão democrática, compreendendo o seu caráter político. Por este caminho credito à 
escola a possibilidade de formar sujeitos capazes de agir e transformar, orientados por 
professores que compreendem o contexto social, econômico, político e cultural, que 
dialogam com a teoria e que refletem e problematizam suas práticas, concretizando a 
função da escola como o locus de produção do conhecimento e da formação do cidadão. 
 
A gestão dos processos pedagógicos na escola 
No caso da escola, pensar a gestão implica entender o conjunto de ações que são 
incumbência do gestor. Nesse encadeamento, os processos pedagógicos são vitais aos 
fins da educação, por serem processos deliberados intencionalmente pelo coletivo da 
escola, com o objetivo de promover, em contextos culturais singulares, relações 
significativas entre o educando e o conhecimento produzido social e historicamente 
pelos homens, favorecendo a produção da materialidade necessária à sua existência. 
Então, os processos pedagógicos se materializam nas ações e nos procedimentos 
que a escola desenvolve para cumprir seu papel político, articulando e integrando todos 
os sujeitos nas atividades educativas, que se configurem como potenciais para a 
formação dos estudantes. Considerando o pressuposto de que o conhecimento não se 
produz somente na escola, mas no conjunto das relações sociais; é preciso diferenciar 
processos amplamente pedagógicos, configurados pelas dimensões educativas que 
perpassam todas as experiências de vida social e do mundo do trabalho. Tais processosconsiderados assistemáticos - não intencionais, são relevantes do ponto de vista de 
construção do conhecimento. 
Os processos especificamente pedagógicos intencionais são desenvolvidos 
sistematicamente, objetivando o acesso à cultura e ao conhecimento que a sociedade 
produziu em seu processo histórico de desenvolvimento social, político, econômico e 
cultural. A educação, conforme Saviani (2008) constitui-se num fenômeno específico 
dos seres humanos, sua essência passa pela compreensão da natureza humana. O 
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homem, no entanto, precisa transformar a natureza por meio do seu trabalho, concebido 
como ação intencional, que cria e recria o mundo. Ainda, com apoio em Saviani (2008), 
concebo a educação na dimensão de um trabalho não material, que acontece através do 
ato educativo sobre a natureza e a cultura, considerando o sujeito situado histórica e 
socialmente; não separando o produto e o ato de produzir os novos saberes. 
Cabe, portanto, à equipe gestora, especificamente, ao coordenador pedagógico a 
função de gerir os processos pedagógicos que visem o cumprimento das 
intencionalidades indicadas no PPP da escola. Nisso corrobora Placco e Souza ao 
destacar que o coordenador pedagógico “[...] é um profissional fundamental na escola 
como articulador das ações, como formador de educadores e, portanto, como 
transformador das condições de ensino e de aprendizagem” (2012, p. 19). Para tanto, 
“gestão” é um termo relativamente novo no campo educativo, que objetiva redefinir a 
organização e o funcionamento da escola, implicando na ruptura com antigos modos de 
administração escolar, apontando para um horizonte participativo e democrático. 
O contato das futuras pedagogas com o campo pedagógico-curricular na escola, 
em suas intervenções por meio do estágio em “gestão de escolas”, permite observar o 
movimento que o coordenador pedagógico imprime ao seu quefazer no próprio espaço 
de trabalho. A despeito disso, o coordenador pedagógico deve alicerçar sua prática 
coordenadora em “habilidades relacionais, estratégias de formação e de ensino, 
construção e gestão de grupo, domínio de fundamentos da educação e áreas correlatas, 
questões atuais da sociedade e da infância e da adolescência (aprendizagem e 
desenvolvimento)” (PLACCO e SOUZA, 2012, p. 18). 
Entretanto, pensar, planejar, promover e desenvolver processos pedagógicos no 
cotidiano escolar, não é tarefa exclusiva do coordenador pedagógico, que sozinho não 
resolverá todos os problemas que se entrecruzam no processo ensino-aprendizagem. 
Muitas vezes, as formas culturais internalizadas ao longo do desenvolvimento dos 
indivíduos constituem material simbólico que levam ao entendimento dicotomizado de 
que aquele que planeja não é aquele que executa. Conforme Placco e Souza (2012), a 
solução de situações-problema que perpassam o fazer docente e escolar, precisa ser 
tomada como responsabilidade do coletivo, pelos diferentes segmentos da escola. 
 
A pluralidade dos achados nos percursos de estágio 
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Uma concepção mais apurada de estágio no Brasil está demarcando sua 
relevância como atividade teórico-prática, que favorece a problematização das questões 
didáticas e da própria formação dos professores. As vivências no estágio permitem aos 
futuros docentes romperem com a falsa dicotomia entre teoria e prática, significando-a 
como práxis, que se desenvolve pelo princípio da dialética (PIMENTA e LIMA, 2004). 
A compreensão dos nexos entre a teoria e a prática passa pelo entendimento de que uma 
prática contextualizada é que possibilita dialogar com os contextos e os diferentes 
sujeitos escolares, fazendo pensar e repensar a própria formação - a práxis educativa. 
Pimenta e Lima (2004) indicam uma concepção de estágio que propicia a 
aproximação com a realidade de atuação, objetivada pela práxis, que é “atividade 
teórica de conhecimento, fundamentação, diálogo e intervenção na realidade” 
(PIMENTA; LIMA, 2004, p. 45), que pressupõe uma postura de pesquisa, ou seja, a 
formação de um professor crítico-reflexivo que valoriza os saberes da prática docente, a 
construção do conhecimento por meio da reflexão e da problematização da prática. 
Então, embasado em uma concepção de estágio que considera o fazer 
pedagógico objeto de investigação, faço algumas considerações aos desafios apontados 
pelas estagiárias em “Gestão de Escolas”. Dos desafios mapeados nos relatórios de 
estágio, optei pelos mais recorrentes e comuns, evidenciados pelas dezoito (18) 
estagiárias, nas seis escolas públicas campo de estágio. Tais elementos foram obtidos 
por intermédio da leitura e releitura das reflexões realizadas pelas estagiárias acerca da 
vivência no estágio, respeitando a singularidade de cada escola e o limite das reflexões 
configuradas nos relatórios de estágio. Desse modo, destaco no mapeamento do material 
empírico, três grandes dimensões: formação continuada de professores; projeto político-
pedagógico; relação professor-aluno. 
A necessidade de ajudar o docente a (re)pensar sua prática requer da escola a 
organização de espaços e tempos específicos à formação continuada dos professores. 
Por sua vez, a formação continuada está diretamente relacionada ao campo pedagógico-
curricular, que na maioria das escolas está sob a responsabilidade do coordenador 
pedagógico. A este cabe, então, o papel de orientar a execução da prática educativa em 
consonância com o PPP da escola, criando metodologias com estratégias que imprimam 
à ação pedagógica caráter de eficiência, respeitando ritmos de aprendizagem, diferenças 
individuais, contextos de inserção da comunidade escolar e outros. 
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É no movimento, nas falas, nas trocas, nas reflexões, que o coordenador 
pedagógico tem elementos para alavancar o programa de formação continuada para os 
docentes da escola. Nesse movimento e numa postura assertiva o coordenador 
pedagógico pode localizar problemáticas relevantes para compor um programa de 
formação continuada, que atenda as demandas da escola. O quesito formação 
continuada de professores na escola de algum modo é atendido, haja vista que algumas 
ações devem ser desenvolvidas, considerando as normas vigentes dos sistemas de 
ensino, bem como de demandas pontuais necessárias ao bom andamento da escola. Na 
escola é perceptível que as demandas pontuais emanam de problemáticas em relação ao 
aluno e que são vinculadas à indisciplina, desmotivação, desinteresse. No discurso 
tácito ou implícito o professor logo encontra um culpado – o aluno, a família, as 
condições de trabalho, o sistema de ensino. Acredito sim que as condições de trabalho 
interferem significativamente no ser e no agir do professor, mas reforço que o docente 
necessita incluir-se no processo ensino-aprendizagem. 
No que se refere à dimensão do projeto político-pedagógico, o que se observa na 
escola é que existe um movimento que busca, a partir da realidade e do contexto 
socioeducacional, o atendimento às demandas que o momento histórico atual exige da 
escola. Por meio dos princípios da problematização, da investigação, da flexibilidade, a 
escola procura agregar os diferentes segmentos que a compõe para engajarem-se no 
coletivo e, de forma democrática, gerir os destinos do processo educativo formal. 
Os discursos do corpo docente e os documentos
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 materializados anunciam a 
configuração de uma escola que se pauta pela democracia, pela participação, pelo 
esforço coletivo. É preciso frisar que em alguns casos as práticas realizadas 
contradizem, tanto o discurso como as proposições do PPP da escola. Portanto, não é o 
discurso e nem o documento formalizado, conforme as diretrizes (normas)que mudará 
as práticas de dinamizar a gestão administrativa e pedagógica da escola. Para Freire 
(1988) não é o discurso que ajuíza a prática, mas ao contrário, é a prática que ajuíza o 
discurso. Nesta linha de pensamento, o autor refere que aquele que apenas fala e nunca 
ouve, “imobiliza” o conhecimento e apenas o transfere ao aluno; considera petulância a 
classe trabalhadora reivindicar seus direitos, exigir libertação e espaços democráticos. 
Nesse sentido, a mudança precisa acontecer no íntimo de cada sujeito, não 
acontecerá por decreto; para mudar é preciso estar consciente da necessidade da 
mudança e assumir uma atitude de mudança no ver, pensar e agir. Vale, então, destacar 
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que “o PPP é proposto com o objetivo de descentralizar e democratizar a tomada de 
decisões pedagógicas, jurídicas e organizacionais na escola, buscando maior 
participação dos agentes escolares” (LIBÂNEO; OLIVEIRA; TOSCHI, 2011, p. 178). 
Para os autores, o PPP representa um meio de todos os segmentos escolares tornarem-se 
co-partícipes e co-responsáveis pelo bom êxito da escola e do educando. 
No que tange à relação professor-aluno é que reside um dos grandes desafios, 
pois, significativa parcela dos docentes, evidenciam dificuldades para conduzir a ação 
pedagógica, desconsiderando que a criança, o adolescente, o jovem, são datados e 
situados num momento histórico, de rápidas e sucessivas mudanças. Tais dificuldades 
podem estar ligadas à tendência em desconsiderar os saberes que o aluno traz para o 
ambiente escolar, havendo resistências evidentes em trabalhar as informações e as 
experiências do educando para transformá-las em conhecimento. 
Por meio do olhar das estagiárias se constata que na escola há falta de interação 
entre professores, alunos, conteúdos e contexto socioeducacional. Sobremaneira, os 
conteúdos trabalhados na escola seguem a dinâmica do livro didático, por isso, não são 
contextualizados e nem problematizados para que o estudante reconheça o seu 
significado. Nesse aspecto, cabe ao professor encontrar alternativas, não só para 
desenvolver o processo ensino-aprendizagem, mas construir no espaço escolar situações 
de interação mútua que favoreçam ao aluno crescer, respeitar o outro e respeitar-se a si 
mesmo. Sem dúvida, esta é uma tarefa difícil de realizar, mas que contribui para 
desenvolver as competências cognitivas e sociais. 
Diante disso, é imprescindível que o coordenador pedagógico conduza sua 
prática, tendo no horizonte a reorientação do processo didático-pedagógico. Para tanto, 
necessita criar junto de seus coordenados técnicas e procedimentos metodológicos, que 
evidenciem a dinâmica dos acontecimentos escolares e valorizem as subjetividades dos 
sujeitos que transitam no cenário da escola. Nisso implica a permanente investigação 
das práticas pedagógicas escolares, o que possibilita uma análise contextualizada. 
O contexto, em uma sociedade dividida em classes, revela que os homens vivem 
em espaços culturais que, embora se cruzem, são diferenciados, mas possibilitam 
diferentes alternativas de acesso aos bens culturais. As diferenças culturais são 
representações da desigualdade de classes, que devem ser consideradas no processo 
ensino-aprendizagem. Os estudantes, por sua vez, têm universos de significados 
variados, que nem sempre são contemplados na linguagem e nas práticas pedagógicas. 
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Na maioria das vezes, a prática pedagógica se desenvolve com base numa suposta 
uniformidade conceitual, sem aproximar a pluralidade dos universos de significados. 
 
O que o olhar crítico permite configurar? 
Este escrito busca o debate acadêmico sobre as travessias que desafiaram a 
realização do estágio em “gestão de escolas”. Nesse sentido, é possível inferir que a 
intervenção realizada na escola possibilita vislumbrar relevantes aspectos acerca do 
estágio supervisionado no campo pedagógico-curricular. Cabe dizer que no espaço 
campo de estágio houve aproximação entre estagiárias e o cotidiano da escola, 
visualizando diferentes tempos, espaços e conhecimentos, que se vinculam aos sentidos 
pedagógicos, marcando principalmente as relações entre os docentes e os educandos. 
É necessário, pois, ressaltar que as questões recorrentes têm potencial para a 
análise descritivo-crítica no que respeita ao processo deste estágio. Ao analisar o 
movimento da gestão pedagógica é preciso criar condições para instituir práticas que 
priorizem o ensino de qualidade, o que requer construções coletivas perpassadas pela 
reflexão sobre: a importância da formação continuada; a configuração do PPP articulado 
com a realidade; as relações estabelecidas entre professor-aluno. É fundamental,então, 
que os futuros docentes estejam atentos ao tempo e ao espaço, evitando cair na 
armadilha de uma análise de senso comum. 
Ao refletir acerca da formação continuada é indispensável pensar no objeto desta 
formação e após debruçar-se sobre o como realizá-la. Cabe dizer que falas ou atividades 
pontuais não resolvem problemáticas enraizadas nas entranhas da escola e no modo de 
encarar o exercício da docência e da gestão escolar. Na escola é necessário fortalecer a 
ideia de programas de formação continuada, pensados, planejados e executados no e 
pelo coletivo da escola, especialmente liderado pela coordenação pedagógica. O ato de 
gerir processos pedagógicos na escola reveste-se de especial desafio ao coordenador 
pedagógico, o qual necessita mobilizar seus pares a favor de práticas pedagógicas 
inovadoras, superando os fazeres orientados pela transmissão-memorização-reprodução. 
No que concerne à dimensão do PPP é preponderante que ao configurá-lo se 
tenha consciência da problematização que circunscreve o cenário educacional. Para que 
o PPP seja de fato um instrumento de orientação, deve abarcar a totalidade das relações 
sociais, que tecem o contexto micro e macro social em que se realizam os processos 
formativos
9
. Nessa perspectiva, destaco a relevância do olhar atento aos sujeitos 
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envolvidos no processo de ensinar e de aprender, considerando o entrecruzamento que 
se estabelece nas relações com o outro e com o meio social com o qual interage. 
No que tange à dimensão das relações entre professor-aluno fica o desafio de 
encontrar os meios adequados para a mediação; nisso entra o compromisso do 
coordenador pedagógico com os sujeitos e com o processo pedagógico. Para isso, é 
necessário ter clareza que a docência é desenvolvida pelos sujeitos (professor-aluno), 
que operam acordos construídos coletivamente em forma de contrato didático. As 
teorias pedagógicas tradicionais, desse modo, necessitam ser suplantadas, haja vista que 
na sociedade contemporânea não há mais espaço para moldar e apassivar o aluno, mas 
para torná-lo sujeito do processo de ensinar e de aprender. 
Cabe registrar que do Estágio Supervisionado, ficou a certeza da importância de 
conhecer a realidade da instituição escolar. A interação com os gestores foi enriquecida, 
pois, as estagiárias vivenciaram a rotina escolar, com isso, aprimoraram a sua formação 
pessoal e profissional, principalmente no que refere à gestão escolar. 
 
Bibliografia: 
BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977. 
BRASIL. MEC/CNE. Resolução CNE/CP 1/2006. Institui Diretrizes Curriculares 
Nacionais para o Curso de Graduação em Pedagogia, licenciatura. 
_____. Parecer CNE/CP n. 3/2006 - Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de 
Pedagogia. 
_____. Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da 
educação nacional. Diário Oficial da União, Brasília, 20 dez. 1996. 
FREIRE, Paulo. A importânciado Ato de Ler: em três artigos que se completam. 22. 
ed. São Paulo: Cortez, 1988. 
LIBÂNEO, José Carlos; OLIVEIRA, João Ferreira de; TOSCHI, Mirza Seabra. 
Educação escolar: políticas, estrutura e organização. 10. ed. São Paulo: Cortez, 2011. 
LÜCK, Heloísa. A evolução da gestão educacional a partir de mudança paradigmática. 
Gestão em rede, n. 03, nov, 1997, p. 13-18. Disponível em: 
<http://cedhap.com.br/publico/ge_GestaoEscolar_02.pdf>. Acesso em: 22 maio 2013. 
PARO, Vitor Henrique. Gestão democrática da escola pública. São Paulo: Ática, 1997. 
PLACCO, Vera Maria Nigro de Souza; SOUZA, Vera Lucia Trevisan de. O trabalho do 
coordenador pedagógico na visão de professores e diretores: contribuições à 
compreensão de sua identidade profissional. In: PLACCO, Vera Maria Nigro de Souza; 
ALMEIDA, Laurinda Ramalho de (orgs.). O coordenador pedagógico: provocações e 
possibilidades de atuação. São Paulo: Loyola, 2012. p. 9-20. 
PIMENTA, Selma Garrido; LIMA, Maria Socorro Lucena. Estágio e docência. São 
Paulo: Cortez, 2004. 
SAVIANI, Dermeval. Pedagogia Histórico-Crítica. 10. ed. São Paulo: Autores 
Associados. 2008. 
 Didática e Prática de Ensino na relação com a Formação de Professores
EdUECE- Livro 2
06488
http://cedhap.com.br/publico/ge_GestaoEscolar_02.pdf
https://secure.upf.br/apps/academico/aapa/consulta_acervo_biblio.php?codacervo=67971
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13 
 
VEIGA, Z. P. A. As instâncias colegiadas da escola. In: VEIGA, I. P. A.; RESENDE, 
L. M. G. (Orgs.). Escola: espaço do projeto político-pedagógico. Campinas: Papirus, 
1998. 
 
 
 
1
 História da Educação, História da Filosofia, Filosofia da Educação, Sociologia, Fundamentos 
Sociológicos da Educação, Fundamentos Biológicos da Educação, Psicologia Educacional, Estatística 
Educacional e Administração Escolar. 
2
 Ciências Sociais, Ciências Humanas, Ciências Naturais, Letras, Artes, Matemática, Física e Química. 
3
 Psicologia da Educação, Sociologia (Geral e da Educação), História da Educação, Filosofia da Educação 
e Administração Escolar. 
4
 Até o final dos anos de 1980 a maioria dos cursos oferecia as disciplinas: Currículos e Programas, 
Teoria e Prática da Escola Média. 
5
 Especialistas deviam atuar em atividades de Administração Escolar, Inspeção Escolar, Orientação 
Educacional e Supervisão Escolar. 
6
 Atendimento aos alunos com necessidades educativas especiais, aos jovens e adultos, aos educandos das 
comunidades quilombolas e indígenas, entre outros. 
7
 O aspecto pedagógico consiste na formulação de “objetivos sociais e políticos e meios formativos”, que 
possam dar significado e direção ao processo educativo. Já o aspecto curricular indica o currículo e o 
“referencial concreto da proposta pedagógica” da escola (LIBÂNEO, OLIVEIRA; TOSCHI, 2011, p. 
345-346). 
8
 Projeto Político-Pedagógico, Regimento Escolar e Plano de Estudos. 
9
 Os processos formativos não são exclusividade da escola, ocorrem também nos espaços extramuros, ou 
seja, na família, nos parques, no trabalho, nos sindicatos, nos partidos, etc., contudo, tem reflexos nos 
fazeres da escola. 
 Didática e Prática de Ensino na relação com a Formação de Professores
EdUECE- Livro 2
06489

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