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Patologia - Miocardites e Valvopatias

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Thais Alves Fagundes 
MIOCARDITES 
Miocardite é definida pela presença de infiltrado inflamatório no miocárdio, associado à agressão e lesão de 
cardiomiócitos, ocorrendo necrose com substituição posterior por fibrose (inflamação é a causa da lesão dos 
cardiomiócitos e não sua consequência). Pode ser isolada ou associada à doença sistêmica, geralmente infecciosa ou 
imunitária. Vírus são frequentemente envolvidos na etiologia de miocardites (coxsackie B, Coxsackie A, pólio, 
influenza, HIV, Epstein-Barr, parvovírus, vírus da hepatite C, caxumba, varicela, sarampo), mobilizando resposta 
inflamatória com o intuito de eliminar os antígenos. 
 
MIOCARDITE CHAGÁSICA 
Infecção chagásica: adquirida por humanos por meio do contato com fezes ou urina de triatomíneos hematófagos 
infectados (transmissão vetorial), ou por transmissão oral. Ocorrida a penetração das formas infectantes, estas se 
transformam no interior das células do hospedeiro em formas amastigotas e se multiplicam, a célula se rompe e as 
três formas, tripomastigota sanguínea, epimastigota e amastigota, são liberadas. As formas tripomastigotas podem 
alcançar a circulação venosa, chegar ao coração e à circulação geral, podendo parasitar qualquer célula do 
organismo. 
Quando as células parasitadas se rompem, juntamente com os parasitos são liberados componentes celulares 
(mitocôndrias, restos de miofibrilas) no meio extracelular. Esses elementos iniciam uma reação inflamatória aguda 
com acúmulo de células polimorfonucleadas e mononucleadas. A resposta do hospedeiro, porém, não consegue 
eliminar todos os parasitos. 
 Comprometimento cardíaco é frequente. 
 Fase aguda: alterações benignas e reversíveis. 
o Miocardite aguda: pode ser difusa ou multifocal. 
 Fase crônica: complicações mais graves. 
o Cardiopatia chagásica crônica: pode ser assintomática ou apresentar-se como síndrome congestiva. 
FASE AGUDA 
Aspectos microscópicos: 
 Pode ser difusa ou multifocal. 
 Podem acometer os três folhetos – miocárdio, endocárdio e epicárdio. 
 Infiltrado inflamatório de células mononucleares, com neutrófilos de permeio. 
 Fibrocélulas degeneradas e com necrose (associado à agressão dos miócitos). 
 Intenso parasitismo tecidual: forma amastigota nas células cardíacas. 
 Edema intersticial (associado à inflamação). 
 
Thais Alves Fagundes 
Sintomatologia: 
 Subclínico. 
 Clínico – acometimento sistêmico: febre, astenia, linfoadenomegalia, alterações cardíacas. 
o Alterações eletrocardiográficas relacionam-se com o processo inflamatório. 
o Taquicardia sinusal, diminuição dos complexos QRS e alterações do segmento ST e da onda T. 
Lesões podem acometer o sistema de geração e condução do estímulo cardíaco (infiltrado inflamatório pode atingir 
o nodo sinoatrial na região atrial, o nodo AV e os ramos do feixe de His; edema distancia células cardíacas; fibrose 
entre os feixes de células cardíacas interrompe estímulo), alterando a contratilidade do coração (causa 
turbilhamento do sangue e predispõe a formação de trombo e fenômeno tromboembólico pulmonar ou sistêmico). 
FORMA CRÔNICA 
Na fase crônica, parasitismo sanguíneo ou tecidual é escasso. Os níveis de anticorpos são elevados e persistentes, de 
modo que o diagnóstico laboratorial baseia-se mais em testes sorológicos do que na detecção de parasitos. Mas há 
persistência da inflamação, apesar da escassez da forma amastigota. 
Sintomatologia: 
 Assintomática: 
o Pacientes com eletrocardiograma alterado, função ventricular normal, área cardíaca normal à 
radiografia, exame físico normal e ausência de manifestações clínicas. 
o Alterações eletrocardiográficas: retardo na condução atrioventricular, anormalidades na 
repolarização ventricular e extrassístoles. 
 Sintomática: 
o Arritmias (extrassístoles ventriculares). 
o Insuficiência cardíaca. 
o Síndrome congestiva: edema periférico, ascite, hepatomegalia e estase jugular. 
o Sinais de baixo débito (insuficiência cardíaca). 
Aspectos microscópicos: 
 Inflamação crônica fibrosante, multifocal – fibrose de interstício. 
 Predomínio de células mononucleares, linfócitos e macrófagos. 
 Discreto edema e congestão vascular. 
 Ausência de ninhos de amastigota (identificados pela biologia molecular). 
 Linfócitos agredindo fibras cardíacas (mecanismo autoimune, que perpetua a inflamação). 
 Hipertrofia das fibras cardíacas remanescentes (tentativa de desempenhar a função das fibras perdidas). 
 
Aspectos macroscópicos: 
 Dilatação global do coração, devido à necrose e substituição por fibrose, causando insuficiência. 
 Dilatação das câmaras cardíacas e a insuficiência das valvas atrioventriculares. 
o Predispõe à estase sanguínea, facilitando à formação de trombo e fenômenos tromboembólicos. 
Thais Alves Fagundes 
o Miocárdio vulnerável à isquemia, pela dilatação com diminuição da perfusão coronariana diastólica. 
 Responsáveis pela cardiomegalia. 
 Adelgaçamento da parede do septo interventricular. 
 Comum acometimento vascular, com espessamento da parede de coronárias, predispondo à isquemia. 
 Lesão vorticilar – característico da miocardite chagásica: 
o Afilamento/Aneurisma da ponta do coração. 
o Ocorre principalmente no ápice cardíaco e na parede livre do ventrículo esquerdo. 
o Com desaparecimento total ou parcial do miocárdio, que se encontra substituído por fibrose, 
ficando a parede cardíaca formada por endocárdio e epicárdio, sem miocárdio entre eles. 
o Causada pelo processo inflamatório, devida a falta de suprimento sanguíneo e isquemia em região 
com baixa irrigação colateral, tornando a parede frágil e dilatada. 
o Pode precipitar alterações do ritmo cardíaco e formação de trombo. 
 
Falência cardíaca na forma crônica: 
 Redução da massa cardíaca, das células cardíacas. 
 Interrupção de fibras nos fascículos por exsudato inflamatório e fibrose. 
 Desarranjo eletrofisiológico. 
 Redução da contratilidade cardíaca e relaxamento inadequado. 
CARDIOPATIA REUMÁTICA 
 Afecção secundária a infecção estreptocócica da orofaringe. 
o Infecções recorrentes das vias respiratórias superiores por estreptococos betahemolíticos do grupo 
A de Lancefield. 
o Indivíduo inicialmente tem uma infecção da orofaringe seguida, 2 a 4 semanas depois, de episódio 
agudo da doença reumática. 
o Nem todos os indivíduos que têm faringite desenvolvem doença reumática (apenas 3% deles 
adquirem a enfermidade, estando associado à predisposição genética). 
 Primeira manifestação na infância, entre 5 e 15 anos de idade – maturidade imunológica. 
o Raridade da doença antes dos 4 anos de idade. 
o Sugere necessidade de várias infecções estreptocócicas para sensibilizar o indivíduo suscetível. 
 Evolução prolongada, com principais repercussões em indivíduos jovens ou adultos. 
 Elevada morbidade, relacionada com alterações cardíacas. 
 Comum em países pobres, devido à dificuldade diagnóstica e do tratamento. 
Afecção imunomediada, tardia: 
 Estreptococos beta-hemolíticos do grupo A de Lancefield. 
 Resulta de resposta imune aos antígenos estreptocócicos: reação cruzada. 
o Resposta inflamatória mediada pelo hospedeiro contra os antígenos do estreptococos. 
o Ocorre reação imunitária cruzada com moléculas do próprio hospedeiro, como no coração. 
o Devido a mimetismo/semelhança molecular entre proteínas bacterianas e do hospedeiro. 
Thais Alves Fagundes 
DIAGNÓSTICO – CRITERIOS DE JONES: 
 Evidência de infecção estreptocócia prévia. 
 Elevação de títulos de antiestreptolisina – anticorpo antiestreptococos. 
 Cultura de material de orofaringe positiva para estreptococos do grupo A. 
SINTOMATOLOGIA (2-4 semanas após a infecção estreptocócica aguda da orofaringe): 
 Febre 
 Artralgia 
 Poliartrite 
 Cardite 
 Eritema marginatum 
 Coréia 
FASE AGUDA 
Aspectos microscópicos: 
 Pode comprometer o pericárdio, o miocárdio e o endocárdio, separadamente ou em conjunto. 
 Lesões das valvas cardíacas pelo infiltradoinflamatório (acometendo principalmente o endocárdio valvar). 
o Vegetações ou verrugas ao longo da borda de fechamento das valvas. 
o Constituição dessas lesões: células inflamatórias, fibrina, necrose. 
o Valva com edema, necrose, infiltrado inflamatório, espessamento. 
 Tecido conjuntivo valvar subjacente contém quantidade variável de mononucleares – neutrófilos. 
 Tecido de granulação, que é molde para fibrose. 
 
Aspectos macroscópicos: 
 Ulcerações na borda da valva mitral, devido à agressão inflamatória e necrose, formando vegetações. 
 Valva aórtica irregular com vegetações. 
 
Miocárdio: 
 Lesões características da febre reumática, chamadas nódulos de Aschoff. 
 Constituídos de granulomas de macrófagos modificados em volta do material fibrinóide. 
 Acúmulo, ao redor das áreas de material fibrinóide, de macrófagos, linfócitos e fibroblastos. 
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 Situam-se no interstício entre os feixes de miocardiócitos e, frequentemente, próximos a vasos. 
 Macrófagos multinucleados que compõem o nódulo de Aschoff são chamados de células de Aschoff. 
 São substituídos por fibrose, não sendo encontrados em fase crônica, na qual as lesões se concentram nas 
valvas cardíacas. 
 Núcleo em olho de coruja: macrófago binucleado. 
 Núcleo em taturana: corte longitudinal do macrófago binucleado, núcleo adquire conformação alongada. 
 
 
FASE CRÔNICA 
 Inflamação valvar/valvulite, com células mononucleares. 
 Acompanhada de neoformação vascular, fibrose e cicatrização. 
 Cúspides espessadas, encurtadas, calcificadas. 
 Orifício valvar mitral muito reduzido e alongado, em formato conhecido como “boca de peixe”. 
 Fusão de comissuras e espessamento causam estenose valvar. 
 Fibrose e encurtamento dos folhetos causam insuficiência valvar. 
Valvas são as estruturas mais acometidas pela doença: 
 Mitral 
 Mitral e aórtica 
 Mitral, aórtica e tricúspide (infrequente). 
 Aórtica isolada (infrequente). 
Valva mitral com estenose: 
 Fusão de comissuras causa estenose valvar na doença reumática. 
 Valva esbranquiçada e consistência endurecida, demonstrando fibrose. 
 Valva irregular favorece a formação de trombos, demonstrados pelas estruturas marrons nas bordas. 
 
Thais Alves Fagundes 
Valva mitral espessada: estenose e insuficiência – dupla lesão valvar 
 Cordas tendíneas encurtadas e espessadas. 
 Valva mitral espessada, causando estenose valvar e dificuldade para abrir. 
 Valva mitral fibrosada com retração das cordoalhas tendíneas pelos músculos papilares, causando 
insuficiência valvar e dificuldade para fechar. 
 
Valva aórtica com estenose: 
 Fusão de comissuras, com fibrose fechando as cúspides e causando estenose. 
 Tecido valvar substituído gradualmente por tecido de granulação, fibrose e calcificação. 
 Causa sobrecarga de pressão no ventrículo esquerdo, havendo hipertrofia concêntrica. 
o Evoluindo para insuficiência ventricular esquerda e dilatação. 
 Sinais de baixo débito. 
o Com posterior sobrecarga do átrio esquerdo. 
o Ocorre hipertrofia do átrio esquerdo, que fica insuficiente e dilatada. 
o Sobrecarregando o leito vascular pulmonar, podendo cursar com congestão pulmonar e edema. 
 Causando hipertensão pulmonar. 
 Pode causar sobrecarga de pressão no ventrículo direito, havendo hipertrofia concêntrica. 
 Evoluindo para insuficiência ventricular direita e dilatação. 
 Com posterior sobrecarga do átrio direito e falência deste. 
 Insuficiência global do coração. 
 
Valva mitral com estenose: aspecto em “boca de peixe” 
 Orifício valvar mitral muito reduzido e alongado, pela fibrose. 
 Formato conhecido como “boca de peixe”. 
 Causa estenose com dificuldade na abertura valvar. 
 Sobrecarga de pressão no átrio esquerdo. 
o Necessita maior força de contração para ejetar o sangue para o ventrículo pela valva estenosada. 
o Ocorre hipertrofia do átrio esquerdo, que fica insuficiente e dilatada. 
o Sobrecarregando o leito vascular pulmonar, podendo cursar com congestão pulmonar e edema. 
 Congestão se relaciona com o aumento da pressão hidrostática na vasculatura pulmonar. 
 Causando hipertensão pulmonar. 
 Pode causar sobrecarga de pressão no ventrículo direito, havendo hipertrofia concêntrica. 
 Evoluindo para insuficiência ventricular direita e dilatação. 
Thais Alves Fagundes 
 Com posterior sobrecarga do átrio direito e falência deste. 
 Insuficiência global do coração. 
 Tratamento: troca valvar prévia à descompensação. 
 
Estenose aórtica calcificada isolada: 
 Calcificação aórtica isolada no idoso: 
o Comum no envelhecimento, em indivíduos acima de 70 anos de idade. 
o Desgeneração na valva aórtica e substituição por fibrose. 
o Havendo muitas vezes calcificação na borda da valva. 
o Estenose pura, sem retração e fusão das comissuras (diagnóstico diferencial com doença reumática). 
o Causando estenose, com dificuldade na abertura. 
 Tratamento: troca valvar prévia à descompensação. 
 
Prolapso da valva mitral: 
 Valva mitral com cúspides com tamanho exagerado, por maior conteúdo. 
 No fechamento, projetam-se para a cavidade atrial esquerda, na sístole ventricular. 
 Esse abaulamento pode causar refluxo do sangue, associado à insuficiência valvar. 
 Podendo ser identificados por exame de imagem (ecocardiograma) ou por achados clínicos, como sopros.

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