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NAYSA GABRIELLY ALVES DE ANDRADE 1 Trombose - É a solidificação do sangue no leito vascular ou no interior das câmaras cardíacas, em um indivíduo vivo - Trombo pode formar-se em qualquer território do sistema cardiovascular: cavidades cardíacas (na parede do órgão ou nas válvulas), artérias, veias e microcirculação - Trombos recentes e coágulos post-mortem podem ser muito semelhantes, podendo ambos dissolver- se espontaneamente, dificultando sua identificação - De modo geral, trombos são friáveis e aderentes à parede do vaso ou do coração; coágulos são elásticos, brilhantes e não aderentes - A fluidez do sangue é indispensável para que o sistema circulatório possa realizar o transporte de oxigênio e nutrientes para as células e recolher e transportar os catabólitos até a sua via de eliminação - A circulação dos cerca de 5 litros de sangue no interior de tubos com pressão hidrostática positiva, que têm segmentos com paredes finas e passíveis de ruptura por traumatismos mínimos, fez surgir um mecanismo de proteção, o sistema de coagulação sanguínea, que tem por finalidade tamponar eventuais sítios de fuga do sangue do interior dos vasos - Apesar de muito eficiente na prevenção de perda sanguínea, a coagulação é uma ameaça ao organismo, pois a solidificação do sangue pode dificultar ou mesmo impedir a circulação - Para evitar coagulação excessiva e potencialmente lesiva, a natureza desenvolveu um sistema regulador da coagulação, representado por fatores anticoagulantes capazes de inibir ou limitar todas as fases do processo ou de dissolver trombos após sua formação (sistema fibrinolítico) - O estado de fluidez ideal do sangue resulta do equilíbrio entre coagulação e fatores anticoagulantes - Aumento da atividade coagulante ou redução da atividade anticoagulante favorece a formação de trombos ETIOPATOGÊSE: - A formação de trombos envolve o processo de coagulação sanguínea e a atividade plaquetária, estando associada a 3 componentes (clássica tríade de Virchow): (1) lesão endotelial (2) alteração do fluxo sanguíneo (3) modificação na coagulabilidade do sangue - Na maioria dos casos, 2-3 fatores estão implicados na formação de trombos LESÃO ENDOTELIAL: - O endotélio tem ações pró e anticoagulante - Agressões variadas ao endotélio (físicas, químicas ou biológicas) podem torná-lo pró-coagulante por aumento na síntese de fatores da coagulação (fator VII) e de fatores ativadores de plaquetas (TXA2 e ADP), por redução na sua capacidade anticoagulante (p. ex., diminuição na expressão de antitrombina no glicocálice) ou por perda do revestimento contínuo dos vasos. Isso se dá por alterações estruturais ou funcionais do endotélio - Lesão estrutural do endotélio com solução de continuidade ocorre em traumatismos (p. ex., cateterismo), por agressões químicas, em inflamações e em ateromas - Perda de células endoteliais expõe a membrana basal (conjuntivo subendotelial), sobre a qual as plaquetas se aderem e são ativadas, iniciando a formação do trombo. Trata-se de processo em tudo semelhante ao que ocorre na formação do tampão plaquetário. Ao mesmo tempo, é ativada a cascata da coagulação sanguínea - A trombose sobre ateromas tem esse mecanismo: a perda endotelial ocorre por aumento excessivo da força de cisalhamento sobre a placa ou por desligamento do endotélio da matriz extracelular facilitado pela ação de metaloproteases liberadas por macrófagos inflamatórios no interior da placa. A força de cisalhamento aumentada já é por si só fator que favorece muito a deposição de plaquetas sobre ateromas - Lesão endotelial é também o fator primário de trombose na parede ventricular em infartos subendocárdicos, em áreas de endocardite de NAYSA GABRIELLY ALVES DE ANDRADE 2 qualquer natureza, em arterites, em flebites e na coagulação intravascular disseminada (nesta ocorre reação inflamatória sistêmica) - Nem sempre é necessária a perda de células endoteliais para se formarem trombos. Alterações funcionais, mesmo sem destruição endotelial, são capazes de modificar o balanço entre fatores pró e anticoagulantes, favorecendo a trombose - Hipóxia de qualquer origem, por exemplo, agride o endotélio e o torna pró-coagulante - Disfunção endotelial ocorre em várias condições, como hipertensão arterial, diabetes melito, hipercolesterolemia, tabagismo, ateromas, entre outras ALTERAÇÃO NO FLUXO SANGUÍNEO: - Modificações na velocidade do sangue (aumento ou redução) e turbulência no fluxo sanguíneo são fatores importantes na gênese de trombos - Retorno venoso diminuído, com estase sanguínea, pode dever-se a fatores sistêmicos (insuficiência cardíaca, imobilidade no leito, uma vez que a contração muscular favorece o retorno venoso) ou locais (compressão de vasos) - Quando há turbulência ou se há modificação na velocidade do fluxo sanguíneo, o endotélio torna-se ativado e desaparece o fluxo laminar, situação em que plaquetas e outras células passam a circular próximas do endotélio; turbulência também lesa diretamente o endotélio - Além de agredir o endotélio, estase sanguínea dificulta a remoção de fatores pró-coagulantes e reduz a chegada de fatores anticoagulantes. Exemplos dessas situações são aneurismas e corações com dilatação de câmaras cardíacas, arritmias cardíacas (especialmente atriais), insuficiência ou estenose valvar ou anomalias congênitas - Com átrios dilatados e fibrilação atrial, há redução do fluxo (estase) pronunciada nas aurículas, local onde os trombos se formam preferencialmente. Nesses casos, além da estase sanguínea, que produz hipóxia (lesão endotelial), a formação de trombos é favorecida também por alteração no fluxo, que promove ativação plaquetária - Trombos auriculares crescem nos episódios de arritmia e representam risco constante de tromboembolismo devido ao fato de a atividade contrátil do coração favorecer sua fragmentação ou desprendimento - Em aneurismas arteriais, além das alterações reológicas da circulação que alteram o fluxo do sangue e favorecem a ativação plaquetária, as alterações primárias na íntima que contribuíram para a formação do aneurisma também participam na gênese do trombo - A regurgitação de sangue que ocorre na insuficiência valvar e em comunicações anômalas no coração produz um jato de sangue em direção ao endocárdio das câmaras de menor pressão - O impacto do sangue tem 2 efeitos mecânicos: sobre o endotélio, é capaz de causar desnudamento da íntima; sobre as plaquetas, inicia a sua ativação AUMENTO DA COAGULABILIDADE DO SANGUE: - Aumento da coagulabilidade sanguínea, por defeitos genéticos ou por condições adquiridas, resulta de: (1) aumento do número de plaquetas (2) maior disponibilidade de fatores pró- coagulantes (3) redução de inibidores da coagulação - Aumento do número de plaquetas e da síntese de fatores da coagulação, especialmente fibrinogênio, acompanha inflamações localizadas ou generalizadas (citocinas variadas estimulam o endotélio e o tornam pró-coagulante) e a resposta sistêmica ao parto, como um componente de defesa para facilitar a hemostasia NAYSA GABRIELLY ALVES DE ANDRADE 3 - Aumento da coagulabilidade sanguínea e redução na velocidade circulatória nessas 2 situações favorecem a formação de trombos venosos (trombose em pacientes imobilizados no leito e trombose venosa periparto) - Após traumatismos, queimaduras, cirurgias extensas e outras agressões teciduais, há liberação de tromboplastina, que ativa a via extrínseca da coagulação - Outras situações também acompanham-se de aumento da coagulação sanguínea: (a) em indivíduos com certos tipos de câncer, encontram-se hipercoagulabilidade sanguínea e maior tendência à formação de trombos em vários locais (síndrome de Trousseau)(b) anticoncepcionais orais associam-se a maior risco de trombose, assim como gravidez e período pós-parto (c) síndrome de anticorpos antifosfolipídeos deve-se à formação de autoanticorpos contra componentes lipídicos (p. ex., cardiolipina), os quais podem agredir células endoteliais ou ativar plaquetas. Na maioria desses casos, os pacientes têm alguma doença autoimune (p. ex., lúpus eritematoso); em outros, não há doença associada (d) síndrome trombocitopênica induzida por heparina, surge em pequena porcentagem de pacientes em tratamento com heparina (anticoagulante). Parece que o distúrbio resulta da formação de anticorpos que reagem com complexos de heparina e fator plaquetário 4 na superfície de plaquetas e células endoteliais, causando ativação, agregação e consumo de plaquetas e lesão endotelial - Redução de fatores inibidores da coagulação pode ocorrer por: (1) perda urinária (antitrombina III), como ocorre na síndrome nefrótica (2) por síntese anormal, por defeitos genéticos - Pessoas com mutação pontual no fator V da coagulação (fator V Leiden) têm risco aumentado de trombose venosa, provavelmente porque o fator V mutado torna-se resistente à inativação pela proteína C - Mutação pontual no gene da protrombina também confere maior risco de trombose - Na deficiência genética do ativador do plasminogênio, há tendência a formação de trombos venosos sem causa aparente, em pessoas na primeira ou na segunda décadas da vida - É frequente que os 3 mecanismos da tríade estejam presentes na patogênese da trombose - Trombose venosa profunda nos membros inferiores se forma, sobretudo, em pacientes imobilizados no leito, mais frequentemente após cirurgias ortopédicas ou traumatismo com imobilização. Nesses casos, ocorrem: (1) diminuição da velocidade do fluxo sanguíneo nas veias por falta dos movimentos musculares importantes no retorno venoso; (2) lesão endotelial por hipóxia, devido à redução do fluxo sanguíneo; (3) alteração na coagulabilidade do sangue decorrente da reação de fase aguda após agressões, em que há aumento na produção de fibrinogênio no fígado e de plaquetas na medula óssea - Macroscopicamente, os trombos apresentam-se como massas de sangue solidificado, de tamanhos variados, aderidos à superfície onde se formaram - Diferentemente dos coágulos sanguíneos, que são elásticos e têm superfície brilhante, os trombos são foscos e friáveis - Em consequência dos ciclos de aderência e agregação plaquetária no trombo, com repetidas coberturas pela malha de fibrina e hemácias aprisionadas, formam-se camadas sucessivas ou sedimentos de sangue solidificado - As lamelas assim percebidas são denominadas linhas ou estrias de Zahn NAYSA GABRIELLY ALVES DE ANDRADE 4 - Dependendo do local de formação, o trombo pode conter maior quantidade de plaquetas ou de hemácias, o que faz variar a sua coloração - Nos locais de fluxo sanguíneo laminar e com maior velocidade, há tendência de os elementos figurados ocuparem o centro da coluna de sangue; o trombo que neles se forma cresce por precipitação de células menores, as plaquetas, na superfície endotelial. As ondas de precipitação de fibrina intercaladas com menor quantidade de eritrócitos e novas agregações plaquetárias conferem coloração mais esbranquiçada ao trombo (trombos mistos, pois têm estrias vermelhas evidentes) - Nos territórios de fluxo lento e turbilhonado (p. ex., em veias), a malha de fibrina aprisiona grande quantidade de elementos figurados do sangue, o que dá ao trombo cor mais avermelhada – trombos vermelhos. Nesses trombos, o aspecto estratificado é bem evidente no ponto onde se inicia a sua formação - Trombos vermelhos tendem a ficar mais claros com o passar do tempo devido ao fenômeno de hemólise - Trombos constituídos exclusivamente por fibrina e plaquetas (trombos brancos) formam-se na microcirculação e não são vistos macroscopicamente - A partir da sua origem, o trombo pode crescer longitudinalmente seguindo a direção do fluxo sanguíneo e produzir massas alongadas no interior dos vasos ou do coração, de tal forma que a parte ou ponto de fixação que ancora o trombo é geralmente mais volumosa e a extremidade livre e flutuante no interior do vaso, mais afilada - A configuração final é de uma estrutura polipoide em que se pode reconhecer uma extremidade fixa denominada cabeça, uma porção intermediária, chamada corpo, e uma parte livre na outra extremidade, conhecida como cauda do trombo - O aspecto microscópico de um trombo é o de um coágulo sanguíneo em que se observam áreas acidófilas com aspecto reticulado ou laminar (estrias de Zahn), nas quais predominam depósitos de plaquetas e fibrina, e regiões onde a rede de fibrina aprisiona os elementos figurados do sangue, especialmente hemácias; tal massa está sempre aderida à parede do vaso ou do coração onde se formou, mesmo que em pequena extensão - Trombos na microcirculação podem conter exclusivamente plaquetas e fibrina, razão pela qual tomam aspecto acidófilo e são denominados trombos hialinos EVOLUÇÃO E CONSEQUÊNCIAS: - O crescimento progressivo do trombo pode obstruir total ou parcialmente a luz do vaso ou das câmaras cardíacas (trombos oclusivos e semioclusivos), com prejuízo no fluxo sanguíneo - Uma vez iniciado, o trombo pode crescer e, após tempo variável, sofrer dissolução ou organização - Trombos recentes muitas vezes sofrem dissolução (trombólise) espontânea pelo sistema fibrinolítico - Trombólise terapêutica é empregada para dissolver trombos recentes com a utilização de ativadores do plasminogênio (estreptocinase ou ativador tecidual do plasminogênio recombinante, rt-PA) introduzidos na circulação ou diretamente no vaso trombosado NAYSA GABRIELLY ALVES DE ANDRADE 5 - Aspiração via cateter pode auxiliar o processo de remoção por fibrinólise - Se não são dissolvidos, os trombos sofrem organização (conjuntivização) ou calcificação - A organização faz-se por meio de reação inflamatória em que os fagócitos englobam as células do coágulo e digerem a fibrina, ao mesmo tempo em que liberam fatores de crescimento e quimiocinas que atraem e ativam células que originam o tecido de granulação, que acaba incorporando o trombo à parede dos vasos ou do coração (conjuntivização do trombo) - Nos trombos oclusivos, no local conjuntivizado pode haver proliferação endotelial que origina canais que permitem o fluxo de sangue através do trombo, restabelecendo parcialmente a circulação. É o que se denomina recanalização do trombo, a qual pode restabelecer em parte a circulação no território comprometido - Calcificação distrófica em trombos forma concreções (flebólitos), mais comumente nas veias dos membros inferiores, podendo ser visíveis em exames de radiografia simples - Os trombos podem também sofrer colonização bacteriana ou fúngica e causar, nos vasos e no coração, diversas lesões, como endocardite valvar ou mural, tromboflebite e endarterite, as duas últimas favorecidas pelo uso de cateteres intravasculares de demora - Quando se fragmentam, tais trombos originam êmbolos sépticos - A consequência principal dos trombos é obstrução do vaso no local de sua formação ou a distância, esta quando o trombo se desprende ou se fragmenta e forma êmbolos - Obstrução arterial leva a isquemia; obstrução venosa reduz a drenagem sanguínea, provocando hiperemia passiva (congestão) e edema
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