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Beber 1997 - Pinturas de índios no BR Central

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PINTURAS DE íNDIOS NO BRASIL CENTRAL:
ALTO SUCURIÚ, SERRANÓPOLlS E CAIAPÔNIA
MARCUSVINíCIUS BEBER*
RESUMO
O Centro-Oeste representa hoje uma das grandes fronteiras da arqueologia
brasileira. Sua posição geográfica e suas condições ambientais favoreceram
um florescimento de culturas na pré-história que a arqueologia tem buscado
resgatar. Nessa busca, o Instituto Anchietano de Pesquisas empreendeu dois
grandes programas: o Programa Arqueológico de Goiás e o Programa
Arqueológico do Mato Grosso do Sul. Neste trabalho, buscamos apresentar
uma comparação entre as áreas estudadas, especialmente Alto Sucuriú,
Serranópolis e Caiapônia.
1- INTRODUÇÃO
Ao longo dos últimos trinta anos, o Instituto Anchietano de Pesquisas
vem trabalhando nos estados do Centro-Oeste brasileiro, especialmente
Goiás e Mato Grosso do Sul, onde vem desenvolvendo dois grandes
Programas Arqueológicos: o Programa Arqueológico de Goiás e o Programa
Arqueológico do Mato Grosso do Sul. Em ambos os casos houve a
subdivisão em vários projetos, como forma de obter uma amostragem
significativa das áreas em questão.
Neste trabalho apresentamos os dados básicos quanto à arte rupestre
dessas áreas, procurando uma comparação dos motivos encontrados nas
três áreas pesquisadas pelo Instituto Anchietano de Pesquisas ao longo dos
últimos trinta anos.
São enfocadas as seguintes áreas: Alto Sucuriú, no Mato Grosso do
Sul; Serranópolis e Caiapônia, no estado de Goiás.
Para nós, arte rupestre é todo testemunho gráfico, deixado por populações
passadas, utilizando como suporte a rocha, sejam paredes de abrigos,
blocos de rocha ou lajedos horizontais.
Apesar das discussões que a utilização desse termo tem levantado na
bibliografia, sua utilização está suficientemente consolidada na comunidade
Científica, e nesse sentido concordamos com Silva (1992, p. 57):-s * Instituto Anchietano de Pesquisas / UNISINOS. Caixa Postal 275, CEP 93001-970-
ão Leop.oldo,RS, Brasil- Email: beber@pub.unisinos.tche.br
BIBLOS. Rio Grande. 9: 107-116, 1997. 107
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Independente, no entanto, de chamarmos de "Arte" determinados
vestígios arqueológicos, continuam as interrogações sobre a sua
origem, seus significados, usos e funções, cabendo portanto ao
arqueólogo buscar o entendimento dos mesmos, na medida em que o
termo, por si só, não é explicativo.
Não temos muitas condições atualmente de responder a boa parte
dessas questões, mas procuramos fornecer elementos que nos ajudem a
encontrá-Ias, para que se possa, então, compreender melhor esse
fenômeno que é a arte rupestre do Planalto Central Brasileiro.
2 - ALTO SUCURIÚ
o Projeto Alto Sucuriú foi o primeiro dos quatro projetos previstos para
o Programa Arqueológico do Mato Grosso do Sul. Está localizado entre
51° 30' e 53° 22' de longitude oeste e 18° e 19° de latitude sul.
Foram encontrados quatro sítios com arte rupestre: o MS-PA-01; o
MS-PA-02 - também conhecido como "Casa de Pedra"; o MS-PA-03 e por
último o MS-PA-04.
As pinturas estão concentradas preferencialmente em dois dos quatro
sítios, o MS-PA-02, com pouco-menos de 35% das figuras, e o MS-PA-04,
com cerca de 60% das figuras. Nos outros sítios encontra-se o restante das
figuras.
Os grafismos predominantes são as figuras fechadas tanto de base
retangular como elipsóide - 18,61 % e 19,17%, respectivamente; juntas,
chegam a quase 40% das pinturas da área. Se contarmos ainda os tipos
próximos, que são figuras formadas pela combinação de elipses, ou mesmo
outros geométricos fechados, que não formam exatamente elipses ou
retângulos, e contabilizarmos ainda as figuras dos tipos 8 e 9, que devem ter
sido figuras fechadas, quer retângulos ou elipses, mas que foram alteradas
pelas intempéries, o percentual alcança 52,78% das figuras.
As figuras abertas, representadas pelas retas, curvas e pontos, que
se combinam de diferentes formas, representam juntas 26,21 %.
Os tipos naturalistas são poucos, e juntos não ultrapassam 15% do
total. Ocorrem fundamentalmente pisadas de mamíferos, pisadas de aves,
com 5,14% e 5,83% respectivamente. As figuras antropomorfas ocorrem
vinte e duas vezes, ou 3,06% do total das pinturas. São figuras chapadas,
em vermelho; em alguns casos, ocorrem por cima das figuràs geométricas,
indicando terem sido pintadas posteriormente. Algumas medem até cerca de
60cm de comprimento e 46cm de largura. Existem figuras maiores, mas são
poucas.
108 BIBlOS, Rio Grande, 9: 107-116, 1997.
As sobreposições repre-
sentam cerca de 16% das
pinturas, encontradas predomi-
nantemente no sítio MS-PA-04.
As figuras que estão por cima
são na maioria em vermelho e
bordô; já os grafismos que estão
por baixo são nas cores amarelo
ou laranja. As figuras bicolores
aparecem predominantemente
por baixo das outras nos
momentos de sobreposição.
Quanto à distribuição
espacial, parecem ocupar os
espaços claros e acessíveis dos
sítios. Não existem casos de
figuras em áreas de difícil
acesso ou escuras. Estão
distribuídas uniformemente nos
sítios, em abrigos que possuem
indícios de ocupação.
As gravações estão
restritas ao sítio MS-PA-02,
onde o arenito mais friável
permite a sua realização.
O Alto Sucuriú, portanto,
apresenta um conjunto de
pinturas que não mostram
cenas. O que predomina são as
pinturas geométricas, de base
tanto elipsóide como retangular.
Em menor quantidade ocorrem
figuras biomorfas, mas ainda
assim completamente estáticas.
A coloração é vermelha
ou bordô, com algumas figuras
bicromáticas de vermelho e
A coloração é fundamentalmente o vermelho e o bordô, em mais de
82% dos casos, obtida a partir do óxido do ferro aplicado em suspensão em
gordura animal ou água. O amarelo, em várias tonalidades, é pouco
freqüente e ocorre quase sempre em combinações bicolores com o
vermelho ou bordô.
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FIGURA 1 - Alto Sucuriú - Mato Grosso do Sul
BIBlOS, Rio Grande, 9: 107-116, 1997. 109
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Nota
Resultados descritivos (e não interpretativos): modelo para minha descrição de resultados.
amarelo. As figuras biomorfas são claramente posteriores e fornecem um
estrato mais recente sobre as geométricas.
3 - SERRANÓPOLlS
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Figura 2 - Serranópolis - Goiás
11
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S.rranópoll. 2
39
FIGURA 3 - Serranópolis - Goiás.
SISLOS, Rio Grande, 9: 107-116, 19
97
.
110
o Projeto Paranaíba está inserido no Programa Arqueológico de
Goiás, elaborado a partir de um convênio firmado em 1973 entre o Instituto
Anchietano de Pesquisas, a Universidade do Vale do Rio dos Sinos e o
Instituto Goiano de Pré-História e Arqueologia.
O objetivo básico do Programa está em "amostrar a arqueologia do
estado, insistindo principalmente em elementos cronológicos, distribucionais
e ecológicos" (Schmitz et aI., 1989, p. 16).
Parte dos dados foram publicados em vários trabalhos, especialmente
o de Schmitz, Barbosa, Jacobus e Ribeiro (1989), que reúne a
documentação dos sítios e o trabalho neles realizado .
Na Área Arqueológica de Serranópolis ocorre um total de 1159 signos,
distribuídos em 14 dos 26 abrigos estudados.
As pinturas estão divididas em duas grandes categorias -
geométricas e naturalistas.
Os geométricos são figuras compostas por linhas retas e curvas,
figuras compostas por pontos, retângulos, triângulos, losangos e elipses,
que juntos totalizam 633 figuras, ou 54,62%. Percebe-se a predominância
das elipses, com mais de 20%, seguidas pelas linhas que se encontram em
ângulos retos, retângulos, linhas isoladas e os pontos. Em termos de
preenchimento, são preferencialmente preenchidas por linhas, e
secundariamente cheias e ponteadas, isso quando as figuras são fechadas.
As figuras naturalistas, por sua vez, apresentam um total de 239
figuras, ou 20,62% do total. Os tipos que ocorrem são os quadrúpedes,
anfíbios, figuras ovais com patas, lacertídeos, peixes, aves, pisadas de
aves, figuras estilizadas de animais, figuras humanas e pisadas
antropomorfas. Percebe-se a predominância dos lacertídeos,seguida pelos
anfibios, aves, figuras e pisadas antropomorfas, com mais de 5%, e os
demais com menos que isso.
As figuras naturalistas são cheias na maior parte dos casos, mas
também apresentam preenchimentos como linhas, pontos ou a combinação
de ambos, porém em menor quantidade.
Quanto à coloração, predomina o vermelho com 68,62% das figuras
naturalistas, seguida pelas figuras em marrom, com 22,59%. As pinturas
bicromáticas representam 5,02%. Os grafismos em amarelo contribuem com
2,09% e o branco com 1,26%. Em 0,42% das figuras não há indicação da
Coloração.
As figuras estão distribuídas em 14 dos 26 abrigos estudados, e
concentradas preferencialmente em quatro deles: no GO-JA-01 com 8,63%,
GO-JA-03 com 52,8%, GO-JA-13 com 19,33% e GO-JA-14 com 8,71% .
J Já os petroglifos estão concentrados preferencialmente nos sítios GO-t-13, GO-JA-14 e. GO-JA-15, e associados às qualidades do arenito
otucatu, que é bem mais friável, facilitando a realização das gravações.
BIBlOS, Rio Grande, 9: 107-116, 1997. 111
Os motivos são formados por linhas retas e curvas que se justapõem
cruzam e/ou se encontram; figuras que lembram pisadas de aves; forma~
elípticas; formas triangulares; círculos ou depressões circulares; pisadas de
felinos; figuras que lembram pés humanos; figuras fechadas sem simetria'
figuras fechadas de tendências quadráticas; ocorrem ainda figuras qU~
lembram escudos, lagartos, estrelas, cruzes, outras formas.
Um elemento que chama bastante a atenção em Serranópolis é a
distribuição das pinturas e petroglifos. As variáveis que definem a seleção
dos locais a serem pintados ou gravados são diferentes, em função do
substrato, ora mais friável, onde são feitas as gravuras, ora mais solidificado,
onde são feitas as pinturas.
Dos 14 sítios com arte rupestre, apenas oito apresentam ambas as
manifestações; entretanto, nunca há um equilíbrio: ou predominam pinturas
ou predominam petroglifos.
4 - CAIAPÔNIA
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FIGURA 3 - Caiapõnia - Goiás.
112
BIBlOS. Rio Grande. 9: 107-116. 1997.
A área arqueológica de Caiapônía está situada entre 16°30' e 16°40'
de latitude sul e 51°40 e 51°20' de longitude oeste, no município de
caiapônia, GO. Foi pesquisada do ponto de vista arqueológico, por ocasião
do Projeto Caiapônia, parte do Programa Arqueológico de Goiás, levado a
termo pelo Instituto Anchietano de Pesquisas, UNISINOS e UCG.
O relatório final dessa etapa foi publicado em 1986, onde pode ser
encontrada toda a documentação, bem como a reprodução dos painéis,
croquis dos sítios, vistas dos blocos e toda a documentação adicional
produzida.
Na região de Caiapônia foram encontrados 42 sítios, a maioria deles
(33) cobertos por pinturas; apenas três possuem gravações.
Os sítios estão concentrados em duas áreas: o Córrego do Ouro, com
27 sítios, dos quais 14 apresentam pinturas e apenas dois deles petroglifos;
as Torres do Rio Bonito, com 14 sítios, 11 deles com pinturas e um com
petroglifos.
Na área do Rio Bonito, foram registradas 2450 figuras. Destas, 73,7%
são geométricas, 11% zoomorfas, 4% antropomorfas, 0,3% fitomorfas e
11% indefinidas. São pintadas preferencialmente em vermelho (80,5%),
alaranjado (14,5%), umas poucas em amarelo (1,5%), preto (0,5%) e
algumas policromáticas (3%).
Na área do Córrego do Ouro, foram registradas 1088 figuras, das
quais 73,3% são geométricas, 9,8% zoomorfas, 5,6% antropomorfas e
11,1% não-definidas.
Nas figuras geométricas ocorrem retas independentes ou que se
cruzam e encontram em diferentes ângulos; curvas que também podem se
cruzar ou encontrar de diferentes formas; pontos que se combinam ora em
linhas, ora formando nuvens ou mesmo figuras; carimbos; triângulos com ou
sem preenchimento interno; retângulos, losangos, círculos, além de outras
formas não-identificadas.
As figuras são formadas por traços ou pontos e raramente chapadas.
Entre as naturalistas, ocorrem peixes, répteis, aves, mamíferos,
antropomorfos e fitomorfos, além de mãos.
Os antropomorfos formam cenas e podem vir isolados, associados ou
justapostos a outras figuras zoomórficas e/ou geométricas.
As figuras zoomorfas, por sua vez, permitem, em alguns casos, a
diferenCiação em nível de classe, percebendo-se mamíferos, répteis, aves e
peixes. Os mamíferos estão representados em perfil com todas as
extremidades visíveis, sugerindo movimento. Percebem-se representações
de macacos, as mais numerosas, veados, antas e felinos. Os répteis são
representados pequenos, chapados, podendo ser lagartos e tartarugas. As
aves são variadas. na forma, mas geralmente são representadas chapadas,
com pernas formadas por traços, bicos abertos em perfil lateral, sugerindo
BIBLOS. Rio Grande. 9: 107-116. 1997. 113
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movimento. Ocorrem normalmente agrupadas mas podem estar isoladas
Os peixes são bastante comuns, representados com o corpo alongado
chapado, com as nadadeiras caudais evidenciàdas; ocorrem sozinhos, em
duplas ou cardumes.
As figuras fitomorfas, por sua vez, são poucas, lembrando tubérculos
palmeiras e outros vegetais não-identificados. '
Quanto ao tamanho das figuras, está entre 5 e 50cm na maior
medida, predominando as figuras entre 10 e 20cm, podendo ocorrer figuras
extremas de até 150x80cm.
Resumindo, podemos dizer que na pintura de Caiapônia temos urna
arte ingênua, de representação, que usa sugestão em vez de
detalhamento e não conhece técnicas sofisticadas na execução. As
mensagens legíveis são extremamente simples: caça, família, dança,
brincadeira, lutas humanas; animais isolados ou associados
ocasionalmente ou em agrupamentos tiptcos, como cirandas de
macacos, aves caminhando umas atrás das outras, fêmeas com
filhotes, cardumes de peixes; algumas plantas; ritual, como pessoas
estendendo os braços sobre menores, procissão de animais (ou
mascarados) em atitudes estranhas. Os numerosos sinais
geométricos ou livres, pertencentes ao seu mundo simbólico e
provavelmente portadores de mensagens compreensíveis para eles,
certamente têm como função básica a decoração do ambiente, que de
estranho se tornaria doméstico, como as mensagens legíveis
certamente marcariam a passagem do grupo pelo local (Schmitz et ai,
1986, p. 300).
Pelos dados disponíveis, podemos ver que a arte rupestre do Brasil
Central apresenta uma tendência de geometrização do litoral para o interior.
Ao compararmos as diferentes tradições rupestres, separados os três
grandes motivos - antropomorfos, zoomorfos e geométricos, notamos que:
* no Alto Sucuriú temos 1,36% das figuras antropomorfas, 7,33%
zoomorfas e 87,57% geométricas;
* em Serranópolis temos 1,71 % de antropomorfas, 25,37% zoomorfas
e 73,14% geométricas;
* em Caiapônia temos 4% antropomorfas, 11% zoomorfas, 73,7%
geométricas, além de 0,3% fitomorfas e 11% indefinidas;
Percebe-se, assim, um aumento nas representações antropomórficas
e zoomórficas em Serranópolis e Caiapônia, ao contrário do Alto Sucuriú,
bem como as figuras com representações cênicas em Caiapônia são mais
abundantes.
Mesmo se considerarmos apenas as geométricas, notamos algumas
114 BIBLOS. Rio Grande. 9: 107-116. 199
7
diferenças, pois no Alto Sucuriú são basicamente retas, curvas, elipses e
retângulos; já nas outras áreas ocorrem, além destas, quadrados, losangos,
triânguloS, e também variações, que são encontradas nas figuras
naturalistas.
Considerando que a ocupação do Brasil Central deve ter começado
por volta dos dez ou doze mil anos antes do presente, correspondendo ao
final do pleistoceno e início do holoceno, associada às condições ambientais
do holoceno com um clima de sem i-aridez se desfazendo, os abrigos devem
ter sido procurados como refúgio e fonte de matéria-prima.
As pinturas rupestres desse momento, especialmente no Alto Sucuriú
e Serranópolis, compreendem figuras geométricas, chapadas, e em alguns
casos ocorre a bicromia. Essas figuras correspondem aos motivos do
primeiro estrato definido no Alto Sucuriú, que está caracterizado por figuras
bicolores em vermelho e amarelo,preponderantemente geométricas.
A cultura material encontrada nas escavações é composta
especialmente por artefatos fabricados sobre o arenito silicificado
encontrado nos abrigos, como raspadores, machados, facas, associados à
tradição lítica Itaparica.
A ocupação seria de pequenos bandos caçadores-coletores, que
ocupariam os sítios como abrigos e fonte de matérias-primas. Possivelmente
Serranópolis tenha visto uma ocupação mais intensa, devido à maior
quantidade de abrigos e maior variabilidade nos motivos representados, o
que poderia indicar uma maior quantidade de pessoas executando a pintura.
Caiapônia, por sua vez, não parece ter visto uma ocupação mais
significativa nesse período.
O segundo momento de ocupação da área parece estar situado entre
os sete e oito mil anos antes do presente, entre o início do holoceno e a
entrada do "Ótimo Climático". As pinturas apresentam uma modificação no
seu conteúdo, tanto em termos de cor como de forma. No Alto Sucuriú,
sobre as figuras geométricas bicolores do momento anterior. estão
sobrepostas figuras chapadas geométricas e biomorfas de cor vermelha a
bordô, o que indica uma execução posterior.
No Alto Sucuriú as pinturas desse momento são quantitativa mente
predominantes, do mesmo modo que em Serranópolis. A cultura material
assOciada a esse momento indica uma produção de lascas irregulares e
pouco retocadas conhecida como Tradição Serranópolis* , que seria de
grupos de caçadores generalizados que estariam vivendo da caça e da
coleta, tendo nos abrigos um ponto de referência.
O terceiro momento estaria associado, então, às ocupações
s . * É importante frisar que a definição de Tradição Serranópolis apresentada por
Chmltz et aI. (1986: p. 327) é uma denominação tentativa que merece melhor caracterização.
BIBLas. Rio Grande. 9: 107-116. 1997 115
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posteriores aos seis mil anos antes do presente, quando há um aumento na
umidade, e a necessidade agora é por abrigos grandes e ventilados, corno
ocorre nos de Serranópolis e Caiapônia. A arte rupestre agora apresenta
uma nova realidade, proliferando figuras biomorfas com motivos do
cotidiano, como cenas de caça, lutas, danças e brincadeiras, caminhando
para uma "naturalização", já que há uma diminuição da incidência de figuras
geométricas, ocorrendo, a exemplo de Caiapônia e Serranópolis, um
aumento nas figuras naturalistas, e em Caiapônia a profusão de figuras
naturalistas, dançando, pulando, brincando, o que parece ser urna
penetração de elementos de tradições como a Planalto, Agreste e talvez
Nordeste.
Evidentemente que as conclusões apresentadas aqui sobre esse
"movimento de geometrização" da arte rupestre são uma primeira reflexão
sobre o assunto, mas parece claro que existem elementos que se difundem
na arte rupestre brasileira. Em termos de Brasil Central, devemos levar em
consideração ainda que temos uma grande tradição lítica, a Tradição
Itaparica, com uma dispersão territorial de mais de 2000 quilômetros, que
nos coloca questões ainda difíceis de serem respondidas, mas que nos
fazem pensar nos mecanismos que devem ter articulado essas populações.
Nesse sentido, parece lógico pensar que a geometrização que se
percebe nas pinturas rupestres refletem, de alguma forma, esses
mecanismos, sem contudo possibilitar que sejam percebidos claramente, até
porque as pesquisas ainda estão buscando a localização dos sítios e
identificação do que é a primeira expressão cultural autenticamente
brasileira.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BEBER. Marcus Vinícius. Arte Rupestre do Nordeste do Mato Grosso do Sul. São Leopoldo,
Instituto Anchietano de Pesquisas/UNISINOS, 1995
GUIDON, Niéde. Tradições Rupestres da Área Arqueológica de Sãà Raimundo Nonato, Piauí,
Brasil. Clio, Recife, Série Arqueológica. 5. p. 5-10, 1989.
PROUS, André. Arqueologia Brasileira. Brasília, Editora da UnB, 1992.
SCHMITZ, Pedra 1.; RIBERIO, Maira B.; BARBOSA, Altair S. et aI. Ceiepônie : Arqueologia nos
Cerrados do Brasil Central, Instituto Anchietano de Pesquisas/UNISINOS, 1986.
SCHMITZ, Pedro 1.; BARBOSA, Altair S; JACOBUS, André L. et aI. Arqueologia nos Cerrados
do Brasil Central Serranópolis I. Pesquisas - Antropologia, São Leopoldo, n. 44, Instituto
Anchietano de Pesquisas, 1986.
SILVA, Fabíola Andréa. Manifestações Artísticas Pré-Históricas - Um estudo Descritivo
Classificatório e Interpretativo da Arte Rupestre de Serranópolis - Goiás. Dissertação de
Mestrado apresentada à UFRGS -IFCH, 1992.
VERONEZE, Ellen. A Ocupação do Planalto Central Brasileiro .' O Nordeste do Mato Grosso
do Sul. São Leopoldo, Instituto Anchietano de Pesquisas/UNISINOS, 1994.
116 BIBLOS, Rio Grande, 9: 107-116, 1997.
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