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Náthaly C. I. Eroles Problema 2 “Tiozão na balada de morrer“ Mód 3 etapa 8 SÍNDROME CORONARIANA AGUDA ❖ INTRODUÇÃO E FISIOPATOLOGIA A síndrome coronariana aguda consiste em uma das faces da doença aterosclerótica, a qual é oriunda da presença de placas ateromatosas na circulação arterial do coração. Ela se evidencia como um quadro instável, que se apresenta com sintomas anginosos que surgem aos mínimos esforços e até mesmo em repouso, estando associada a altos índices de morbidade e mortalidade. A síndrome coronariana aguda ocupa o segundo lugar no quesito de mortalidade global no Brasil, sendo a principal causa do óbito em doenças cardiovasculares, sendo estimados cerca de 300 a 400 mil casos a cada ano. Para compreender a Síndrome Coronariana Aguda (SCA), faz-se necessário compreender o processo desencadeante da doença aterosclerótica. Ao longo dos anos ocorre o depósito de colesterol do tipo LDL no subendotélio de vasos arteriais. Em associação com macrófagos, formam as chamadas células espumosas, quadro esse que configura a formação de um ateroma, o qual consiste em uma estrutura com core lipídico localizada na região subendotelial do vaso, recoberta por uma capa fibrosa. Os fatores de risco para a doença aterosclerótica se relacionam com a presença de um endotélio mais inflamado, o qual acaba por expressar moléculas de adesão, como VCAM- 1. Tais moléculas atraem elementos presentes no plasma, com ênfase nos monócitos, os quais, ao entrarem em contato com essas proteínas de adesão, se internalizam na camada subendotelial, local onde essas células se diferencial em macrófagos. Uma vez instalados, os macrófagos subendoteliais fagocitam moléculas de gordura, principalmente colesterol do tipo LDL, de modo a gerar as chamadas de células espumosas, os quais se acumulam na camada subendotelial ao longo do tempo, comprimindo o endotélio contra a luz do vaso. Toda essa lesão gera uma capa fibrótica que recobre essas células, em decorrência da migração de células da camada muscular lisa do vaso, que pode se calcificar ao longo do tempo. Mecanismo de formação da placa. Evolução das alterações da parede arterial na hipótese da resposta à lesão. 1. Lesão endotelial com adesão de monócitos e plaquetas (as últimas a locais onde se perdeu o endotélio). 2. Migração de monócitos e células musculares lisas para a íntima. 3. Proliferação das células musculares lisas na íntima com produção de matriz extra celular. Pensa-se que a hiperlipidemia e outros fatores de risco causem lesão endotelial, resultando em adesão de plaquetas e monócitos e liberação de fatores de crescimento, incluindo fator de crescimento derivado das plaquetas (PDGF), que levam à migração e proliferação de células musculares lisas. As células espumosas das placas ateromatosas são derivadas de macrófagos e células musculares lisas – de macrófagos através do receptor de lipoproteína com densidade muito baixa (VLDL) e modificações da lipoproteína de baixa densidade (LDL) reconhecidas pelos receptores depuradores (p. ex., LDL oxidado) e de células musculares lisas por mecanismos menos certos. O lipídio extracelular é derivado da insudação da luz do vaso, particularmente na presença de hipercolesterolemia, e também de células espumosas em degeneração. O acúmulo de colesterol na placa reflete um desequilíbrio entre influxo e efluxo, e a lipoproteína de alta densidade (HDL) provavelmente ajuda a remover o colesterol desses acúmulos. As células musculares lisas migram para a íntima, proliferam e produzem matriz extracelular (MEC), incluindo colágeno e proteoglicanos. IL-1, interleucina-1; MCP-1, proteína quimioatraente de monócitos-1. O quadro em questão é desencadeado pelo instabilização aguda de placa aterosclerótica localizada em campos coronarianos, propiciando a agregação plaquetária, de modo a formar um trombo na luz arterial, o que gera um agravamento agudo da obstrução vascular. O grau de obstrução determinará o aparecimento de diferentes sintomas clínicos, bem como o grau de isquemia ao qual o miocárdio for submetido. Nos casos em que o trombo promover uma obstrução parcial, com fluxo sanguíneo residual (seja pela porção ainda não ocluída ou por circulação colateral), ou com a ocorrência de uma oclusão transitória da luz vascular, temos dois quadros possíveis mais brandos da doença: o infarto agudo do miocárdio sem supradesnivelamento do segmento ST (IAMSSST) e a angina instável. Já quando ocorre adaina mendonca adaina mendonca a obstrução total da luz arterial, sem o suprimento por circulação colateral, ocorre uma privação completa da irrigação do miocárdio, levando ao infarto agudo do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST (IAMSST). Sendo assim, esses três quadros fazem parte da Síndrome Coronariana Aguda, sendo o grau de obstrução o determinante da gravidade e da intensidade do quadro clínico desencadeado. • A síndrome coronariana aguda pode ser caracterizada também pelas regiões do miocárdio atingidas pela isquemia ou pelas modificações tardias que surgem ao ECG. Infartos sem supra de ST costuma provocar necrose do miocárdio restrita à região subendocárdica, daí serem denominados de infartos subendocárdicos. Esse tipo de acometimento não costuma gerar cicatrizes eletrocardiográficas, de modo a também serem chamados infartos sem onda Q ou não-Q. Nos casos de isquemia severa e persistente, a necrose é mais extensa, atingindo toda a espessura do miocárdio, classificando esse evento como infarto transmural. Nesse caso, temos o desenvolvimento de uma onda Q ao ECG, de modo que esse evento pode ser denominado também como infarto com onda Q, ou infarto Q. A instabilização de uma placa ateromatosa enraizada na luz de algum ramo coronariano ocorre por meio de rotura dessa placa, erosão superficial e hemorragia intraplaca. Em termos gerais, a rotura da placa consiste na forma mais grave de instabilização, sendo preponderante entre os casos de infarto agudo do miocárdio (IAM) fatais. Isso ocorre porque a placa rota faz com que o sangue seja exposto às substâncias trombogênicas que se encontram no interior da placa, propiciando a formação de um coágulo no local da rotura. Enquanto isso, a erosão da placa está relacionada às formas mais brandas da síndrome coronariana aguda, na qual ocorre a remoção de placas endoteliais vasculares, ocorrendo a exposição de colágeno da membrana basal, que estimula plaquetas circulantes, ativando a cascata de coagulação. Essa ativação geralmente é mais tênue, de modo que produz um coágulo mais friável do que aquele da rotura, mas ainda assim, esse mecanismo corresponde a cerca de 20% dos óbitos fatais por IAM. A hemorragia da placa é mais rara e atua rompendo a placa, uma vez que provoca uma rápida expansão da lesão. Uma vez que a placa tenha sofrido uma erosão superficial com extensão pequena, a trombose costuma ser autolimitada, sem gerar repercussões sintomáticas para o paciente, sendo que na maioria das vezes, o coágulo pode ser dissolvido pelo próprio sistema fibrinolítico endógeno ou pode também ser incorporado pela placa, de modo a contribuir para o aumento dessa. Caso ocorra uma trombose mais extensa, normalmente associada a rotura da placa com exposição de seu núcleo lipídico, pode ocorrer obstrução da luz mais severa ou até completa, gerando o aparecimento de sintomas. Nos casos de oclusão parcial, o fluxo residual impede a privação completa de oxigênio para as células miocárdicas, preservando a integridade dessas e evitando a necrose celular, consistindo no quadro característico da angina instável. Caso ocorra oclusão completa temporária, tem-se, a princípio um evento que não gera supradesnivelamento do segmento ST, característico do infarto subendocárdico, que também não gera cicatrizes eletrocardiográficas. Podemos dizer que tanto o infarto subendocárdico quanto a angina instável são bem semelhantes do ponto de vista fisiopatológico, motivo esse pelo qual recebem tratamento muitosemelhante. Quando ocorre a obstrução completa sustentada, a onda de isquemia se prolonga para além do endocárdio, de modo que a falta de suprimento sanguíneo atinge toda a espessura miocárdica, gerando o IAM transmural, o qual gera o aparecimento do supradesnivelamento do segmento ST, bem como o aparecimento de cicatrizes observáveis ao ECG por meio da presença de ondas Q. ❖ EPIDEMIOLOGIA O infarto agudo do miocárdio é responsável por cerca de 8,8% dos óbitos no Brasil, sendo a mortalidade mais alta no sistema público do que no privado, decorrente de dificuldade de acesso ao serviço de terapia intensiva precocemente. Nos Estados Unidos, a doença coronariana por si só (quadro esse que inclui a síndrome coronariana aguda) atinge cerca de 17 milhões de pessoa, sendo que cerca de 10 milhões sofrem de sintomas anginosos, ocorrendo cerca de 380 mil mortes decorrentes de infarto agudo do miocárdio a cada ano por meio de morte súbita. É importante ressaltarmos que a incidência da doença coronariana aumenta conforme a idade do paciente, sendo que a ocorrência do evento, é responsável por limitações na qualidade de vida do indivíduo ao restringir suas atividades em decorrência de incapacidade adquirida após o evento, a sua maioria decorrente de quadros de angina instável e déficits do ventrículo esquerdo. ❖ FATORES DE RISCO Os fatores de risco para a SCA são aqueles relacionados à ocorrência de aterosclerose, sendo que alguns desses são modificáveis e outros não. Apesar do fato de mulheres possuírem uma carga aterosclerótica significativa, os homens são mais propensos a desenvolverem doenças coronarianas mais precocemente, sendo a prevalência dessa cada vez maior conforme a idade do paciente aumenta. Como em várias doenças, um potente fator de risco para o desenvolvimento de doenças coronarianas consiste em quadros familiares prévios dessa, o que sugere um mecanismo genético de predisposição, o qual, obviamente, não pode ser alterado. Os riscos são acumulativos, de modo que é de suma importância a avaliação dos fatores de risco modificáveis, como dislipidemia, hipertensão, diabetes mellitus, síndrome metabólica, tabagismo, obesidade, sedentarismo e etilismo, os quais devem ser mitigados e, dentro do possível, eliminados. ❖ QUADRO CLÍNICO Os sintomas decorrentes da síndrome coronariana aguda decorrem do desbalanço entre oferta e demanda de oxigênio quanto ao miocárdio, gerando um cenário propício para a isquemia, uma vez que diante da doença aterosclerótica, ocorre disfunção endotelial, reduzindo a vasodilatação que ocorreria para compensar o au- mento da demando por oxigênio, dada a obstrução ocorrida. O sintoma preponderante desse quadro consiste na dor precordial, também chamada de angina, geralmente descrita como sensação em aperto no tórax, restroesternal, de início súbito, aos mínimos esforços ou em repouso, sem relação com esforço prévio, piorando em situações de exercício e estresse e melhorando um pouco ao repouso e, como veremos adiante, com a administração de nitrato. Pode ser descrita a irradiação dessa para o epigástrio, cérvice, mandíbula, dorso e membro superior esquerdo, sendo que é comum a sensação de parestesia nesse último. O paciente geralmente não associará a dor aos movimentos respiratórios e não indicará um ponto específico doloroso. Isso porque a dor isquêmica consiste em uma dor visceral, a qual não envia sinais neurológicos de dor localizada, mas sim de dor difusa. O paciente com esse quadro poderá se apresentar claramente ansioso e desconfortável, podendo também sofrer de taquicardia, dispneia, vômitos ou náuseas, bem como elevação da pressão arterial sistêmica. A ausculta cardíaca pode variar, podendo estar dentro dos índices de normalidade, ou ainda revelar a presença de B4, pela diminuição da complacência do ventrículo esquerdo, ou ainda B3, caso haja disfunção ventricular. Sopros serão auscultados somente nos casos em que a isquemia acometer os músculos papilares, que será evidenciado pela presença de sopro característico de insuficiência mitral. • Muitas vezes o paciente se apresentará com claro desconforto corporal, podendo estar levemente curvado devido à dor anginosa e com o punho na região do coração. Essa condição postural do paciente configura o chamado sinal de Levine. • É importante que a dor seja bem investigada, uma vez que a angina decorrente da síndrome coronariana aguda é, como o próprio nome diz, aguda. Diante disso, o paciente não relatará dor recorrente, mas episódio que ocorrer há um curto espaço de tempo, geralmente entre 20 e 30 minutos. • Pacientes mais velho e diabéticos podem não apresentar quadro típico da doença, sem a presença de desconforto torácico, uma vez que, principalmente nos diabéticos, ocorre um quadro de denervação, decorrente da neuropatia diabética. Tais pacientes apresentarão o chamado equivalente anginoso ou isquêmico, que consiste na apresentação de sintomas como sudorese, mal-estar súbito, dispneia, náusea etc (sintomas que podem estar presentes com a angina em outros pacientes com síndrome coronariana aguda), sendo mais comum em mulheres, idosos e diabéticos. Desse modo, deve-se ter atenção redobrada caso esses pacientes se apresentem na emergência com queixa de vertigem, dispneia, sudorese, náuseas, vômitos, arritmias ventriculares e até mesmo hipotensão. É muito importante que a história e o raciocínio clínico sejam feitos de maneira coerente no caso da SCA, pois, a dor torácica não é patognomônica de Síndrome Coronariana Aguda. Desse modo, deve-se rastrear achados e dados da anamnese e do exame físico que guiem o raciocínio clínico na direção certa. Isso porque, apesar de muitos acometimentos patológicos que causam dor torácica poderem ser benignos, existem doenças que se manifestam com quadros de dores no peito que podem culminar na morte do paciente, sendo que o tratamento de uma pode ser o inverso do utilizado em um diagnóstico diferencial. Os sinais vitais do paciente devem ser monitorados com atenção, observando o surgimento de hipo ou hipertensão, uma vez que em casos de acometimento extenso do miocárdio, pode ocorrer a manifestação de sinais e sintomas de insuficiência cardíaca, como dispneia, pressão venosa central elevada, bem como a evolução para choque cardiogênico aliado à hipotensão e vasoconstrição, que poderá ser suspeitada pelas extremidades frias ao toque. ❖ SEGUIMENTO Uma vez iniciados os sintomas do paciente, o tempo entre a tomada de decisão de procurar o serviço de emergência e a chegada nesse geralmente é demorado, especialmente no que concerne pacientes idosos, do sexo feminino e de baixa condição socioeconômica. Havendo a possibilidade e a disponibilidade da realização de um eletrocardiograma (ECG) anteriormente à chegada ao serviço de emergência, esse deve ser feito de imediato, uma vez que a identificação do supradesnivelamento do segmento ST poderá ser utilizado para encaminhar o paciente para o atendimento prioritário. Chegando ao serviço, todo paciente que levante suspeita para SCA deve realizar um ECG em até dez minutos desde a sua chegada. A realização desse é fundamental, pois, além de ser um divisor de águas quanto à classificação, revela a situação da perfusão cardíaca, bem como identifica maior ou menor gravidade do quadro, podendo configurar situação de urgência. Ao realizar o exame, deverá ser observado se existe supra de ST em alguma derivação e, na ausência desse, procura-se achados diferenciais como o infra do mesmo segmento eletrocardiográfico. Relembrando, o supra de ST é tão grave porque ele consiste no sinal elétrico de um coração cujo ramo coronário esteja obstruído por completo (geralmente), configurando o chamado infarto com supra de ST. A ausência desse, mesmo que a presença de infra de ST, quando compatível com a SCA, configura dois possíveis quadros: o infarto sem supra de ST e a angina instável. O ECG no caso de IAMSST, o supradesnivelamento deST pode ser caracterizado pela elevação do ponto J em ao menos 1 mm em derivações contíguas (derivações sequenciais). A exceção a essa regra são as derivações V2 e V3, cujo critério para a identificação de supra de ST é um pouco diferente. Nelas, o supradesnivelamento do segmento ST se dá por meio da elevação do segmento J acima de 1,5 mm para mulheres, e para homens esse valor aumenta para 2 mm, naqueles com mais de 40 anos, e para 2,5 mm para aqueles com menos de 40 anos. É importante frisar que a ocorrência de bloqueio de ramo esquerdo novo ou considerado novo deve ser caracterizado como supradesnivelamento do segmento ST. É importante que, além da identificação do supradesnivelamento de ST, saibamos também identificar a porção miocárdica acometida, de acordo com a derivação que apresenta o supra de ST. Identificada a derivação ou as derivações, passamos a observar os planos em que cada uma delas enxerga a atividade elétrica do coração, de modo que possamos inferir a região isquêmica. De um modo geral: • a região inferior é registrada por DII, DIII e aVF; • a região lateral, por DI, aVL, V5 e V6; • e a anterior, pelas derivações de V1 a V4. É importante colocarmos aqui que a identificação de supra de ST em parede inferior requer derivações ele- trocardiográficas auxiliares, uma vez que faz-se necessária a investigação dos campos relativos, principalmente, à coronária direita, responsável majoritária pela irrigação do ventrículo direito. Assim, adiciona-se ao exame as derivações V3R e V4R, cujas posições são as mesmas de V3 e V4, porém à direita. Também são inseridas as derivações posteriores, V7, V8 e V9, à esquerda, cuja indicação é a mesma, sendo que a inserção de cada uma dessas derivações auxiliares requer o registro na folha do exame, a fim de explicitar o que foi feito, evitando possíveis confusões. Além do eletrocardiograma, deve-se realizar um acesso venoso calibroso no paciente. Isso porque medicações necessitarão ser administradas e exames deverão ser colhidos. No momento de sua chegada, devem ser dosados os níveis séricos dos marcadores de necrose do miocárdio. O mais específico utilizado é a troponina, que consiste em um marcador biológico de lesão e de necrose miocárdica, tendo os seus níveis sanguíneos aumentados quando de um acometimento ao músculo cardíaco. Essa substância possui uma cinética quanto à sua elevação, sendo que o início do aumento é percebido no sangue após 3 horas do início da dor anginosa, com um pico atingido entre 18 e 24 horas, podendo persistir por até 10 dias em níveis elevados na corrente sanguínea do paciente. Desde 2010, os ensaios ultrassensíveis aumentaram a confiabilidade da dosagem de troponinas para identificar quadros de IAM, mas ao custo de, como consequência, ocorrer a redução da sua especificidade, aumentando o número de falsos positivos. Diante disso, é importante que para refinar a busca, ao buscar pelos níveis de troponina no sangue, esses devem ser explicitamente quantitativos e não categóricos, de modo que o valor possa ser avaliado, sendo considerado indicativo de infarto quando esse estiver acima do percentil 99. Ou seja, quando comparado com uma população sem patologias rela- cionadas ao IAM, 99% dessa população apresentará níveis de troponina menores que o os que são evidenciados pelos pacientes com infarto. Justamente por isso, é importante que a mensuração da troponina seja realizada juntamente com uma clínica sugestiva ou característica de doença isquêmica miocárdica, dado que às vezes essa dosagem pode vir dentro de valores limítrofes, os quais podem ser confundidos com os diagnósticos diferenciais para a elevação da troponina. • Cabe ressaltar que a troponina consiste em um marcador específico para o coração, mas deve-se ter em mente que a sua elevação não é específica do IAM, uma vez que outras patologias podem causar elevação dos níveis séricos dessa proteína, dentre eles, temos os principais diagnósticos diferenciais: insuficiência cardíaca, doença real crônica, taquiarritmias, miocardites, tromboembolismo pulmonar, sepse e dissecção de aorta. No cenário de níveis de troponina duvidosos, bem como nos quais o paciente chega antes de três horas do início do quadro, pode-se realizar a dosagem seriada de troponina, ou simplesmente o que se chama de colher a troponina em tempo hábil. O motivo do uso da expressão “tempo hábil” consiste no fato de que, como já vimos, a elevação da troponina não ocorre de imediato, podendo demorar até três horas após o início do quadro de isquemia para que isso ocorra. Diante disso, deve-se colher a dosagem de troponina do paciente a cada uma ou duas horas, observando a curva da concentração dessa proteína. A elevação da dosagem maior do que 20% do valor inicialmente colhido é altamente sugestiva de infarto, indicando o chamado valor em crescente, configurando quadro compatível com a síndrome coronariana aguda. Outra possibilidade consiste no padrão de elevação do tipo platô, o qual é caracterizado por um aumento menor do que 20% do inicial quando da segunda coleta de troponina, o qual está relacionado aos diagnósticos diferenciais que podem cursar com elevação dos níveis séricos de troponina já listados anteriormente. ❖ DIAGNÓSTICO O diagnóstico da Síndrome Coronariana Aguda é feito diante de um cenário clínico compatível. As suas subdivisões, incluem os infartos com e sem supra e a angina instável. Logo, para o diagnóstico é fundamental que esses três sejam diferenciados, dado que o prognóstico e a gravidade de cada um desses diferem. O IAM é definido pela presença de lesão miocárdica, a qual é evidenciada por níveis séricos de troponina acima do percentil 99, acompanhada de isquemia miocárdica aguda, e é caracterizada pela presença de ao menos um dos seguintes fatores: sintomas característicos de isquemia (angina ou equivalente isquêmico), alterações eletrocardiográficas típicas (supra ou infra de ST, inversão de onda T ou onda Q patológica), alteração de imagem, como ecocardiograma ou ressonância magnética, revelando área hipocinética (diminuição da mobilidade segmentar) nova ou cateterismo cardíaco com evidência de trombose coronariana. Ainda pode ser utilizado como critério o achado de trombo coronário quando da realização da autópsia. O diagnóstico do IAMSST é, aliado à clínica compatível, eminentemente eletrocardiográfico, não necessitando que seja aguardada a dosagem sérica da troponina, uma vez que essa pode demorar a se elevar. Sendo assim, a presença do supradesnivelamento do segmento ST é suficiente para que o paciente seja elencado como de tratamento urgente. Dada a heterogeneidade dos grupos que se enquadram em síndromes isquêmicas sem supra de ST (IAM sem supra e angina instável), faz-se necessária a estratificação de risco desses pacientes, a qual pode ser realizada principalmente pelos escores TIMI, que pontuará o paciente de acordo com os seus critérios, classificando-o como de risco baixo (0 a 2 pontos), intermediário (3 a 4 pontos) e alto (5 a 7 pontos). Pode também ser utilizado o score de GRACE, o qual é mais complexo, pontuando em mais quesitos e de forma mais refinada. O seu uso pode ser feito a partir de calculadoras facilmente disponíveis para dispositivos eletrônicos, sendo que ao utilizá-la, os pontos atribuídos ao paciente o classificação em faixas de risco que influenciarão quanto ao tratamento do paciente, sendo baixo risco (menor do que 108 pontos), médio risco (109 a 140 pontos) e alto risco (maior ou igual a 141 pontos). ❖ MEDIDAS INICIAIS E TRATAMENTO PRECOCE O tratamento inicial da síndrome coronariana aguda inclui repouso com monitoramento via ECG e pronta terapia antitrombótica. A dor anginosa deve ser tratada com morfina, salvo nos casos de hipotensão, sendo que administração de nitroglicerina sublingual é indicada inicialmente para o alívio do desconforto isquêmico, por meio da dilataçãoarterial coronariana, podendo ser seguido por terapia intravenosa para o desconforto isquêmico em curso, insuficiência cardíaca congestiva ou hipertensão não controlada. A abordagem com betabloqueadores é controversa, mas de modo geral é favorável, com início do tratamento nas primeiras 24 horas após a admissão. A administração via oral costuma ser segura, sendo a terapia intravenosa preconizada para os casos não controlados de hipertensão. O uso dessa classe de fármacos deve ser evitado em casos de risco de choque cardiogênico, evidenciados por hipotensão e déficits do ventrículo direito, associados principalmente com queda do retorno venoso, o que diminui a pré-carga do ventrículo direito. O início ou a continuação de terapia com estatinas leva a efeitos pleiotrópicos, bem como à redução dos níveis séricos de colesterol, resultando em melhorias nos desfechos cardiovasculares a longo prazo. Essas devem ser iniciadas em até 24 horas do início do quadro, devendo ser tomadas pelo paciente continuamente, em dose máxima. O uso de IECA e de BRA possuem um papel relevante no tratamento da síndrome coronariana aguda, especialmente nos casos em que o paciente possui IAM prévio, disfunção ventricular ou insuficiência cardíaca. Na ausência de contraindicações, a terapia deve ter início dentro de 24 horas após a admissão. Uma vez realizada essas medidas gerais, deve-se ter em mente os principais passos a serem seguidos diante de um paciente com dor torácica com clínica sugestiva de Síndrome Coronariana, os quais são resumidos por meio do quadro abaixo: ❖ TRATAMENTO DA SÍNDROME CORONARIANA AGUDA COM SUPRA DE ST A identificação de um IAMSST requer, como necessidade urgente, a terapia de reperfusão, caso os sintomas tenham começado a menos de 12 horas. É importante que a decisão seja tomada rapidamente, a fim de evitar a progressão da isquemia miocárdica (lembre-se de que TEMPO É MÚSCULO!). A reperfusão miocárdica pode ser feita por meio do procedimento percutâneo, via cateterismo, ou por via farmacológica, fazendo o uso de fibrinolíticos. E para decidir entre essas duas opções da melhor forma possível, deve- se ter em mente o conceito de tempo porta-balão. • O tempo porta-balão consiste no tempo da entrada do paciente no serviço até o balonamento via cateter da artéria coronariana. Caso o paciente consiga ser encaminhado para a sala de hemodinâmica do hospital para realizar o cateterismo em até 90 minutos após a sua chegada no serviço de emergência, deve-se optar pela realização da angioplastia primária. Caso o hospital em questão não possua serviço de hemodinâmica, mas o paciente pode ser transferido para um outro centro de saúde que o tenha, deve-se optar pela angioplastia no caso de o tempo porta-balão para esse paciente, incluindo a sua transferência para o serviço especializado, for de até 120 minutos. Caso não haja a possibilidade de cumprir com esses intervalos temporais, é recomendada a terapia fibrinolítica para o paciente, devendo ser seguida a consideração de transferência em um período de 3 a 24 horas para um centro com serviço de hemodinâmica. A angioplastia primária consiste em um tratamento superior à terapia fibrinolítica, uma vez que estudos demonstram que ela traz consigo menores índices de mortalidade, reinfarto e AVC. É a melhor opção para aqueles que cumprem os critérios quanto ao tempo porta-balão, bem como para aqueles que sofreram choque cardiogênico, independentemente de critérios temporais. O procedimento consiste na inserção de um cateter por meio de uma entrada arterial. Guia-se o dispositivo até o ponto coronariano acometido, infla-se um balão, a fim de desobstruir a artéria, e firma-se a abertura do vaso com um stent, que impede a retração elástica do vaso pós-balonamento. Para a colocação do stent, existem opções quanto ao tipo farmacológico e não farmacológico. O stent farmacológico é recoberto por drogas anti-proliferativas, como paclitaxel, reduzindo a possibilidade de proliferação endotelial no interior do stent, de modo a reduzir as taxas de reestenose (nova aterosclerose no inte- rior do stent) e, por consequência, diminui a necessidade de novas intervenções posteriores. Porém, essa classe está associada ao aumento do risco de trombose, principalmente quanto aos stents farmacológicos de primeira geração. Por outro lado, o stent convencional tem como benefício a diminuição do tempo requerido de anti-agregação plaquetária, dado que o risco de trombose é menor. Logo, deve-se avaliar a condição do paciente, seu prognóstico e sua história prévia para, dentro das possibilidades, escolher entre o melhor stent para ele. Apesar dessas caracterís- ticas, ressalta-se que em termos de mortalidade, ambos os dispositivos são equivalentes. Quando da realização do cateterismo, ao se localizar lesões arteriais além daquela relacionada à artéria culpada pelo evento, essas também podem ser reparadas, caso o paciente esteja estável hemodinamicamente, podendo também as lesões acessórias serem corrigidas futuramente. A aspiração do trombo não possui efeitos significantes quanto ao risco de morte por causas cardiovasculares, IAM ou insuficiência cardíaca severa dentro de 180 dias quando comparada à angioplastia convencional. Junto a isso, ensaios clínicos de- monstraram que o uso dessa técnica aumentou o risco de AVC dentro de 30 dias nos pacientes que a ela são submetidos. Nos casos em que não seja possível cumprir os requisitos do tempo porta-balão, deve-se proceder com a terapia fibrinolítica. O ideal é que o tempo de chegada até a punção venosa para iniciar o tratamento (tempo porta-agulha) seja menor do que 30 minutos, sendo o ideal em até 10 minutos. Reiterando a necessidade de urgência do tratamento, o benefício é maior quando a terapia tem o seu início em até 2 horas a partir do início do quadro (quanto mais precoce, melhor), uma vez que com o passar do tempo, a organização do trombo, bem como a sua firmação, reduz a capacidade do agente fibrinolítico de dissolver esse trombo. A fibrinólise pode ser feita com o uso da streptoquinase (SK), administrando-se 1,5 milhões de UI entre 30 e 60 minutos. Ela possui efeitos colaterais alérgicos, como urticária e hipotensão e, além disso, ela já não é mais tão utilizada. O tratamento é feito majoritariamente com os novos fibrinolíticos, que apresentam melhores resultados, dado que são fibrinoespecíficos. Um deles é a alteplase (Tpa), que deve ser administrada em uma dose de 15 mg em bolus, seguida de manutenção de 0,75 mg/kg após 30 minutos e de 0,5 mg/kg após 60 minutos da primeira dose de manutenção, de modo que o tratamento dura uma hora e meia. É importante ressaltar que a dose total não pode ultrapassar o valor de 100 mg. Pode-se utilizar também a tenecteplase (TNK), sendo administrada em uma dose única de 0,5 mg/kg em bolus, que não deve ultrapassar 50 mg no total. No caso do paciente possuir mais de 75 anos, a dose deve ser reduzida pela metade. Devemos nos atentar para as con- traindicações quanto à terapia fibrinolítica, as quais possuem enfoque principalmente no tocante a AVCs hemorrágicos. Uma vez realizada uma das terapias fibrinolíticas, deve-se ficar atento para o aparecimento dos Critérios de Reperfusão entre 60 a 90 minutos após o tratamento. O primeiro critério é eletrocardiográfico, consistindo na redução de, pelo menos, 30 a 50% do supra de ST, devendo ter como referência a derivação que apresentava a maior elevação do segmento ST. O segundo critério é sintomático e consiste na melhora da dor referida pelo paciente. Em caso positivo, adota-se a estratégia farmacoinvasiva, na qual, após a fibrinólise, o paciente deve ser encaminhado para o cateterismo dentre 2 a 24 horas, uma vez que se sabe que o fibrinolítico pode não ser capaz de desobstruir com- pletamente a artéria do paciente, de modo que esse necessitará de uma angioplastia. Nos casos em que não forem satisfeitos os critérios de reperfusão, o pacienteé classificado como urgente, devendo ser submetido a uma angioplastia de resgate. Junto a todo esse tratamento de reperfusão, como medida inicial, a dor anginosa deve ser tratada, a fim de diminuir o tônus simpático, o qual é capaz de gerar mais estresse ao coração que já está acometido. Para isso, administra-se dinitrato de isossorbida sublingual (Isordil) na dose de 5mg para alívio do desconforto isquêmico, uma vez que esse fármaco atuará proporcionando a dilatação dos vasos coronarianos, de modo a dar certo alívio à dor causada pela isquemia. Pode-se utilizar também a nitroglicerina, 10 mcg/min, por via endovenosa em bomba de infusão contínua. Junto a isso, deve ser administrada morfina como analgésico para controle adicional da dor, de 2 a 8 mg, via endovenosa, podendo ser repetida em 5 a 15 minutos, salvo a existência de contraindicações. • Os nitratos são contraindicados nos casos em que o paciente apresentar hipotensão, infarto de ventrículo direito e quando esse faz uso de inibidores de fosfodiesterase, como sildenafila e tadafila, nas últimas 48 horas. • A morfina NÃO deve ser utilizada nos casos de IAMSST relacionados ao ventrículo direito, uma vez que a hipotensão que esse fármaco pode gerar acabaria por colapsar a ação do coração direito, o qual depende de volume (retorno venoso) para o seu funcionamento, podendo levar o paciente ao choque cardiogênico, dada a hipotensão profunda. Além disso, deve-se atentar para o uso de inibidores de P2Y12, uma vez que ela pode reduzir os efeitos desses fármacos em alguns pacientes. Além da terapia de reperfusão, os pacientes com IAMSST requerem também terapias adicionais que auxiliam na abertura das artérias. Para isso, são prescritos antiagregantes plaquetários, cujo objetivo consiste na diminuição da formação do trombo branco, bem como na diminuição do risco de trombose no stent. Administra-se, portanto, ácido acetilsalicílico (AAS) pelo resto da vida do paciente. Inicialmente, dá-se uma dose de ataque entre 162 e 325 mg mastigados, com manutenção diária de 75 a 100 mg/dia. É importante que todos os pacientes com IAMSST façam o uso da aspirina, uma vez que ele possui significativo efeito quanto ao desfecho de morte. A única exceção ao uso de AAS consiste na presença de úlcera gástrica ativa e histórico de reação anafilática prévia quando do uso desse fármaco. Casos de alergia leve, como urticária, não contraindicam o seu uso, devendo ser prescrita medicação anti-histamínica para o controle de sintomas adversos. A dupla anti-agregação plaquetária é completada pelo uso de inibidores do receptor de P2Y12, cujo uso deve ser feito por um ano. Uma das opções de escolha é o clopidogrel, sendo que pacientes que passaram pela angioplastia primária devem receber dose de ataque de 600 mg, com manutenção de 75 mg/dia via oral. Caso o paciente tenha passado pela fibrinólise, a dose diminui pelo risco de sangramento. O ataque é feito com 300 mg, com manutenção de 75 mg/dia. Porém, caso o paciente tenha mais de 75 anos, não se deve realizar a dose de ataque, pelo risco elevado de sangramento. Uma outra opção é o ticagrelor, que possui uma melhor estabilidade quanto fármaco em comparação com o clopidogrel, no tocante à anti-agregação plena. Porém, esse fármaco só deve ser utilizado nos casos em que o paciente foi submetido à angioplastia primária, não devendo ser utilizado nos casos após a terapia fibrinolítica. Realiza- se a dose de ataque de 180 mg, com manutenção de 90 mg, a cada 12 horas, via oral. Tem-se ainda a opção do prasugrel, que, assim como o ticagrelor, só deve ser utilizado nos casos de angioplastia primária. Nesse caso, a dose de ataque é de 60 mg, com manutenção de 10 mg/dia, via oral. Caso o paciente possua mais de 75 anos ou menos de 60 kg, a manutenção deve ser de 5 mg ao dia. Cabe ressaltar que o prasugrel possui maior risco de sangramento intracraniano, sendo o seu uso contraindicado nos casos de AVC prévio. Como opção de anti-agregantes plaquetários, pode-se fazer o uso de inibidores da glicoproteína IIb/IIIa, cujo uso é mais restrito e infrequente. São administradas por via endovenosa, em bomba de infusão contínua. A prescrição dessas drogas é geralmente feita pelo próprio hemodinamicista, que irá indicar o uso nos casos de identificação de grande quantidade de trombos no cateterismo, ou ainda quando não há fluxo arterial coronariano, mesmo quando o balão é insuflado na coronária obliterada. Os fármacos geralmente utilizados nesses casos são o tirofibana e o abciximab. • Vamos deixar bem claro que a terapia de anti-agregação plaquetária é geralmente dupla, sendo feita de preferência com AAS junto a um inibidor de P2Y12. Os inibidores da glicoproteína IIb/IIIa não devem ser a primeira escolha de uso. Junto a isso, deve ser feita a terapia anticoagulante, cujo objetivo é prevenir a formação do trombo vermelho, dissolvendo a trombina. O fármaco mais utilizado é a enoxaparina, que tem usos distintos a depender da terapia de reperfusão realizada, mas em ambos os casos a administração de ataque é feita por via endovenosa e a de manutenção, por via subcutânea. Nos casos de fibrinólise, administra-se uma dose de ataque de 30 UI, com manutenção de 1 mg/kg a cada 12 horas. Caso o paciente possua mais de 75 anos, não deve ser realizada dose de ataque. Agora, se o paciente passou pela angioplastia primária, realiza-se o ataque de 0,5 mg/kg, sendo geralmente realizada pelo próprio hemodinamicista, com manutenção semelhante à situação de fibrinólise. A terapia anticoagulante deve ser realizada por um período de até oito dias, até a alta do paciente, ou até a realização da angioplastia, o que ocorrer primeiro. • Algumas correções quanto à posologia devem ser feitas em casos especiais, relacionados às condições do paciente. Caso esse possua um ritmo de filtração glomerular menor do que 30 ml/ min, a manutenção deve ser de 1 mg/kg, via subcutânea, uma vez ao dia. Caso o paciente possua mais de 75 anos, a manutenção deve ser de 0,75mg/kg, via subcutânea, a cada 12 horas. A segunda opção de anticoagulante é a heparina não fracionada (HNF), que é mais complicada quanto à sua utilização, pois é administrada em bomba de infusão contínua. Uma vez que o paciente tenha passado pela fibrinólise, realiza-se o ataque de 60 UI/kg via endovenosa, sendo o máximo de 4000 UI administradas. A manutenção é feita com 12 UI/kg, com o TTPa mantido entre 50 e 70 segundos. Na angioplastia primária, o ataque é realizado pelo hemodinamicista, administrando-se de 70 a 100 UI/kg, via endovenosa, sendo a manutenção igual aos casos de fibrinólise. A HNF deve ser utilizada até a angioplastia ou por até 48 horas, o que ocorrer primeiro. O uso de oxigenoterapia só se mostra benéfico para pacientes cuja saturação se encontra abaixo de 90%, ou para aqueles cuja gasometria arterial acusou pressão parcial de oxigênio menor do que 60 mmHg. Betabloqueadores podem ser utilizados, possuindo benefício de médio a longo prazo, devendo ser iniciados em até 24 horas. Caso o paciente possua fração de ejeção do ventrículo direito reduzida (menor do que 40%), preconizam-se betabloqueadores com benefícios quanto à mortalidade, que são: carvedilol, bisoprolol e succinato de metoprolol. Esses fármacos são contraindicados nos casos de choque cardiogênico, insuficiência cardíaca descompensada e bradiarritmias. • É bem intuitivo pensar que no caso de um paciente com SCA chegar no pronto atendimento com taquicardia sinusal, que o ideal nessa situação seja o uso de betabloqueadores para abaixar a frequência cardíaca. Porém, deve-se lembrar que a taquicardia pode consistir em uma resposta fisiológica a alguma situação, dentre elas, o choque cardiogênico. Sendo assim, caso seja administrado um betabloqueador, pode ser que o paciente fique demasiadamente hipotenso, agravando mais ainda o seu quadro hemodinâmico. Por isso, é importante ter em mente que não há necessidade de uso imediato de betabloqueadores, podendo aguardara estabilização do quadro para o início de sua administração, em até 24 horas. IECA e BRA também podem ser utilizados, sendo que, caso seja adequado, a terapia com esses fármacos deve ser iniciada em até 24 horas. Os pacientes que se beneficiam do uso dessa classe de drogas não aqueles com fração de ejeção do ventrículo esquerdo menor do que 40%, diabéticos ou hipertensos. • Dado o mecanismo de atuação desses fármacos, IECA e BRA NUNCA devem ser administrados em conjunto! Ou é um, ou é outro. Os antagonistas de aldosterona, como a espironolactona, devem ser utilizados quando já se faz o uso de IECA ou BRA junto com um betabloqueador, diante do cenário de fração de ejeção do ventrículo esquerdo menor do que 40%, com apresentação de insuficiência cardíaca ou diabetes mellitus. Porém, esses fármacos não são utilizados no tratamento inicial, sendo avaliada a necessidade do seu uso em momentos oportunos. É importante o uso de estatinas de alta potência, dado o seu benefício de reduzir infartos, por meio da estabilização das placas ateromatosas. Sendo assim, faz-se o uso de atorvastatina de 40 a 80 mg, ou de rosuvastatina de 20 a 40 mg. É importante que seja observado o alvo de LDL do paciente diante do uso desses fármacos, o qual deve ser menor do que 50 mg/ dL. ❖ TRATAMENTO DA SÍNDROME CORONARIANA AGUDA SEM SUPRA DE ST Uma vez diagnosticada a Síndrome Coronariana Aguda, o paciente deve receber de imediato antiagregantes plaquetários, a fim de inibir a formação do trombo branco. Dessa forma, administra-se ácido acetilsalicílico (AAS) em dose de ataque (200 a 300 mg), devendo ser mastigados, com posterior dose de manutenção entre 75 e 100 mg ao dia, para o resto da vida do paciente. É realizada a dupla anti-agregação por meio da administração de um inibidor de P2Y12, geralmente o clopidogrel, em dose de ataque de 300 mg, com manutenção de 75 mg por dia, durante um ano. Podem ser utilizados no lugar do clopidogrel, o ticagrelor (ataque de 180 mg e manutenção de 90 mg) e o prasugrel (ataque de 60 mg e manutenção de 10 mg). • O prasugrel só deve ser administrado após haver o conhecimento da anatomia da lesão do paciente. Ou seja, somente após o cateterismo. Isso porque o prasugrel possui melhor performance em pacientes que fazem angioplastia, com colocação de stent. Nos pacientes que não realizam tal procedimento ou naqueles que são submetidos à cirurgia de revascularização do miocárdio, esse fármaco aumenta o risco de sangramento, o qual supera os seus benefícios. • O ticagrelor, quando disponível, pode ser preferido para administração ao paciente em SCA sem supra, uma vez que há uma maior resposta desses a esse fármaco, diferente do que ocorre com o clopidogrel no tocante à farmacodinâmica (metabolização), prejudicando a anti-agregação. Como a principal queixa do paciente com SCA é a dor anginosa, o alívio dessa faz-se necessário para a tranquilização e bem-estar do paciente, bem como para que a colaboração desse para com o tratamento seja adequada. Para tal, pode ser administrada morfina para o controle da dor e nitratos, cujas indicações e contraindicações já foram vistas no tratamento de IAMSST. Dado que um dos sintomas da SCA é a dispneia, a oxigenoterapia pode ser benéfica. A suplementação com oxigênio deve ser feita nos casos em que o paciente apresenta sinais de hipoxemia, seja com a saturação menor do que 90% ou pela pressão de oxigênio menor do que 60 mmHg na gasometria arterial. Os anticoagulantes devem ser administrados a fim de evitar a formação do trombo vermelho, resultante da agregação de hemácias. Nos casos de pacientes com SCA sem supra, a primeira opção consiste na enoxaparina, devendo ser aplicada por via subcutânea, 1 mg/kg a cada 12 horas. Ela dever ser administrada até a realização da angioplastia, ou até a alta do paciente ou por até oito dias (importante frisar aqui a questão do “ou”, de modo que o evento que ocorrer primeiro é suficiente para a interrupção da administração do medicamento). Pode ser utilizada a heparina não fracionada, mas o seu manejo é mais complicado quando comparado à enoxaparina. Ela deve ser administrada em bomba de infusão contínua, via endovenosa, com ataque de 60 UI/ kg sendo máximo de 5000 UI, com manutenção de 12 UI/kg, mantendo o TTPa (tempo de protrombina) entre 50 e 70 segundos. Esse fármaco pode ser utilizado até a angioplastia ou por até 48 horas, o que ocorrer primeiro. O fondaparinux é utilizado principalmente para pacientes com alto risco de sangramento, devendo ser administrado por via subcutânea, 2,5 mg, uma vez ao dia. Em até 24 horas após o início do tratamento devem ser administrados fármacos que melhoram o desfecho quanto ao remodelamento e quanto à sobrevida a longo prazo, como estatinas de alta potência em dose máxima, betabloqueadores e vasodilatadores, como inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECA) e bloqueadores do receptor de angiotensina (BRA), principalmente para aqueles cujas sequelas contemplam fração de ejeção reduzida (menor do que 40%). Pacientes com risco intermediário podem seguir para ambas as estratégias, devendo ser internados, sendo que a escolha deverá partir do consenso do médico com o paciente, avaliando qual desses se encaixará melhor para a correta avaliação do quadro do paciente. Pacientes classificados pelos escores mencionados como de alto risco, devem seguir para cateterismo cardíaco, enquanto os de baixo risco podem ser submetidos a exames para estratificação não invasivos, como o Eco estresse, cintilografia e teste ergométrico, podendo ser prescrito para esse paciente somente AAS e estatinas. ❖ COMPLICAÇÕES MECÂNICAS PÓS-INFARTO As complicações mecânicas consistem em uma alteração da anatomia normal do coração, decorrentes dos déficits espaciais gerados pela necrose. Essas complicações são sempre acompanhadas por choque cardiogênico, que consiste em um quadro de hipoperfusão gerado por baixo débito cardíaco, dado o acometimento da plena capacidade do coração em suprir as demandas do organismo. Logo, é bem intuitivo que alterações graves como essas sejam mais relacionadas ao IAMSST (IAM transmural). Apesar dessa gravidade, felizmente somente cerca de 1% de todos os infartos evoluem para tal situação. Porém, deve- se atentar que, dos infartos fatais, cerca de 30% correspondem à evolução com complicações mecânicas, sendo que os que se enquadram nessa situação são acometidos de infarto e nem sequer conseguem chegar ao hospital, dada a gravidade do acometimento. Cabe ressaltar que esse quadro continua sendo gravíssimo, mas que devido aos avanços da reperfusão precoce, a sua incidência vem caindo. Devemos atentar para os fatores de risco que aumentam susceptibilidade do paciente para o desenvolvimento desse quadro. O primeiro deles consiste em um pico muito elevado dos marcadores de necrose miocárdica, principalmente a troponina, uma vez que representa maior quantidade de músculo acometido. A escassez de circulação colateral, quando de um primeiro evento isquêmico, também aumenta a chance de evolução para complicações mecânicas, dado que o coração, nesse caso, possui poucos vasos para tentar suprir a área isquemiada. Os infartos anteriores se relacionam com o aumento da probabilidade de desenvolver comunicação interventricular e de rotura de parede livre. Enquanto isso, o IAM de parede inferior se relaciona à maior probabilidade de ocorrência de insuficiência mitral aguda. A rotura de parede livre ocorre geralmente do terceiro ao quinto dia pós-IAM, podendo ocorrer em até duas semanas após o evento. Nesse caso, a isquemia gera a ruptura da parede miocárdica, gerando o extravasamento de sangue para o pericárdio e, com isso, gerando o quadro de tamponamento cardíaco. A continuidade desse extravasamento faz com que o débito cardíaco caia, uma vez que há menos sangue em circulação, levando o paciente ao choque, evoluindo na maioria das vezes para óbito nos casos de rotura total da paredeventricular esquerda. O quadro clínico de uma rotura completa caracteriza-se pela evolução com tamponamento cardíaco, o qual pode ser evidenciado no exame físico pela tríade de Beck (bulhas abafadas, estase jugular e o choque), bem como pela presença de pulso paradoxal, ocorrendo variação maior do que 10 mmHg da pressão de pulso quando comparada a inspiração e a expiração. A evolução do quadro geralmente consiste em atividade elétrica sem pulso, culminando em morte súbita. Em casos de ruptura incompleta ou subaguda, ocorre quadro de dor pleurítica, semelhante à pericardite e choque cardiogênico, com ausência de sopro à ausculta. Pode-se diagnosticar essa complicação por meio do ecocardiograma, o qual evidenciará a lesão miocárdica de rotura. O tratamento pode ser feito por meio de uma pericardiocentese para aliviar a pressão, mas tal procedimento não é o ideal, uma vez que não impede que o sangramento pare de ocorrer. O padrão consiste no tratamento cirúrgico da lesão, realizando o fechamento do orifício pelo qual ocorreu a saída de sangue. A comunicação interventricular pode ocorrer entre o terceiro e quinto dia pós-infarto. Essa complicação decorre do acometimento do suprimento vascular do septo interventricular, que é suprido pela artéria descendente anterior (em seus dois terços anteriores) e pela descendente posterior (em seu terço posterior). Logo, em linhas gerais, pode-se dizer que para que ocorra a comunicação interventricular, faz-se necessário um infarto dessas duas artérias levando a isquemia de uma região do septo que seja capaz de gerar esse quadro. Em pacientes com artéria descendente anterior longa (tipo 3), que pode irrigar a porção apical por completa do septo, a obstrução desse ramo arterial pode cursar com necrose da porção apical do septo interventricular, causando o quadro de comunicação. A comunicação interventricular desencadeia um quadro clínico caracterizada pela presença instabilidade hemodinâmica, culminando em choque. Junto a isso, observa-se a preponderância de sinais de insuficiência cardíaca direita (congestão sistêmica), auscultando-se um sopro muito característico: holossistólico, focado em ápice (nos casos de comunicação apical), mas podendo ser bem auscultado em todos os focos, sendo descrito como de 4 + ou mais (sopro com frêmito). Como toda complicação mecânica, o diagnóstico é dado pelo ecocardiograma, que evidenciará a lesão com sinais de sobrecarga ventricular direita, dado o aumento de pressão pelo maior volume sanguíneo. O tratamento consiste na administração de vasodilatadores, inotrópicos e diuréticos, a fim de diminuir o gradiente pressórico na aorta (dado o mecanismo de vasodilatação periférica), fazendo com que haja um gradiente pressórico maior entre o ventrículo esquerdo e a aorta, de modo que o sangue tenha maior tendência para se dirigir para ela ao invés de para o ventrículo direito. O diurético atua diminuindo o volume circulante, de modo a haver menos volume a ser transferido para o coração direito pela comunicação. O inotrópico atua melhorando a performance cardíaca em bombear o sangue para a aorta, auxiliando no mecanismo dos vasodilatadores. Logo, tem-se que tal conduta é apenas paliativa, a fim de que haja tempo hábil para que a comunicação seja interrompida por via cirúrgica, que consiste no tratamento resolutivo. A insuficiência mitral aguda pode ocorrer no período entre 2 a 7 dias após o IAM, sendo decorrente da ruptura do músculo papilar ou das cordas tendíneas da valva mitral. Devemos lembrar que a valva mitral possui dois aportes musculares: o músculo papilar anterolateral, que é irrigado pelas artérias descendente anterior e circunflexa; e o músculo papilar posteromedial, cuja irrigação é feita por meio da artéria coronária direita. Logo, obliterações desses ramos arteriais podem cursar com isquemia desses músculos, os quais podem se romper por necrose ou podem simplesmente perder a sua patência, gerando frouxidão que cursa com insuficiência desse músculo para sustentar a cordoalha tendínea. Pacientes com esse quadro apresentam a típica hipotensão do choque cardiogênico, cursando com edema agudo de pulmão, dado o aumento de pressão no átrio esquerdo que se transmite para o pulmão. A ausculta revela um sopro holossistólico regurgitativo em foco mitral, classificado de 3+ para baixo (baixa intensidade). Como nas outras complicações, realiza-se o diagnóstico por meio do ecocardiograma, que evidenciará a frouxidão valvar e a regurgitação intensa ao Doppler. Esse quadro é tratado por meio de vasodilatadores, inotrópicos e diuréticos, os quais atuarão pelo mesmo mecanismo observado no tratamento da comunicação interventricular, aumentando a tendência do sangue a cursar o seu caminho natural para a aorta ao invés de regurgitar e propiciando a existência de menos volume circulante, de modo a reduzir, como consequência, o volume que acaba por regurgitar. Pode-se tratar o paciente por meio de um balão intra-aórtico, o qual será alocado na artéria aorta do paciente por meio de um acesso femoral. Esse balão insuflará no período da diástole e se esvaziará na sístole, de modo a melhorar a perfusão coronariana, uma vez que essas recebem sangue na diástole, e aumentar a condução aórtica do sangue, dado que o seu esvaziamento auxilia na propulsão do sangue. Ambos os tratamentos são paliativos, sendo o tratamento definitivo cirúrgico, para o qual deve ser avaliado o estado do músculo papilar. No caso em que esse músculo não estiver preservado, deve ser realizada a troca valvar; caso o músculo ainda esteja em boas condições, pode-se realizar a valvoplastia mitral, de modo a manter a valva do paciente. Além das complicações mecânicas propriamente ditas, podem ocorrer sequelas da artéria acometida e da região por ela irrigada, que podem ser funcionais (prejudicam o funcionamento correto do coração) ou elétricas (alteração do ritmo cardíaco). ❖ CUIDADOS PÓS-TRATAMENTO E PRÉ-ALTA Nos casos de IAM sem complicações pós-tratamento com angioplastia primária, a internação dura cerca de três dias. Durante a fase final da hospitalização, o paciente deve retomar suas atividades, mas ainda deve ser monitorado, devendo a terapia medicamentosa deve ter preferência pela via oral, que é adequada para que o paciente a utilize fora do ambiente hospitalar. Deve ser realizada uma avaliação funcional antes da alta, incluindo um ECG para avaliar a função ventricular esquerda e um teste de estresse deve ser aplicado em determinados pacientes, como naqueles que receberam que foram classificados de baixo risco. Devem ser incentivadas medidas de mudança do estilo de vida, como dieta, atividade física, tabagismo e outros fatores de risco (dislipidemia, HAS e diabetes). Os tratamentos ambulatoriais e de prevenção secundária devem ser revistos, devendo ocorrer um planejamento para o acompanhamento. Junto a isso, o paciente com alta deve ser referenciado para a reabilitação cardíaca, dado o fato de que essa possui efeitos de melhoria quanto ao desfecho desse paciente. EFEITOS DAS DROGAS ILÍCITAS MAIS PREVALENTES ❖ CANNABIS Entre as substâncias ilícitas, a cannabis (maconha) é a mais consumida no mundo. Seu composto psicoativo principal é o delta-9-tetraidrocanabinol (THC). A inalação da fumaça é responsável por 50% de absorção do THC, que rapidamente atinge os pulmões e segue pela corrente sanguínea cruzando a barreira hematoencefálica em poucos minutos. É lipossolúvel e pode permanecer até 7 dias no organismo. A maconha é feita a partir das folhas da planta Cannabis sativa. Entre as diferentes apresentações, o haxixe e o skunk apresentam teores de THC maiores do que a maconha e, no Brasil, são menos frequentes. A maioria dos usuários não se torna dependente, mas a dependência da maconha vem sendo diagnosticada há algum tempo, nos mesmos padrões das outras substâncias. Os principais efeitos da intoxicação aguda aparecem em alguns minutos. O uso agudo da maconha provocaeuforia e relaxamento, alterações da sensopercepção, distorção do tempo e intensificação de experiências sensoriais comuns como comer, assistir a um filme ou ouvir música. Além disso, há diminuição da memória recente e da atenção, da habilidade motora e do tempo de reação durante o período de intoxicação. Os efeitos desagradáveis mais comuns, principalmente em usuários ocasionais, são ansiedade e reações de pânico. A toxicidade aguda é muito baixa, não havendo casos confirmados de morte por intoxicação por maconha. Outros efeitos agudos inconvenientes podem ser reações alérgicas ou idiossincrásicas, possivelmente, relacionadas aos contaminantes dos preparos, mais do que os efeitos farmacológicos da maconha. A maconha é capaz de piorar quadros de esquizofrenia, além de constituir um importante fator desencadeador nos indivíduos com maior vulnerabilidade. Desse modo, pessoas com esquizofrenia usuárias de maconha, assim como seus familiares, devem ser orientadas sobre os riscos envolvidos. Há evidência de que o uso prolongado de maconha é capaz de causar prejuízos cognitivos relacionados à organização e à integração de informações complexas, envolvendo vários mecanismos de processos de atenção e memória. Esses prejuízos podem aparecer após poucos anos de consumo. Processos de aprendizagem podem apresentar déficits após períodos mais breves de tempo. Prejuízos da atenção podem ser detectados a partir de fenômenos como aumento da vulnerabilidade à distração, afrouxamento das associações, intrusão de erros em testes de memória, inabilidade em rejeitar informações irrelevantes e piora da atenção seletiva. O prejuízo cognitivo persiste um longo tempo após o período de intoxicação e as evidências de recuperação das funções após períodos de abstinência são mistas. Especialistas acreditam que há um subgrupo de indivíduos que desenvolverão transtornos psiquiátricos e declínio cognitivo permanente, e que o uso de cannabis é um entre diversos fatores de risco para esquizofrenia. A recomendação é que os profissionais de saúde devam informar a usuários de maconha sobre os já comprovados efeitos nocivos (risco de acidente, danos respiratórios para usuários crônicos, risco de desenvolver dependência, déficit cognitivo e psicose). O sistema respiratório também é afetado pelo uso crônico da maconha; laringite, faringite, bronquite, tosse e rouquidão e sintomas semelhantes à asma já foram descritos, em associação com uma obstrução leve, porém significativa das vias aéreas. Os cigarros de maconha contêm um grande número de carcinógenos que também estão presentes no tabaco. Fumar um cigarro de maconha, comparado com um cigarro de tabaco, está associado a um aumento de três vezes na quantidade de alcatrão inalado e retido nos pulmões, provavelmente em função do maior volume na tragada, inalação mais profunda, e mais tempo segurando a respiração. Os sintomas da síndrome de abstinência ocorrem com a interrupção súbita de um uso contínuo e de altas doses da substância. Caracterizam-se por irritabilidade, inquietação, insônia, anorexia ou náusea. Sensação de fissura, mialgia, cefaleia e sintomas depressivos também podem ocorrer. ❖ COCAÍNA E CRACK A cocaína é um estimulante e anestésico local, utilizada principalmente por via intranasal, injetável ou pulmonar (crack). A cocaína estimula o sistema nervoso central (SNC) por meio do bloqueio da recaptação de dopamina, norepinefrina e serotonina (com intensidade decrescente nos respectivos sistemas de neurotransmissão) nas sinapses. A via escolhida interfere na quantidade e na qualidade dos efeitos provocados, assim como no potencial para causar dependência e nos riscos relacionados ao modo de consumo. Quanto mais rápida a disponibilidade da droga em seu local de ação, maior o potencial de dependência. Dessa forma, os usos injetável e pulmonar têm maior potencial de dependência do que o intranasal. A cocaína é extraída das folhas da planta de coca, e geralmente é preparada como um pó hidrossolúvel, o hidrocloreto de cocaína. Vendida nas ruas, ela é livremente diluída com pó de talco, lactose ou outras substâncias de aspecto similar. A cocaína pode ser aspirada ou dissolvida em água e injetada subcutânea ou intravenosamente. A cristalização do alcaloide puro produz as pedras de “crack”, assim chamado em função do barulho (estalidos) que faz quando a cocaína é aquecida para produzir os vapores que são inalados. As ações farmacológicas da cocaína e do crack são idênticas. Tem valor de comercialização baixo e alto potencial dependógeno. Seu consumo aumentou consideravelmente nos últimos 20 anos por todas as classes, tendo uma grande prevalência junto à população em situação de rua e está muito associado a comportamentos de risco e situações de violência. Os efeitos agudos e crônicos da cocaína em vários sistemas e órgãos são os seguintes: • Efeitos cardiovasculares: Os efeitos físicos mais sérios da cocaína estão relacionados à sua ação aguda no sistema cardiovascular, onde se comporta como um agente simpatomimético (Figura 2). Facilita a neurotransmissão tanto no SNC, onde bloqueia a recaptação de dopamina, quanto nas terminações nervosas adrenérgicas, onde bloqueia a recaptação tanto da adrenalina quanto da noradrenalina, enquanto estimula a liberação pré-sináptica da noradrenalina. O efeito final é o acúmulo desses dois neurotransmissores nas sinapses, resultando em estimulação excessiva, manifestada por taquicardia, hipertensão e vasoconstrição periférica. A cocaína também pode provocar isquemia miocárdica, por causar vasoconstrição arterial coronária e aumento da agregação plaquetária com formação de trombos. O tabagismo potencializa o vasospasmo coronariano induzido pela cocaína. Dessa forma, o duplo efeito da cocaína, causando um aumento na demanda de oxigênio para o miocárdio através da sua ação simpatomimética, e ao mesmo tempo reduzindo o fluxo sanguíneo coronariano, monta o cenário para uma isquemia miocárdica, podendo levar ao infarto do miocárdio. A cocaína também pode precipitar arritmias letais pelo aumento da atividade simpática, bem como por interromper o transporte normal de íons (K+, Ca2+, Na+) no miocárdio. Esses efeitos tóxicos não estão necessariamente dose-de- pendentes, e um evento fatal pode ocorrer em um indivíduo que usa cocaína pela primeira vez, com o que é tipicamente uma dose que altera o humor. • SNC: Os efeitos agudos mais comuns no SNC são hiperpirexia (provavelmente causada por alteração das vias dopaminérgicas que controlam a temperatura corporal) e convulsões. • Efeitos na gestação: Em gestantes, a cocaína pode causar reduções agudas no fluxo sanguíneo para a placenta, resultando em hipóxia fetal e aborto espontâneo. O desenvolvimento neurológico está prejudicado no feto de uma gestante usuária crônica da droga. O uso crônico da cocaína pode causar: (1) perfuração do septo nasal em usuários que fazem administração nasal; (2) redução na capacidade de difusão pulmonar em usuários que inalam a fumaça; e (3) o desenvolvimento de cardiomiopatia dilatada. As complicações psiquiátricas são as que mais levam os usuários de cocaína à atenção médica, como ataques de pânico, transtorno depressivo, disforia, irritabilidade, ideação paranoide e alucinações; dores torácicas agudas em pacientes jovens também são causas frequentes. A síndrome de abstinência de cocaína e crack não é potencialmente fatal, mas causa intenso desconforto. Ela pode ser descrita como trifásica, sendo a primeira após meia hora depois da parada do uso, podendo prolongar-se por até 3 ou 4 dias; caracteriza-se por humor depressivo, hipersonia, esgotamento físico e arrependimento pelo uso. O desejo por retomar o uso pode apresentar-se nessa fase, em geral após alguns dias. A fase seguinte é chamada de fase disfórica tardia e pode durar de duas semanas a 3 ou 4 meses; caracteriza-se por irritabilidade que se alterna com humor depressivo, anedonia, insônia e intensificaçãodo desejo de uso. Essa sintomatologia constitui uma barreira importante para a manutenção da abstinência. A fase seguinte pode durar meses ou anos e é conhecida como extinção, em que tende a reduzir a compulsão pelo uso, mas ainda permanecem alguns sintomas de anedonia, dificuldade de planejamento e assertividade. Não existe evidência de resposta desses sintomas de abstinência com o uso de antidepressivos. SINDROMES COLINÉRGICAS E ADRENÉRGICA ❖ COCAÍNA E SIMPATOMIMÉTICOS Agentes simpatomiméticos são análogos a catecolaminas, com a habilidade de ativar o sistema nervoso simpático. Anfetaminas, efedrina, cocaína e análogos (inclusive o crack) são as principais drogas implicadas nesse tipo de intoxicação, bastante frequente em prontos-socorros de grandes cidades (especialmente o excesso de cocaína). As vias de intoxicação são bastante variáveis e incluem oral, inalatória, nasal e parenteral. Muito raramente, podem ser encontrados indivíduos que ingeriram pacotes de drogas para o tráfico, como forma de transporte (conhecidos como “mulas”). Anfetaminas e simpaticomiméticos estimulam a liberação e inibem o bloqueio na recaptação de neurotransmissores monoaminérgicos, tanto no SNC como nas terminações simpáticas. Tais agentes são rapidamente absorvidos pelo trato gastrintestinal, com início de ação em 30 minutos e pico em 2 a 3 horas. As vias parenteral e inalatória têm efeitos praticamente imediatos. Quadro clínico e exames complementares A intoxicação resulta em efeitos no SNC e no sistema cardiovascular predominantemente. Manifestações típicas incluem náuseas, vômitos, cefaleia, palpitações, ansiedade, nervosismo, agitação, confusão, delirium, fasciculações, hiperventilação, tremores, convulsões e coma. Desta forma, a intoxicação catecolaminérgica pode ocasionar várias emergências cardiovasculares (taquiarritmias, hipertensão, dor precordial, infarto do miocárdio, dissecção de aorta, acidente vascular encefálico e morte súbita). Com o uso crônico, há progressiva deterioração neuropsicocomportamental, podendo evoluir para quadros psicóticos. A cocaína tem maior gravidade e pode levar a quadros mais dramáticos vistos em prontos-socorros, podendo ser confundida com hipertensão maligna, feocromocitoma, hipertireoidismo, síndrome de abstinência e distúrbios psiquiátricos primários. Essa droga tem rápida metabolização, e apenas uma mínima quantidade é eliminada inalterada na urina. O início e a duração dos efeitos variam com dose, forma de administração, taxa de absorção, eliminação e tolerância individual. Após administração intravenosa ou inalatória, em 3 a 5 minutos já tem início euforia, com resposta cardiovascular após 8 a 12 minutos. Usuários crônicos podem tolerar grandes doses, até 10 g/d, sem reações tóxicas. As consequências mais graves devem-se à estimulação adrenérgica excessiva (convulsões, agitação e vasoconstrição). Nas intoxicações leves a moderadas, os principais achados são cefaleia, dor torácica, náuseas, vômitos, agitação e ansiedade. O paciente pode manifestar taquicardia, hipertensão, sudorese e midríase. Já nas formas graves, podem surgir convulsões, alucinações e instabilidade hemodinâmica. Os exames complementares iniciais são: 1. Eletrocardiograma: pode mostrar taquiarritmias, TV, supra ou infradesnivelamento do segmento ST, alterações da repolarização, distúrbios da condução, incluindo bloqueio de ramo esquerdo; 2. Radiografia de tórax: pode mostrar aumento da área cardíaca, vários graus de congestão e até edema pulmonar cardiogênico; 3. Rastreamento qualitativo na urina: suficiente para confirmar o diagnóstico. Todos aqueles com sintomas neurológicos persistentes devem ser submetidos a tomografia computadorizada de crânio Tratamento a) O tratamento é de suporte cardiovascular, com manutenção do paciente com boa hidratação e não utilização de medicações cardiovasculares de longa ação (cerca de 2 a 4 horas após o efeito da cocaína, costuma haver hipotensão); b) O carvão ativado raramente é usado, em razão de ocorrer intoxicação por via parenteral ou inalatória, na maioria das vezes; c) Como regra geral, o benzodiazepínico é o agente de escolha, não só para ansiedade, agitação, convulsões, mas também para síndromes coronarianas, taquicardia e emergências hipertensivas; d) Além de benzodiazepínico, os seguintes agentes poderão ser associados: Nitroglicerina: associar em edema agudo pulmonar e nas síndromes coronarianas agudas; Nitroprussiato de sódio: em algumas emergências hipertensivas, como acidente vascular cerebral e dissecção aguda de aorta; Lidocaína: antiarrítmico de eleição para TV. e) É prudente evitar betabloqueadores isoladamente em emergências relacionadas a cocaína, pois podem, paradoxalmente, piorar a vasoconstrição. Diante de uma crise hipertensiva adrenérgica, o controle dos níveis pressóricos deve iniciar-se com um alfabloqueador venoso (fentolamina), podendo ser adicionado um betabloqueador posteriormente; f) Status epilepticus deve ser tratado de modo agressivo, com benzodiazepínico e fenobarbital. SCA SEM supradesnivelamento do segmento ST • A síndrome coronariana aguda (SCA) sem supradesnivelamento do segmento ST inclui angina instável e infarto agudo do miocárdio sem supra, cujo tratamento é igual • Os casos de SCA sem supra em que o paciente apresenta instabilidade hemodinâmica, elétrica ou dor incoercível devem ser encaminhados para angiografia de emergência, assim como os casos de SCA com supra. • O tratamento envolve a antiagregação e melhora da relação entre consumo e demanda de oxigênio no miocárdio. • Quanto maior o risco mais precoce deve ser a estratégia invasiva, reservando-se a estratégia conservadora para os pacientes de baixo risco ou para aqueles em que existe dúvida quanto à natureza dos sintomas. ❖ ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA Existem três mecanismos de instabilização de placa que levam à SCA: ruptura de placa, erosão de placa e exposição de nódulo calcificado. Enquanto no infarto agudo transmural o principal mecanismo é a ruptura de placa, no IAM sem supradesnivelamento de ST o principal mecanismo fisiopatológico é a erosão de placa aterosclerótica, seguida de ruptura de placa e de nódulo calcificados. A abertura da placa aterosclerótica expõe uma superfície trombogênica e libera o núcleo necrótico, que contém micropartículas pró-trombóticas. Em se tratando de IAM sem supra, ocorre uma desvitalização tecidual não transmural, pois a coronária está subocluída ou mesmo ocluída e existe a presença de colaterais. No caso da angina instável, existe desequilíbrio entre oferta e demanda, ocasionando sintomas, mas não o suficiente para levar à necrose de cardiomiócítos. Alterações de tensão de cisalhamento causada por tortuosidades arteriais, estenoses e bifurcações provocam mudança de expressão em células endoteliais de proteínas inflamatórias, dentre as quais o receptor Toll-like 2 (TLR2). A ativação desse receptor predispõe a descamação endotelial, diminui a capacidade de reparo da camada endotelial e ainda pode promover apoptose. Neutrófilos formam armadilhas extracelulares (Neutrophil extracellular traps - NETs) compostas de cromatina descondensada, histona, antimicrobianos e outras proteínas. Além de seu papel na imunidade inata, os NETs têm papel na erosão de placas e promovem trombose por ativação plaquetária, ligando- se a fatores da coagulação e ao fator de von Willebrand. Células endoteliais ativadas induzem a formação de NETs e reciprocamente NETs induzem a disfunção endotelial. O TLR2 interage com NETs influenciando citocinas, como produção de IL-17. ❖ FATORES DE RISCO Os fatores de risco cardiovasculares incluem hipertensão arterial sistêmica, diabetes melito, dislipidemia, história familiar e tabagismo, mas não há uma correlação bem definida da relevância desses fatores na evolução clínica de pacientes admitidos com SCA. Estudos demonstram que a presença de três ou mais desses fatores, em conjunto, constituemmarcador independente de pior prognóstico nas síndromes coronarianas agudas. ❖ DIAGNÓSTICO Existem dois diagnósticos na suspeita de SCA: a angina instável e o IAM. A angina instável é provocada por insuficiente aporte de oxigênio a cardiomiócitos, sem, no entanto, provocar necrose celular. É definida como angina pectoris (ou equivalente anginoso) e apresenta pelo menos uma das seguintes características: 1) ocorre em repouso (ou mínimo esforço); 2) tem, em geral, duração de 20 minutos (se não for interrompida por nitrato ou outro analgésico); 3) é grave e descrita como dor franca; 4) ocorre em crescendo (dor com cada vez menos esforço, que é cada vez pior, que passou a acordar o paciente). A dor torácica é o principal sintoma de isquemia, mas pode se apresentar apenas como equivalente anginoso: dor epigástrica, dispepsia, dispneia, náuseas e vômitos, sudorese, hipotensão e síncope. Pacientes idosos (> 75 anos de idade), mulheres e portadores de diabetes com doença renal crônica ou demência podem se apresentar mais comumente com equivalentes anginosos no DE, com queixas atípicas, que incluem dor epigástrica, dispepsia, dispneia e, raramente, sincope. Nos casos de SCA sem supra de ST, a dor torácica anginosa terá uma das características relacionadas: a) dor prolongada em repouso; b) angina de início recente ("de novo") classificada como III ou IV pela classificação da Canadian Cardiovascular Society (CCS); c) recente desestabilização de angina estável prévia, com pelo menos classificação III da CCS ("angina em crescendo"); ou d) angina pós-IAM (Tabe la 2). Outras classificações de angina como a de Braunwald É necessária uma combinação de critérios para o diagnóstico de IAM, a saber: curva de aumento ou diminuição de um biomarcador cardíaco, de preferência troponina cardíaca e pelo menos um dos seguintes fatores: a) sintomas compatíveis com isquemia; b) alteração de segmento ST significativamente nova (ou presumivelmente nova) ou bloqueio de ramo esquerdo em eletrocardiograma (ECG); c) desenvolvimento de ondas Q patológicas no ECG; d) evidência de imagem nova ou presumidamente nova de perda de miocárdio viável; ou e) trombo intracoronariano detectado em angio grafia ou autópsia. As demais possibilidades de critérios diagnósticos de IAM incluem pós-angioplastia, pós -cirurgia cardíaca, trombose de stent e morte súbita sugestiva antes da coleta de exames. O diagnóstico diferencial entre IAM com supradesnível do segmento ST ou sem depende exclusivamente do aparecimento ou não desse tipo de alteração no ECG; o diagnóstico diferencial do IAM sem supradesnível de ST e angina instável depende da presença (IAM sem supra) ou não (AI) de marcadores de necrose miocárdica elevados. O IAM pode ser dividido em tipos, sendo o tipo 1 relacionado a obstruções luminais agudas e o tipo 2 relacionado ao desequilíbrio entre a oferta e a demanda de oxigênio. Uma vez diagnosticada a SCA sem supra de ST, torna-se prioritário determinar se o risco do paciente é alto, médio ou baixo. O termo “risco” refere-se à probabilidade a curto prazo de óbito ou eventos cardíacos maiores, como o IAM. Pacientes de médio/alto risco se beneficiam de internação em unidade coronariana, com realização de tratamento “agressivo” e estratégia invasiva precoce (coronariografia e revascularização, que pode ser angioplastia ou cirurgia). Já os pacientes de baixo risco alcançam os mesmos resultados com uma estratégia “conservadora” ou “invasiva” (esta última, nesses casos, apenas aumenta o risco de complicações e os custos). Para estratificar o risco, observaremos uma série de fatores, que podem ser clínicos, eletrocardiográficos, laboratoriais ou derivados de métodos especiais de estratificação ❖ ELETROCARDIOGRAMA A depressão do segmento ST ocorre; ela pode ser transitória em pacientes sem evidência de biomarcador de necrose do miocárdio, mas pode ser persistente por vários dias na IMSEST. As mudanças nas ondas T são comuns, mas são sinais menos específicos de isquemia, a menos que sejam novas e inversões profundas da onda T (≥ 0,3 mV). ❖ ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO E PROGNÓSTICO A estratificação do risco (de eventos isquêmicos e de sangramento) tem papel fundamental na condução dos pacientes com SCAs/SST, principalmente em relação à conduta terapêutica a ser adotada. Na década de 1990, Braunwald et al.propuseram uma classificação com base em critérios clínicos, com divisão dos pacientes em subgrupos de alto, intermediário e baixo risco para óbito ou IAM não fatal em curto prazo. Essa classificação é pontual, já que a presença de uma única variável (infradesnível do segmen-to ST, por exemplo) pode catalogar o paciente como de alto risco. ❖ TRATAMENTO Todos os pacientes com suspeita de SCA sem supra de ST devem ser atendidos em sala de emergência ou unidade coronariana e devem ser submetidos ao MOVE, que consiste em: 1. Monitorização não invasiva contínua (no mínimo com pressão arterial, frequência cardíaca e cardioscopia). 2. Recebimento de oxigênio suplementar se saturação periférica de oxigênio < 90% ou se desconforto respiratório. 3. Acesso venoso periférico garantido para coleta de exames e infusão de medicações. 4. Realização de ECG de 12 derivações, que deve ser interpretado em até 10 minutos da admissão do paciente. • Ácido acetilsalicílico (AAS): 150-300 mg (recomendação 300 mg) VO na admissão, seguido por 100 mg VO 1 x/dia. O ácido acetilsalicílico inibe irreversivelmente a atividade da ciclo-oxigenase (COX-1), reprime a produção de tromboxano A2 e interage negativamente na agregação plaquetária. • Inibidor do receptor de ADP P2Yl2: indicado para todos os pacientes com diagnóstico de SCA de alto risco, para redução da agregação plaquetária, em associação ao AAS. Ticagrelor e prasugrel se demonstraram superiores ao clopidogrel nas SCA, mas mantemos o clopidogrel consideran do que há locais em que apenas essa droga está disponível. • Anticoagulação: indicado para todos os pacientes com diagnóstico de SCA para inibir a geração e a atividade da trombina, reduzindo, assim, os eventos relacionados ao trombo. A troca de anticoagulantes é desencorajada. (Heparina não fracionada, Enoxaparina, Fondaparinux, Bivalirndina, Hirudina e argatroban entre outros) • Terapia anti-isquêmica: o objetivo da terapia anti-isquêmica farmacológica é diminuir a demanda miocárdica de oxigênio (diminuindo a frequência cardíaca, a pressão arterial, a pré-carga e a contratilidade miocárdica) ou aumentar o suprimento de oxigênio no miocárdio (por administração de oxigênio ou através de vasodilatação coronariana). Se, mesmo com o tratamento, o paciente continuar com dor intensa ou equivalentes isquêmicos, é recomendada uma angiografia coronariana em duas horas, independentemente dos achados do ECG e dos níveis de troponina (trata-se de uma das recomendações emergenciais no SCA sem supra). Em pacientes cujos sintomas isquêmicos não são aliviados por nitratos e betabloqueadores, a administração de morfina 2-3 mg IV é razoável enquanto se espera pela angiografia coronariana, com a ressalva de que a morfina pode retardar a absorção intestinal das medicações. • Nitratos: os nitratos intravenosos (nitroglicerina 25 mg/5 mL 10 mL + SG 240 mL, correr EV BIC dose inicial de 5-10 mcg/ min ou 1,5-3 mL/h) são mais eficazes que os nitratos sublinguais ( dinitrato de isossorbida 5 mg SL) em relação ao alívio dos sintomas e à regressão da depressão ST. • Betabloqueadores (metoprolol 25-100 mg VO 1 x/dia ou propranolol 10-80 mg VO 2-3 x/dia): inibem competitivamente os efeitos miocárdicos das catecolaminas circulantes, reduzindo a frequência cardíaca, a pressão arterial e a contratilidade miocárdica e diminuindo, portanto, o consumo de oxigênio no miocárdio. A FC alvo é de aproximadamente 60 bpm. • Bloqueadores dos canais de cálcio: esse grupo de fármacos com ação anti-isquêmica diminui o influxo de cálcio através da membrana celular, reduzindo
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