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Dislexias Profª. Drª. Roberta Aline Sbrana Transtorno de Aprendizagem ou Dificuldade Escolar? Quando percebemos em sala de aula que um aluno enfrenta algum problema de aprendizagem, precisamos estar atentos: será uma Dificuldade Escolar ou indícios de um possível Transtorno Específico de Aprendizagem? O Transtorno Específico de Aprendizagem está relacionado à uma “disfunção do Sistema Nervoso Central (SNC), sendo, portanto, um fator biológico, que não está relacionado ao trabalho desenvolvido pelo professor”, mas pode ser auxiliado por ele (CIASCA, 2003, p. 27). Diferentemente, a Dificuldade Escolar pode envolver “diferentes fatores, desde sociais, familiares e pessoais até pedagógicos, que estão relacionados aos materiais, métodos e estratégias utilizados pelo professor no processo de ensino e aprendizagem, ou mesmo ao espaço físico da escola, no qual o estudante convive” (CIASCA, 2003, p. 27). O que é Dislexia? Dislexia: O prefixo grego “dis” significa “dificuldade, perturbação” e o elemento “lexia” remete a “ler””. Deste modo, entende-se que o vocábulo remete à dificuldade de leitura (HENNIGH, 2003, p. 13). Existem inúmeras definições de dislexia, mas na conceituação mais aceita, ela é entendida como [...] um transtorno específico de aquisição e do desenvolvimento da aprendizagem da leitura, caracterizado por um rendimento em leitura inferior ao esperado para a idade e que não se caracteriza como o resultado direto de comprometimento da inteligência geral, lesões neurológicas, problemas visuais ou auditivos, distúrbios emocionais ou escolarização inadequada (ALVES et al, 2011, p. 30). Além do conceito exposto anteriormente e de vários outros existentes, há a definição adotada pela Associação Brasileira de Dislexia em 2003, que descreve a dislexia como sendo a [...] incapacidade específica de aprendizagem de origem neurobiológica. É caraterizada por dificuldades na correção e/ou fluência na leitura de palavras e por baixa competência leitora e ortográfica. Estas dificuldades resultam de um déficit fonológico, inesperado, em relação às outras capacidades cognitivas e às condições educativas. Secundariamente podem surgir dificuldades de compreensão leitora, experiências de leitura reduzida que pode impedir o desenvolvimento do vocabulário e dos conhecimentos gerais (PINTO, 2012, p. 22). Apesar da existência de diferentes conceitos de dislexia, de modo geral, ela pode ser entendida, como uma dificuldade em reconhecer letras, além de decodificar e soletrar palavras, na qual o indivíduo ainda apresenta baixo rendimento em leitura para a sua faixa etária. Contudo, é preciso não generalizar estas características, pois cada pessoa pode apresentar qualidades distintas uma das outras (EVANS, 2006). Níveis de Dislexia Além disso... Como salienta o Instituto ABCD (2017), a dislexia apresenta níveis diversos e, portanto, é necessário considerar “uma escala de desempenho contínuo que vai desde casos leves até os severos”. Nos casos considerados leves, segundo esta escala, o disléxico possui falhas na escrita, contudo ele apresenta menor dificuldade para compreensão textual, exigindo somente algumas releituras. Nos casos mais severos de dislexia, seguindo a mesma escala de desempenho contínuo, as dificuldades são grandes, persistentes e perceptíveis principalmente durante o processo de alfabetização, pois normalmente ocasiona no atraso do desenvolvimento das habilidades de leitura, escrita e compreensão da criança disléxica (INSTITUTO ABCD, 2017). Apesar das dificuldades citadas acima, nos disléxicos a “compreensão oral se mantém intacta”; deste modo, em situações em que prevalece a comunicação oral (textos transmitidos oralmente, conversas, etc.) as informações são normalmente compreendidas por eles (INSTITUTO ABCD, 2017). Para facilitar os processos de escrita com crianças disléxicas, é possível utilizar um escriba, mas, ainda assim, as dificuldades serão diminuídas, não excluídas (INSTITUTO ABCD, 2017). Causas da Dislexia Como explica Navas (2011, p. 41), aprender a ler é um processo complexo que depende de diferentes habilidades, como a “[...] linguagem oral, memória, atenção, coordenação visual e manual”. Além disso, o aprendizado da leitura e escrita envolve questões de domínio do código alfabético e relações de sintaxe, semântica, coesão e coerência. É importante considera também que este aprendizado não acontece apenas na escola, uma vez que as crianças estão inseridas em uma sociedade letrada, antes mesmo de frequentar a educação formal (NAVAS, 2011, p. 41). Diversos fatores (“físicos, culturais, sociais, econômicos, pedagógicos e/ou emocionais”) podem influenciar na aprendizagem da criança e levá-la a apresentar dificuldades no processo de alfabetização. Contudo, tais dificuldades podem estar associadas a uma condição de ordem funcional, como é o caso da criança disléxica (NAVAS, 2011, p. 44). Com o objetivo de descobrir os motivos das crianças apresentarem tais dificuldades foram elaboradas diferentes teorias sobre a origem/causa da dislexia (CARVALHAIS E SILVA, 2007, p. 22). Carvalhais e Silva (2007, p. 22) explicam, que há diferentes teorias que explicam a dislexia do desenvolvimento: “teorias cognitivas, de base neurobiológica, teorias genéticas e hereditárias e teorias que se apoiam em fatores ambientais”. Apesar das teorias iniciais acreditarem ser a dislexia um “problema ao nível da discriminação visual, dos movimentos oculares e da memória visual”, as algumas teorias desenvolvidas nos anos de 1970 e outras teorias mais recentes, tem a compreensão de que “[...] a dislexia é uma desordem de base neurológica com origem genética [...]” (CARVALHAIS E SILVA, 2007, p. 22). Por ser um Transtorno com origem genética, a dislexia possui um caráter de hereditário, pois o gene “transmissor” emerge de uma pequena ramificação do cromossomo 6, e este é dominante, explicando assim vários casos de dislexia em uma mesma família. Portanto, o histórico familial é um dos mais importantes fatores de risco. (EVANS, 2006 apud MONTANARI, 2015, p. 14). A teoria do déficit no processamento temporal explica que as “[...] dificuldades estariam em processar características temporais de estímulos de diferentes modalidades sensoriais, como estímulos auditivos, visuais e sensório-motores, quando apresentados de maneira rápida e em sequência” (MURPHY; SCHOCHAT, 2009, p. 14 apud MONTANARI, 2015, p. 14) Além disso, esta dificuldade no processamento auditivo temporal está relacionado a um problema em processar elementos acústicos curtos, como as consoantes, o que leva a dificuldade de associar as letras aos seus sons (MURPHY; SCHOCHAT, 2009, p. 14 apud MONTANARI, 2015, p. 14). Para que um indivíduo aprenda normalmente é essencial que haja condições estruturais e funcionais do sistema nervoso central; contudo, quando acontece alguma anomalia nestas áreas de desenvolvimento isto poderá acarretar em alterações no processo de aprendizagem (ZORZI; CIASCA, 2005). A dislexia fonológica está relacionada com disfunções no lobo temporal, dando origem à teoria do déficit fonológico, que consiste na incapacidade de representar e acessar o som palavra. Nestes casos, as dificuldades apresentadas pelos disléxicos se referem à segmentação fonológica, ou seja, de dividir as palavras em unidades menores, que são os fonemas. Devido às falhas nas conexões cerebrais, o cérebro dos disléxicos apresenta um funcionamento diferente do cérebro de pessoas não disléxicas (CARVALHAIS E SILVA, 2007 apud MONTANARI, 2015, p. 15). [...] no processo de leitura, os disléxicos utilizam somente a área cerebral que processa fonemas, gerando como consequência disso a dificuldade que apresentam os disléxicos em diferenciar fonemas de sílabas, pois sua região cerebral responsável pela análise de palavras se mantém inativa, além de suas ligações cerebrais que não incluem a área responsável pela identificaçãode palavras e, assim, a criança disléxica não consegue reconhecer palavras que já tenha lido ou estudado, tornando a leitura um grande esforço, pois toda palavra que lê aparenta ser nova e desconhecida (EVANS, 2006, p. 16). Uma causa recorrente da dislexia é o atraso na aquisição da fala, questão que pode comprometer a percepção fonética (EVANS, 2006 apud MONTANARI, 2015, p. 15). Características da Dislexia A leitura e a escrita são processos complexos, portanto, é comum que no início do processo de alfabetização a criança apresente certos erros e dificuldades em seu desenvolvimento na formulação de hipóteses da escrita, até que ela domine o sistema ortográfico. No começo, é normal que o aluno troque letras e/ou palavras, sílabas, sem que isso represente uma preocupação (ZORZI; CIASCA, 2009). É necessário maior atenção e preocupação quando estes erros e dificuldades são persistentes, ou seja, eles continuam e se intensificam mesmo após o término do processo de alfabetização. A permanência destes erros podem “refletir déficits que produzem dificuldades ou lentidão acentuada no sentido de a criança gerar e generalizar hipóteses que, sucessivamente, permitam a apreensão cada vez mais aprofundada da escrita” (ZORZI; CIASCA, 2009, p. 407). A dislexia é um transtorno específico de aprendizagem que atinge crianças sem deficiência intelectual, sem déficits sensoriais, que aparentemente receberam instrução educacional apropriada, mas que, não apresentam bom desempenho de leitura e/ou escrita (GIACHETI; CAPELLINI, 2000) (ROTTA; PEDROSO, 2006). De acordo com algumas pesquisas realizadas atualmente 10% das crianças em idade escolar são disléxicas, “isso significa que a cada 40 crianças, haverá uma ou duas que precisam de ajuda especializada, e duas ou mais que precisarão de algum outro nível de ajuda” (SMYTHE, 2011, p. 154 apud MONTANARI, 2015, p. 16). O aluno disléxico apresenta dificuldades desde o início da escolaridade, mas, normalmente, a escola, os professores e pais irão se tentar para estas dificuldades apenas no terceiro ano escolar ao final deste período, quando as exigências em relação à leitura e à escrita são maiores devido ao final da alfabetização; momento em que o desempenho escolar deste aluno é percebido como inferior e começa a conhecer o fracasso (ROTTA; PEDROSO, 2006 apud MONTANARI, 2015, p. 16). Por isso, o grande desafio das escolas, professores e pais é identificar de modo precoce a dislexia, sendo o principal sintoma a dificuldade em ler e escrever, para que, o quanto antes, a criança tenha um diagnóstico e acompanhamento (CATSS; CHAN, 2011 apud MONTANARI, 2015, p. 16). Com a dificuldade de identificação precoce da dislexia há alguns “sinais clínicos” que podem ser observados por professores nas crianças durante suas práticas educativas (CATSS; CHAN, 2011 apud MONTANARI, 2015, p. 17): a) Sinais na Pré-escola: fala tardia; dificuldade de pronunciar alguns fonemas; falta de vocabulário demorando a inserir novas palavras; dificuldade para aprender cores, formas, números e a escrita do nome; dificuldade para entender regras e rotina; falta de habilidade motora fina; dificuldades em recontar uma história e manter sua sequência (PRADO, 2010). Dificuldade em tarefas que exijam habilidades fonológicas, tais como dividir uma palavra em pedaços e brincar com rimas; dificuldade para reconhecer letras e evocar palavras (vocabulário restrito) (MOOJEN; FRANÇA, 2006, p.171). Com a dificuldade de identificação precoce da dislexia há alguns “sinais clínicos” que podem ser observados por professores nas crianças durante suas práticas educativas: a) Sinais na Pré-escola: má organização do espaço, dificuldade em situar as partes do corpo; dificuldade para reconhecer direita e esquerda, em cima e em baixo. Indicativos de má lateralização podem ser identificados através do desenho, no momento que a criança desenha bonecos de cabeça para baixo, observa o livro de trás para frente, etc. (FICHOT, 1973 apud MONTANARI, 2015, p. 20). Segundo a Associação Brasileira de Dislexia (2016) também podem ser considerados “Sinais de Dislexia na pré-escola”: • Dispersão. • Fraco desenvolvimento da atenção. • Dificuldade de aprender rimas e canções. • Fraco desenvolvimento da coordenação motora. • Dificuldade com quebra-cabeças. • Falta de interesse por livros impressos. Com a dificuldade de identificação precoce da dislexia há alguns “sinais clínicos” que podem ser observados por professores nas crianças durante suas práticas educativas (CATSS; CHAN, 2011 apud MONTANARI, 2015, p. 17): b) Sinais no Ensino Fundamental: dificuldade em aprender o alfabeto; dificuldade no planejamento motor de letras e números; dificuldade para separar e sequenciar sons (ex: p-a-t-o); dificuldade com rimas (habilidades auditivas); dificuldade em discriminar fonemas homorgânicas (p-b, t-d, f-v, k-g, x-j, s-z); dificuldade em sequencia e memória de palavras; dificuldade para aprender a ler, escrever e soletrar; dificuldade em orientação temporal (ontem-hoje-amanhã, dias da semana, meses do ano); dificuldade de orientação espacial (direita-esquerda, embaixo, em cima); dificuldade na execução da letra cursiva; dificuldade na preensão do lápis; dificuldade em fazer cópias (PRADO, 2010, p. 16 - 17). Com a dificuldade de identificação precoce da dislexia há alguns “sinais clínicos” que podem ser observados por professores nas crianças durante suas práticas educativas (CATSS; CHAN, 2011 apud MONTANARI, 2015, p. 17): c) Sinais na fase escolar de modo geral: Desempenho inferior nas tarefas de habilidades fonológicas; déficits na nomeação rápida; dificuldade em aprender a ler e escreve; memória de curto prazo deficiente; dificuldades de aprender sequencias comuns (dias da semana, meses do ano); dificuldades na matemática não apareceram na capacidade de desenvolver o cálculo aritmético, mas, em alguns casos, durante a tentativa de interpretar o problema lido (MOOJEN; FRANÇA, 2006, p.171-172). Segundo a Associação Brasileira de Dislexia (2016) podem ser considerados “Sinais de Dislexia na fase escolar”: •Dificuldade na aquisição e automação da leitura e da escrita. • Conhecimento precário de rima (sons iguais no final das palavras) e aliteração (sons iguais no início das palavras). • Desatenção e dispersão. • Dificuldade em copiar de livros e da lousa. • Dificuldade na coordenação motora fina (letras, desenhos, etc.) e/ou grossa (ginástica, dança etc.). • Desorganização geral: constantes atrasos na entrega de trabalhos escolares e perda de seus pertences. • Confusão para nomear entre esquerda e direita. • Dificuldade em manusear mapas, dicionários, listas telefônicas etc. • Vocabulário precário, com sentenças curtas e imaturas ou longas e vagas. d) Sinais da dislexia na fase adulta: na maioria dos casos, é possível observar uma leitura lenta, apesar de algumas pessoas realizarem a leitura de modo correto; além de apresentarem dificuldade com ortografia e produção de textos (MOOJEN; FRANÇA, 2006, p.172). Além de observar os sinais da dislexia, é necessário compreender que a criança disléxica tem uma forma particular de reconhecer o mundo. É essencial que pais e professores conheçam as características expostas pela Policlínica Edukaleidos (2015), a fim de entender e contribui na aprendizagem e desenvolvimento das crianças com dislexia: • Reconhecimento de letras como se estivessem de trás para a frente ou de cabeça para baixo. • Impressão de texto em movimento. • Inabilidade em diferenciar letras e números que apresentam similaridades na forma, como letras minúsculas “q – p” e “d – b”, “d - q” e os números 10 e 01. • Inabilidade em apontar diferenças entre letras de formas similares, mesmo que com orientações distintas, resultando na escrita espelhada. Além de observar os sinais da dislexia, é necessário compreender que a criança disléxica tem uma forma particular de reconhecer o mundo. É essencial que paise professores conheçam as características expostas pela Policlínica Edukaleidos (2015), a fim de entender e contribui na aprendizagem e desenvolvimento das crianças com dislexia: • Visualização correta de letras, mas incapacidade de pronunciar palavras; isto é, inabilidade de vincular letras à sonoridade que possuem e, assim, compreendê-las. • Capacidade de ler uma palavra corretamente, mas incapacidade de compreendê-la ou de se lembrar do que foi lido, de modo que se faça necessária a leitura de um trecho inúmeras vezes. • Visualização das letras como se estivessem todas misturadas, fora de ordem e amontoadas, incapacitando o entendimento e reconhecimento de palavras. Os Tipos de Dislexia Rotta e Pedroso (2006 apud MONTANARI, 2015, p. 20) explicam que a dislexia apresenta três tipos: a) Dislexia Disfonética: dificuldade de ler palavras desconhecidas, a criança tenta adivinhar o que esta escrito, comete erros na leitura e na escrita do tipo: inversões, omissões e aglomerações de fonemas ou sílabas. b) Dislexia Diseidética: a leitura é realizada de forma lenta, com decomposição das palavras; os erros mais comuns da escrita são inversões e falhas na acentuação. c) Dislexia mista: essa dislexia é caracterizada por apresentar associações das duas anteriores, com diferentes combinações e intensidades. Além da dislexia do desenvolvimento, há também a dislexia adquirida ou alexia que é decorrente de uma lesão cerebral (CARVALHAIS; SILVA, 2007). Dislexia adquirida Dislexia adquirida é um termo utilizado para caracterizar um “distúrbio de leitura encontrado em leitores adultos anteriormente capazes, causado por danos cerebrais, como por exemplo um acidente cerebral-vascular” (GUIMARÃES, 2004, p. 290). Os adultos com dislexia adquirida apresentam “problemas nos módulos cognitivos utilizados na conversão da palavra escrita para o som e, dependendo do módulo afetado, têm-se diferentes padrões de disfunção na leitura” (ELLIS, 1995 apud GUIMARÃES, 2004, p. 290). PINHEIRO (1994) e MORAIS (1996) explicam, que os “padrões de disfunção na leitura podem ser divididos em dois grupos: dislexias periféricas e dislexias centrais”. Na dislexia periférica os danos localizam-se no sistema de análise visual, provocando uma série de prejuízos na percepção das letras. Além disso, os danos podem ocorrer no nível da identificação de letras (dislexia por negligência), no nível da análise visual (dislexia da atenção) ou no nível do processamento global e do reconhecimento de palavras como um todo (leitura letra-por-letra)(GUIMARÃES, 2004, p. 290). Nas dislexias centrais, além do sistema de análise visual, partes de uma das rotas (fonológica ou lexical), ou mesmo das duas, está danificada. As dislexias em que apenas uma das rotas está prejudicada são denominadas síndromes de um único componente, por exemplo, a leitura não-semântica ou a dislexia fonológica. Quando ambas as rotas apresentam problemas, as dislexias são denominadas síndromes de componentes múltiplos – por exemplo, as dislexias de superfície (dificuldade com palavras irregulares) e profunda (dificuldade com palavras inventadas, não familiares, abstratas, etc.). Dislexia e intervenção É essencial que haja um trabalho conjunto entre a família e a escola com o objetivo de estimular a criança que apresenta os sintomas de dislexia ou que já recebeu o diagnóstico desse transtorno específico de aprendizagem. Não existe apenas um método ou o método mais correto para se trabalhar no ambiente escolar com alunos disléxicos, tendo em vista o seu desenvolvimento e aprendizagem. Há diferentes métodos e estratégias que podem ser utilizados pelo professor, mas não existe um eficaz para todos os casos, uma vez que cada disléxico pode apresentar diferentes características (SOUSA, 1998 apud MONTANARI, 2015, p. 22). As atividades na sala de aula com esses alunos devem ser desenvolvidas de forma integrada e contextualizada, envolvendo “[...] linguagem, raciocínio, concentração, percepção, esquema corporal, orientação espacial, temporal e a lateralidade” (PRADO, 2010, p. 12). É importante trabalhar com atividades de consciência fonológica, visando “estimular a aquisição de leitura e da escrita auditivamente e, por meio de figuras, carimbos, colagens de cartelas no caderno” (PRADO, 2010, p. 30). O professor também pode desenvolver atividades de estimulação auditiva e visual para trabalhar fonema-grafema utilizando músicas, no qual ao ouvir a música o aluno marca com palmas os fonemas e grafemas já trabalhados. Para trabalhar com a leitura, pode-se utilizar músicas, histórias, vocábulos já trabalhados, etc. (PRADO, 2010 apud MONTANARI, 2015, p. 22). Para trabalhar escrita pode-se utilizar a montagem de jogo simbólico (faz-de-conta) com o aluno de forma que ele possa desenvolver a escrita dos objetos, personagens da história, etc., ou mesmo outros jogos que envolvam a escrita de palavras, números, por exemplo, bingo, dominó, etc. Há cinco princípios essenciais que o professor precisa conhecer e entender a fim de auxiliar a aprendizagem do aluno disléxico (HENNIGH, 2003 apud MONTANARI, 2015, p. 22): O primeiro se refere ao uso de métodos multissensoriais, pois os alunos aprendem melhor com a utilização simultânea e integrada das diferentes modalidades sensórias. O segundo princípio é com relação à leitura, a qual o professor precisa agregar uma visão positiva, pois devido à dificuldade que enfrentam, muitos alunos disléxicos acabam desmotivados. O terceiro consiste em minimizar o rótulo de disléxico, pois este pode afetar a autoestima da criança e fazer com que ela não acredite em suas capacidades. O quarto princípio indica que “os professores e os alunos devem permitir que seus padrões de leitura corretos sirvam de modelo à criança com dislexia” (p.36). O último explica que o professor deve trabalhar com a leitura de forma a englobar o som, a letra e o reconhecimento da palavra. Ao trabalhar com os métodos multissensoriais em sala de aula, um recurso interessante a ser utilizado pelo professor com todos os alunos e que poderá contribuir, principalmente, para a aprendizagem dos alunos disléxicos são os audiolivros, também conhecidos como “livro falado” ou ainda, audiobooks, ou seja, livros em formato de áudio. Este recurso tem sido utilizado atualmente como forma de divulgar inúmeras obras literárias. Além disso, em sua maioria, estas obras custam até 70% menos que a versão em papel, sendo, por vezes, mais acessíveis! Há também a possibilidade, dependendo da etapa de escolaridade em que o professor atua, dos próprios alunos elaborarem os seus audiolivros, com suas histórias narradas e gravadas para todos ouvirem. O professor também podem gravar suas aulas para que o aluno disléxico possa ouvi-las posteriormente, o que irá contribuir para a sua aprendizagem. O professor deve atuar como um orientador e um facilitador da aprendizagem para o aluno disléxico, organizando a sala de aula para que seja um ambiente estimulante e de apoio para o seu desenvolvimento e aprendizado. Também é importante que estabeleça em conjunto com o aluno objetivos a serem atingidos, motivando o aprendiz (HENNIGH, 2003 apud MONTANARI, 2015, p. 23). Outra questão relevante é que o professor esteja sempre atento se o aluno disléxico está compreendendo o conteúdo explicado e constantemente busque novos métodos para ensinar, além de incentiva-lo a participar de atividades em sala, adequando-as. Contudo, não há uma regra a ser estabelecida; cada caso deve ser considerado mediante as necessidades e particularidades de cada aluno (HENNIGH, 2003 apud MONTANARI, 2015, p. 23). Algumas situações em sala de aula que podem ser evitadas com alunos disléxicos... Evite pedir ao aluno disléxico que leia em voz alta durante as aulas, a fim de evitar a sua exposição a situações constrangedoras, preconceitos, bullying, etc. Como o aluno disléxico apresenta dificuldade em ler, durante a prova ele tambémapresentará esta dificuldade; por isso, é indicado que o professor realize a leitura das questões antes do início da prova; desta forma, o aluno disléxico terá um entendimento mais rápido e claro (LUCA, 2012 apud MONTANARI, 2015, p. 26). É necessário conceder ao aluno disléxico maior tempo para realizar as avaliações, pois eles são mais lentos para processar e registrar as informações. Além disso, é indicado que as avaliações sejam realizadas de forma oral (LUCA, 2012 apud MONTANARI, 2015, p. 26). Algumas situações em sala de aula que podem ser evitadas com alunos disléxicos... Sempre que possível, evite a atividade da cópia, esta é cansativa para qualquer criança, mas o aluno disléxico vê esta atividade como castigo. Uma sugestão é dar um texto ou história já escrito, apenas pra ele responder algumas questões, o que pode ser feito oralmente (LUCA, 2012 apud MONTANARI, 2015, p. 26). Os trabalhos extras são relevantes, pois permitem ao aluno que tem dificuldade com a escrita, como os disléxicos, em expressar o conhecimento aprendido de diferentes formas como desenhos, colagens, fotos, maquetes, músicas, etc. (LUCA, 2012 apud MONTANARI, 2015, p. 26). Algumas situações em sala de aula que podem ser evitadas com alunos disléxicos... É importante que o conteúdo seja trabalhado de “forma clara e objetiva e devem ser usados exemplos e situações práticas durante toda a aula. Os disléxicos em geral apresentam uma boa percepção e compreensão visual” (LUCA, 2012, p. 2 apud MONTANARI, 2015, p. 26). Última dica: valorizar o aluno. “O disléxico tem gravado em sua mente provavelmente mais insucessos do que sucessos. Então, precisamos valorizar os pequenos acertos, mostrando assim que ele deve persistir. Ele certamente não precisa de ninguém que aponte a todo o momento seus erros e enganos” (LUCA, 2012, p. 3 apud MONTANARI, 2015, p. 26-27). Luca (2012, p. 02 apud MONTANARI, 2015, p. 26) expõe algumas dicas acerca da função da escola perante o aluno com dislexia: É obrigação da escola conhecer os transtornos que possam influenciar na aprendizagem e realizar junto ao aluno o acolhimento, tão necessário, mostrando a ele que está ao seu lado e que também irá ajudá-lo a superar as dificuldades que surgirem. As informações devem ser passadas a todos os professores com o qual o aluno tem aula e a escola deve providenciar nivelamento de conhecimento a respeito da dislexia para todos os professores. Luca (2012, p. 02 apud MONTANARI, 2015, p. 26) expõe algumas dicas acerca da função da escola perante o aluno com dislexia: O professor deve prevenir as discriminações que possam ocorrer em relação ao aluno disléxico. Caso seja necessário: [...] devem ser passadas informações sobre o transtorno para a classe como um todo; sempre com a devida precaução de não estar expondo o aluno ou colocando-o em situação vexatória. Buscar sempre incluí-lo em todas as atividades, fazendo com que contribua com o que tiver de melhor: suas habilidades (LUCA, 2012, p .2) A Associação Brasileira de Dislexia (ABD) descreve como é feito o processo de intervenção de disléxicos. A intervenção se inicia após a avaliação, por meio de uma terapia com fonoaudiologia, que consiste no tratamento das alterações apresentadas na avaliação (MONTANARI, 2015, p. 25). Também são utilizados exercícios específicos dependendo das dificuldades, além da utilização de materiais lúdicos como computador, jogos, brinquedos para a estimulação, o uso dos materiais dependerá da idade do paciente (MONTANARI, 2015, p. 25). A ABD aponta a necessidade do fonoaudiólogo no processo de intervenção precoce, pois este pode atuar de forma de minimizar as dificuldades que poderão surgir no aprendizado da leitura e escrita (MONTANARI, 2015, p. 25). Alguns jogos... O GATO DO PADRE Objetivo: domínio verbal, integração. Os alunos são organizados em círculo. Escolhe-se uma letra do alfabeto e cada aluno deverá dizer um adjetivo para o gato do padre. Exemplo: a letra A: o gato do padre é ágil. Pode-se trocar de letra quando cansar, ou ninguém souber mais nenhum adjetivo. Ganha quem conseguir dizer mais adjetivos. Pode-se variar pedindo para os educandos escreverem (atividade em grupo incluindo o aluno disléxico), e somente após um tempo verifica-se quem descobriu mais adjetivos (PRADO, 2010, p. 44 apud MONTANARI, 2015, p. 62). JORNAL MUNDIAL Objetivos: alfabetização, interpretação de texto. Construir, juntamente com os alunos, uma imitação de aparelho de televisão com caixa de papelão. Solicitar aos alunos que criem roteiros e apresentem reportagens sobre temas ligados à escola ou sobre notícias gerais (pode ser sobre o bairro, a cidade, etc.). Em etapas subsequentes o nível dos programas pode ganhar aperfeiçoamento e incluir diferentes matérias, como opiniões, comentários, entrevistas e outros elementos que costumar caracterizar e jornais apresentados no país (PRADO, 2010, p. 46 apud MONTANARI, 2015, p. 63). VAMOS ADIVINHAR? Objetivo: alfabetização, compreensão e leitura. Formar um dominó com 28 peças e cada peça apresentando uma figura, por exemplo: um cavalo, e ao lado uma frase identificadora, por exemplo: com ele podemos passear e disputar. Depois de distribuir as peças entre os participantes, o educador separa a peça que inicia o jogo e cada aluno deverá ler a mensagem escrita e procurar entre suas peças as figuras correspondentes, ou vice-versa (PRADO, 2010, p.46 apud MONTANARI, 2015, p. 64). JOGOS COM GIBIS Objetivo: memória e fluência verbal. Com os alunos que ainda não sabem ler, o professor deve estimular o raciocínio dedutivo, levando o aluno a observar as ilustrações e buscar sentido na história. Deve iniciar o contato com o aluno com esse material, mostrar os passos de uma interpretação que são óbvios para os alunos maiores. Por exemplo, que toda leitura se faz da esquerda para a direita e de cima para baixo. Inúmeros jogos podem ser propostos, apagando-se balões, sugerindo a colocação em ordem dos quadrinhos antecipadamente desordenados, orientando os alunos para que transformem histórias originais por outras de conteúdo ligado ao que é aprendido e, finalmente, estimulando os grupos de alunos para que construam seus próprios gibis, criando personagens, desenvolvendo argumentos, estabelecendo roteiros e completando a arte final (PRADO, 2010, p. 31 e 32 apud MONTANARI, 2015, p. 56). Referências ABD- ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE DISLEXIA. Disponível em: http://www.dislexia.org.br. Acesso em: 10. agost. 2021. EVANS, J. S. Um estudo sobre dislexia. 44f. Especialização em Ensino de Línguas Estrangeiras Modernas. Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Curitiba, 2006. CAPELLINI, S. A. et al. Desempenho em consciência fonológica, memória operacional, leitura e escrita na dislexia familial. Revista de Atualização Científica, v.19, n.4, p. 374-380, out./dez. 2007. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/pfono/v19n4/a09v19n4.pdf. Acesso em: 06. Out.2021. CARVALHAIS, L. S. de A.; SILVA, C. Consequências sociais e emocionais da dislexia de desenvolvimento: um estudo de caso. Pró-Fono Revista Semestral da Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional (ABRAPEE), v.11, n. 1, p. 21-29, jan./jun. 2007. Disponível em http://www.scielo.br/pdf/pee/v11n1/v11n1a03.pdf. Acesso em: 02. Out. 2021. http://www.scielo.br/pdf/pfono/v19n4/a09v19n4.pdf Referências CIASCA, Sylvia Maria (Org.). Distúrbios de Aprendizagem: Proposta de Avaliação Interdisciplinar. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003. HENNIG, K. A.. Compreender a dislexia um guia para os pais e professores. Porto Editora, 2003. MOOJEN, S; FRANÇA, M.. Dislexia: visão fonoaudiológica e psicopedagógica. In: ROTTA, N.T.; OHLWEILER, L.; RIESGO, R. S.. Transtornos de aprendizagem: abordagem neurobiológica e multidisciplinar. Artmed, 2006. P. 165-180. MONTANARI, R. 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