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Esporte educacional Aula 1 - Histórico, conceitos e princípios INTRODUÇÃO Esporte, o que é esporte? Quando falamos esta palavra, despertamos nas pessoas as mais variadas reações: desde um sentimento de felicidade ao lembrar-se de um momento de sua vida que lhe trouxe grande satisfação, ou até mesmo uma tristeza, certamente provocada por algo ruim que ocorreu em uma determinada prática ou vivência esportiva. Logo, sempre que falarmos em esporte provocaremos reações nas pessoas; porém, a nossa grande preocupação deve-se pautar em quais tipos de reações iremos provocar, pois, reações como integração, respeito às regras, resiliência e outras análogas a estas, são fundamentais para a formação de qualquer cidadão. Nesta aula iremos apresentar o esporte educacional, seu conceito, seus valores e seus princípios. Ao �nal desta, você estará apto a entender que o esporte, quando bem aplicado, transforma-se em um importante instrumento de transformação social. Mostraremos os diferentes ambientes em que poderá ser trabalhado e, por �m, proporcionaremos o entendimento de que o esporte não é bom, nem mau, depende somente de como é abordado. OBJETIVOS Conhecer e analisar o Conceito de Esporte Educacional; Identi�car os valores e os princípios norteadores do Esporte Educacional; Propor formas de inclusão do Esporte Educacional na sociedade atual. CONCEITO O esporte é considerado por muitos sociólogos como um dos mais importantes fenômenos do Século XX e passou a fazer parte da história da sociedade moderna e contemporânea de tal forma que hoje é praticamente impossível imaginar tais sociedades sem esporte. Vocês acreditam que este conceito se refere ao esporte educacional? Será que o Esporte Educacional deve ser pautado em valores como desrespeito, agressão verbal ou em adjetivos pejorativos como os citados acima? Claro que não! O Esporte educacional, de acordo com Tubino (2007), é aquele baseado em princípios educacionais como participação, cooperação, coeducação, corresponsabilidade e inclusão. Surge a partir da Carta Internacional de Educação Física, elaborada pela UNESCO, como resposta ao uso político do esporte durante a Guerra Fria. Esta Carta contempla 11 artigos, cujo primeiro deles dispõe que “A prática da educação física e do desporto é um direito fundamental de todos”. Fonte da Imagem: bikeriderlondon / Shutterstock Desta forma, o Esporte Educacional busca desconstruir a imagem de que toda prática esportiva necessita estar atrelada ao alto rendimento e principalmente de que os mais fortes deverão sempre ser mais valorizados do que os mais fracos; ou seja, busca descaracterizar a exclusão dos menos aptos em prol dos mais aptos. Fonte: Blend Images / Shutterstock Portanto, com o intuito de aumentar a sua abrangência, devemos preconizar que este modelo deixe de �car entrincheirado nos muros da escola (área formal) e conquiste a liberdade de poder ser utilizado em todas as áreas esportivas, contemplando o que chamamos de área não formal. No Brasil, por ocasião dos Jogos Escolares Brasileiros (JEBs), em 1985, iniciou-se o debate sobre o Esporte Educacional. Em 1993, a Lei n° 8672/1993 e o Decreto n° 981/1993 reforçam o conceito de Esporte Educacional ao a�rmar que a hipercompetitividade e a alta seletividade invalidam a prática esportiva educacional. E em 1995, com a criação do Ministério Extraordinário do Esporte e do INDESP (Instituto Nacional do Desenvolvimento do Esporte), foi elaborado um documento-ensaio com os princípios fundamentais do Esporte Educacional. Fonte da Imagem: melis / Shutterstock Vocês conseguem perceber a clara diferença entre o que é preconizado pelo Esporte Educacional e pelo esporte de alto rendimento? Enquanto o primeiro tem como seu principal eixo norteador a inclusão, o segundo destaca-se, muitas vezes, pela exclusão. Será que um é melhor do que o outro? Para permitir uma maior re�exão vamos, nesta aula, analisar o Esporte Educacional e na próxima aula debater sobre o Esporte de Alto Rendimento. ESPORTE DE PARTICIPAÇÃO E LAZER, DE RENDIMENTO E EDUCACIONAL Devemos compreender o conceito e a prática do esporte em suas três dimensões: de participação e lazer, de rendimento e educacional. PARTICIPAÇÃO E LAZER Na dimensão de participação e lazer, o princípio norteador é o prazer pela prática. O lúdico permeia todo o processo de aprendizagem do esporte, tendo como �nalidade a descontração, a diversão, o desenvolvimento pessoal e a interação social. Está voltado para o preenchimento do tempo livre de obrigações da vida cotidiana. RENDIMENTO O Esporte de Rendimento tem como duas de suas características a seletividade e a exclusão. Obedece a regras estabelecidas universalmente e apresenta uma tendência a ser praticado pelos talentos esportivos; dessa forma, está a serviço do mercado através da compra e venda de produtos esportivos e da indústria do entretenimento. Rea�rma-se, contudo, a ideia de que não há por que ser contra o esporte de rendimento, a�nal ele tem um porquê e um para quê, além do para quem de sua existência. EDUCACIONAL O Esporte Educacional difundido dentro e fora da escola tem por �nalidade democratizar e gerar cultura, con�gurando- se como uma prática social de exercício crítico da cidadania, privilegiando a inclusão social, a troca de saberes e conhecimentos, o respeito às diferenças, a diversidade, a valorização das culturas e a experiência signi�cativa. O esporte em sua dimensão educacional, além de proporcionar aos alunos o aprendizado do esporte, deve encaminhá- los a re�etir e a discutir criticamente sobre a relação entre a prática esportiva e o contexto social em que vivem. PRINCÍPIOS DO ESPORTE EDUCACIONAL O esporte educacional está fundamentado em valores ou princípios educacionais. Vamos a eles. PARTICIPAÇÃO O esporte educacional, de acordo com as suas diretrizes, propõe que todos os alunos participem das aulas, não havendo exclusão. Entretanto, como fazer isto se nas escolas, nos clubes, nos projetos sociais e até mesmo nas ruas, uma vez que temos pessoas tão heterogêneas? Simples, ou melhor, não tão simples, uma vez que, as atividades que serão propostas deverão contemplar todos os praticantes daquela determinada aula/atividade. Por que não tão simples? Porque para que as atividades possam realmente promover a participação, precisam ser planejadas, precisam ter progressão pedagógica, precisam ser motivadoras e acima de tudo têm que despertar o interesse dos alunos. Logo, sem participação, não há adesão, sem adesão, não temos como transformar o nosso aluno. COOPERAÇÃO Vivemos em uma sociedade que a cada dia se concentra mais no seu “próprio umbigo”. A tecnologia ao mesmo tempo que veio para somar, nos deixou o legado do isolamento. As pessoas vivem conectadas 24 horas por dia e, muitas, acabam sem tempo para se preocupar com o outro. O dicionário Michaelis de�ne cooperação como: “Ato de cooperar; colaboração; prestação de auxílio para um �m comum; solidariedade”. Cooperar, para o Esporte Educacional, signi�ca ajudar o outro, prestar auxílio para que você, o outro e o seu grupo, superem os seus limites. Preconiza-se que, através da ajuda mútua, todos podem melhorar. Deste modo, não existe a cobrança do ganhar a qualquer preço, mas sim de que todos irão ganhar, independentemente do escore do jogo. A cooperação deve revelar a união de esforços no exercício constante da busca do desenvolvimento de ações conjuntas para a realização de objetivos comuns, fundamentada no potencial cooperativo e no sentimento comunitário de cada um dos participantes do processo, estreitando, assim, os laços de solidariedade, parceria e con�ança mútua, de maneira a fortalecer as habilidades de perseverar, de compartilhar sucessos e insucessos, de compreender e aceitar o outro. No entanto, a cooperação não se estabelece apenas entre os educandos, mas também entre educador e educando, cada qual desempenhando seu papel no processo educativo, compartilhando problemas e soluções no processo de ensino-aprendizagem. Por exemplo: em uma equipe quepratica futebol, o educador tem algumas opções de como propor uma atividade para treinar jogadas com o objetivo de superar um sistema defensivo. Se o próprio sistema é colocado como uma situação-problema para que os alunos criem movimentações de ataque, o educador assume um papel de mediador nessa relação, orientando-os na busca das possíveis soluções, em um processo de construção conjunta. Em vez de repetir jogadas ensaiadas criadas por um adulto, as próprias crianças dão sentido às suas ações táticas, o que estimula a participação de todos como protagonistas no processo de aprendizagem. COEDUCAÇÃO Pode ser entendida como uma concepção da Educação, como um processo unitário de integração e modi�cação recíproca, considerando a heterogeneidade (sexo, idade, nível socioeconômico, condição física etc.) dos elementos sociais envolvidos e fundamentando-se nas experiências vividas de cada um dos participantes. A atuação pedagógica apoia-se na ação e re�exão e tem os seus alicerces na relação professor-aluno como o encontro entre dois educadores. CORRESPONSABILIDADE Ser corresponsável signi�ca se fazer presente e assumir responsabilidades pelo seu grupo. Signi�ca entender que qualquer ato que você venha a praticar, trará consequências não só para você, mas para todos que estão a sua volta. Quantas vezes vemos em uma partida de futebol um jogador ser expulso ainda no primeiro tempo? Por quantas vezes nos perguntamos: “O que passou na cabeça dele?” “Cadê o compromisso dele com o grupo?” O que o Esporte Educacional prioriza é justamente o contrário deste tipo de comportamento e procura potencializar atividades em que os componentes do grupo entendam este conceito e, a partir daí, transcendam este conceito para as suas atividades cotidianas. INCLUSÃO O princípio da inclusão, assim como o da participação, não aceita a segregação, pois dentro da escola todos precisam, sem distinção, vivenciar situações esportivas. Entende-se por atividade esportiva inclusiva, toda e qualquer que, levando em consideração as potencialidades e as limitações físico-motoras, cognitivas, psicológicas e sociais dos seus praticantes, propicie a sua efetiva participação nas diversas atividades esportivas recreativas e, consequentemente, o desenvolvimento de todas as suas potencialidades. Ressalta-se que, numa perspectiva inclusiva, para se desenvolver trabalho com pessoa portadora de necessidades especiais através de atividade física, não é su�ciente conhecer apenas suas características nos aspectos físicos, mas é necessário o entendimento de suas relações com os demais participantes, com as atividades físicas e/ou desportivas e o signi�cado dessas atividades para eles. Em sua essência, essas perspectivas não são diferentes das propostas para aqueles não portadores dessas necessidades (COSTA, 2002). TOTALIDADE Visa ao fortalecimento da unidade do homem (consigo, com o outro e com o mundo), considerando a emoção, a sensação, o pensamento e a intuição como elementos indissociáveis desta mesma unidade, favorecendo o desenvolvimento do processo de autoconhecimento, autoestima e autossuperação, visando à preservação de sua individualidade em relação às diversas outras individualidades. O desenvolvimento ocorre em todos os seus aspectos simultaneamente, quais sejam: intelectual, motor, social, emocional, outros. EMANCIPAÇÃO Busca da independência, autonomia e liberdade do homem, fundamentando-se nos princípios da educação transpessoal, pelo qual o aprendiz “é encorajado a despertar, a se tornar autônomo, a indagar, a explorar todos os cantos e frestas da experiência consciente, a procurar o signi�cado, a testar os limites exteriores, a veri�car as fronteiras e as profundidades do próprio eu”, oportunizando assim o desenvolvimento por intermédio da criatividade e da autenticidade, da capacidade de discernir criticamente e elaborar genuinamente as suas próprias razões de existir. A emancipação é favorecida quando o educador, por exemplo, com objetivo de que seu grupo desenvolva a habilidade de saltar, propõe uma atividade em que, em vez de alinhar as crianças lado a lado em um canto da quadra e solicitar que repitam o movimento demonstrado até o outro lado, oferece estímulos por meio de obstáculos que devem ser superados executando saltos que já conhecem, ou criando outros que julguem e�cazes para a superação do desa�o. REGIONALISMO Respeito, proteção e valorização das raízes e heranças culturais, como sinergias constitutivas do todo, considerando a singularidade inerente aos diversos mundos culturais, surgidos da relação intrínseca entre seus elementos, de forma a resgatar e preservar a sua identidade cultural, no processo de construção do coletivo. Planejar o processo de aprendizagem do esporte, partindo dos conhecimentos que as crianças já possuem em direção à construção de novas ações motoras, faz com que se reconheça a criança também como ser cultural, que se constrói por intermédio da história de seus pais e avós nascidos em outras comunidades, com outros jogos, pelas brincadeiras infantis aprendidas na escola, na rua, na cidade em que nasceu, na região em que vive. O regional e o global também interagem nesse ponto, sob o princípio do regionalismo, como uma maneira não só de resgatar as heranças culturais, mas de valorizá-las como parte da história de vida de cada um e de todos (FREIRE, 1996). Na sociedade atual precisamos entender que o Esporte Educacional requer planejamento pedagógico, que se desenvolve ao longo do tempo, visando atingir os objetivos educacionais a que se propõe. Esta intencionalidade pedagógica deve ser traduzida em premissas como: Ensinar o esporte para todos, respeitando a diversidade de gênero, biotipo, etnia etc; Ensinar de forma adequada o esporte, considerando a diversidade para desenvolver as habilidades técnicas e as táticas esportivas dos alunos, para além das aptidões esportivas; Ensinar mais do esporte, estimulando o desenvolvimento de competências para a inserção social e exercício da cidadania, que implica no desenvolvimento da capacidade de leitura crítica do mundo e do próprio esporte nos diferentes contextos em que este se manifesta. O Esporte Educacional se diferencia do esporte de rendimento porque não seleciona os mais aptos, não está submetido à lógica exclusiva do rendimento máximo que está presente nas competições e grandes eventos esportivos de alto nível. É importante ressaltar que não se trata da atribuição de valor negativo à competição, como algo a ser Fonte: oliveromg / Shutterstock evitado; pelo contrário, a competição dentro do processo educacional proporciona aprendizagens especí�cas e deve ser pensada ou planejada para que todos a vivenciem. Há um reconhecimento da importância do esporte de alto rendimento; no entanto, enfatiza-se a necessidade de priorizar o desenvolvimento do indivíduo e não apenas o desenvolvimento de habilidades técnicas dos esportes. O esporte, em sua dimensão educacional, além de proporcionar aos alunos o aprendizado do esporte, deve encaminhá- los a re�etir e discutir criticamente sobre a relação entre a prática esportiva e o contexto social em que vivem. O Esporte Educacional difundido dentro e fora da escola tem por �nalidade democratizar e gerar cultura, con�gurando- se como uma prática social de exercício crítico da cidadania, privilegiando a inclusão social, a troca de saberes e conhecimentos, o respeito às diferenças, a diversidade e a valorização das culturas. No início da aula simulamos uma situação na qual um professor/treinador faz comentários “grosseiros” a cerca de um aluno. Tais comentários são pertinentes ao conceito de esporte educacional? Pensem nisso... Será que os valores preconizados pelo esporte educacional foram contemplados? Resposta Correta Glossário