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TCC - DELEGAÇÃO DO PODER DE POLÍCIA

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A (IM)POSSIBILIDADE DE DELEGAÇÃO DO PODER DE POLÍCIA A 
PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PRIVADO: 
UMA ANÁLISE DOS CICLOS DE PODER DE POLÍCIA E A QUESTÃO DAS 
EMPRESAS MUNICIPAIS DE FISCALIZAÇÃO DE TRÂNSITO1 
 
Tiago Schuh Beck2 
André Augusto Cella3 
 
 
RESUMO 
O presente artigo versa sobre a (im)possibilidade de delegação do poder de polícia a pessoas 
jurídicas de direito privado, de modo que busca solucionar a seguinte indagação: é possível 
delegar o poder de polícia a entidades pessoas jurídicas de direito privado, sem que isso seja 
uma afronta ao poder de império do Estado e às previsões constitucionais? Para tanto, em um 
primeiro momento, observa-se alguns conceitos indispensáveis para a compreensão do estudo, 
além de um breve contexto histórico que justifica uma mudança de paradigma. Posteriormente, 
algumas jurisprudências foram analisadas no intuito de averiguar como os Tribunais têm 
entendido a questão da delegabilidade do poder de polícia no que se refere às empresas 
municipais de fiscalização de trânsito. Ao final, concluiu-se pelo reconhecimento da 
imprescindibilidade de delegação do poder de polícia a entes privados. O método de abordagem 
utilizado foi o dedutivo, com a consulta a livros, sítios eletrônicos especializados, entre outros. 
Foram utilizados dois métodos de procedimento: o histórico, em razão da necessidade de trazer 
ao leitor o momento histórico da mudança de paradigma a respeito da possibilidade de 
delegação de polícia a pessoas jurídicas de direito privado; e o monográfico, já que serão 
analisados casos que ilustram como as empresas municipais de fiscalização de trânsito têm 
atuado frente as divergências que norteiam o problema da presente pesquisa. 
 
Palavras-chave: Administração Pública; delegação; pessoas jurídicas de direito privado; poder 
de polícia; trânsito municipal. 
 
ABSTRACT 
This paper addresses the (im)possibility of delegating police power to private corporations, 
pursuing the solution to the following question: is it possible to delegate police power do private 
corporations, with no harm to State sovereignty and constitutional law? To answer that 
question, at first, some indispensable concepts to the comprehension of the study shall be 
addressed, as well as a brief historical context which justifies the change in the model of this 
subject. Afterwards, some precedents will be analyzed with the purpose of investigating how 
Brazilian Courts of Justice have ruled cases where the delegation of police power to municipal 
traffic police corporations is discussed. Finally, there will be a conclusion in favor of the 
necessity of police power delegation to private corporations. The research adopted the 
deductive approach method, with the consultation of books, specialized websites, among other 
 
1 Pesquisa apresentada à Disciplina de Trabalho Final de Graduação II, como requisito parcial para a obtenção do 
grau de Bacharel em Direito 
2 Acadêmico do 9º Semestre do Curso de Direito da Universidade Franciscana (UFN). Endereço eletrônico: 
tiagosbeck@gmail.com 
3 Advogado da União. Especialista em Direito Civil pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Professor 
do Curso de Direito da Universidade Franciscana (UFN). Endereço eletrônico: andrecella@gmail.com 
2 
 
sources. Two methods of proceeding were also used: the historical one, because of the 
importance of bringing the reader of this paper to the moment when models of police power 
administration were changed in favor of delegation to private corporations; and the 
monographic one, as judicial precedents which illustrate how municipal traffic police 
corporations have been acting despite the problems which are the subject of this research. 
 
Keywords: delegation; municipal traffic police; police power; private corporations; Public 
Administration. 
 
INTRODUÇÃO 
 
A presente pesquisa tem por escopo analisar o que há de relevante na doutrina e na 
jurisprudência, no intuito de investigar a (im)possibilidade de delegação do poder de polícia a 
pessoas jurídicas de direito privado. Isso porque, majoritariamente, doutrina e jurisprudência 
pátrias entendem não ser possível a delegação do poder de polícia a pessoas jurídicas de direito 
privado, principalmente pelo fato de que somente pessoas jurídicas de direito público possuem 
o denominado poder de império e, portanto, caberia somente a estas o exercício do poder de 
polícia. Ademais, há entendimentos de que haveria uma violação ao princípio da isonomia, 
tendo em vista que essa delegação geraria um desequilíbrio nas relações jurídicas entre os 
particulares. 
A fim de elucidar o tema proposto, é importante destacar que o poder de polícia se 
caracteriza como a faculdade que a Administração Pública possui de condicionar a liberdade 
individual em prol da coletividade, no intuito de possibilitar uma harmonia na relação entre 
interesses individuais e interesses coletivos. Dessa forma, pode-se afirmar que o poder de 
polícia está calcado na busca do bem-estar coletivo, vez que visa a manutenção da ordem por 
meio da contenção de atividades executadas por particulares que podem gerar um desequilíbrio 
nas relações existentes entre a sociedade. 
Nessa perspectiva, salienta-se que objeto de estudo que permeia a presente pesquisa 
tem sido alvo de discussões e divergências no âmbito dos Tribunais Superiores. Portanto, esse 
artigo se limitará a investigar se é possível delegar o poder de polícia a pessoas jurídicas de 
direito privado. 
Assim, chega-se ao seguinte questionamento: é possível delegar o poder de polícia a 
entidades pessoas jurídicas de direito privado, sem que isso seja uma afronta ao poder de 
império do Estado e às previsões constitucionais? 
Diante disso, faz-se necessário observar que a presente pesquisa visa proporcionar um 
entendimento aprofundado sobre a problemática, notadamente no que tange à compatibilidade 
3 
 
com os princípios do direito pátrio pertinentes ao tema, haja vista que a Administração Pública 
não pode se abster de aplicá-los, sob pena de invalidação dos atos administrativos que praticar. 
Dessa forma, verificada a importância do poder de polícia no âmbito do Direito 
Administrativo e também para a sociedade como um todo, o desenvolvimento desse estudo se 
justifica pelo fato de que, em diversas ocasiões, esse poder é utilizado de maneira distinta entre 
os próprios particulares, justamente pelo fato de não haver um entendimento pacificado a 
respeito do tema. À vista disso, observa-se, por exemplo, um alto número de demandas ao Poder 
Judiciário por parte das empresas municipais de fiscalização de trânsito, tendo em vista que 
muitas delas acreditam que possuem o poder de fiscalização e de sanção, os quais estão 
inseridos nos ciclos do poder de polícia. 
É sobre essa problemática que versa o trabalho, o qual será elaborado a partir do 
emprego do método de abordagem dedutivo, uma vez que através de livros, sítios eletrônicos 
especializados, entre outros, partir-se-á de um estudo geral de conceituação de poder de polícia 
e de suas características para se chegar a uma conclusão a respeito da possibilidade de delegação 
do poder de polícia a pessoas jurídicas de direito privado. 
Aliado a esse referencial metodológico, serão utilizados dois métodos de procedimento: 
o histórico, em razão da necessidade de trazer ao leitor o momento histórico da mudança de 
paradigma/pensamento a respeito da possibilidade de delegação de polícia a pessoas jurídicas 
de direito privado; e o monográfico, já que serão analisados casos que ilustram como as 
empresas municipais de fiscalização de trânsito têm atuado frente as divergências que norteiam 
o problema da presente pesquisa. 
Além do mais, ressalta-se que o trabalho foi dividido em dois capítulos. No primeiro, 
apresentar-se-á delineamentos conceituais, características e peculiaridades dopoder de polícia 
e de empresas estatais. Após isso, será exposto um breve histórico das transformações ocorridas 
no País, sobretudo na década de 1990, sendo esse fundamental para o entendimento da mudança 
de paradigma no que tange à impossibilidade de delegação do poder de polícia a entes privados. 
Já, no segundo capítulo, serão analisados casos julgados por alguns Tribunais de Justiça. Por 
fim, serão expostas algumas conclusões relativas à (im)possibilidade de delegação do poder de 
polícia a pessoas jurídicas de direito privado: 
Assim, nota-se a importância da presente pesquisa, pois além de versar sobre um tema 
atual, encontra-se adequada à linha de pesquisa do Curso de Direito da Universidade 
Franciscana, qual seja, “Teoria Jurídica, Cidadania e Globalização”, haja vista que o estudo 
visa trazer a lume esclarecimentos que possam levar a uma nova compreensão quanto ao dogma 
da impossibilidade de delegação do poder de polícia a entes privados, já que se pretende chegar 
4 
 
à principal prerrogativa do poder de polícia, que é a busca pelo bem-estar coletivo, a fim de que 
a cidadania possa ser exercida de maneira harmônica com os interesses coletivos. 
 
1 PODER DE POLÍCIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E EMPRESAS ESTATAIS 
 
1.1 DELINEAMENTOS CONCEITUAIS, CARACTERÍSTICAS E PECULIARIDADES 
 
O conceito de poder de polícia está previsto no artigo 78, caput, do Código Tributário 
Nacional (CTN): 
 
Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou 
disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de 
fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos 
costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades 
econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à 
tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou 
coletivos. 
 
CARVALHO FILHO (2017, p. 84), em poucas palavras, conceitua poder de polícia 
como “a prerrogativa de direito público que, calcada na lei, autoriza a Administração Pública a 
restringir o uso e o gozo da liberdade e da propriedade em favor do interesse da coletividade”. 
A fim de complementar o conceito supracitado, DI PIETRO (2017, p.151) assevera 
que “[...] esse interesse público diz respeito aos mais variados setores da sociedade, tais como 
segurança, moral, saúde, meio ambiente, defesa do consumidor, patrimônio cultural, 
propriedade”. 
Portanto, em síntese, poder de polícia é a faculdade que a Administração Pública 
possui de condicionar e restringir os interesses individuais em prol da coletividade4, a fim de 
que haja uma harmonia na sociedade e o bem-estar social possa ser alcançado. Diante disso, há 
uma intervenção negativa do Estado, a qual não acrescenta utilidades, mas restringe 
possibilidades. 
Nesse contexto, há a incidência do princípio da supremacia do interesse público5 sobre 
o particular, de modo que os interesses subjetivos dos indivíduos não podem se sobrepor aos 
 
4 Sobre essa questão, elucida MEIRELLES (2016, p. 155): “a razão do poder de polícia é o interesse social e o seu 
fundamento está na supremacia geral que o Estado exerce em seu território sobre todas as pessoas, bens e 
atividades, supremacia que se revela nos mandamentos constitucionais e nas normas de ordem pública, que a cada 
passo opõem condicionamentos e restrições aos direitos individuais em favor da coletividade, incumbindo ao 
Poder Público o seu policiamento administrativo”. 
5 O princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado é princípio geral de Direito inerente a 
qualquer sociedade. É a própria condição de sua existência. Assim, não se radica em dispositivo específico algum 
da Constituição, ainda que inúmeros aludam ou impliquem manifestações concretas dele, como, por exemplo, os 
5 
 
interesses e bem-estar da coletividade. Trata-se, pois, de um juízo de ponderação entre o 
interesse público e privado. 
Assim, salienta-se que o poder de polícia só pode ser exercido para atender ao interesse 
público. Dessa maneira, afirma DI PIETRO (2017, p. 155): 
 
[...] o poder de polícia não deve ir além do necessário para a satisfação do interesse 
público que visa proteger; a sua finalidade não é destruir os direitos individuais, mas, 
ao contrário, assegurar o seu exercício, condicionando-o ao bem-estar social; só 
poderá reduzi-los quando em conflito com interesses maiores da coletividade e na 
medida estritamente necessária à consecução dos fins estatais. 
 
Logo, diferentemente do que ocorria nos Estados absolutistas, onde o poder de polícia 
podia ser exercido de modo ilimitado, em um Estado Democrático de Direito isso não é mais 
admitido, pois deve-se analisar a necessidade e a proporcionalidade da intervenção estatal. 
Outrossim, FURTADO (2013, p. 532), aduz que: 
 
Ao se proceder ao estudo do poder de polícia do Estado, constata-se que as atividades 
desenvolvidas pelos particulares necessitam de ordenação, de planificação, de 
limitação, de controle, a fim de evitar que os abusos cometidos pelos particulares 
atentem contra os interesses da própria sociedade. 
 
Também, cabe referir que poder de polícia administrativo – objeto do presente estudo 
- e poder de polícia judiciário são conceitos distintos, de modo que, em linhas gerais, aquele é 
regido pelas normas administrativas, enquanto que este é regido pelo direito processual penal. 
Conforme MARRARA (2015, p. 261-262) no plano operacional, a polícia 
administrativa abrange três tipos de estratégias - preventivas, fiscalizatórias e repressivas - para 
limitar o exercício da propriedade ou da liberdade, a saber: 
 
1) As preventivas são aquelas que orientam o comportamento dos particulares no 
intuito de evitar lesões a interesses públicos primários determinados e, com isso, 
resguardar direitos. A prática de atos liberatórios, como a licença ambiental e a 
urbanística ou as autorizações para realização de fusão empresarial, exemplifica a 
faceta preventiva. Também as medidas administrativas cautelares cumprem função 
preventiva em inúmeros casos. 
2) As atividades fiscalizatórias, de outra parte, englobam um conjunto de medidas de 
busca de informação a respeito do cumprimento da legislação administrativa e servem 
a fornecer à administração dados necessários para combater infrações a normas de 
polícia por meio de medidas cautelares ou processos administrativos repressivos. 
3) As atividades repressivas abrangem a criação de infrações e a imposição de 
medidas punitivas (sanções) contra aqueles que agem em violação das normas 
 
princípios da função social da propriedade, da defesa do consumidor ou do meio ambiente (art. 170, III, V e VI), 
ou tantos outros. Afinal, o princípio em causa é um pressuposto lógico do convívio social. Para o Direito 
Administrativo interessam apenas os aspectos de sua expressão na esfera administrativa. Para não deixar sua sem 
referência constitucional algumas implicações concretas especificamente dispostas na Lei Maior e pertinentes ao 
Direito Administrativo, basta referir aos institutos da desapropriação e da requisição (art. 5º, XXIV e XXV), nos 
quais é evidente a supremacia do interesse público sobre o interesse privado. BANDEIRA DE MELLO (2013, p. 
99). 
6 
 
administrativas de polícia. Enquadra-se igualmente na função repressiva o uso de 
alguns acordos, integrativos e substitutivos, no exercício da polícia, como os 
compromissos administrativos de cessação de infração, existentes, por exemplo, no 
direito ambiental e no direito da concorrência. Não se olvide, ainda, que os 
instrumentos repressivos muitas vezes acabam deflagrando um efeito preventivo 
indireto de ordem geral ou individual. 
 
Giza-se que tais distinções são imprescindíveis para a posterior análise acerca da 
possibilidadede delegação do poder de polícia a pessoas jurídicas de direito privado. Além 
disso, insta salientar que a delegação de poder de polícia possui três modalidades: concessão6, 
permissão7 e autorização8. 
Por conseguinte, faz-se necessário estabelecer a distinção entre poder de polícia 
originário e poder de polícia delegado. Para tanto, segue o ensinamento de MEIRELLES (2016, 
p. 154): 
 
[...] deve-se distinguir o poder de polícia originário do poder de polícia delegado, pois 
que aquele nasce com a entidade que o exerce e este provém de outra, através de 
transferência legal. O poder de polícia originário é pleno no seu exercício e 
consectário, ao passo que o delegado é limitado aos termos da delegação e se 
caracteriza por atos de execução. Por isso mesmo, no poder de polícia delegado não 
se compreende a imposição de taxas, porque o poder de tributar é intransferível da 
entidade estatal que o recebeu constitucionalmente. Só esta pode taxar e transferir 
recursos para o delegado realizar o policiamento que lhe foi atribuído. Mas no poder 
de polícia delegado está implícita a faculdade de aplicar sanções aos infratores, na 
forma regulamentar, pois que isto é atributo de seu exercício9. 
 
Nessa acepção, o poder de polícia originário será sempre uma pessoa política do 
Estado (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), executado pela entidade para a qual foi 
criado, enquanto que o poder de polícia delegado é aquele exercido pelos integrantes da 
chamada Administração indireta, isto é, pessoas administrativas do Estado, as quais recebem 
delegação legal de atividades do ente estatal originário. 
 
6 De acordo com BANDEIRA DE MELLO (2013, p. 717-718), “concessão de serviço público é o instituto através 
do qual o Estado atribui o exercício de um serviço público a alguém que aceita prestá-lo em nome próprio, por sua 
conta e risco, nas condições fixadas e alteráveis unilateralmente pelo Poder Público, mas sob garantia contratual 
de um equilíbrio econômico-financeiro, remunerando-se pela própria exploração do serviço, em geral e 
basicamente mediante tarifas cobradas diretamente dos usuários do serviço”. 
7 “Permissão de serviço público é o ato unilateral e precário intuitu personae, através do qual o Poder Público 
transfere a alguém o desempenho de um serviço de sua alçada, proporcionando, à moda do que faz na concessão, 
a possibilidade de cobrança de tarifas dos usuários. Dita outorga se faz por licitação (art. 175 da Constituição 
federal) e pode ser gratuita ou onerosa, isto é, exigindo-se do permissionário pagamento(s) como contraprestação” 
BANDEIRA DE MELLO (2013, p. 775). 
8 Nas palavras de DI PIETRO (2017, p. 302), “a autorização de serviço público constitui ato unilateral 
discricionário e precário pelo qual o poder público delega a execução de um serviço público de sua titularidade, 
para que o particular o execute predominantemente em seu próprio benefício [...]”. 
9 Na ADI 1. 717 o STF, em "interpretação conjugada dos artigos 52, XIII, 22, XVI, 21, XXIV, 70, parágrafo único, 
149 e 175" da CF,julgou inconstitucional a delegação de atividade típica de Estado a uma entidade privada. A 
delegação do exercício do poder de polícia de trânsito a sociedade de economia mista está submetida a repercussão 
geral no STF (ARE 662.186). 
 
7 
 
Ademais, faz-se necessário destacar que o poder de polícia é exercido nos Poderes 
Legislativo e Executivo. Nesse diapasão, COSTA LOBATO e CAMPOS DA SILVA (2016, p. 
84), aduzem que “enquanto no Poder Legislativo se exerce poder de polícia através da criação, 
mediante lei, de limitações administrativas ao exercício das liberdades públicas, o Poder 
Executivo regulamenta as leis e controla sua aplicação preventiva ou repressivamente, 
exercendo o poder de polícia administrativa”. 
Posto isso, importante trazer à baila três importantes características do poder de 
polícia: discricionariedade, autoexecutoriedade e coercibilidade. Assim, passa-se a conceituar 
cada uma delas, de acordo com MEIRELLES (2016, p. 159-161). 
No que tange à discricionariedade, esta consiste na livre escolha que a Administração 
dispõe de exercer o poder de polícia, calcada nos critérios de conveniência e oportunidade. Já, 
a autoexecutoriedade é o não condicionamento dos atos de polícia a aprovação prévia pelo 
Poder Judiciário ou qualquer outro órgão. Isso significa que a Administração pode praticar atos 
e colocá-los em imediata execução. Por fim, a coercibilidade diz respeito ao fato de que todo o 
ato de polícia é imperativo, isto é, deve obrigatoriamente ser respeitado pelo particular. 
Superada a análise do poder de polícia, passa-se à análise das empresas estatais 
(empresas públicas e sociedades de economia mista). Estas integram a Administração Pública 
indireta e se submetem ao regime jurídico de direito privado. 
BANDEIRA DE MELLO (2013, p. 191-195), assim conceitua empresa pública e 
sociedade de economia mista: 
 
[...] empresa pública federal é a pessoa jurídica criada por força de autorização legal 
como instrumento de ação do Estado, dotada de personalidade de Direito Privado, mas 
submetida a certas regras especiais decorrentes de ser coadjuvante da ação 
governamental, constituída sob quaisquer das formas admitidas em Direito e cujo 
capital seja formado unicamente por recursos de pessoas de Direito Público interno 
ou de pessoas de suas Administrações indiretas, com predominância acionária 
residente na esfera federal. 
Sociedade de economia mista federal há de ser entendida como a pessoa jurídica cuja 
criação é autorizada por lei, como um instrumento de ação do Estado, dotada de 
personalidade de Direito Privado, mas submetida a certas regras especiais [...], 
constituída sob a forma de sociedade anônima, cujas ações com direito a voto 
pertençam em sua maioria à União ou entidade de sua Administração indireta, sobre 
remanescente acionário de propriedade particular. 
 
Desse modo, a principal diferença reside no fato de que as empresas públicas possuem 
capital totalmente estatal, enquanto que as sociedades de economia mista têm o seu capital 
subsidiado tanto pelo Estado como por particulares, embora sejam controladas pelo Estado. 
Além do mais, é importante referir que a Administração Pública indireta é fruto da 
descentralização administrativa. Sobre esta, DI PIETRO (2017, p. 438) assevera: 
8 
 
A descentralização administrativa ocorre quando as atribuições que os entes 
descentralizados exercem só têm o valor jurídico que lhes empresta o ente central; 
suas atribuições não decorrem, com força própria, da Constituição, mas do poder 
central. É o tipo de descentralização própria dos Estados unitários, em que há um 
centro único de poder, do qual se destacam, com relação de subordinação, os poderes 
das pessoas jurídicas locais. [...]. Esse processo de descentralização envolve, portanto: 
1. reconhecimento de personalidade jurídica ao ente descentralizado; 2. existência de 
órgãos próprios, com capacidade de autoadministração exercida com certa 
independência em relação ao poder central; 3. patrimônio próprio, necessário à 
consecução de seus fins; 4. capacidade específica, ou seja, limitada à execução do 
serviço público determinado que lhe foi transferido, o que implica sujeição ao 
princípio da especialidade, que impede o ente descentralizado de desviar-se dos fins 
que justificaram a sua criação; 5. sujeição a controle ou tutela, exercido nos limites da 
lei, pelo ente instituidor; esse controle tem que ser limitado pela lei precisamente para 
assegurar certa margem de independência ao ente descentralizado, sem o que não se 
justificaria a sua instituição. 
 
Portanto, na descentralização, ocorre a transferência de prestação de serviço para a 
Administração Indireta ou para o particular, os quais possuem personalidade jurídica própria, 
mas são controlados e fiscalizados pelo ente central.1.2 BREVES APONTAMENTOS HISTÓRICOS: DÉCADA DE 1990 E MUDANÇA DE 
PARADIGMA NO QUE TANGE À DELEGAÇÃO DO PODER DE POLÍCIA A ENTES 
PRIVADOS 
 
Tradicionalmente, doutrina e jurisprudência entendem não ser possível a delegação do 
poder de polícia a pessoas jurídicas de direito privado. Isso porque prevalece a ideia de que é 
uma atividade exclusiva do Estado, exercida por meio da coerção10, através do poder de 
império, que encontra fundamento na supremacia do interesse público sobre o particular, sendo 
esse exclusivo e intransferível. 
No mesmo sentido, o fundamento da indelegabilidade está calcado no fato de muitos 
autores entenderem que uma possível delegação do poder de polícia a entes privados violaria o 
princípio da isonomia e geraria um desequilíbrio social. Também, uma possível delegação 
representaria uma negação da própria autoridade estatal. Nesse contexto, aduz BANDEIRA DE 
MELLO (2013, p. 855-857): 
 
 
10 A coerção é um dos principais fundamentos que a doutrina expõe para defender a ideia de indelegabilidade do 
poder de polícia a particulares. Para KLEIN (2014, p. 17), “a justificativa para tanto reside no monopólio estatal 
de violência, consagrado no sistema constitucional, em razão do qual não é possível que o Estado pode impor 
coercitivamente deveres a particulares. A possibilidade de manifestação coercitiva e imperativa da atividade do 
poder de polícia pelo Estado está vinculada à legitimidade do poder político e ao princípio da República. Trata-se 
de poder funcional, necessário ao atendimento dos interesses da coletividade, que, por isso, foi originariamente 
atribuído ao Estado. Também por essa razão há o monopólio estatal da violência, como instrumento para a 
persecução de finalidades públicas”. 
9 
 
A restrição à atribuição de atos de polícia a particulares funda-se no corretíssimo 
entendimento de que não se lhes pode, ao menos em princípio, cometer o encargo de 
praticar atos que envolvem o exercício de misteres tipicamente públicos quando em 
causa liberdade e propriedade, porque ofenderiam o equilíbrio entre os particulares 
em geral, ensejando que uns oficialmente exercessem supremacia sobre outros. (…) 
salvo hipóteses excepcionalíssimas (caso dos poderes outorgados aos comandantes de 
navio), não há delegação de ato jurídico de polícia a particular e nem a possibilidade 
de que este o exerça a título contratual” 
 
Como se pode inferir, há o entendimento de que a indelegabilidade do poder de polícia 
encontra guarida no princípio da isonomia, previsto no artigo. 5º, caput¸ da Constituição 
Federal. 
Assim sendo, se o poder de polícia fosse delegado a particulares, haveria um 
desequilíbrio nas relações jurídicas entre esses, o que resultaria em uma clara violação ao 
referido princípio. Ademais, a negação da autoridade estatal acarretaria na violação do poder 
de império, sendo esse uma das principais prerrogativas conferidas ao Estado. 
Outrossim, outro problema apontado pela doutrina é que o exercício do poder de 
polícia por particulares ocasionaria um conflito de interesses, uma vez que a busca pelo lucro 
por parte dos entes privados obstaria a finalidade da função sancionatória. Giza-se que uma 
parte minoritária11 da doutrina entende ser possível a delegação do poder de polícia no aspecto 
fiscalizatório a pessoas jurídicas de direito privado. 
Todavia, a discussão começa a tomar novos contornos e novas ideias começam a surgir 
a partir da década de 1990, no governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), com a 
“consagração” de processos iniciados em governos estrategistas anteriores, como a abertura do 
mercado brasileiro ao estrangeiro e a quebra do monopólio estatal, que passa a delegar algumas 
de suas atividades à iniciativa privada, a privatização das empresas estatais, dentre outras 
medidas. Nesse sentido, preleciona BINENBOJM (2016, p. 247): 
 
Aos poucos, ganhou corpo a concepção de que as parcerias com o setor privado seriam 
um instrumento relevante para reduzir o aparato estatal – medida que se coadunava 
com a visão de uma Administração Pública gerencial e flexível – e que os agentes 
privados poderiam desempenhar importantes finalidades públicas. Tornava-se, assim, 
mais tênue a separação entre o público e o privado. Daí a ascensão das delegações a 
 
11 Nesse sentido, assevera CARVALHO FILHO (2017, p. 85) “[...]. Observe-se que a existência da lei é o 
pressuposto de validade da polícia administrativa exercida pela própria Administração Direta e, desse modo, nada 
obstaria que servisse também como respaldo da atuação de entidades paraestatais, mesmo que sejam elas dotadas 
de personalidade jurídica de direito privado. [...]. A respeito do tema, suscitou-se grande polêmica relacionada à 
Guarda Municipal, quando o Município do Rio de Janeiro a instituiu sob a forma de empresa pública. Com o 
argumento de que se tratava de pessoa jurídica de direito privado, bem como pela circunstância de que seus 
servidores se subordinavam ao regime trabalhista, o que não lhes poderia conferir estabilidade, alguns passaram a 
defender a anulação das multas de trânsito por eles aplicadas em consequência da impossibilidade jurídica de ser 
exercido poder de polícia pela entidade. A nosso ver, tal entendimento reflete flagrante desvio de perspectiva. 
Inexiste qualquer vedação constitucional para que pessoas administrativas de direito privado possam exercer o 
poder de polícia em sua modalidade fiscalizatória”. 
10 
 
particulares e privatizações de atividades públicas, a partir do final da década de 1990 
e início do século XXI. 
 
Logo, observa-se que, no âmbito do Direito Administrativo, alguns fenômenos 
técnico-jurídicos intensificaram-se a partir da década de 1990, como por exemplo a 
terceirização12 e a criação das agências reguladoras13. Assim, diante de uma sociedade cada vez 
mais complexa, do elevado grau de desenvolvimento tecnológico e dos impactos da 
globalização econômica, os modelos institucionais existentes se reinventam a cada dia. Nesse 
contexto, passa-se a questionar a visão tradicional de que todas as funções de ordem social e 
econômica devem ser concentradas na figura do Estado. 
O questionamento se dá em razão de o Estado ter fracassado em inúmeros aspectos, 
além de ter se tornado demasiadamente grande e custoso, motivo pelo qual houve a criação de 
novos mecanismos para deslocar a competência de tarefas até então executados pelo Estado 
para o campo privado. Nessa acepção, “as transformações institucionais caminham no sentido 
da quebra do monopólio estatal no exercício da atividade ordenadora” (BINENBOJM, 2016, p. 
244). 
Ademais, é oportuno esclarecer que a Constituição Federal reservou competências 
significativas aos Municípios, assegurando-lhes um lugar de destaque na definição de políticas 
públicas de trânsito e desenvolvimento urbano, haja vista que passou a considerá-lo como 
componente da estrutura administrativa. 
No mesmo viés, diferentemente do Código de Trânsito Nacional de 1966, pelo qual os 
Municípios não participavam diretamente da gestão do trânsito brasileiro, com exceção do que 
se referia às rodovias sob sua jurisdição, o CTB possibilitou a denominada municipalização do 
trânsito, a qual poderá ser exercida somente se o Município estiver integrado ao Sistema 
Nacional de Trânsito14 (SNT). Tal inovação equiparou os Municípios à União, aos Estados e ao 
 
12 “Terceirização significa, pura e simplesmente, passar para particulares tarefas que vinham sendo desempenhadas 
pelo Estado. Daí, que este rotulo abriga os mais distintos instrumentos jurídicos, já que se pode repassar a 
particulares atividades públicas por meio de concessão, permissão, delegação, contrato administrativo de obras, 
de prestação deserviços etc”. BANDEIRA DE MELLO (2013, p.228). Incumbe chamar a atenção para o fato de 
que, no ano de 2018, ao julgar a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 324, o STF 
considerou constitucional a terceirização de atividade-fim. A decisão possui repercussão geral. 
13 Segundo DI PIETRO (2017, p.502), pode-se considerar a existência de dois tipos de agências reguladoras no 
direito brasileiro: a) as que exercem, com base em lei, típico poder de polícia, com a imposição de limitações 
administrativas, previstas em lei, fiscalização, repressão; é o caso, por exemplo, da Agência Nacional de Vigilância 
Sanitária (Anvisa), [...], da Agência Nacional de Saúde Pública Suplementar (ANS), [...], da Agência Nacional de 
Águas [...]. b) as que regulam e controlam as atividades que constituem objeto de concessão, permissão ou 
autorização de serviço público (telecomunicações, energia elétrica, transportes etc.) ou de concessão para 
exploração de bem público (petróleo e outras riquezas minerais, rodovias etc.). 
14 O CTB prevê em seu art. 5 que “o Sistema Nacional de Trânsito é o conjunto de órgãos e entidades da União, 
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios que tem por finalidade o exercício das atividades de 
planejamento, administração, normatização, pesquisa, registro e licenciamento de veículos, formação, habilitação 
11 
 
Distrito Federal. Ademais, outra novidade legislativa foi a possibilidade de atribuição do poder 
de polícia administrativo de trânsito aos Municípios - fiscalizar, vistoriar, aplicar penas de 
polícia na forma de advertência, multa, dentre outros. 
A respeito do tema, assevera CARVALHO FILHO (2017, p. 85): 
 
[...] suscitou-se grande polêmica relacionada à Guarda Municipal, quando o 
Município do Rio de Janeiro a instituiu sob a forma de empresa pública. Com o 
argumento de que se tratava de pessoa jurídica de direito privado, bem como pela 
circunstância de que seus servidores se subordinavam ao regime trabalhista, o que não 
lhes poderia conferir estabilidade, alguns passaram a defender a anulação das multas 
de trânsito por eles aplicadas em consequência da impossibilidade jurídica de ser 
exercido poder de polícia pela entidade. 
 
No entanto, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 658.570, perante o Supremo 
Tribunal Federal, o Relator do caso, Ministro Luís Roberto Barroso, asseverou que, dentro de 
sua esfera de atuação, delimitada pelo CTB, os Municípios podem determinar que o poder de 
polícia que lhe compete seja exercido pela guarda municipal. Além disso, aludiu que o artigo 
144, §8º, da CF, não impede que a guarda municipal exerça funções adicionais à de proteção 
dos bens, serviços e instalações do Município. 
Também, afirmou que poder de polícia não se confunde com segurança pública, tendo 
em vista que o exercício do primeiro não é prerrogativa exclusiva das entidades policiais, a 
quem a Constituição outorgou, com exclusividade, no art. 144, apenas as funções de promoção 
de segurança pública. 
Posto isso, frisa-se que o art. 24 do CTB dá azo aos Municípios para definirem as 
condições de tráfego nas vias sob sua jurisdição. Dessa forma, observa-se que o Conselho 
Nacional de Trânsito (CONTRAN) regulamentou a utilização de imagens de câmeras de 
monitoramento de segurança, no intuito de comprovar infrações de trânsito. Em um primeiro 
momento, a Resolução nº 471/2013, permitiu a fiscalização de trânsito nas rodovias e estradas. 
Posteriormente, sua redação foi alterada pela Resolução 532/2015, a qual incluiu tanto nas vias 
rurais como nas vias urbanas a possibilidade de monitoramento por vídeo para fiscalização de 
trânsito. 
Isso significa que um agente de trânsito pode multar um veículo sem estar no local da 
infração, mas tão somente em uma central de vídeo monitoramento. A justificativa se dá em 
razão de que muitos Municípios não possuem o contingente necessário de agentes de trânsito 
 
e reciclagem de condutores, educação, engenharia, operação do sistema viário, policiamento, fiscalização, 
julgamento de infrações e de recursos e aplicação de penalidades”. 
12 
 
para monitorar as vias urbanas. Verifica-se, portanto, um nítido processo de descentralização e 
consequente quebra do monopólio estatal. 
Apesar disso, prevalece na doutrina o dogma da impossibilidade de delegação das 
atividades de ordenação do poder de polícia a entes privados15, de modo que cabe ao particular 
no máximo a execução de certos atos materiais, desde que meramente acessórios ou 
instrumentais. No entanto, é possível vislumbrar, ainda que timidamente, uma mudança de 
paradigma, principalmente em razão da teoria dos ciclos de poder de polícia. 
Nessa perspectiva, antes de adentrar na teoria dos ciclos de poder de polícia, 
imprescindível trazer à tona esclarecimentos acerca dos atos materiais supramencionados. Para 
tanto, assim preleciona MAFFINI (2008, p. 71): 
 
É necessário salientar que é possível a transferência a particulares, desde que se o faça 
com regularidade licitatória e contratual, de atos materiais de preparação do poder de 
polícia propriamente dito (ex.: expedição de tíquetes de parquímetros, o ato de 
fotografar veículos em controladores eletrônicos de velocidade, o ato material de 
vistoriar um veículo para fins de licenciamento etc.), bem como de atos materiais de 
execução do poder de polícia (ex.: ato material de apreender veículos em situação 
irregular demolição de obra irregular etc.). O que não é possível é a transferência a 
particulares da prática de atos administrativos – dotados de cunho decisório, portanto 
– de polícia administrativa (ex.: o licenciamento de veículos automotores, a decisão 
quanto à autuação de trânsito, a decisão quanto à apreensão de veículo, a decisão 
quanto à demolição de obra irregular etc.). Trata-se, pois, de atividade estatal 
indelegável a particulares. 
 
Dessa forma, os atos materiais são aqueles nos quais não manifestam a vontade do 
Estado, de modo que são considerados acessórios, caracterizados como uma “atividade meio”. 
Posto isso, no que concerne aos ciclos de poder de polícia, estes são divididos em 
quatro: 1) ordem de polícia; 2) consentimento de polícia; 3) fiscalização de polícia; 4) sanção 
de polícia. Assim, passa-se a conceituar cada um, de acordo com MOREIRA NETO (2014, p. 
1474-1485). 
1) Ordem de polícia: caracteriza-se como uma limitação, a fim de que não se faça aquilo 
que possa prejudicar o interesse geral ou para que não se deixe de fazer alguma coisa que possa 
evitar ulterior prejuízo público; 
2) Consentimento de polícia: ato administrativo de anuência, caracterizado por um 
controle administrativo prévio da efetiva compatibilização do uso de certo bem ou do exercício 
de certa atividade com o interesse público; 
 
15 Sobre o tema, esclarece KLEIN (2014, p. 428): “são usuais as manifestações no sentido da possibilidade de 
desenvolvimento por entidades privadas de atividades instrumentais ou acessórias ao exercício das atividades de 
polícia administrativa. A doutrina propõe a separação entre atividade jurídica e atividade material da 
Administração, enunciando ser a segunda desprovida de conteúdo jurídico”. 
13 
 
3) Fiscalização de polícia: possui duas funções: 1) realizar a prevenção das infrações 
pela observação do adequado cumprimento, por parte dos administrados, das ordens e dos 
consentimentos de polícia; 2) preparar a repressão das infrações pela constatação formal da 
existência de atos infratores; 
4) Sanção de polícia: é a repressão da infração, que tem por intuito compelir o infrator 
à prática de ato corretivo. 
Nota-se que o autor considera que o 2º e o 3º ciclos delegáveis, haja vista que estão 
ligados ao poder de gestão do Estado. Em contrapartida, o 1º e o 4º ciclo são indelegáveis, pois 
estão relacionadosà atividade de império do Estado. 
Nesse viés, BINENBOJM (2016, p. 239-240) assevera que “há em curso um processo 
de paulatina desestatização e desterritorialização de uma atividade até então considerada 
inerente e exclusiva do Estado”. Sobre os termos, assim preleciona o autor: 
 
De um lado, a desestatização do poder de polícia pode ser verificada pela crescente 
atribuição, reconhecimento ou pelo exercício de fato – isto é, independentemente de 
qualquer título jurídico-formal – de funções ordenadoras por atores privados. De 
outro, a desterritorialização decorre do reconhecimento de novas formas de regulação, 
produzidas por entidades transnacionais, que já não extraem seu fundamento de 
legitimidade da soberania estatal. 
 
Superado o entendimento da doutrina, passa-se a expor, brevemente, a posição atual 
do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF). 
O STJ entende que as fases de fiscalização e consentimento podem delegadas a pessoas 
jurídicas de direito privado. O entendimento é calcado nos quatro ciclos do poder de polícia. 
Diante disso, salienta-se que o caso maior relevância que envolve a aplicação dos ciclos de 
poder de polícia é o da empresa BHTrans, cuja autorização para criação se deu através da Lei 
Municipal nº 5.953, pelo Município de Belo Horizonte, que inovou ao delegar seu poder de 
fiscalização e sanção a um ente privado. 
A fim de encontrar uma solução para o caso, uma vez que o Tribunal de Justiça de 
Minas Gerais (TJ-MG), diferentemente do Ministério Público do Estado de Minas Gerais 
(MP/MG), entendeu pela possibilidade da delegação de atos fiscalizatórios e sancionatórios16, 
 
16 ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – BHTRANS – PODER DE 
POLÍCIA – FISCALIZAR O TRÂNSITO E IMPOR SANÇÕES – COMPETÊNCIA LEGISLATIVA 
SUPLEMENTAR – VALIDADE – MATÉRIA DE INTERESSE LOCAL QUE PODE SER 
REGULAMENTADA PELA MUNICIPALIDADE. A Empresa de Transporte e Trânsito de Belo Horizonte 
(BHTrans), criada com o objetivo de gerenciar o trânsito local, tem competência para aplicar multa aos infratores 
de trânsito, nos termos do art. 24, do Código Nacional de Trânsito. Sendo o poder de polícia inerente à 
Administração Pública e recebendo o agente de trânsito delegação da autoridade competente para agir dentro dos 
14 
 
o STJ desmembrou os ciclos de poder de polícia e aplicou-os ao caso em concreto, como se 
observa a seguir: atuação normativa (ordem de polícia); emissão da CNH (consentimento de 
polícia); equipamentos de fiscalização de trânsito (fiscalização de polícia); imposição de multas 
(sanção de polícia). 
Assim, reformou parcialmente a decisão do TJ-MG, haja vista que entendeu que os 
atos de fiscalização e de consentimento podem ser delegados às empresas, enquanto que os atos 
de ordem e sanção são indelegáveis. De acordo com o voto do Ministro Relator Mauro 
Campbell Marques, no que se refere aos atos sancionatórios, “o bom desenvolvimento por 
particulares estaria, inclusive, comprometido pela busca do lucro - aplicação de multas para 
aumentar a arrecadação”17. 
Nesse sentido, ressalta-se que o STJ tem firmado o mesmo entendimento em outros 
julgados, assim como parte minoritária da doutrina. 
No entanto, conforme salienta BINENBOJM (2016, p. 254): 
 
Em junho de 2010, o STJ reexaminou o feito por ocasião do julgamento dos embargos 
de declaração opostos pela BHTRANS. Na ocasião, a empresa suscitou a omissão do 
Tribunal quanto à existência de regras constitucionais que pudessem balizar o 
entendimento de que sociedade de economia mista não poderia exercer atividades de 
controle de trânsito. A questão, contudo, permaneceu sem resposta, tendo o STJ se 
limitado a reafirmar a impossibilidade da prática de atos sancionatórios por pessoas 
jurídicas de direito privado. Interposto Recurso Extraordinário pela BHTRANS, o 
caso teve sua repercussão geral reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal. 
 
Por outro lado, o STF entende ser indelegável o poder de polícia a entes privados. A 
decisão que norteia o atual entendimento foi exarada em 2002, na Ação Direta de 
 
limites da jurisdição do Município, extrai-se que este possui o poder-dever de aplicar as multas cabíveis ao ato 
infracional em concreto, sob pena de sua atuação, ao final, revelar-se inócua. (TJMG, Apelação Cível nº 
1.0024.04.353035-1/001, rel. Des. Edilson Fernandes, 6ª Câmara Cível, j. em 26.04.2005, DJ de 17.06.2005). 
17 ADMINISTRATIVO. PODER DE POLÍCIA. TRÂNSITO. SANÇÃO PECUNIÁRIA APLICADA POR 
SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. IMPOSSIBILIDADE. [...] 2. No que tange ao mérito, convém 
assinalar que, em sentido amplo, poder de polícia pode ser conceituado como o dever estatal de limitar -se o 
exercício da propriedade e da liberdade em favor do interesse público. A controvérsia em debate é a 
possibilidade de exercício do poder de polícia por particulares (no caso, aplicação de multas de trânsito por 
sociedade de economia mista). 4. No âmbito da limitação do exercício da propriedade e da liberdade no trânsito, 
esses grupos ficam bem definidos: o CTB estabelece normas genéricas e abstratas para a obtenção da Carteira 
Nacional de Habilitação (legislação); a emissão da carteira corporifica a vontade o Poder Público 
(consentimento); a Administração instala equipamentos eletrônicos para verificar se há respeito à velocidade 
estabelecida em lei (fiscalização); e também a Administração sanciona aquele que não guarda observância 
ao CTB (sanção). 5. Somente os atos relativos ao consentimento e à fiscalização são delegáveis, pois aqueles 
referentes à legislação e à sanção derivam do poder de coerção do Poder Público. 6. No que tange aos atos de 
sanção, o bom desenvolvimento por particulares estaria, inclusive, comprometido pela busca do lucro - 
aplicação de multas para aumentar a arrecadação. 7. Recurso especial provido (REsp 817534/MG, Rel. Ministro 
MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/11/2009, DJe 10/12/2009). 
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91797/c%C3%B3digo-de-tr%C3%A2nsito-brasileiro-lei-9503-97
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91797/c%C3%B3digo-de-tr%C3%A2nsito-brasileiro-lei-9503-97
15 
 
Inconstitucionalidade (ADI) nº 1.717/DF18, que versava sobre Conselhos de Classe19, de modo 
que somente pode ser exercido por pessoas jurídicas de direito público. Ressalta-se que é 
possível a delegação de atividades meramente instrumentais. 
Nesse sentido, o Relator do processo, Ministro Sydney Sanches, argumentou que 
Constituição Federal prevê que os conselhos de fiscalização profissional realizam atividades 
típicas do Estado, de modo que abrangem, por exemplo, o poder de polícia, no que tange ao 
exercício de atividades profissionais. Portanto, devem se revestir da natureza jurídica de 
autarquia, em razão de exercerem poder de império quanto a fiscalização de atividades 
profissionais e em eventual aplicação de sanções. 
Superado isso, giza-se que no ano de 2012, por ocasião do Agravo nº 662.186/MG20, 
em virtude da necessidade de observância dos limites da delegação do poder de polícia a 
empresas estatais, o STF reconheceu a repercussão geral da controvérsia no que tange a 
delegação do poder de polícia a entes privados. 
Desse modo, o caso BHTrans21 passou a ser processado como RE nº 840.230 e aguarda 
julgamento. Questiona-se, principalmente, se a empresa poderia impor multas àqueles que 
 
18 DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 
DO ART. 58 E SEUS PARÁGRAFOS DA LEI FEDERAL Nº 9.649, DE 27.05.1998, QUE TRATAM DOS 
SERVIÇOS DE FISCALIZAÇÃO DE PROFISSÕES REGULAMENTADAS. 1. Estando prejudicada a Ação, 
quanto ao § 3º do art. 58 da Lei nº 9.649, de 27.05.1998, como já decidiu o Plenário, quando apreciou o pedido de 
medida cautelar, a Ação Direta é julgada procedente, quantoao mais, declarando-se a inconstitucionalidade do 
"caput" e dos § 1º, 2º, 4º, 5º, 6º, 7º e 8º do mesmo art. 58. 2. Isso porque a interpretação conjugada dos artigos 5º, 
XIII, 22, XVI, 21, XXIV, 70, parágrafo único, 149 e 175 da Constituição Federal, leva à conclusão, no sentido da 
indelegabilidade, a uma entidade privada, de atividade típica de Estado, que abrange até poder de polícia, de 
tributar e de punir, no que concerne ao exercício de atividades profissionais regulamentadas, como ocorre com os 
dispositivos impugnados. 3. Decisão unânime. (STF - ADI: 1717 DF, Relator: SYDNEY SANCHES, Data de 
Julgamento: 07/11/2002, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJ 28-03-2003 PP-00061 EMENT VOL-02104-01 
PP-00149). 
19 Ressalta-se que no ano de 2006, o STF, na apreciação da ADI nº 3.026, firmou entendimento contrário em 
relação à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). A Corte Superior entendeu que a Ordem é uma entidade “sui 
generis”, isto é, trata-se de um serviço público independente, que não se submete ao controle e nem se vincula à 
Administração Pública, razão pela qual se caracteriza como uma espécie de ente público não estatal. Portanto, a 
OAB possui uma personalidade jurídica própria. Nesse contexto, diferentemente dos demais Conselhos de 
Fiscalização Profissional, a Ordem não possui natureza jurídica de autarquia. 
20 DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APLICAÇÃO DE MULTA DE TRÂNSITO POR 
SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. PODER DE POLÍCIA. DELEGAÇÃO DOS ATOS DE 
FISCALIZAÇÃO E SANÇÃO A PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO. Decisão: O Tribunal 
reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada, vencido o Ministro Marco 
Aurélio. Não se manifestaram os Ministros Gilmar Mendes, Joaquim Barbosa, Cármen Lúcia e Rosa Weber.” 
(ARE nº 662.186, rel. Min. Luiz Fux, j. em 22.03.2012, DJe de 13.09.2012). Sinteticamente, trata-se de Recurso 
extraordinário com agravo em que se discute, à luz dos artigos 23, XII; 30; 39, caput, 41; 173; e 247, da 
Constituição Federal, a possibilidade, ou não, de delegação do exercício do poder de polícia a pessoas jurídicas de 
direito privado integrantes da Administração Pública indireta para aplicação de multa de trânsito. 
21 O Laboratório de Regulação Econômica da UERJ requereu seu ingresso como amicus curiae e, em sua 
manifestação, sustenta a constitucionalidade da delegação do poder de polícia a sociedades empresárias estatais, 
inclusive em sua fase sancionatória, desde que observados determinados parâmetros. O UERJ Reg. entende que 
não há óbice constitucional à atribuição do exercício de poder de polícia a entidades estatais regidas pelo direito 
16 
 
desrespeitam as leis de trânsito. Vale lembrar que, em casos análogos, a Corte Superior 
entendeu ser ilícita a delegação do poder de polícia a particulares. 
 
2 ANÁLISE DE CASOS E A (IM)POSSIBILIDADE DE DELEGAÇÃO DO PODER DE 
POLÍCIA A PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PRIVADO 
 
2.1 ANÁLISE DE CASOS 
 
2.1.1 Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (TJ/RS) 
 
O caso em apreço abaixo colacionado, qual seja, Apelação Cível nº 700758546078, 
julgado em 2014, diz respeito à possibilidade de aplicação de multa de trânsito pela Empresa 
Pública de Transporte e Circulação S/A (EPTC), na cidade de Porto Alegre (RS). 
 
APELAÇÃO. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. MULTA DE 
TRÂNSITO. COMPETÊNCIA DA EPTC. A EPTC, muito embora tenha 
personalidade jurídica de direito privado, possui competência para fiscalizar, autuar e 
aplicar medidas administrativas em razão do cometimento de infrações de trânsito, 
investida que está no exercício de poder de polícia administrativa. Submetida a 
empresa às normas de direito público, uma vez que investida no exercício de polícia 
administrativa de trânsito, seus atos gozam de presunção de legitimidade, a qual não 
foi ilidida por provas que demonstrem que o autor não dirigia utilizando o telefone 
celular. PROCEDIMENTO DE APLICAÇÃO DE PENALIDADE. 
NOTIFICAÇÕES DA AUTUAÇÃO E DA IMPOSIÇÃO DA PENALIDADE. 
DUPLA NOTIFICAÇÃO. PRESUNÇÃO DE LEGITIMIDADE DOS ATOS 
ADMINISTRATIVOS. A Resolução n. 149/2003 do CONTRAN consolidou a 
obrigatoriedade da concessão de defesa prévia ao condutor. A Notificação da 
Autuação de Infração de Trânsito deve ser necessariamente seguida do prazo de 
quinze dias para a apresentação de defesa antes da Notificação da Imposição de 
Penalidade. Procedimento legal que foi devidamente observado pela ré, não restando 
configurada ofensa à ampla defesa e ao devido processo legal. PRESUNÇÃO DE 
LEGITIMIDADE DOS ATOS ADMINISTRATIVOS NÃO INFIRMADA PELO 
CONTEXTO PROBATÓRIO. Caso em que o contexto probatório não infirmou a 
contento a presunção de legitimidade do ato administrativo impugnado. RECURSO 
A QUE SE NEGA SEGUIMENTO. 
 
Ao proferir o seu voto, a Desembargadora Relatora Denise Oliveira Cezar reconheceu 
a competência da EPTC para aplicar penalidade de trânsito. Desse modo, com base em 
precedentes da Corte, alegou que a empresa possui competência para fiscalizar, autuar e aplicar 
medidas administrativas em razão do cometimento de infrações de trânsito, uma vez que está 
 
privado (JOTA, 2018). Assim, a petição foi protocolada na data de 23 de maio de 2018, de modo que atualmente 
o caso se encontra concluso ao Relator Ministro Luiz Fux, e ainda não foi definitivamente julgado pelo Tribunal. 
17 
 
investida no exercício do poder de polícia administrativo, motivo pelo qual seus atos gozam de 
presunção de legitimidade. 
Portanto, nota-se que, em relação à EPTC, a jurisprudência majoritária do TJ/RS22, 
reconhece a possibilidade desta de autuar infrações e aplicar multas. 
Em contrapartida, incumbe chamar a atenção para o fato de que, em 2012, por ocasião 
da Apelação Cível nº 7004691581523, o Desembargador Relator Luiz Felipe Silveira Difini 
entendeu que a autuação por infração de trânsito é um ato de autoridade e, portanto, indelegável. 
Assim, aduziu que a instauração de procedimento administrativo, seu 
impulsionamento e julgamento de defesas/recursos a ele atinentes, inequivocamente, 
configuram típico exercício do poder de polícia que, como visto, é exclusivo da própria 
Administração Pública, por se tratarem de atos de autoridade. 
Nesse sentido, reconheceu a incompetência da EPTC no que concerne ao 
procedimento de autuação por infrações de trânsito cometidas no Município de Porto Alegre e, 
consequentemente, a nulidade do auto de infração. 
Nesse viés, importante ressaltar que a Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do 
Sul (DPE/RS), por meio do Núcleo de Defesa do Consumidor e de Tutelas Coletivas, ajuizou 
no ano de 2010, a Ação Civil Pública nº 11001444273 junto à 11ª da Vara da Fazenda da 
Comarca de Porto Alegre, a fim de suspender liminarmente os atos da empresa, as eventuais 
execuções decorrentes e a vedação de novas autuações. 
A DPE/RS fundamentou o pedido com base no desvio de competência por parte da 
EPTC, uma vez que a lei que a criou concede apenas o poder de fiscalização e não o de aplicar 
 
22 APELAÇÃO CÍVEL Nº 70030060859, SEGUNDA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, 
RELATOR: ARNO WERLANG, JULGADO EM 25/11/2009. APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO 
ESPECIFICADO. MULTA DE TRÂNSITO. EPTC. [...]. 1. Os Municípios estruturados para a execução das 
normas de trânsito, ainda que o façam através de empresas privadas, exercem competência delegada pela União 
de executar a fiscalização do trânsito, autuar e aplicar as medidas administrativas cabíveis por infração de 
circulação, estacionamento e para as previstas no Código Nacional de Trânsito. E o fazendo, atuam investido no 
exercício regular do poder de polícia, eminentemente de caráter público, regulado por normas jurídicas de direito 
público, e não do Direito Civil [...]. 
APELAÇÃO CÍVEL Nº 70026249235, VIGÉSIMA PRIMEIRA CÂMARACÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA 
DO RS, RELATOR: LISELENA SCHIFINO ROBLES RIBEIRO, JULGADO EM 24/09/2008. APELAÇÃO 
CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. INFRAÇÃO DE TRÂNSITO. [...] 4 - A EPTC, quando 
aplica multa pela prática de infrações de trânsito, desenvolve típica atividade pública, consistente no exercício do 
poder de polícia administrativa, submetendo-se ao regime jurídico-administrativo. 5 - Os empregados da EPTC, 
independentemente de serem estatutários ou celetistas, são servidores públicos e seus atos gozam de presunção de 
legitimidade, como todos os atos administrativos. 
23 APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. DIREITO ADMINISTRATIVO. MULTA 
DE TRÂNSITO. EPTC. EMPRESA PÚBLICA. PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO. 
COMPETÊNCIA. INVIABILIDADE DE DELEGAÇÃO DO EXERCÍCIO DO PODER DE POLÍCIA A 
PESSOA DE DIREITO PRIVADO, ESPECIFICAMENTE NO QUE TANGE AOS DENOMINADOS ATOS DE 
AUTORIDADE, NO CASO, AUTUAÇÃO, INSTAURAÇÃO DE PROCEDIMENTO E JULGAMENTO DE 
DEFESAS E/OU RECURSOS. 
18 
 
multas. Além disso, afirma a Defensoria que os empregados da EPTC não são servidores 
públicos municipais, mas sim trabalhadores da iniciativa privada. 
Nesse contexto, afirmou que o CTB exige que os agentes da autoridade de Trânsito 
sejam servidores civis estatutários ou celetistas. Dessa forma, embora os empregados da 
EPTC sejam celetistas, não são servidores públicos municipais. Por fim, aduziu a Defensoria, 
baseada nos quatro ciclos de poder de polícia, que a aplicação de multa é indelegável à pessoa 
jurídica de direito privado. 
Ressalta-se que a liminar foi indeferida pelo Juiz de Direito Maurício Alves Duarte da 
11ª Vara da Fazenda Pública da Capital – Foro Regional do Partenon -, haja vista que 
considerou que a medida poderia instituir o caos no trânsito da cidade. 
 
2.1.2 Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina (TJ/SC) 
 
A Apelação Cível em apreço, julgada em 2018, sob o nº 0005144-80.2009.8.24.0038, 
na cidade de Joinville, discutiu a possibilidade de a sociedade de economia mista, denominada 
Companhia de Desenvolvimento e Urbanização de Joinville – Conurb, atual Instituto de 
Trânsito e Transporte – Ittranm, autarquia municipal, de exercer a polícia administrativa, 
consoante se analisa a seguir: 
 
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA. MULTA DE TRÂNSITO. 
COMPETÊNCIA DA CONURB PARA LAVRAR AUTO DE INFRAÇÃO. 
MATÉRIA DEFINIDA PELO GRUPO DE CÂMARAS DE DIREITO PÚBLICO 
EM COMPOSIÇÃO DE DIVERGÊNCIA (ART. 555, § 1º, DO CPC/1973). 
LEGALIDADE DO AUTO DE INFRAÇÃO [...] 
 
O Desembargador Relator Jorge Luiz de Borba se utilizou do julgamento da Apelação 
Cível nº 2010.066827-4, de relatoria do Desembargador Paulo Henrique Moritz Martins da 
Silva, para reiterar que o presidente da Conurb, atual Ittran, é autoridade competente para lavrar 
autos de infração de trânsito. A fim de justificar o voto, colacionou a decisão supracitada, haja 
vista que entendeu que a questão foi muito bem analisada pelo Desembargador Paulo. 
Desse modo, a aludida decisão referiu que o Departamento Nacional de Trânsito 
declarou o Município de Joinville integrado ao Sistema Nacional de Trânsito através da Conurb. 
Por sua vez, essa companhia concedeu à Cartão Jaraguá a implantação, operação, manutenção 
e gerenciamento do sistema de estacionamento rotativo. Isso significa que os orientadores do 
sistema rotativo são funcionários da empresa Cartão Jaraguá e credenciados pelo Presidente da 
Conurb, de modo que lhes incumbe a tarefa de constatar a infração. 
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91797/c%C3%B3digo-de-tr%C3%A2nsito-brasileiro-lei-9503-97
19 
 
Também, a Lei Municipal nº 3921/1999 de Joinville atribuiu à sociedade de economia 
mista (CONURB) a competência para gerir o trânsito municipal, sendo o Presidente da 
companhia responsável pela lavratura de autos de infração, na condição de autoridade de 
trânsito do Município. 
Além do mais, apesar da competência para gerenciamento do trânsito ser atribuída à 
Conurb, o controle permaneceu com o Município, motivo pelo qual restou caracterizada a figura 
da descentralização, e não da concessão, já que os recursos aplicados continuavam a ter origem 
pública, o regime jurídico não se alterou e não se transferiu a prestação de serviço para órbita 
estranha à da Administração Pública. 
Por fim, aduziu o Desembargador que não houve inovação na atuação da Conurb, mas 
apenas fiscalização do cumprimento de normas pré-estabelecidas e aplicação de penalidades 
(também previamente delimitadas) aos infratores, de modo que não ocorreram ilegalidades. 
Salienta-se que o caso relativo à Conurb se encontra pacificado no TJ/SC, através do 
Grupo de Câmaras de Direito Público, em composição de divergência. 
 
2.1.3 Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ/SP) 
 
O Acórdão colacionado, de nº 1041701-02.2016.8.26.0506, julgado em 2017, diz 
respeito à possibilidade legal da sociedade de economia mista – TRANSERP -, fiscalizar e 
aplicar multas por infração de trânsito, em razão de delegação feita pelo Município de 
Ribeirão Preto, conforme se observa a seguir: 
 
REPETIÇÃO DE INDÉBITO – TRANSERP – Pretensão de reconhecimento da 
inexigibilidade da multa de trânsito aplicada – Sentença procedência em parte – 
Pleito de reforma da sentença – Cabimento – PRELIMINAR – Cerceamento de 
defesa – Afastamento – Cabe ao magistrado avaliar a necessidade da produção de 
prova oral – Questão de direito – MÉRITO – Multa aplicada por sociedade de 
economia mista – Delegação do poder de polícia municipal quanto à fiscalização e 
autuação de trânsito, nos termos do art. 25 do CTB (Lei Federal nº 9.503, de 
23/09/1.997) – Possibilidade – A despeito da controvérsia do tema, existindo 
pendência de repercussão geral da matéria no STF – Ausência de vedação legal – 
Presença de grave risco de dano à ordem pública e de desrespeito à legislação de 
trânsito e à segurança das pessoas na hipótese de retirada da competência da 
empresa delegada – Necessidade de prevalência do interesse público [...]. 
 
Em seu voto, o Desembargador Relator Kleber Leyser de Aquino asseverou que a 
questão não é pacífica na jurisprudência, na medida em que está pendente o julgamento do 
caso BHTrans. 
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10624093/artigo-25-da-lei-n-9503-de-23-de-setembro-de-1997
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91797/c%C3%B3digo-de-tr%C3%A2nsito-brasileiro-lei-9503-97
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91797/c%C3%B3digo-de-tr%C3%A2nsito-brasileiro-lei-9503-97
20 
 
Apesar disso, com base em outros julgados24, deu provimento ao apelo da 
TRANSERP, no sentido de reconhecer a esta o direito de fiscalizar e impor multas, haja vista 
que não há qualquer vedação constitucional expressa para a delegação do poder de polícia 
municipal, no tocante à fiscalização de trânsito e respectiva autuação. 
Ademais, suscitou que tanto a Constituição Federal, em seu artigo 30, incisos I, II e 
V25, quanto o CTB, no artigo 24, incisos VI e IX26 e no artigo 25, dão azo para reconhecer o 
direito da empresa. Ressalta-se que o artigo 25 do CTB permite a delegação das atividades 
dos órgãos e entidades executivos do Sistema Nacional de Trânsito a outras empresas. 
Também, alegou que a TRANSERP foi criada pela Lei Municipal nº 3.734/1980 e a 
partir da Lei Complementar nº 998/2000, passou a ser entidade executiva de trânsito, a quem 
cabe a gerência do trânsito de Ribeirão Preto, em atendimento ao que preceitua o artigo 25 do 
CTB. Portanto, pode realizar autuações e processar as multas lavradas pelos policiais 
militares, pelos radares e pelos agentes de trânsito civis. 
Outrossim, afirmou que é necessário assegurar a prevalência do interesse público, 
afastando-se o concreto risco à ordem pública, à segurança do trânsito e das pessoas, a fim de 
se reconhecer como legal a delegabilidade do poder de polícia à TRANSERP.24 AGRAVO DE INSTRUMENTO ATO JUDICIAL IMPUGNADO DEFERIMENTO DE LIMINAR 
ANTECIPATÓRIA INFRAÇÕES DE TRÂNSITO Competência da TRANSERP Empresa de Trânsito e 
Transporte Urbano de Ribeirão Preto S/A para a lavratura dos autos de infração. Autuações lícitas. O Município 
tem competência para legislar sobre assuntos de interesse local e suplementar a legislação federal e estadual (CF, 
art. 30, I, II), o que autoriza a celebração de convênios ou credenciamentos em matéria de trânsito [...] (Agravo de 
Instrumento nº 2037373-12.2015.8.26.0000; Rel. Des. José Maria Câmara Junior; Comarca: Ribeirão Preto; Órgão 
julgador: 9ª Câm. de Direito Público; Data do julgamento: 25/03/2.015; Data de registro: 26/03/2015). 
AÇÃO ANULATÓRIA DE MULTA DE TRÂNSITO. MUNICÍPIO DE RIBEIRÃO PRETO - MULTAS 
APLICADAS POR SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA TRANSERP. Sentença de procedência do pedido. 
Alegação no sentido de que pessoa jurídica de direito privado não pode exercer poder de polícia. Inadmissibilidade. 
Pessoa jurídica controlada pelo Município e que tem a finalidade específica de fiscalizar, autuar e aplicar multas 
de trânsito. Sociedade de economia mista atuando como entidade executiva municipal de trânsito. Artigos 24, 
inciso VI, e 25, ambos do Código de Trânsito Brasileiro. Precedentes desta Corte. Recurso provido. (Apelação nº 
1016734-24.2015.8.26.0506; Rel. Des. Camargo Pereira; Comarca: Ribeirão Preto; Órgão julgador: 3ª Câm. de 
Direito Público; Data do julgamento: 29/03/2016). 
25 Art. 30. Compete aos Municípios: 
I - legislar sobre assuntos de interesse local; II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber; [...] 
V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse 
local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial; [...]. 
26 Art. 24. Compete aos órgãos e entidades executivos de trânsito dos Municípios, no âmbito de sua 
circunscrição: [...] VI - executar a fiscalização de trânsito, autuar e aplicar as medidas administrativas cabíveis, 
por infrações de circulação, estacionamento e parada previstas neste Código, no exercício regular do Poder de 
Polícia de Trânsito; [...] IX - fiscalizar o cumprimento da norma contida no art. 95, aplicando as penalidades e 
arrecadando as multas nele previstas; [...]. 
21 
 
Importante referir que há decisões no mesmo Tribunal em sentido contrário, como 
se observa no Agravo de Instrumento nº 2019491-37.2015.8.26.0000, julgado no ano de 2015, 
de relatoria do Desembargador Venício Salles.27 
Além do mais, a Apelação Cível nº 1031294-34.2016.8.26.0506, também relativa à 
empresa TRANSERP, julgada em 2018, reconheceu a impossibilidade da delegação do poder 
de polícia à empresa com capital privado: 
 
APELAÇÃO. MULTA. TRANSERP. PROCESSUAL CIVIL. Cerceamento de 
defesa. Inocorrência. Julgamento antecipado da lide. Admissibilidade. Inteligência do 
art. 355, I, do CPC. ADMINISTRATIVO. Multa aplicada por sociedade de economia 
mista (TRANSERP). Inadmissibilidade. Poder de polícia que não pode ser delegado 
à empresa com capital privado. Precedente do E. Superior Tribunal de Justiça (REsp 
817.534-MG). Infração registrada por radar eletrônico. Indiferença para fins de 
regularidade do ato, tendo em vista que o vício não está no agente autuador, mas na 
natureza jurídica da pessoa encarregada de aplicar a penalidade. Sentença de 
procedência mantida. Recurso de apelação não provido. 
 
A Desembargadora Relatora Heloísa Mimessi alega que a TRANSERP não possui 
competência para a imposição de multas. Dessa forma, aduz que não convém admitir que o 
poder de polícia seja exercido por sociedade de economia mista, ainda que com capital 
predominantemente público, como é o caso da TRANSERP. 
O entendimento da Relatora está calcado na teoria dos 4 ciclos de poder de polícia. 
Portanto, não é admissível a imposição de sanções decorrentes do poder de polícia por 
sociedade de economia mista, pela potencialidade de conflito entre o público e o privado. 
 
2.2 A (IM)POSSIBILIDADE DE DELEGAÇÃO DO PODER DE POLÍCIA A PESSOAS 
JURÍDICAS DE DIREITO PRIVADO 
 
Consoante já referido, a questão da possibilidade de delegação do poder de polícia a 
pessoas jurídicas de direito privado provocou uma série de ações protocoladas em Tribunais 
espalhados por todo o País, razão pela qual o STF reconheceu a repercussão geral da matéria. 
 Assim, a partir de todo o exposto na pesquisa, constata-se que a defesa absoluta da 
indelegabilidade a particulares reflete preceitos contrários às transformações sociais e a giros 
 
27 Segundo o Desembargador Venicio Salles, “realizar fiscalização do trânsito é tarefa típica do Poder Executivo, 
ou seja, atribuição restrita à Administração Direta. O atributo de poder de polícia é indelegável a entidade de direito 
privado. Observe-se que, da mesma forma como o Judiciário não pode delegar suas atribuições jurisdicionais e o 
Legislativo não pode transferir seu poder de legislar, o Executivo não pode conceder ou delegar suas atribuições 
típicas ou ínsitas. Apenas serviços públicos que não configurem exercício de “poder” podem ser objeto de 
concessão, delegação ou autorização. Destarte, a agravante não ostenta legitimidade para aplicar sanção pecuniária 
desta natureza [...]”. 
22 
 
democráticos, consubstanciados pela falência e ineficácia do monopólio estatal. Nesse viés, a 
Constituição Federal não impede que sejam implementadas alternativas a fim de se atingir os 
interesses públicos. 
Por outro lado, a defesa irrestrita da delegação do poder de polícia a pessoas jurídicas 
de direito privado acarretaria um desequilíbrio na relação entre particulares, tendo em vista que 
a busca pelo lucro obstaria a finalidade da função sancionatória e da busca exclusiva à harmonia 
da vida em sociedade. Além do mais, violaria prerrogativas próprias do Estado, como o poder 
de império28. 
Ainda, importante inferir que não é possível extrair da Constituição Federal qualquer 
conclusão no que tange a possibilidade ou a impossibilidade de delegação do poder de polícia 
a pessoas jurídicas de direito privado. 
No entanto, conforme BINENBOJM (2016, p. 262): 
 
[...] a ausência de dispositivo constitucional que vede ou que autorize, expressa ou 
tacitamente, o exercício do poder de polícia por entes privados não pode ser 
interpretada como vedação ou permissão genéricas à delegação. [...]. Há matérias que 
simplesmente não são reguladas pela Constituição, mas nem por isso se pode entender 
que tal silêncio seja eloquente. 
 
Dessa forma, salienta-se que o Estado não possui mecanismos suficientes para regular 
de maneira unilateral todas as atividades essenciais do poder de polícia administrativo, em razão 
complexidade e do dinamismo da vida em sociedade e das mudanças estruturais pelas quais as 
instituições passaram, sobretudo a partir da década de 90, em função da privatização e 
consequente descentralização29. 
Nesse contexto, esclarece BINENBOJM (2016, p. 265-266): 
 
28 Nesse contexto, preleciona KLEIN (2014, p. 17): “Apenas o próprio Estado pode impor coercitivamente deveres 
a particulares. A possibilidade de manifestação coercitiva e imperativa de polícia do Estado está vinculada à 
legitimidade do poder político e ao princípio da República. Trata-se de poder funcional, necessário ao atendimento 
dos interesses da coletividade, que, por isso, foi originariamente atribuído ao Estado” 
29 “Tal como constata Pedro Gonçalves, no direito comparado, a doutrina é minoritária quanto à tese que advoga 
a impossibilidade constitucional da delegação de poderes públicos à entidades particulares e a pessoas. V. 
GONÇALVES, Pedro António Pimenta da Costa. Entidades privadas com poderes públicos: o exercício de poderes 
públicos de autoridade por entidades privadas com funções administrativas. Coimbra: Almedina,2008, p. 933. Na 
Alemanha, por exemplo, o exercício de poderes públicos por entidades privadas encontra guarida constitucional, 
segundo sua doutrina majoritária, a partir do disposto no art. 33 da Constituição Alemã. Lá se descreve a existência 
do chamado “Beliehene” – entidade particular incumbida de executar tarefas públicas por meio de um 
“Beleihung”, que “adquiriu um estatuto autônomo no direito administrativo alemão, que nele reconhece uma figura 
sujeita a um regime especial, fundamentalmente marcado pela aplicação das regras de direito administrativo à 
execução das tarefas e das competências pública que lhe estão confiadas e às relações jurídicas que, nesse domínio, 
estabelece com terceiros”. V. GONÇALVES, Pedro António Pimenta da Costa. Ob. cit., p. 50. Já em Portugal, 
existe permissivo constitucional expresso estatuído no art. 267, item 6 da Constituição da República Portuguesa 
(“Artigo 267.º (…) 6. As entidades privadas que exerçam poderes públicos podem ser sujeitas, nos termos da lei, 
a fiscalização administrativa”). As controvérsias, portanto, resumem-se aos limites da delegação do poder de 
polícia. Cf. MOREIRA, Vital. Administração autónoma e associações públicas. Coimbra: Coimbra Editora, 2003, 
p. 545/546”. Apud BINENBOJM (2016, p. 263) 
23 
 
[...] o exercício de funções públicas não pode desconsiderar os custos que elas 
envolvem e as limitações impostas pela realidade concreta. Por vezes não será viável 
nem factível, material e tecnologicamente, a adoção de medidas de polícia diretamente 
pelo ente público. Outras vezes, essa possibilidade demandará custos tão acentuados 
(tanto financeiros como de pessoal) que, sob um exame simples de proporcionalidade, 
não será justificável. Ou poderá, ainda, levar a resultados opostos aos esperados 
(verdadeiros paradoxos), caso o poder público não detenha a capacidade institucional 
necessária para realizar as tarefas de polícia com eficiência. Nesses casos, o impulso 
pragmático aponta para a necessidade do reconhecimento da legitimidade de arranjos 
institucionais que permitam que o Poder Público se valha do auxílio de particulares, 
em maior ou menor grau, para o exercício de funções de ordenação da vida social e 
econômica. [...]. Isso não quer dizer que o Poder Público, na adoção desses modelos 
híbridos (modelos mais ou menos desestatizados), possa eximir-se do dever de buscar 
anteparos institucionais capazes de assegurar que os direitos fundamentais e as 
conquistas do Estado democrático de direito sejam assegurados e respeitados. Com 
efeito, afirmar que o Estado não detém o monopólio do exercício do poder de polícia 
não significa dizer que ele possa se demitir, de forma permanente e definitiva, do seu 
exercício quando o delegar a particulares. [...]. Em suma, mesmo quando permite que 
entes privados exerçam poderes de polícia, o Estado continua a ser titular do papel de 
ordenador, supervisor e indutor das ordenações exercidas, em maior ou menor grau, 
pelos particulares. Ao Estado sempre caberá policiar o exercício privado do poder de 
polícia, ou, em linguagem mais atual, regulá-lo e fiscalizá-lo, como meio de conciliar 
as exigências pragmáticas de um mundo complexo e fragmentário com as conquistas 
civilizatórias. 
 
Por conseguinte, a crescente complexidade das atividades de polícia exige que o 
Estado adote medidas céleres e eficazes, no intuito de se atingir o fim precípuo do interesse 
público. Para isso, os arranjos institucionais devem ser aprimorados e adaptados às mutações 
sociais e aos modelos institucionais, de modo que é necessário a superação do dogma da 
impossibilidade de delegação do poder de polícia a pessoas jurídicas de direito privado. 
À vista disso, a colaboração de particulares para o exercício do poder de polícia é 
imprescindível para uma eficaz resposta aos estímulos externos. Logo, há de se reconhecer que 
concentrar a prerrogativa do poder de polícia tão somente na figura do Estado é altamente 
custoso e ineficiente. 
Apesar disso, um dos principais elementos a ser sopesado quando envolver sociedades 
de economia mista é um potencial conflito entre os interesses privados da empresa – busca do 
lucro – e os interesses públicos, sob pena de desvio de finalidade ou de poder30. 
Também, frisa-se que há limites para a atuação dos particulares no exercício do poder 
de polícia, no sentido de que existem atividades que não podem deixar de ser desempenhadas 
diretamente pelo Estado, como por exemplo competências que envolvam manifestações 
 
30 Nas palavras de DI PIETRO (2017, p. 253) “[...] ocorre o desvio de poder quando o agente pratica o ato com 
inobservância do interesse público ou com objetivo diverso daquele previsto explícita ou implicitamente na lei. O 
agente desvia-se ou afasta-se da finalidade que deveria atingir para alcançar resultado diverso, não amparado pela 
lei”. 
24 
 
coercitivas do poder estatal, já que haveria violação ao princípio da isonomia e da soberania. 
Outrossim, deve-se sempre observar os direitos e garantias fundamentais. 
Assim sendo, deve-se analisar separadamente as atividades específicas que envolvem 
o poder de polícia para uma possível delegação a entes privados, de modo que limitar a matéria 
a um princípio geral de indelegabilidade significa dar azo à morosidade e a ineficiência do 
Estado no que tange às complexas atividades que envolvem o poder de polícia. 
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS 
 
No decorrer deste trabalho, foram apresentados conceitos, aspectos históricos, 
julgamentos de Tribunais, sendo esses indispensáveis para esclarecer a complexa questão 
acerca da (im)possibilidade de delegação do poder de polícia a pessoas jurídicas de direito 
privado. 
Desse modo, a partir do estudo proposto, verifica-se que o Estado não possui mais 
condições de concentrar em si todas as atividades relativas ao exercício do poder de polícia. As 
mudanças institucionais ocorridas, sobretudo na década de 90, exigem um Estado cada vez mais 
célere para que os interesses públicos sejam atendidos. Outrossim, a sociedade se reinventa a 
cada dia, motivo pelo qual as relações sociais se tornam cada vez mais complexas e exigem 
uma resposta eficaz do Estado frente às inúmeras demandas. 
Posto isso, observa-se que é ilógico monopolizar a prerrogativa do poder de polícia na 
figura do Estado no que tange a uma possível delegabilidade a pessoas jurídicas de direito 
privado, haja vista que esse demonstrou ser ineficaz para a resolução dos conflitos. Prova disso 
são as inúmeras ações ajuizadas nos Tribunais de Justiça, que divergem quanto a possibilidade 
de delegação, até mesmo internamente, motivo pelo qual resta configurada uma considerável 
insegurança jurídica. 
Como alternativa ao problema, alguns doutrinadores passaram a criar teorias no intuito 
de contribuir para a solução das divergências. A exemplo disso, tem-se o jurista Diogo de 
Figueiredo Moreira Neto, que, como exposto no decorrer do artigo, desenvolveu a teoria dos 
quatro ciclos de poder de polícia, a qual serviu de base para o julgamento do STJ relativo ao 
caso BHTrans. Destarte, é necessário superar o dogma de que o Estado, ao delegar a entidades 
privadas determinadas tarefas intrínsecas ao poder de polícia, abster-se-á de fiscalizar o correto 
cumprimento das tarefas a serem executadas pelos particulares. 
Ainda, conforme já exposto, imprescindível observar instrumentos que garantam a 
correta execução de determinados atos de poder de polícia por entes privados, como por 
25 
 
exemplo o respeito às garantias e direitos fundamentais. Ademais, empresas que, através do 
exercício de poder de polícia, visam tão somente interesses lucrativos, incorrem em desvio de 
finalidade, já que a supremacia do interesse público sobre o particular é um dos principais 
pilares que norteiam o poder de polícia administrativo. 
Desse modo, é inconcebível defender a ideia

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