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O Direito Internacional é dividido em duas vertentes: Público; Privado. O direito Internacional público, conhecido também e historicamente como direito das gentes, compreende o conjunto de regras e princípios internacionais destinados a reger os direitos e deveres, envolvendo Estados, organizações internacionais, coletividades não estatais e indivíduos. Por sua vez, o direito Internacional privado se preocupa com situações particulares, mas de conteúdo internacional, sendo utilizado para tratar da aplicação de leis civis, comerciais ou penais estrangeiras em relações privadas de caráter internacional. Muito embora uma grande parte de nossa sociedade não perceba, as características cotidianas atuais fazem com que o direito internacional privado tenha cada vez mais importância nas relações jurídicas das pessoas, isto em razão da globalização que, de forma marcante, causou a interação dos povos dos diversos países nas últimas décadas. Nesse cenário houve um aumento das relações individuais de caráter privado, sendo que estas, em muitas situações, passaram a contar com a participação de elementos estrangeiros. Quando essas interações ocorrem dentro das expectativas das partes envolvidas, não se observam maiores problemas; contudo, nunca podemos perder de vista que nas sociedades humanas os conflitos são inevitáveis, razão pela qual o sistema jurídico deve estar apto para resolver os litígios, inclusive quando envolvem elementos estrangeiros. Cada um dos atuais Estados Nacionais tem a sua própria história, fazendo com que tenhamos uma pluralidade de ordenamentos jurídicos que podem apresentar características extremamente distantes. Se não há uma uniformidade de tradições e costumes dos diferentes povos, não é uma grande surpresa que tenhamos regras e princípios diversos a reger as relações jurídicas. Quando as relações jurídicas se desenvolvem apenas com pessoas físicas e jurídicas de um único Estado e no território deste, haverá a incidência de regras internas; porém, se essas relações envolverem pessoas de diversas nacionalidades ou empresas situadas em outros países ou, ainda, se a pactuação for realizada no território de um país e a execução em outro – entre outras situações – podem ocorrer conflitos que, muitas vezes, serão objetos de processos judiciais em caráter internacional. Em situações como as acima mencionadas, certamente se formará um conflito de leis e de jurisdições, sendo que haverá a necessidade de se utilizar o direito internacional privado para indicar como devem ser resolvidos, ou seja, com a aplicação de normas jurídicas internas ou de normatização estrangeira. Diante desses conflitos, em regra, o direito internacional privado estabelecerá quais regras de direito interno devem ser utilizadas na solução do litígio. Entre várias possibilidades, as questões que envolvem a aplicação do Direito Internacional privado podem decorrer de situações como a representada pelo seguinte esquema: Neste caso, temos um Sujeito “A” vinculado à legislação do Estado 1 e um Sujeito “B” vinculado à legislação do Estado 2. Essa vinculação decorre, por exemplo, em razão da nacionalidade ou do domicílio desses sujeitos. Se esses sujeitos, “A” e “B”, estabelecerem uma relação jurídica no Estado 3 – por exemplo, um contrato – e deste decorrer um litígio pelo seu descumprimento, caberá ao Direito Internacional privado, por meio de suas regras e princípios, estabelecer se essa questão deverá ser apreciada com base na legislação interna do Estado 1, 2 ou 3. Será também esse ramo do Direito que estabelecerá, se houver a proposição de um processo judicial, a jurisdição competente para apreciar esse litígio – se pelo Estado 1, 2 ou 3. CONCEITO E OBJETIVO DO DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO Podemos definir o Direito Internacional privado como: “O ramo do direito público interno que indica o ordenamento jurídico aplicável às relações de direito privado que apresentem pontos de contato com ordenamentos de mais de um país” Tal definição ressalta uma série de importantes elementos de nossa disciplina que precisam ser mais detalhados: Esse ramo do Direito não trata de relações entre sujeitos de Direito Internacional – Estados e organizações internacionais –, mas de relações privadas de cunho internacional; As relações jurídicas de interesse do Direito Internacional privado devem ter por característica o contato com o ordenamento jurídico de mais de um país; Apesar de tratar de relações particulares, o Direito Internacional privado é um ramo do Direito Público interno, pois não trata diretamente dessas relações, mas sobre a definição da legislação e da jurisdição aplicadas na solução das questões que lhe são apresentadas. A diferenciação do Direito Público e do Direito Privado faz com que, entre outros aspectos, haja maior ou menor participação da vontade na formação e no desenvolvimento das relações jurídicas. No Direito Público, em geral, a participação da vontade é sempre restrita, enquanto no Direito Privado é, em regra, mais ampla. Há autores que não concordam com essa classificação do Direito Internacional privado como Direito Público. É o caso de Rechsteiner (2014), quem afirma se tratar de um Direito Privado; contudo, quando se refere a questões processuais, assume o caráter de Direito Público. Outro ponto que divide opiniões está no objeto de estudo desse ramo do Direito. Nesse particular, menciona Dolinger (2012, p. 19) que: Como vimos, o Direito Internacional privado deve ser considerado um sobredireito, pois tem como objetivo indicar o direito aplicável para a solução do litígio, sem, propriamente, incidir sobre a sua solução. Dessa forma, os objetivos mais relevantes dessa disciplina correspondem a resolver o conflito de: Leis; Jurisdições. O conflito de leis investiga as relações humanas ligadas a dois ou mais sistemas jurídicos cujas regras materiais não são concordantes, assim como o direito aplicável a uma ou diversas relações jurídicas de Direito Privado com conexão internacional. O conflito de jurisdições analisa a competência do Poder Judiciário – nacional ou de outro Estado – na solução de situações que envolvem pessoas, coisas ou interesses que extravasam o limite de uma soberania, observando o reconhecimento e a execução de sentenças proferidas no estrangeiro. Além dessas questões, como vimos, o Direito Internacional privado também tem como objetivos: Definir a nacionalidade; Estabelecer regras sobre a condição jurídica do estrangeiro. DENOMINAÇÃO DA DISCIPLINA A denominação de nossa disciplina foi cunhada por Joseph Story, nos Estados Unidos, em 1834, e utilizada como título de obra por Foleix, na França, em 1843, ganhando aceitação quase universal. Os anglo-americanos preferem a denominação “Conflict of Laws”, mais adequada, pois se refere ao principal objeto da Ciência (DOLINGER, 2012, p. 25). Essa denominação possui ampla aceitação em nosso país e no exterior, inclusive pela Hague Academy of International Law – Academia de Direito Internacional de Haia –, um dos A Disciplina não mais se restringe – como se sustentou outrora – a instituições do Direito Privado; atua igualmente no campo do Direito Público: questões fiscais, financeiras, monetário- cambiais, penais e administrativas assumem aspectos internacionais e exigem que se recorra a regras e princípios do Direito Internacional privado. Há várias concepções sobre o objeto do Direito Internacional privado. A mais ampla é a francesa, que entende abranger a Disciplina quatro matériasdistintas: a nacionalidade; a condição jurídica do estrangeiro; o conflito das leis e o conflito de jurisdições, havendo ainda uma corrente, liderada por Antoine Pillet, que adiciona como quinto tópico, os direitos adquiridos na sua dimensão internacional. principais centros de estudo em matéria jurídica internacional. Embora tenha essa ampla aceitação, a denominação de nossa disciplina sofre críticas dos vários autores que a essa se dedicam, sendo que podemos destacar a seguinte: Se as normas de Direito Internacional privado são editadas internamente por cada Estado, não seria indevido mencionar “Direito Internacional”? Há também alguns autores que contestam o seu caráter de ramo específico do Direito, pois seria apenas um conjunto de normas e princípios que objetivam solucionar o conflito de leis no espaço. FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO No Direito Internacional privado prevalece o estudo das fontes internas, que são a Constituição Federal, a Lei, a Doutrina, a jurisprudência, os princípios gerais do Direito e os costumes. Há também a incidência de tratados internacionais em que nosso país é um dos pactuantes. Vejamos brevemente essas fontes. CONSTITUIÇÃO FEDERAL Nossa atual Constituição Federal foi promulgada em 1988 e apresenta algumas disposições que se encaixam nos objetivos do Direito Internacional privado. Como exemplos dessas disposições temos as seguintes: Sobre a sucessão de bens estrangeiros situados em nosso país, se houver cônjuge ou filhos brasileiros: A sucessão de bens de estrangeiros situados no País será regulada pela lei brasileira em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, sempre que não lhes seja mais favorável a lei pessoal do “de cujus”; LEI É a fonte principal do Direito Internacional privado, sendo que em nosso país, as principais regras estão dispostas do artigo 7º ao 17 da Lei de introdução às normas do direito brasileiro. PRINCIPIOS GERAIS DO DIREITO São enunciados genéricos que orientam a compreensão e aplicação das normas jurídicas como, por exemplo, “ninguém pode se beneficiar da própria torpeza”; “quem causa prejuízo a outrem deve indenizá-lo”. DOUTRINA Tem particular importância no Direito Internacional privado, afinal, interpreta as decisões judiciais em matéria de direito internacional privado, e com base nas mesmas elabora princípios da matéria; por outro lado, a doutrina serve de orientação para os tribunais, que, muito mais do que nas outras áreas, recorrem à lição dos doutrinadores para decidir questões de direito internacional privado. JURISPRUDÊNCIA É uma fonte de extrema importância, pois a reiteração de interpretações dadas pelos tribunais indica, em situações fáticas, a forma como, em geral, determinadas questões específicas da disciplina são resolvidas. COSTUMES Correspondem a uma importante fonte do Direito Internacional privado, sendo caracterizados pela presença de dois elementos: Objetivo – o costume se estabelece pela prática reiterada de determinada conduta; Subjetivo – é a convicção da obrigatoriedade dessa prática, pois é correta e deve ser respeitada. TRATADOS São acordos internacionais que materializam os interesses e objetivos dos entes participantes – Estados e organizações internacionais –, buscando a convergência de seus interesses e garantindo o equilíbrio nas relações internacionais. MÉTODO DO DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO A regra é que o direito de um país somente pode ser aplicado a fatos ocorridos no seu território. A isso chamamos de territorialidade. No entanto, há algumas situações em que o direito de um país pode ser aplicado para fatos havidos fora de seu território, no que chamamos de extraterritorialidade. Essas várias relações jurídicas podem gerar um conflito de leis que ocorre em razão de um elemento estrangeiro, chamado de elemento de conexão. Assim, o papel do direito internacional privado é o de estabelecer, em razão do elemento de conexão, regras e princípios para a aplicação do direito interno ou do direito estrangeiro – sendo este último caso decorrente da extraterritorialidade. Esse elemento de conexão, que está presente na relação jurídica, estabelece o contato entre a situação fática e a norma jurídica – de direito interno – que a regerá. O elemento de conexão pode ser de diversas naturezas, tais como elementos fáticos ou em razão das pessoas – físicas ou jurídicas – envolvidas. Devemos, contudo, destacar que a aplicação do Direito estrangeiro somente pode ocorrer quando autorizado pela própria lei interna, a qual chamamos de Lei do foro ou Lex fori. Cada país basicamente possui suas próprias normas de Direito Internacional privado, e, por tal razão, o juiz ao aplicar o direito, baseia-se em primeiro lugar na ordem jurídica interna. Se as normas de direito internacional privado indicarem o direito estrangeiro como aplicável, este não impõe ao juiz por força própria. A sua aplicação dependerá da vontade do legislador nacional e nunca do Estado estrangeiro. Dessa forma, cabe ao direito internacional privado, diante de determinada situação jurídica, estabelecer quando será aplicado o direito: Interno do país; Estrangeiro. Em razão das normas de direito internacional privado não incidirem diretamente na solução material do conflito que foi apresentado à jurisdição, mas apenas indicarem a lei a ser aplicada, dizemos que são normas indiretas. As regras de conexão do direito internacional privado, DIP apenas escolhem, dentre os sistemas jurídicos de alguma forma ligados à hipótese, qual deve ser aplicado. São normas instrumentais. O aplicador da Lei seguirá a regra de direito internacional privado como se fora uma seta indicativa do direito aplicável, e, neste procurará as normas jurídicas que regulam o caso sub judice. Dessa forma, aplicando-se as regras do Direito Internacional privado, temos as seguintes possibilidades: Se os estrangeiros forem domiciliados no Brasil → deve ser aplicada a Lei brasileira – no caso, o Artigo 8º do Código Civil; Se eles não forem domiciliados no Brasil → não deve ser aplicada a Lei brasileira, mas a Lei de domicílio de ambos – que pode ser a Lei holandesa ou a Lei de outro país – onde são domiciliados. Observe que esse critério – aplicação da Lei do domicílio – foi criado pela legislação brasileira, sendo que, em situações semelhantes, outros Estados estabelecem critérios diferentes, de modo que nesses casos é muito comum que a legislação determine que seja aplicada a Lei de nacionalidade da pessoa envolvida. CONFLITOS NO DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO Parte da doutrina entende que os conflitos de normas de direito internacional privado devem ser resolvidos da mesma forma como se resolvem os conflitos espaciais entre leis civis, comerciais, processuais etc. Isso ocorre em razão desses conflitos possuírem uma mesma natureza, afinal, no fundo e na realidade, tratam-se de conflitos entre as leis do foro e estrangeira. Dessa forma, as questões relacionadas a esses conflitos devem ser solucionadas com justiça e equidade, sem prevenções discriminatórias contra o direito estrangeiro. Ademais, tais conflitos no espaço decorrem de dois fatores: Diversidade legislativa, ou seja, cada sistema jurídico, autônomo e soberano dá tratamento diferente a aspectos sociais; Existência de uma sociedade transnacional que se caracteriza por proporcionar relações entre indivíduos vinculados a distintos sistemas jurídicos. Em regra, deve prevalecer o direito pátrio, sendo que a aplicação do direito estrangeiro somente pode ocorrer quando houver expressa determinação da legislação interna. Contudo,nos casos em que deve ser aplicado o direito estrangeiro, tal incidência deverá ser afastada quando se verificar que: Choca-se com a ordem pública, a soberania ou os bons costumes; Fica caracterizada a intenção dos envolvidos de fraudar a legislação interna. A fraude à Lei apresenta dois elementos distintos, um objetivo e outro subjetivo. O elemento objetivo se caracteriza com a prática de ato que, em razão das disposições das leis nacionais, não poderia ser realizado; já o elemento subjetivo se caracteriza pela intenção do agente de fugir da aplicação da lei que regularia a sua situação e, de forma deliberada, buscaria na lei estrangeira o devido amparo de sua pretensão.
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