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Revoluções Industriais e Ideias do Século XIX

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Aula 01
História Mundial p/ CACD (Diplomata)
Primeira Fase - Com Videoaulas -
Pós-Edital
Autores:
Diogo D'angelo, Pedro Henrique
Soares Santos
Aula 01
13 de Julho de 2020
 
 
 
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Sumário 
Revoluções Industriais .......................................................................................................................................... 3 
A Primeira revolução Industrial e o protagonismo inglês: ferro, carvão e lã .................................................. 3 
A Segunda Revolução Industrial: da locomotiva a vapor ao capitalismo organizado ................................... 5 
O liberalismo: a polissemia de um conceito ........................................................................................................ 8 
O liberalismo econômico e a Fisiocracia ......................................................................................................... 8 
Liberalismo político ....................................................................................................................................... 11 
A crítica ao Capitalismo organizado: socialistas, marxistas e anarquistas ....................................................... 13 
Os socialistas utópicos ................................................................................................................................... 13 
O marxismo de Karl Marx ............................................................................................................................ 19 
A terceira via: a Doutrina Social da Igreja Católica .................................................................................... 27 
Questões Comentadas ...................................................................................................................................... 29 
Lista de Questões .............................................................................................................................................. 41 
Gabarito ........................................................................................................................................................... 47 
 
 
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APRESENTAÇÃO 
Saudações caro aluno! 
É com muita satisfação que apresentamos mais uma de nossas aulas a você! Continuando nosso cronograma, 
apresentaremos agora nosso texto sobre as revoluções industriais e as ideias econômicas e políticas do 
século XIX: o liberalismo e o socialismo. 
A aula será organizada da seguinte forma: apresentaremos os principais desenvolvimentos das revoluções 
industriais e do capitalismo do século XIX, em seguida, abordarmos o liberalismo dos pontos de vista político 
e econômico para, então, avançarmos para as ideias de esquerda – socialismos, marxismo e anarquismo. 
Depois passaremos para a resolução de questões. 
Todo vapor à frente! 
 
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REVOLUÇÕES INDUSTRIAIS 
A Primeira revolução Industrial e o protagonismo inglês: ferro, carvão e lã 
Entre a segunda metade do século XVIII (a partir de aproximadamente 1760) e a primeira metade do século 
XIX, a produção manufatureira tradicional de tecidos (como o próprio nome diz, à base do trabalho 100% 
artesanal) foi radicalmente eclipsada, em poucos anos, por algo fundamentalmente mais inovador: o 
aparecimento de máquinas de tear mecânicas, permitindo que poucos tecelões fossem capazes de produzir 
linhos de alta qualidade. 
Particularmente importantes para o estopim dessas mudanças foram os industriais britânicos. Não por uma 
capacidade inventiva peculiar em relação a outros povos, visto que alguns desses, como os próprios 
franceses, segundo Eric Hobsbawm, possuíam tecnologias mais avançadas do que suas contemporâneas 
inglesas1. Nem ainda por uma cultura letrada avançada, uma vez que, igualmente, alguns de seus vizinhos 
continentais possuíam escolas e universidades de melhor qualidade do que aquelas encontradas em solo 
britânico. Por que, portanto, o protagonismo inglês? 
A resposta para este questionamento reside na história política da Inglaterra. Menos de um século antes do 
tear mecânico ou da primeira máquina à vapor ganharem vida em galpões improvisados das pequenas e 
pacatas cidades inglesas, a ilha britânica fora sacudida por ventos revolucionários. Entre 1640 e 1688 
desenrolou-se na Inglaterra um agitado contexto de guerras entre diferentes grupos políticos, sob pretextos 
e com objetivos claramente diversos, que levaram a uma nova e igualmente revolucionária forma de governo 
em sua última fase, conhecida como “Revolução Gloriosa” (1688-89): a monarquia parlamentar. Baseando-
se na premissa de que o monarca não poderia, sozinho, continuar a guiar o interesse público mediante a sua 
exclusiva vontade, pouco-a-pouco, ao longo do século XVII, o Parlamento inglês assumiu a liderança 
governamental, centrando-a em seus membros. Guilherme III, que ascendeu ao trono depois da Revolução 
Gloriosa, enterrou de vez o gérmen do absolutismo monárquico britânico ao assinar a Declaração de Direitos 
(Bill of Rights). 
Muitos dos envolvidos diretamente no estopim da Revolução Inglesa e na “vitória” do Parlamento estavam 
diretamente ligados aos setores historicamente denominados de “burguesias”2, em suma, banqueiros, 
capitães mercantes, donos de fábricas, produtores rurais da pequena nobreza (gentry) etc. Muitos de seus 
membros estiveram ligados aos puritanos, grupo religioso de base calvinista que primeiro se revoltou contra 
Carlos I no início do período revolucionário. Este é um ponto importante de se salientar, visto que serão 
essas mesmas burguesias as responsáveis pela condução, ao lado de uma nobreza em franca transformação, 
das novas políticas econômicas inglesas (e as principais interessadas na modernização da produção de itens 
em seu país). 
 
1 HOBSBAWM, Eric. J. A Era das Revoluções. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2009, pág, 38. 
2 A terminologia “burguesia” em referência aos setores diretamente ligados à produção industrial e concatenados com a 
liderança do sistema capitalista será aqui utilizado em concordância com parcela significante da historiografia tradicional de 
linha marxista, referencial para o certame. 
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O século XVIII será, conforme Hobsbawm, o século do fortalecimento de uma original consciência burguesa 
sobre a sociedade inglesa, transformando honra e terras, os maiores bens de outrora, em valores menores 
perante a ascensão do capital (dinheiro) e do lucro. Gerar lucro, portanto, tornou-se a nova meta dos ricos 
britânicos (ainda que a nobreza tradicional, ao menos em sua cultura e consciência, tenha permanecido 
avessa à excessiva valorização do lucro). Para se aumentar os lucros era necessário que, primeiramente, 
fosse expandida a produção. 
A expansão da produção se deu por meio de um processo violento conhecido como os Cercamentos que 
ocorreram do século XVI ao XVIII. Esse processo resultou no empobrecimento do campesinato que, buscando 
melhores condições de vida, saiu do campo e se dirigiu aos centros urbanos. Nesses locais, formaram uma 
massa de trabalhadores disponíveis para as manufaturas que estavam em plena fase de crescimento. 
O apogeu da indústria têxtil se daria durante a primeira metade do século XIX, graças à inserção da economia 
britânica ao redor do mundo mediante os conhecidos Tratado desiguais (dos quais tratamos no PDF de 
Neocolonialismo e Imperialismo) e por seu flagrante protagonismo diplomático sobre os interesses europeus 
após a queda de NapoleãoBonaparte e a definição do Concerto de Viena. Os ingleses, fosse por 
temperamento particular, fosse por necessidade pragmática, levavam em seus navios não somente caixas 
de tecidos e roupas manufaturadas, mas também os seus costumes, ideias e cultura. E seu capital! 
A partir de 1830, o movimento industrial iniciado pelos ingleses (e do qual permaneceria como líder até a 
Primeira Guerra Mundial) se expandiu para a Europa Continental e, atravessando o Atlântico, aportou nos 
Estados Unidos da América, território historicamente orgulhoso de sua cultura de liberdade econômica e 
protagonismo comercial, e ali prosperou. Na Europa, os principais focos de industrialização estiveram, assim 
como na Inglaterra, umbilicalmente ligados às zonas de extração de carvão (principal fonte de energia deste 
século) e de ferro (matéria-prima essencial para a produção de maquinário pesado) conhecidas. Dentre elas 
se destacaram o norte da França e o sul da Bélgica, na região do rio Sambre, que marca a fronteira destes 
dois países, e o vale do Ruhr, na então Confederação Germânica. Igualmente se desenvolveram, em 
decorrência da produção industrial daquelas regiões acima mencionadas, as grandes zonas portuárias 
europeias, como os portos de Hamburgo e Bremen (Alemanha), Roterdã (atual Holanda), Le Havre e 
Marselha (respectivamente localizados na Normandia e na Provença). 
 
 
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Figura 1. Tear Mecânico do Século XVIII 
Demonstra-se assim a dinamicidade da produção industrial e dos capitais dela decorrentes, pois para que 
uma indústria viesse à luz eram necessários larga quantidade de ferro e outras matérias-primas de 
construção e um enorme contingente de trabalhadores braçais. Outrossim, a produção per si de nada valia 
se não houvesse compradores, e o caminho percorrido por uma camisa de lã a partir das fábricas têxteis do 
Ruhr, Lódz (Polônia) ou Moscou (Rússia) rumo à casa de um nobre português, por exemplo, era longo e 
árduo, necessitando de vias de escoamento rápidas e eficientes até os portos europeus. Como sabemos, a 
necessidade anda de mãos dadas com a ciência, o que à época, e para esse problema em específico, significou 
o aparecimento da locomotiva a vapor e o estopim da Segunda Revolução Industrial. 
 
A Segunda Revolução Industrial: da locomotiva a vapor ao capitalismo organizado 
As primeiras locomotivas a vapor surgiram na Inglaterra já por volta de 1812. A lógica destas máquinas é 
bastante singela: um veículo atrelado a trilhos no chão movido por um motor a vapor, cuja energia é gerada 
a partir da queima de carvão. Tal simplicidade material foi o responsável pela abertura de portas para uma 
nova realidade industrial, ainda mais dinâmica e revolucionária do que a fase anterior. 
O caro estudante poderá se questionar sobre a validade desta afirmação, indagando-se de que modo uma 
locomotiva a vapor é de tal forma revolucionária. Explicamos: não entrando nas minúcias da engenhosidade 
envolvida em torno da criação do motor a vapor (o que por si só revolucionou a produção industrial), 
reflitamos que, para o funcionamento objetivo da locomotiva, far-se-iam necessários três fatores básicos, o 
trilho (pelo qual se move); a estação (o posto voltado à coleta de mercadorias e pessoas, bem como para o 
reabastecimento de carvão e para pequenos reparos) e, obviamente, a locomotiva (isto é, os vagões per se). 
A fabricação destes itens demandava a produção de vários itens, o que incentivou ainda mais a produção 
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industrial. A pré-fabricação demandaria, é claro, fábricas bem equipadas e mão-de-obra qualificada. 
Ademais, para garantir os custos da produção e os salários dos funcionários eram necessários capitais, que 
por sua vez viriam de centros bancários (como a City de Londres). Percebeu a quantidade de atividades 
envolvidas em torno da construção de uma simples estrada de ferro, cujo simples objetivo é o transporte de 
uma enorme locomotiva de um ponto A a um ponto B? Podemos resumir esse pensamento em um simples 
axioma: “Para onde fosse o trem, para lá seguiria o capital”. 
A expansão das linhas férreas por toda a Europa continental manteve ocupados, na clássica colocação da 
historiografia marxista, os bancos e os capitais industriais europeus, pelo menos entre 1830 e 1850. Neste 
contexto de rápido desenvolvimento industrial, a sociedade europeia, já há muito em transformação, 
encontrou o seu clímax. No curso de menos de um século, famílias inteiras de camponeses haviam buscado 
refúgio e sustento junto às fábricas surgidas nas cidades europeias. Pode-se entrever, diante de tal cenário, 
o inchaço urbano e a inadequação dos locais de habitação, em sua maioria sujos cortiços (geralmente 
grandes e velhos casarões abarrotados de famílias pobres) ou ainda (se houvesse sorte) vilarejos insalubres 
nos entornos das fábricas. 
 
Figura 2. Locomotiva a vapor 
A incapacidade de absorção das cidades face ao êxodo rural em movimento (algo que o Brasil somente 
conheceria a partir de 1950) foi acompanhada do despreparo de industriais e operários (a nova máscara do 
velho camponês) para lidar com esta nova realidade de trabalho. Em suas antigas terras, camponeses e 
familiares viviam conforme o tempo da natureza, acordando ao cantar do galo, ainda de madrugada, 
trabalhando junto às suas famílias até o pôr-do-sol, e depois se recolhendo com seus pares para o aconchego 
de seu lar, onde dormiriam ainda cedo, conforme a vida útil de suas velas e lamparinas. 
Contudo, nas fábricas, o tempo que comanda não é o da natureza, mas sim o do relógio mecânico. Leve-se 
em conta que, antes, a exposição solar (diferente em cada estação do ano europeu) era o indicativo do tempo 
a se trabalhar, porém, dentro de uma fábrica, “sempre é dia”. Não mais o sol indicará o ritmo de trabalho, 
mas sim o constante e infindável tique-taque do relógio. Assim, no auge da Revolução Industrial, era comum 
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um operário ou um minerador permanecer em seu posto de trabalho (sob péssimas condições) por até 16 
horas seguidas, de segunda à sábado. O aparecimento da luz elétrica no último quartel do XIX, a par dos 
magníficos avanços tecnológicos que inaugurou, apenas colaborou com este exaustivo ritmo de produção. 
Mas não podemos observar a história sob uma luneta monocromática, pois cabe lembrar que também para 
os industriais (patrões e chefes) tratava-se de uma realidade completamente nova. 
Cidades mal planejadas e inchadas; serviços públicos precários e/ou inexistentes; ritmos de trabalho 
exaustivos, fatores que andaram lado-a-lado com o constante progresso material e científico, a ponto de se 
acreditar que a utopia da paz universal estava a se aproximar (cunhando-se assim, de forma auto referencial 
o termo Belle Époque – “Bela Época”) para esse contexto: impossível não pensarmos em Os Miseráveis de 
Victor Hugo; no Germinal de Émile Zola, no clássico do cinema mudo Tempos Modernos de autoria do genial 
Charles Chaplin, ou porque não até mesmo no Frankenstein de Mary Shelley, nas clássicas ficções de Júlio 
Verne, como Viagem ao Centro da Terra e Vinte Mil Léguas Submarinas, ou nos romances sociais de Jane 
Austen (Orgulho e Preconceito) ou, quem sabe, até mesmo o realismo artístico de Manet e Courbet ou o 
realismo em O Cortiço de Aluísio de Azevedo. 
 
Figura 3. Operários europeus em meados do Século XIX 
O rápido avanço de capitais e o fortalecimento dos centros bancário europeus passaram a coordenar o ritmo 
dos aglomerados industriais do continente.Logo este pacto traria à luz um tipo diferente e quase autônomo 
de capitalismo: o financeiro. O esgotamento do mercado europeu, repleto de competição industrial, fez com 
que o capital financeiro europeu (em especial britânico, francês, holandês e alemão) buscasse novos rumos. 
A América se tornou o primeiro alvo, especialmente a partir da década de 1880, levando muitas de suas 
nações, a exemplo de Brasil, Argentina, Uruguai, Chile, Peru e Colômbia, dentre outros, a se inserirem 
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plenamente na lógica do capitalismo internacional, basicamente como exportadores de matérias-primas 
(carne, café, alimentos, etc) e importadores de itens industriais europeus. Mais tarde esta situação 
fomentaria o argumento dos nacional-desenvolvimentistas (com base nos estudos da Cepal no âmbito da 
ONU) de que essa “lógica perversa” supostamente imposta pelos europeus teria atrasado a industrialização 
dos países latino-americanos e, por consequência, retardado o desenvolvimento econômico da região 
(ignorando que este enriquecimento afetou positivamente, ainda que com óbvias nuances, todos os setores 
sociais envolvidos na produção das matérias-primas). 
O rápido desenvolvimento do capitalismo e os consequentes impactos por ele gerados sobre o espectro 
social foram objeto de estudo de diversos autores, tanto os defensores de suas benesses, quanto os ferozes 
críticos de seus impactos negativos. O desenvolvimento destas análises se deu de forma especial na segunda 
metade do XIX, graças ao avanço das ciências humanas, especialmente em torno da História, da Sociologia e 
da Economia. Vejamos algumas destas linhas de pensamento e reflexão do Capitalismo na próxima parte, 
das quais se destacam o liberalismo, os socialismos “utópicos”, o anarquismo e o marxismo. 
 
O LIBERALISMO: A POLISSEMIA DE UM CONCEITO 
A primeira questão sobre a qual devemos nos atentar sobre o conceito de “liberalismo” é que ele é 
polissêmico, isto é, possui muito significados e ramificações diferentes. Num primeiro nível, é necessário 
distinguir duas ramificações: pode-se falar de “liberalismo político” e de “liberalismo econômico”, ou seja, 
ideias políticas e ideias econômicas, que, embora ligadas por alguns aspectos em comum, têm diferenças 
entre elas e dentro delas. 
Vamos iniciar nosso aprofundamento a partir do liberalismo econômico e suas ramificações e 
posteriormente para o político. Fique atento, no entanto, para o fato de que os processos de 
desenvolvimento das ideias liberais são, por vezes, sincrônicos. 
 
O liberalismo econômico e a Fisiocracia 
No século XVIII, as análises sobre as economias dos países europeus se tornaram cada vez mais complexas e 
sistemáticas levando à construção de teorias relevantes para o século seguinte. Estas análises surgiram como 
respostas aos vários problemas dos diferentes Estados, resultando, portanto, em diversas interpretações. 
Programas de política econômica não eram novos. Antes esforços para sistematizar os problemas 
econômicos enfrentados pelos diferentes países europeus já haviam sido dispendidos. A diferença a partir 
do século XVIII era o número, o alcance e a conexão entre as áreas econômicas, resultando numa linha de 
pensamento organizada, em oposição à intuição empírica que caracterizava as políticas econômicas até 
aquele período histórico. 
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Por mais incrível que nos possa soar atualmente, estas ideias econômicas se derivaram dos campos de 
especulação filosófica, mais especificamente da teologia. Era parte do pensamento teológico a noção de que 
havia no mundo uma ordem natural que se autorregulava – a Providência divina. Esta ação da Providência 
era sempre vista como benigna – já que advinda dos céus – e que levaria ao bem dos homens. Da teologia, 
essa concepção de mundo migrou para a política e, por fim, para o mundo econômico – que até o século 
XVIII era quase inseparável do universo político. 
A noção de uma ordem natural que correlacionava todo o mundo era um poderoso estímulo para a 
investigação dos fenômenos físicos, sociais, políticos e econômicos, na medida em que realizar estas 
pesquisas seria conhecer mais e melhor a Providência divina e seus planos. Esta noção, somada às análises 
dos problemas particulares de cada país levou a trabalhos de generalização das atividades humanas, 
particularmente da economia. 
Esse movimento intelectual ocorreu a muitas pessoas no mesmo momento histórico. Uma linha mestra que 
guiava a todos neste aspecto era o de que os vários fenômenos econômicos eram relacionados e que as 
decisões tomadas pelos indivíduos tendiam a estabelecer padrões. A ênfase, no entanto, nesta 
autorregulação e como ela ocorria variou conforme os pensadores. 
Os pensadores mais sistemáticos e os únicos a formarem uma escola de pensamento no século XVIII foram 
os fisiocratas franceses. A Fisiocracia foi uma linha de pensamento que propunha que a agricultura seria a 
única área da economia que realmente criava riquezas. Partindo das considerações que fizemos acima, 
acreditavam que, caso as produções fossem deixadas por conta própria, elas tenderiam a crescer sempre – 
laissez faire, laissez passer, le monde va de lui-même,3 frase síntese do movimento. Os fisiocratas chegaram 
em suas formulações teóricas a partir da análise de dois problemas práticos da França: a agricultura 
estagnada e o problema fiscal da Coroa, que estavam correlacionados. Na França a agricultura era a única 
atividade financeira capaz de produzir uma receita líquida, isto é, uma receita que superava os custos de 
produção. Daí provinha a defesa apaixonada, pelos fisiocratas, de uma agricultura de larga escala livre em 
vez de pequenas propriedades produtoras. Por esta razão igualmente, eles queriam o fim das restrições de 
movimentação de pessoal e de trabalhadores dentro do país – que ainda era restrita pela servidão em 
algumas partes do país. Livre movimentação permitiria mais braços para trabalhar onde fosse necessário. 
Vale lembrar que estamos falando de um momento histórico em que não havia máquinas nos campos para 
plantar ou colher a produção. Logo, grandes produções implicavam muitas pessoas trabalhando. 
Esses pensadores também se mostravam favoráveis ao fim dos privilégios fiscais dos nobres e do clero tanto 
quanto os monopólios das guildas. Os privilégios fiscais porque estes faziam com que as receitas do Estado 
fossem inadequadas para manter suas atividades, forçando-o a manter esses mesmos privilégios e 
monopólios para se refinanciar – num círculo econômico negativo. Os monopólios das guildas, por sua vez, 
impediam a livre movimentação e a competição que permitiria menores preços e produtos de maior 
qualidade. 
Adam Smith, por sua vez, analisava outras questões quando escreveu suas obras, afinal, estava imerso no 
contexto econômico escocês e inglês e, portanto, enfrentando várias outras problemáticas. Smith, como 
 
3 “Deixai fazer, deixar passar, o mundo caminha por si mesmo.” 
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filósofo moral, estava preocupado com a questão das virtudes e a construção de uma sociedade moral. Todas 
as suas obras tinham isso por objetivo quando as escreveu. Sua primeira, e que foi um sucesso logo depois 
de lançada, foi a “Teoria dos Sentimentos Morais”. Nela, ele compreendia uma série de processos 
intrapessoais e interpessoais que exortavam os leitores a uma atitude mais virtuosa, que levasse a uma 
autorreflexão de seu próprio comportamento em relação a si mesmo e aos demais. 
O objetivo de Smith nãoera diferente quando ele escreveu seu livro mais conhecido hoje, “A Riqueza das 
Nações”. Neste seu tratado sobre a produção de riquezas, ele faz uma série de afirmações que se tornariam 
cânon décadas depois para os defensores de um Estado pequeno e pouco interventor na economia e na 
sociedade. Para Smith, o Estado deveria ater-se às atividades da economia que não despertavam a vontade 
dos indivíduos de investir e sobre aquelas vitais para a sociedade, a justiça e a segurança em particular. Todo 
o resto deveria ser liberalizado para ação dos indivíduos. Isto é, os monopólios existentes deveriam ser 
liquidados e a competição deveriam dar o tom das práticas econômicas. 
 
Figura 4. Adam Smith 
Mas o que isso tem a ver com a construção de uma sociedade mais virtuosa? Para Smith, os monopólios 
davam a alguns poucos um poder exagerado sobre grupos muito grandes. Para ser bem específico, e que era 
uma das maiores preocupações dele quando escreveu sua obra: a restrição e o monopólio sobre a 
importação de grãos, que prejudicava seriamente os mais pobres. Na medida em que o dono do monopólio 
poderia estabelecer arbitrariamente seus preços, ele tinha em suas mãos o destino de muitas pessoas. Para 
Smith isto permitia muito facilmente a corrupção das virtudes, ou seja, a produção de vícios, que causava 
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malefícios ao conjunto da sociedade. A competição, por sua vez, levava a uma diminuição dos preços dos 
produtos, melhorando a vida dos mais pobres.4 
Estes pensamentos foram desdobrados em outras regiões, conforme as problemáticas específicas, como foi 
o caso espanhol e italiano. Uma região que permaneceu mais ligado ao pensamento mercantilista foi a 
Alemanha, cujos principados mantiveram as políticas protecionistas e de incentivo às produções 
manufatureiras por mais tempo – um conjunto de ideias econômicas conhecido como Cameralismo. 
Em suma, caro aluno, as ideias “liberais” da economia surgiram num contexto de questionamento das bases 
do Antigo Regime. Analisando as situações de cada um de seus países, os diversos intelectuais do período 
alcançaram respostas próximas que, em geral, abalavam a base econômica do Antigo Regime – o 
protecionismo mercantilista com seus monopólios. Suas respostas para os problemas eram: acabar com os 
monopólios de produção e de comercialização de bens; retirar o Estado das áreas não-essenciais da 
economia; incentivar a competição; diminuir os impostos de importação; acabar com os privilégios fiscais 
das castas sociais; racionalizar o fisco estatal. 
Estas ideias não seriam imediatamente aceitas e postas em prática pelos governantes. Progressivamente, 
algumas dessas concepções seriam adotadas. Alguns dos liberais franceses chegaram ao poder durante o 
reinado de Luís XVI e tentariam implementar seu programa liberal, com pouco sucesso naquele momento 
histórico. Outras monarquias absolutas também realizariam algumas reformas pontuais antes da revolução 
francesa, que se intensificariam depois. 
Se percebeu, mencionamos que monarquias absolutas – ou seja, sistemas políticos não-liberais – adotaram 
algumas medidas da agenda liberal na economia. Então, podemos concluir, que as duas “faces” do 
liberalismo de que falamos antes podem existir separadamente – embora, nesse período, o liberalismo 
econômico acabaria, numa interpretação marxista da história, a implodir o edifício do Antigo Regime e a 
instaurar o liberalismo político. 
 Passemos agora para o liberalismo político, seus principais autores e seus princípios. 
Liberalismo político 
O conjunto de ideias políticas a que chamamos de “liberalismo político” surgiu de considerações de vários 
autores ao longo do tempo, formando “cânones” que seriam utilizados na prática das instituições no século 
XIX. 
O chamado “pai do liberalismo” foi John Locke. Ele viveu no século XVII e estava vivo quando da Revolução 
Gloriosa na Inglaterra. Seus principais textos foram reflexões sobre a natureza do governo civil, isto é, uma 
teoria do porquê do surgimento dos governos. Para ele, os governos vieram a surgir para guardar e proteger 
as propriedades dos indivíduos. Sendo assim, o Estado deveria ser responsável somente pela segurança dos 
 
4 SANTOS, P. H. S.. “Adam Smith e a sociedade comercial.” Em tempo de História (digital), v. 26, p. 25-37, 2015. 
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povos, evitando agir em qualquer outra área da sociedade. Isto implicava, limitar drasticamente os poderes 
dos soberanos, garantindo os direitos dos indivíduos e proprietários. 
 
Figura 5. John Locke 
 
Outro autor significativo para a criação desse core de ideias do liberalismo foi Montesquieu, filósofo 
iluminista francês. Sua ideia mais importante seria aquela da separação dos poderes, ou seja, de que os 
poderes do Estado – de executar, de legislar e de julgar – deveriam ser separados da figura do soberano que, 
na sua época, acumulava-os todos. Essa concepção dos poderes do Estado teria um imenso impacto sobre 
os países ocidentais depois da Revolução Francesa e seria, sem dúvida, uma das mais importantes e práticas 
noções sobre política. 
Em terceiro lugar, podemos ainda elencar as contribuições de Benjamin Constant para encorpar o ideário 
liberal. Para Constant, para além da divisão de poderes e da restrição da atuação do governo em relação aos 
indivíduos, os governos deveriam ser representativos, ou melhor, deveriam ser conduzidos por pessoas que 
representassem a população. Constant acreditava que o modelo de democracia direta tal qual criado na 
Grécia já não era possível pela dimensão dos países, a quantidade de pessoas/eleitores e pelas características 
mesmas das novas economias, que não permitiam uma dedicação exclusiva à política. Assim sendo, seria 
necessário que o povo – entendendo “povo” como aqueles que detinham os direitos políticos – elegesse um 
grupo de pessoas que pudesse representar a vontade nacional numa Assembleia e decidir sobre os processos 
políticos. Constant também ganha um papel importante na história de nosso país porque ele foi o criador do 
“Poder Moderador” no qual seria inspirado o quarto poder de nossa Constituição imperial de 1824. 
O liberalismo também seria estreitamente ligado ao constitucionalismo, isto é, à ideia de que ser “liberal” 
era defender uma constituição escrita para seu país. O porquê de se defender uma constituição relacionava-
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se à ideia de que com a constituição – a lei maior – se estabeleceriam as divisões dos poderes e as relações 
entre o Estado e os indivíduos, marcando os direitos civis e políticos destes últimos, os quais o Estado não 
poderia retirar. Um grande impulso para a criação de constituições e eleições para os parlamentos seria dada 
com a Revolução Francesa. 
Em suma, o liberalismo político refere-se a um conjunto de ideias que defendia (1) as garantias e direitos dos 
indivíduos contra a ação do Estado, (2) constituições escritas, (3) representação política, (4) divisão dos 
poderes. 
A CRÍTICA AO CAPITALISMO ORGANIZADO: SOCIALISTAS, MARXISTAS E 
ANARQUISTAS 
Os socialistas utópicos 
Assim como observamos no caso do Liberalismo, também o termo “socialismo” está carregado de 
polissemias e nuances internas. Isto, aliás, decorre de uma peculiaridade própria da segunda metade do 
século XIX: a vocação pelos “-ismos” e pela padronização cartesiana dos mais ínfimos aspectos da vida em 
sociedade, sendo, não por um acaso, o contexto do despertar das chamadas “ciências sociais”, dentre as 
quais se destaca a Sociologia,a mais proeminente das áreas de conhecimento a se debruçar sobre o estudo 
das ideias socialistas. 
Mas ao historiador não cabe apenas a busca pela ideia, mas também pelo seu contexto, isto é, pelo seu 
encaixe em um espaço temporal próprio. Conforme já vimos, as Revoluções Industriais tiveram grande 
impacto sobre o meio social europeu, especialmente após 1815 e o desenvolvimento do capitalismo 
industrial nas regiões continentais, tendo por modelo o que já estava se sucedendo havia um século no Reino 
Unido. 
Tal como ocorrera na Inglaterra, também no restante da Europa houve o crescimento dos grandes centros 
urbanos, por consequência das migrações maciças de camponeses oriundos das regiões rurais em busca de 
empregos e melhores condições de vida nos centros industriais. A forjadura desse mundo industrial esteve 
umbilicalmente ligada ao que posteriormente seria estudado como o período de hegemonia das “burguesias 
nacionais”. Sua influência foi ainda mais marcante na Europa continental, uma vez que, ao contrário da 
pragmática relação de interesses entre aristocracia rural e burguesias mercantis ocorrida na Inglaterra pós-
Revolução Gloriosa, ali pouco caso fez os setores aristocráticos tradicionais da perspectiva burguesa de 
economia e política. Não obstante, fosse por meios revolucionários (a exemplo da Revolução Francesa) fosse 
a partir de reformas políticas, o século XIX pertenceu não mais à velha classe dominante aristocrática rural, 
mas sim a uma nova e pujante classe burguesa. 
O desenrolar de um novo ethos “burguês” na Europa do século XIX foi possível não somente pelo 
apossamento das economias dos grandes Estados-nações europeus, mas principalmente pelo crescente 
ganho de poder político verificado entre membros das burguesias ao longo deste século. Isto posto, os 
pressupostos ideológicos que levaram ao enfraquecimento da velha classe aristocrática face aos seus 
sucessores entre o fim do século XVIII e a primeira metade do XIX logo se tornaram a regra do jogo. Podemos 
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enumerar alguns destes pressupostos, que, ainda que parte da consciência política dos europeus desde ao 
menos a Idade Média, somente agora se consolidariam à nível de políticas públicas: a defesa da propriedade 
privada (não somente à nível de terras, como também à nível de consciência e liberdades individuais), de 
uma economia alheia às regulações dos governantes, de uma sociedade regida pelo ideal liberal de um 
“império das Leis”, pela divisão do trabalho com base na produção, comércio e lucro, dentre outros. 
Foi neste contexto de forte industrialização e estopim da consciência burguesa de mundo que surgiu, 
sobretudo em torno do eixo França-Reino Unido, uma série de ideologias de fundo social que se 
autodenominaram “socialistas”. Segundo Bobbio: 
Em geral, o Socialismo tem sido historicamente definido como programa político das 
classes trabalhadoras que se foram formando durante a Revolução Industrial. A base 
comum das múltiplas variantes do Socialismo pode ser identificada na transformação do 
ordenamento jurídico e econômico fundado na propriedade privada dos meios de 
produção e troca, numa organização social na qual: a) o direito de propriedade seja 
fortemente limitado; b) os principais recursos econômicos estejam sob o controle das 
classes trabalhadoras; c) a sua gestão tenha por objetivo promover a igualdade social (e 
não somente jurídica e política), através da intervenção dos poderes públicos.5 
Apesar de possuírem linhas de pensamento em geral (conforme apresentada na citação acima), a perspectiva 
acerca do papel a ser desempenhado pelos mais pobres no ganho de visibilidade e direitos e da própria 
noção que tinham de si próprios foi diferente ao longo do tempo. Basicamente, podemos considerar, afim 
de melhor compreender as diferenças de ideias e propósitos entre os diferentes ramos socialistas, dois 
períodos diferentes: o primeiro se refere ao contexto 1789-1848, momento compreendido entre o início da 
Revolução Francesa e o desenrolar da Primavera dos Povos, enquanto o segundo corte cronológico se refere 
à segunda metade do XIX. 
Durante o primeiro momento se desenvolveu na Europa aquilo que mais tarde seria conhecido como 
socialismo utópico, termo cunhado pelos alemães Karl Marx e Friedrich Engels em suas obras, que aliás 
deram suporte e vida à vertente socialista presente na segunda metade do XIX, o autodenominado 
socialismo científico. Engana-se quem por ventura pensar que se trata de uma diferença de cunho 
meramente semântico, posto que a cisão entre estes socialistas se refere a tópicos bastante profundos. 
Primeiramente, a visão acerca das conquistas sociais, encarada pelos utópicos como benesses a serem 
angariadas mediante reformas sociais pacíficas, enquanto que para os antagonistas científicos tratava-se de 
direitos a serem conquistados à força pelos trabalhadores, sem concessões para com as “burguesias 
dominantes”. 
A primeira vertente, utópica, do socialismo é deveras heterogênea (o que é um dos seus mais marcantes 
contrastes em relação aos socialistas científicos). Ali encontramos diversos autores, destacando-se Robert 
Owen, Saint-Simon, Charles Fourier, Louis Blanc, dentre outros. Robert Owen (1771-1858), o primeiro de 
nosso rol, foi um rico industrial galês do setor de tecidos, cujas origens humildes lhe providenciaram uma 
aguçada ação assistencial juntos aos operários de sua fábrica, localizada na região de New Lanark na Escócia 
 
5 Socialismo In BOBBIO, Norberto (org.) Dicionário de Política. v. 2. Brasília: Editora UnB, 2007, pp. 1196-1197. 
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(local que mais tarde se tornaria uma espécie de Meca para socialistas reformistas no final do XIX). Suas 
ideias foram prioritariamente testadas em sua própria fábrica. Indo na contramão das práticas vigentes entre 
industriais de toda a Europa, Owen tratou de diminuir a jornada de trabalho de seus operários para 10 horas 
diárias (face às costumeiras 12 a 16 horas de trabalho comuns à época), também construiu um bairro 
operário com boas condições de infraestrutura para atender às famílias de seus funcionários, onde se 
encontrava até mesmo uma escola primária. Suscitou a formação de uma cooperativa dentro da fábrica, que 
mediaria as negociações entre superiores e operários, que serviria não somente para propor programas em 
comum, como também (e este é o ponto crucial) a gestão comum dos meios de produção6. Por isto, Owen 
também é comumente conhecido como um dos primeiros cooperativistas europeus. 
Owen e seus seguidores foram os primeiros autores a utilizar o termo “socialismo” com a significação 
moderna, o que se exemplifica pelo opúsculo “O que é o Socialismo”, por ele escrito e editado em 1841, que 
o tornaria um dos mais ferrenhos opositores do sistema capitalista regido sob a égide do individualismo 
liberal7 e da ética cristã. Seu pensamento, no entanto, não foi de todo original, pois do outro lado do Canal 
da Mancha um contemporâneo seu levaria a ideia de cooperativismo ao extremo. 
 
Figura 6. Robert Owen 
Trata-se do francês Charles Fourier (1772-1837), outro grande oponente do liberalismo e da economia 
capitalista. Tornou-se famoso pela criação dos utópicos falanstérios (ou falanges), unidades de produção 
 
6 Idem. 
7 Idem. 
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cooperativistas e autossuficientes, que serviriam ao mesmo tempo como lar e local de trabalho daqueles 
que ali viessem a residir. Para Fourier, assim como para Rousseau, o homem, sendo intrinsecamentebom, 
deveria vencer determinados obstáculos sociais de modo a conseguir alcançar suas plenas capacidades 
individuais. Fourier acreditava que estes obstáculos estavam cristalizados na forma capitalista de 
organização econômica, no individualismo egoístico e pela imposição de valores considerados “opressores” 
e “restritivos” por parte dos costumes cristãos (dentre eles a ideia de um matrimônio monogâmico, por ele 
desprezado). A resolução destes obstáculos se daria em locais afastados do meio social, onde homens e 
mulheres fossem capazes de autogerir suas próprias vidas e satisfazer, deste modo, suas paixões e vocações 
pessoais, sem os empecilhos inerentes à “hipócrita” sociedade cristã-ocidental burguesa de seu tempo. O 
fourienismo se espalhou pelo mundo por meio de imigrantes franceses adeptos de suas ideias, que levaram 
a experiência dos falanstérios para diversos países, incluso o próprio Brasil, onde se fundou, por volta de 
1841 o Falanstério de Saí em Santa Catarina. Não obstante, à exceção de alguns poucos casos relativamente 
exitosos nos Estados Unidos, nenhum dos falanstérios, nem as ideias de seu idealizador, alcançaram 
notoriedade com o passar dos anos. 
 
Figura 7. Charles Fourier 
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Figura 8. Um dos projetos de Falanstérios 
 
Outros franceses que se destacaram entre os utópicos foram Claude-Henri de Rouvroy, o Conde de Saint-
Simon (1760-1825) e Louis Blanc (1811-1882). Saint-Simon (como veio a ser conhecido pelos seus seguidores) 
destacou-se pela pouca “veia” socialista de suas ideias, se comparadas com aquelas dos autores anteriores. 
Em realidade, muito se discute na atualidade se é verdadeiramente justo incluí-lo no rol dos socialistas, visto 
que seus ideais mais se assemelhavam com os dos pais do liberalismo econômico (dentre eles Adam Smith, 
autor de cabeceira de Saint-Simon) do que com os de seus contemporâneos socialistas. Fato é, no entanto, 
que o Conde de Saint-Simon (título a que mais tarde renunciaria em prol de seus ideais) foi largamente 
estudado por socialistas de todo o XIX, incluso Marx e Engels, que analisaria o pensamento do francês com 
certas honrarias na obra A evolução do socialismo da utopia à ciência, de 18888. 
Saint-Simon acreditava que os pontos principais a serem levados em consideração na promoção de 
indivíduos e nas interações sociais seriam a meritocracia e a fraternidade. Pensava ser possível a construção 
de uma sociedade regida com base nestes princípios, o que ganhou contornos em sua ideia de classe 
industrial, isto é, um conjunto de pessoas ligadas à cadeia produtiva industrial (vista, aliás, com bons olhos 
pelo pensador) que, devido às suas capacidades de liderança e mérito, tornar-se-iam as lideranças naturais 
do corpo social. Assim, bons líderes industriais teriam por objetivo guiar toda a sociedade, especialmente os 
mais pobres, a um estado de prosperidade e progresso perpétuo, baseados nas benesses intrínsecas ao 
capitalismo. Ao Estado (entidade que tenderia a praticamente inexistir no futuro utópico de Saint-Simon) 
caberia tão somente garantir o interesse social das medidas propugnadas pela classe industrial e impedir a 
ação “parasitária” daqueles que colocassem em risco o bem comum. Perceba que, apesar do seu radical 
 
8 Idem, pág. 1198. 
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apoio aos pontos positivos da sociedade industrial, Saint-Simon não deixava de ressaltar que o fim último de 
toda a ação política e econômica deveria ser os mais pobres e desprovidos de direitos. 
 
Figura 9. Saint-Simon 
 
O último socialista pertencente ao ramo dos utópicos a ser abordado é o também francês Louis Blanc. Figura 
proeminente no meio político francês a partir de 1848, e contemporâneo dos socialistas científicos, Blanc 
idealizou a construção de associações profissionais operárias, divididas por ramos produtivos, financiadas 
pelo Estado. Teve a oportunidade de colocar o seu projeto em andamento durante a II República, surgida 
durante os tumultos revolucionários de 1848 que levaram à queda da Monarquia de Julho. Não obstante, 
tendo sido veementemente combatido por opositores, viu seu ideal de sociedade ser desfigurado quando 
fora relativamente posto em prática por poucos meses, e ser definitivamente derrotado com a ascensão de 
Napoleão III. 
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Figura 10. Louis Blanc 
 
O socialismo dito utópico se baseou largamente em ideais de emancipação social dos mais pobres, de 
igualdade de condições entre as diferentes classes sociais e, sobretudo, na busca pela concordância entre 
industriais e operários, que resultaria, fosse por meio de reformas pacíficas (como defendiam Owen, Saint-
Simon e Blanc), fosse a partir da criação de organizações fechadas regidas por regras próprias (como os 
falanstérios de Fourier), na consolidação de uma sociedade mais fraterna e justa. Note, entretanto, que a 
despeito de se tratarem de intelectuais que basearam suas ideias em fontes em comum, houve pouca 
homogeneidade entre os utópicos. 
A partir da década de 1840, o jovem filósofo e economista alemão Karl Marx buscou ampliar e refinar a crítica 
aos problemas sociais presentes na sociedade industrial de seu tempo, iniciada por seus predecessores. Não 
obstante, e apesar de render elogios às motivações daqueles intelectuais, Marx seria para sempre conhecido 
como o primeiro socialista a “comprovar cientificamente” as suas ideias e a tornar triunfante a perspectiva 
do dito socialismo científico na posteridade, afastando a realidade inerente às contradições internas do meio 
de produção capitalista das “fábulas utópicas” dos primeiros socialistas. 
O marxismo de Karl Marx 
 
O marxismo é comumente abordado como um sinônimo ou mesmo uma espécie de síntese do pensamento 
socialista. Refere-se aqui ao marxismo como a vertente política triunfante que levou a cabo, no primeiro 
quartel do século XX, uma interpretação bastante específica do pensamento de seu criador, Karl Marx, e de 
seu fiel escudeiro, o rico descendente de industriais Friedrich Engels. Antes, contudo, de adentrarmos os 
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aspectos do intricado pensamento de Marx e das nuances presentes em meio aos “marxismos”, 
apresentemos o personagem em questão. 
Karl Marx (1818-1883), nasceu na região da Prússia e ali desenvolveu os seus primeiros estudos em Direito, 
disciplina que mais tarde abandonaria em favor da Filosofia. Seus primeiros escritos significativos foram 
tratados de caráter interpretativo e revisório das obras de Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770-1831). Foi 
na Universidade de Berlim, durante a década de 1830, que Marx teve contato com a meticulosa dialética 
hegeliana. 
Hegel, no curso de sua vida intelectual, participara de intensos embates intelectuais com outros 
proeminentes filósofos alemães de seu tempo e concebera um sistema de pensamento fundamentalmente 
embasado na tradição idealista alemã. Sua abordagem filosófica primava pela busca do todo, isto é, pelo 
encontro de uma verdade universal. Esta verdade, para Hegel, se encontrava no transcurso da história. Pela 
história, o mundo assume formas diferentes, concebidas ao longo de um processo de transformações. Isto 
posto, é correto afirmar, portanto, que na base da dialética hegeliana se apresenta o pressuposto de uma 
universalidade da mudança, que se contrapõe a um tempo estático. Não obstante,algo faz com as rodas do 
mundo estejam em constante movimento, ao que Hegel apresenta como o Weltgeist (“Espírito do Mundo”). 
Compreendamos, da forma mais didática possível, o desencadeamento do Weltgeist para a filosofia 
hegeliana, para que assim possamos retornar às elucubrações acerca de seus usos dentro do pensamento 
marxiano. Primeiramente, é essencial conceber que, para Hegel, o “Espírito do Mundo” é a ideia máxima 
que serve de eixo para as mudanças do mundo ao longo da História. Assim, chegamos a uma parte crucial 
de seu pensamento: são as ideias, portanto, o conceito que nós homens fazemos da natureza, que concebem 
a universalidade do mundo. O espírito do mundo transcende o homem, porque pensa “através” deste, 
ganhando exterioridade e assumindo formas próprias, e deste modo impactando o mundo e transformando-
o. 
No entanto, a ideia é, ela mesma, o resultado de um encontro intercambiável entre o conceito subjetivo 
humano do mundo (sua consciência e seu espírito) e da natureza objetiva deste mundo (as leis da física e da 
matemática, por exemplo). Segundo Hegel, o conceito subjetivo nos leva, em um primeiro momento, a uma 
tese individual daquilo que nos circunda, o que se choca com a veracidade dos fatos objetivos, a antítese. O 
resultado desta intersecção gera a ideia (Logos), que por sua vez é a síntese, o devir de nosso intercâmbio 
com o mundo. Podemos resumir essa intricada teoria da seguinte forma: eu sinto o real para poder entende-
lo, e assim eu o transformo, por meio de minhas ideias. Essa constante (tese -> antítese -> síntese) é 
nomeada por Hegel como dialética, segundo ele a melhor forma de se compreender todas as coisas que 
compõem o universo, uma vez que estão sob a direção do Weltgeist, uma força inerentemente dialética. 
Marx, no entanto, ainda jovem se tornou um forte crítico da dialética hegeliana, conforme fora concebida 
originalmente. Sua principal crítica se devia ao papel das ideias no transcurso da história (e 
consequentemente ao protagonismo de um espírito universal que tudo direciona). Marx divisava que, ao 
contrário do que concebera Hegel em seu idealismo, não eram as ideias que moldavam e transformavam o 
mundo e o homem, mas sim as condições materiais de sobrevivência do homem. Assim, Marx não 
discordava da dialética per si, pois se tornou parte indissolúvel de sua teoria da história, mas sim à concepção 
hegeliana de que as ideias sobrepõem às condições materiais. Assim, defende, são as condições materiais 
que moldam os homens e suas ideias. 
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Marx fundiu, portanto, a dialética hegeliana (em seus aspectos estruturais) à filosofia materialista de Ludwig 
Feuerbach, outro importante filósofo, também de tradição hegeliana, que conhecera junto ao um grupo de 
jovens estudantes de esquerda em Berlim. Deste modo, passou a conceber que o mundo de fato se encontra 
em constante movimento graças ao constante choque de forças oposta que conferem dinamicidade ao curso 
da história. Todavia, este movimento não se explicava pela ação das ideias, mas sim da ação material dos 
sujeitos históricos, ou seja, todos nós humanos. Mais tarde, marxistas sob a influência de Engels se refeririam 
a este conceito inaugural do pensamento do jovem Marx como um materialismo dialético. 
 
Figura 11. Marx e Engels, respectivamente 
 
Tendo se tornado doutor em filosofia no ano de 1841, Marx se dirigiu para a cidade alemã de Colônia, onde 
passou a integrar a frente de um jornal ferozmente crítico ao governo prussiano. Suas críticas foram 
correspondidas a fogo e chumbo, levando Marx, junto a sua jovem esposa de família aristocrática, a se mudar 
para Paris em 1843, afim de fugir das autoridades prussianas. Ali continuou a sua carreira de redator, desta 
vez em um pequeno jornal franco-prussiano também crítico ao governo prussiano, o que lhe rendeu a 
expulsão de França, rumando então para a Bélgica. Antes, contudo, de se retirar (ou ser retirado) de Paris, 
Marx foi apresentado a Engels e entre eles surgiu uma forte amizade que atravessaria o século. Não obstante, 
foi Engels, que se encantara com a sagacidade de seu companheiro quanto aos escritos dos socialistas 
franceses (dos quais falamos no tópico anterior), quem finalizou o processo de conversão de Marx para o 
socialismo, após leva-lo a uma série de reuniões secretas de revolucionários socialistas parisienses. 
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Em Bruxelas, junto a Engels, Marx assistiu atônito ao rápido alastrar das brasas revolucionárias de 1848, e ali 
escreveu, em meio a um mundo revolto em pólvora e cinzas, o primeiro (e mais popular) de seus escritos 
revolucionários: o Manifesto do Partido Comunista (Manifest der Kommunistischen Partei), originalmente 
concebido como um panfleto de ideias sob a égide da Liga dos Comunistas, órgão criado por seus antigos 
camaradas de Colônia, considerado por muitos como a semente da qual germinaria a I Internacional 
Comunista mais tarde. Enquanto defendia em seu manifesto radicais transformações sociais nas nações 
industrializadas europeias, Marx abria o caminho para a defesa de uma futura ordem mundial de base 
proletária (o termo é aqui entendido como o operário urbano mantenedor, com base unicamente em seu 
salário, de uma “prole”). 
Apesar da publicação do Manifesto ser atualmente entendida por muitos como a concretização de um Marx 
comunista, na realidade não passara de apenas um ensaio inflamado (mas pouco “científico”, isto é, baseado 
em análises racionais da realidade objetiva). E ele compreendia essa realidade: era necessário esmiuçar o 
seu pensamento e sua crítica da realidade exploratória do sistema capitalista, caso contrário se 
transformaria, ao seu ver, em mais um utópico idealizador de uma ordem futura intangível e inalcançável. 
Fator importante para o amadurecimento de seu pensamento foi a expulsão que sofrera dos governos belga 
e prussiano (pois retornara brevemente para Colônia), o que acarretaria em seu exílio em Londres, que se 
tornaria a morada definitiva até a sua morte. 
Em Londres, além de publicar para o New York Tribune, Marx passou a conviver diariamente com os escritos 
dos renomados economistas clássicos britânicos, dedicando-se especialmente ao pensamento de David 
Ricardo e Adam Smith. De seus estudos e interpretações das ideias destes dois grandes pensadores, decorreu 
o papel primário da relação sujeito-trabalho no pensamento marxista, bem como tantas outras influências, 
tais como a concepção de valor, divisão social do trabalho e mais-valia. Compreendamos! 
Para Marx, conforme vimos, as ideias se submetem à realidade material dos homens (e não o contrário, 
como para Hegel). A relação do homem com o mundo, portanto, gera, como síntese, aquele que é o principal 
fio condutor de transformação do mundo e de auto realização do Homem: o trabalho (olha a dialética aqui 
pessoal!). O homem interage com o mundo a sua volta por meio de seus trabalhos, e deste modo, de forma 
dialética, compreende a natureza e nela se insere. Sendo o homem um ser essencialmente social, conclui-
se, portanto, que o trabalho é um ato social, e, assim, desenvolve-se em sociedade. Perceba, caro estudante, 
o que Marx quer nos falar aos berros: AS RELAÇÕES SOCIAIS ESTÃO INTERCONECTADAS COM AS RELAÇÕES 
DE PRODUÇÃO! 
Marx compreendera que, para entender as bases fundantes do capitalismo industrial, deveria transcender 
aos sistemas filosóficos (dos quais já apreendera o essencial) e recorrer aos estudos da história econômica 
do capitalismo e das relações de produção anteriores, visto que estes, como tudo no mundo, estão em 
constante movimento. Em seus longos estudos, dos quais sobressaíram importantes obras como“Crítica da 
Economia Política” e “O Capital”, Marx defendeu que, no transcurso do movimento histórico, as sociedades 
sempre estiveram ligadas a Modos de produção muito próprios de seu tempo, os quais, por força da dialética 
histórica, se viam, após um longo progresso, inexoravelmente determinados a serem superados, dadas as 
suas contradições internas, por novos modos de produção mais avançados. Mas cada modo de produção 
subsiste a partir da posse de determinados meios de produção que tornam possível a efetivação do trabalho 
e a produção e troca de mercadorias, das quais oriunda o lucro do proprietário destes meios. Logo, eis a lei 
máxima da teoria da história segundo a concepção marxista: cada Modo de produção é concebido com base 
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no controle por parte de uma classe dominante, controladora dos meios de produção que torna possível o 
trabalho humano, submetendo, deste modo, um grupo de indivíduos ao seu domínio, sendo esta a 
antagonista classe dominada. Todavia, é próprio do movimento histórico que o crescente antagonismo entre 
classe dominante e classe dominada (a contradição interna inerente a todos os meios de produção 
existentes) leve a uma síntese lógica: o surgimento de um novo modo de produção e de uma nova dialética 
entre dominadores-dominados. 
Para Marx, assim, é parte do motor da história que a classe dominante seja sempre superada, pois, conforme 
já afirmara no Manifesto do Partido Comunista “A história da humanidade é a história da luta de classes”. 
Assim chegamos, ao longo dos séculos, ao capitalismo. Em seus estudos históricos, percebeu que o modo de 
produção capitalista (sistema baseado em torno dos lucros crescentes gerados pela produção e acúmulo de 
capital) surgira a partir da primeira grande classe revolucionária da história: a própria burguesia. Mas esta 
burguesia, tendo derrotado a antiga nobreza feudal, tornou-se, no lugar daquela, a nova classe dominante, 
e assim gerou a sua antítese, o proletariado, o qual tem o seu trabalho explorado para que o burguês possa 
obter lucros crescentes. 
O que o proletariado deveria fazer para vencer a burguesia que lhe explorava? Eis a resposta de Marx: 
aguardar e se preparar! Aguardar que as contradições internas levassem à imediata superação do sistema 
capitalista e à tomada dos meios de produção pelos proletários, os quais, sendo a classe social definitiva e 
“verdadeiramente ciente” de seu papel histórico, não tomaria para si o papel de nova classe dominante, mas 
destruiria, de uma vez por todas, o sistema de classes sociais e socializaria, passado o primeiro momento de 
controle do Estado e expurgo da burguesia, os meios de produção a todos os indivíduos espalhados pelo 
globo. Portanto, segundo Marx, o socialismo não é somente uma ideia utópica saída das mentes de poucos 
intelectuais, regidos por pretensões próprias, mas sim a natural e definitiva forma de produção a ser imposta 
pelo próprio movimento da história. 
Marx não definiu exatamente o que ocorreria após a superação do capitalismo, mas registrou em “O capital” 
que, passada uma primeira fase de tomada de controle dos meios de produção pelo proletariado, 
denominada mais tarde como a ditadura do proletariado9, e de completa reorganização social, em um 
segundo momento haveria a “completa extinção da divisão de classes e da forma mercatória, todo o domínio 
político desapareceria na sansiomoniana “administração das coisas” e a repartição do produto social se 
realizaria segundo as necessidades”10. A primeira fase foi mais tarde denominada de sistema socialista, 
enquanto que a segunda e última fase foi denominada como a consolidação do sistema comunista. 
Após o relativo fracasso das revoltas de 1848 e a desintegração da Liga dos Comunistas de Colônia, bem 
como a perseguição de órgãos de polícia de países continentais aos grupos organizados de operários, uma 
nova estratégia passou a ser traçada pelos socialistas europeus. Cabe ressaltar que neste período o termo 
“Socialismo” se referia a uma série de vertentes internas. Na mesma medida, não podemos cair na confusão 
de considerar que o pensamento de Marx já se fazia preponderante neste período, uma vez que suas ideias 
 
9 Termo cunhado por Lênin. 
10 Idem, pág. 1198. 
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somente se tornariam a coluna vertebral da ortodoxia comunista a partir do triunfo de Lênin na Revolução 
Russa. 
Em resposta ao quase profético chamado de Marx em seu Manifesto de 1848 (“operários de todo o mundo, 
uni-vos!”) em 1864 surgiu, com sede em Londres, a “Associação internacional dos trabalhadores”, que ficaria 
conhecida mais tarde somente como a I Internacional. Essa associação marcou a história do movimento 
operário europeu, pois 1) rompeu as fronteiras nacionais e, ao menos no plano teórico, as fidelidades aos 
governos nacionais, sendo, desse modo, um movimento essencialmente internacionalizante, 2) reuniu sob 
um “mesmo teto” os principais nomes das diversas vertentes socialistas europeias, bem como de outros 
movimentos de caráter operário ainda não suficientemente adeptos do ideário socialista e 3) criou linhas 
gerais para a ação operária mundo afora (o que gerou, por consequência, as primeiras cisões dentro do 
movimento). 
A I Internacional durou apenas 8 anos, de 1864 a 1872, sendo realizados no período 5 congressos gerais, nos 
quais se debateram os objetivos a serem alcançados universalmente pelos trabalhadores. A liderança da 
Internacional, o Conselho Geral, era composto de figuras proeminentes, como o próprio Karl Marx. As 
principais vertentes que assumiram forma durante os congressos gerais foram os socialistas, subdivididos 
entre blanquistas; sansimonianos; lassalianos e marxistas (que se autodenominavam comunistas), além dos 
anarquistas proudhonianos e bakuninistas, sindicalistas reformistas democratas e radicais, dentre outros. 
Em seu auge, pouco antes de seu fim, a Internacional chegou a ter algo próximo de 150 mil membros filiados, 
espalhados pelos grandes centros industriais europeus (Inglaterra, França, Bélgica, norte da Espanha e 
Prússia) e também no nordeste industrializado estadunidense. 
Dentre os pontos de conciliação alcançados pela Internacional e aprovados em seus congressos destacam-
se o sentimento de solidariedade operária, a defesa do fim da propriedade privada e da coletivização dos 
parques industriais e das ferramentas úteis ao trabalho industrial (no vocabulário marxista, os meios de 
produção). No entanto, rixas pessoais e discordâncias doutrinárias elevaram o tom de cisma dentro da 
associação já em seu nascimento. É o caso das disputas intelectuais entre Karl Marx e Pierre-Joseph 
Proudhon. Deixe-me esclarecer, primeiramente, uma verdade factual essencial: Proudhon não participou da 
Internacional, pois faleceu no ano de sua inauguração, no entanto, as velhas rusgas entre ele e seu antigo 
amigo Marx vieram novamente à tona durante os Congressos da associação por meio dos seus seguidores. 
Na década de 1840, portanto antes mesmo da publicação do Manifesto do Partido Comunista e da guinada 
economicista de seu pensamento, Karl Marx participara de diversas discussões teóricas com Proudhon. Os 
dois chegaram a ser “camaradas” por um certo tempo, à época em que Marx residiu em Paris. Não obstante, 
com o tempo, as diferentes visões acerca da mudança da situação operária face à “exploração” capitalista 
os afastou. O principal ponto de discórdia, exposto por Proudhon em seu livro Sistemas de contradições 
econômicas ou Filosofia da Miséria de 1846, era relativo à forma com que o capitalismo deveria ser superado, 
se por meios individuais ou por meios revolucionários. Proudhon, em franca discordânciaà Marx (ao qual 
critica diretamente neste livro), defendia a via individual, pela qual, primeiramente, os indivíduos deveriam 
se libertar de qualquer forma de opressão (fosse econômica, espiritual ou cultural) mediante a auto 
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iluminação. Somente assim, de forma autônoma, os próprios indivíduos seriam capazes de se rebelar face 
ao sistema11. 
Proudhon foi o primeiro intelectual a assumir para si a alcunha de anarquista, termo por muitos encarado 
como algo pejorativo. Sua firme defesa do indivíduo em oposição às classes (algo tão caro para o pensamento 
de Marx) e, sobretudo, às organizações que visassem representa-los, posicionou-o entre duas fronteiras 
internas ao anarquismo do XIX: o anarquismo individualista e o comunista (representado pelos 
bakuninistas)12. Outrossim, separou-o definitivamente de qualquer possível laço ideológico que o unisse à 
tradição marxista. 
A resposta de Marx à provocativa obra de Proudhon veio um ano depois, em 1847, sob o nome de Miséria 
da Filosofia (uma ironia escancarada para com o título da obra de seu adversário). Neste livro, que 
permaneceu desconhecido até o seu renascimento sob a I Internacional, Marx criticou a visão utópica de 
Proudhon acerca do proletariado e desprezou o modelo de federações trabalhistas autônomas propostas 
por este. Por esse motivo, Marx e Engels engendrariam mais tarde Proudhon no rol dos socialistas utópicos 
(o que era negado por seus seguidores, no entanto). 
As rixas entre Marx e proudhonianos, com o acréscimo de Bakunin e seus seguidores bakuninistas 
(especialmente espanhóis adeptos do anarquismo coletivista, que permaneceu firme na tradição anarquista 
daquele país até o século XX) que desferiam críticas para ambos os lados, levou à definitiva cisão dos 
anarquistas como um todo para com a Internacional, que ao seu ver caminhava para a “via autoritária” de 
seus principais líderes, como o próprio Marx. Assim, com o expurgo dos anarquistas em 187213, a 
Internacional deixaria de existir por um longo período. 
Apenas em 1889, sob a iniciativa de Engels, marxistas e outros socialistas voltaram a se reunir em torno de 
uma Associação operária internacional, que ficou conhecida como a II Internacional. Viria a durar até 1916, 
quando, por pressão de suas “contradições internas”, sobretudo entre espartaquistas alemães, sob liderança 
de Rosa Luxemburgo, e leninistas, liderado pelo próprio Lênin. 
Além daquela rusga definitiva que definiria o fim da II Internacional durante a Grande Guerra, outras 
questões basilares cimentaram o curso das ações dos internacionalistas. Após a sua abertura, o primeiro 
grande ato da associação seria a proclamação, em 1º de maio daquele mesmo ano, do Dia Internacional dos 
Trabalhadores. Mas o clima de festa teria data contada. Vale recordar que, entre 1872 e 1889, os diferentes 
movimentos socialistas espalhados pelo continente (como os socialdemocratas alemães e os reformistas 
ingleses) continuaram a agir de forma autônoma com diferentes metas traçadas. 
Era essa questão que agitava a associação na virada do século. É digno de nota que, ao contrário da baixa 
popularidade de suas ideias na I Internacional, agora, sob clara influência de Engels, a II Internacional seguia 
um rumo claramente marxista, privilegiando o conceito de luta de classes e de revolução proletária como 
forma de obtenção do poder político. Não obstante, representantes contrários à via revolucionária, 
 
11 Anarquismo In Bobbio, Norberto (org.) Dicionário de Política, v. 1. Brasília: Ed. UnB, 2007, pág. 24. 
12 Idem. 
13 Os anarquistas, sob a liderança de Bakunin, formariam a sua própria associação, por eles nomeada como a Internacional 
de Saint-Imier, que durou de 1872 a 1877. 
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sobretudo ingleses, insistiam em outra meta a ser traçada pelo operariado. Em sua visão, o capitalismo pós-
1880 sofrera radicais transformações em relação àquele praticado entre 1850 e 1872. Acreditavam que o 
ganho de conquistas sociais na Inglaterra, por exemplo, somente fora possível graças à mobilização dos 
trabalhadores em torno da defesa de seus direitos por meios democráticos, sobretudo por meio da ação 
parlamentar. Portanto, defendiam a via reformista e o completo abandono do ideário revolucionário como 
melhor estratégia a ser tomada pelos trabalhadores. Para os marxistas, e em bom linguajar marxista, a 
proposta reformista dos trabalhistas ingleses significava ceder à burguesia e trair o movimento operário. O 
resultado para essa “traição” foi o abandono aos reformistas, que por sua vez, se auto alienaram da via 
marxista e passaram a integrar, de vez, a recém-criada Fabian Society (Sociedade Fabiana)14, cujas pilares 
teóricos estão resumidos na obra Fabian Essays in Socialism, publicado por George Shaw em 1889. 
Após a exclusão dos reformistas ingleses outra cisão ocorreu, uma que se mostraria muito mais dolorosa do 
que a primeira em relação ao futuro político alemão. A partir de 1904, ganharia forma nos congressos da II 
Internacional uma tendência “cinza” entre os tons de branco e preto de reformistas e marxistas. Essa 
tendência intermediária foi encabeçada pela maioria da socialdemocracia alemã, e foram considerados 
verdadeiros “traidores” pela ala ortodoxa da socialdemocracia alemã, encabeça por Rosa Luxemburgo15. 
Essa nova tendência “revisionista” pregava que uma revolução imediata seria impossível, devido à falta de 
recursos e de consciência de classe devidamente formadas entre os trabalhadores. 
No entanto (e isso os difere dos reformistas) continuavam a pregar a superação do Estado de Classes por 
meio de um rebento revolucionário, ainda que o momento exato para esse estouro revolucionário se daria 
com o passar do tempo, na medida em que os operários e suas lideranças conseguissem conquistar espaço 
na sociedade (e conquistar os meios necessários) a partir de representação partidária e de conquistas de 
direitos pelas vias liberal-democráticas. A defesa desta via “retardatária” enfureceu os marxistas mais 
ortodoxos, e abriu uma ferida que não viria a cicatrizar no futuro. Após o fim da II Internacional, em 1916, 
marxistas (agora entendidos como leninistas) e socialdemocratas (aqueles que haviam rachado com Rosa 
Luxemburgo durante a Grande Guerra) nunca mais voltariam a cooperar, o que se mostraria, anos mais 
tarde, fundamental para a ascensão do nazismo na década de 1930. 
A última rusga a ser averiguada em nosso estudo sobre a II Internacional se refere às divergências ideológicas 
entre Rosa Luxemburgo e Lênin. Ambos concordavam em linhas interpretativas gerais: havia um Estado de 
Classes liberal-burguês a ser superado mediante a ação revolucionária organizada dos proletários. No 
entanto, Luxemburgo defendia que a via revolucionária deveria subsistir em face das organizações de base 
dos proletários, na Rússia conhecidos como sovietes, e deveria surgir em momentos de aguda crise 
econômica do capitalismo industrial (onde as contradições internas preconizadas por Marx atingiriam o seu 
ápice). Por outro lado, Lênin defendia que toda a ação dos sovietes e demais organismos de classes operários 
deveriam se submeter à suprema liderança de um Partido geral e de seu comitê, composto de 
“revolucionários em tempo integral” que seriam capazes de se dedicar exclusivamente à revolução 
comunista. Assim, Lênin, ao contrário de Luxemburgo, defendia que a Revolução somente seria possível sob 
a liderança de uma vanguarda revolucionária. 
 
14 O fabianismo ainda consiste em doutrina socialista majoritária sobretudo entre os trabalhistas históricos britânicos. Alguns 
de seus mais proeminentes membros foram H.G. Wells, Leonard Woolf, VirginiaWoolf e Bertrand Russell. 
15 BOBBIO, v.2, Idem, pág. 1200. 
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Essa cisão atingiu a sua máxima forma após 1917, quando, por ventura da exitosa revolução armada levada 
à cabo por Lênin e seus bolcheviques contra o regime czarista russo, a teoria leninista passaria a imperar 
sobre a visão de Luxemburgo (que por sua vez, seria derrotada e morta durante uma fracassada tentativa 
revolucionária na Alemanha em 1919). Assim, o leninismo seria pouco-a-pouco elevado ao nível de ortodoxia 
dogmática dos Partidos Comunistas, especialmente após a ascensão de Stálin na União Soviética e definição 
das doutrinas centrais do chamado “marxismo-leninismo”. 
A terceira via: a Doutrina Social da Igreja Católica 
 
A segunda metade do século XIX observou a ascensão da radical oposição ideológica entre adeptos do 
liberalismo, tendentes ao apoio às classes industriais e à sociedade capitalista, e as levas de operários que 
buscaram em sindicatos anarquistas e associações operárias de cunho socialista o amparo social de que 
necessitavam. Mais do que isto, se utilizarmos um termo essencialmente marxista, perceberemos que a 
divisão de classe estava próxima do limite. 
Diante deste cenário, a Igreja Católica decidiu fazer ecoar a sua visão, com base nos evangelhos e em sua 
Tradição e Magistério, acerca da crise social galopante no continente europeu, que levava cada vez mais 
pessoas para o apoio às doutrinas revolucionárias. A primeira grande manifestação da Igreja neste sentido 
se deu por meio da publicação da encíclica Rerum Novarum (“Das Coisas Novas”), escrita pelo Papa Leão XIII 
e publicada em 15 de maio de 1891. 
Nesta encíclica, o papa definiu as bases para a Doutrina Social da Igreja e defendeu as reivindicações dos 
operários desprovidos de direitos básicos frente ao sistema capitalista. Leão XIII resume a perspectiva da 
Igreja sobre a situação então vigente: 
é necessário, com medidas prontas e eficazes, vir em auxílio dos homens das classes 
inferiores, atendendo a que eles estão, pela maior parte, numa situação de infortúnio e de 
miséria imerecida. O século passado destruiu, sem as substituir por coisa alguma, as 
corporações antigas, que eram para eles uma protecção; os princípios e o sentimento 
religioso desapareceram das leis e das instituições públicas, e assim, pouco a pouco, os 
trabalhadores, isolados e sem defesa, têm-se visto, com o decorrer do tempo, entregues à 
mercê de senhores desumanos e à cobiça duma concorrência desenfreada. A usura voraz 
veio agravar ainda mais o mal. Condenada muitas vezes pelo julgamento da Igreja, não tem 
deixado de ser praticada sob outra forma por homens ávidos de ganância, e de insaciável 
ambição. A tudo isto deve acrescentar-se o monopólio do trabalho e dos papéis de crédito, 
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que se tornaram o quinhão dum pequeno número de ricos e de opulentos, que impõem 
assim um jugo quase servil à imensa multidão dos proletários.16 
A voraz crítica lançada pelo Sumo Pontífice à “usura” dos “homens ávidos de ganância” (claramente os 
grandes capitalistas de seu tempo) não pode ser, no entanto, confundida por um apoio discreto à crítica 
socialista. Pois prossegue o texto: 
Os Socialistas, para curar este mal, instigam nos pobres o ódio invejoso contra os que 
possuem, e pretendem que toda a propriedade de bens particulares deve ser suprimida, 
que os bens dum indivíduo qualquer devem ser comuns a todos, e que a sua administração 
deve voltar para os Municípios ou para o Estado. Mediante esta transladação das 
propriedades e esta igual repartição das riquezas e das comodidades que elas 
proporcionam entre os cidadãos, lisonjeiam-se de aplicar um remédio eficaz aos males 
presentes. Mas semelhante teoria, longe de ser capaz de pôr termo ao conflito, prejudicaria 
o operário se fosse posta em prática. Pelo contrário, é sumamente injusta, por violar os 
direitos legítimos dos proprietários, viciar as funções do Estado e tender para a subversão 
completa do edifício social. 
Assim, fica claro que a encíclica busca oferecer aos operários europeus uma espécie de terceira via face ao 
capitalismo liberal e ao radicalismo das esquerdas, ao lançar base pela defesa integral da propriedade 
privada e da liberdade individual segundo os valores cristãos como o melhor caminho de defesa da 
integridade e dignidade humanas em um tempo de laicização e reversão de costumes. Defendia também a 
ação de grupos organizados de trabalhadores católicos, tais quais os sindicatos já existentes, desprovidos, 
porém, de influências ideológicas contrárias à fé. 
A Rerum Novarum agitou os meios sociais e possibilitou a existência de uma alternativa clara para os 
trabalhadores insatisfeitos. Após a sua publicação, diversos países, na Europa e em outros continentes, de 
base católica romana perceberam o aparecimento de várias associações de trabalhadores católicos, 
geralmente organizações instigadas por leigos sob a cooperação de autoridades eclesiásticas. Ainda, a 
Doutrina Social da Igreja tornar-se-ia um ponto fulcral para o posicionamento da fé católica em um mundo 
marcado pela intensa modernização tecnológica e pelo rápido desenvolvimento do capitalismo. 
No mundo intelectual, figuras de grande calado, como o francês Hilaire Belloc e o inglês Gilbert Keith 
Chesterton, passaram a propugnar aquela que se tornaria a expressão econômica da visão social católica, 
conhecido por Distributismo. Além do mais, diversas outras encíclicas papais se seguiriam a Rerum Novarum 
acerca da temática social, tais como Quadragesimo anno (publicada pelo papa Pio XI em 1931), a Mater et 
Magistra (do papa João XXIII, em 1961) e a encíclica Populorum Progressio, de Paulo VI, publicada em 1967, 
bem como muitos outras cartas apostólicas e encíclicas mais modernas. 
 
 
16 Encíclica Rerum Novarum. LEÃO XIII, 15 de maio de 1891. Disponível em: https://w2.vatican.va/content/leo-
xiii/pt/encyclicals/documents/hf_l-xiii_enc_15051891_rerum-novarum.html. Acesso em: 16/01/2018. 
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QUESTÕES COMENTADAS 
 
CACD 2004 
 
Há algo que não se pode dizer do século XX: que foi um tempo de brumas, silêncios e mistérios. Tudo nele 
foi a céu aberto, agressivamente iluminado, escancarado e estridente. E, no entanto, ele é ainda um enigma 
— um claro enigma, parafraseando Drummond —, e dele não podemos fazer o necrológio completo. E 
porque findou como uma curva inesperada da história, em um astucioso desencontro do que achávamos ser 
o futuro, turvou nossa memória e nosso olhar. E tornou-se pedra e esfinge, com um brilho que ainda cega e 
desafia. O século XX foi, sem dúvida, um século das utopias. O seu andamento coincidiu com a máxima 
expansão das categorias fundamentais do mundo moderno — sujeito e trabalho —, eixos que presidiram a 
atualização e exasperaram os limites do liberalismo e do socialismo, as duas grandes utopias da 
modernidade. E talvez por isso exiba uma característica única e contraditória: parece ter sido o mais 
preparado e explicado pelos séculos anteriores e, simultaneamente, o que mais distanciou a humanidade de 
seu passado, mesmo o mais próximo, decretando o caráter obsoleto de formas de vida e sociabilidade 
consolidadas durante milênios. O século XX sancionou o Estado-nação como a forma, por excelência, de 
organização das sociedades em peregrinação para o futuro e em busca de transparência. Os Estados 
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