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Lourrane Felício, Medicina UNICEPLAC, turma XXXVIII Módulo 3 | TBL 4 Objetivos 1. Conhecer os tipos de memória e amnésia Aprendizado é a aquisição de novos conhecimentos ou habilidades; Memória é a retenção da informação aprendida; Memórias Declarativas e Não Declarativas Memória declarativa: é a memória para fatos e eventos; possui subtipos (memórias episódicas - auto-biográficas/de experiências de vida- e memórias semânticas -de fatos-); • Estão disponíveis para evocação consciente; • É também chamada de memória explícita, pois resulta de um esforço mais consciente; • São frequentemente fáceis de formar e, também, facilmente esquecidas; • Estudos sugerem que o l im i te para o armazenamento de informações declarativas seja notavelmente alto; Memórias não declarativas: são divididas em diversas categorias, sendo que o tipo que mais importante é a memória procedural, ou seja, a m e m ó r i a p a r a h a b i l i d a d e s , h á b i t o s e comportamentos; • Não estão disponíveis para evocação consciente; • É também chamada de memória implícita, pois resulta diretamente da experiência; • A formação de memórias não declarativas exige repetição e prática durante um período mais longo, mas essas memórias são menos prováveis de ser esquecidas; • Considere a diferença entre memorizar os nomes de pessoas em uma festa (declarativa) e aprender a esquiar (não declarativa); Tipos de Memórias Procedurais Envolve o aprendizado de uma resposta motora a uma entrada sensorial; A formação de memórias procedurais pode se dar mediante duas classes de aprendizado: não associativo ou associativo; • Não Associativo: o aprendizado não associativo d e s c r e v e u m a m u d a n ç a n a r e s p o s t a comportamental que ocorre ao longo do tempo em resposta a um único tipo de estímulo. Existem dois tipos: habituação e sensitização; - A habituação consiste em aprender a ignorar um estímulo que não tenha significado; os seres humanos estão habituados a muitos tipos de estímulos; carros e caminhões estejam passando na rua, um cão esteja latindo, ou um colega de quarto esteja ouvindo determinada música pela centésima vez – e tudo isso acontece sem que haja efetiva percepção - Você ouve passos às suas costas e, embora isso normalmente não o perturbe, agora você se apavora. Faróis de carros aparecem, e você reage afastando-se da rua; o forte estímulo sensorial causou sensitização, uma forma de aprendizado que intensifica sua resposta a todos os estímulos, mesmo àqueles que previamente evocavam pouca ou nenhuma reação; • Associativo: o comportamento é alterado pela formação de associações entre eventos; isso contrasta com a resposta alterada a um único estímulo no aprendizado não associativo. Dois tipos de aprendizado associativo são normalmente considerados: condicionamento clássico e condicionamento operante (ou instrumental); O condicionamento clássico envolve a associação entre um estímulo que evoque uma resposta mensurável e um segundo estímulo que, normalmente, não evoca essa resposta. O primeiro tipo de estímulo, aquele que normalmente evoca a resposta, é chamado de estímulo incondicionado (EI), pois não há necessidade de treino (condicionamento) para que ele determine uma Lourrane Felício, Medicina UNICEPLAC, turma XXXVIII resposta. O segundo tipo de estímulo, aquele que normalmente não evoca essa mesma resposta, é chamado de estímulo condicionado (EC), pois requer treino (condicionamento) antes que ele evoque essa resposta. A resposta aprendida ao estímulo condicionado é chamada de resposta condicionada (RC). Tipos de Memórias Declarativas Algumas memórias podem durar mais do que outras; Memórias de longo prazo: são aquelas que se pode recordar dias, meses ou anos após terem sido originalmente armazenadas; • A informação que constitui a memória de longo prazo representa apenas uma fração daquilo que experimentamos diariamente; • O trauma e a ECT não afetam memórias de longo prazo, as quais foram armazenadas muito tempo atrás (p. ex., memórias da infância); Memórias de curto prazo: têm em comum a propriedade de serem vulneráveis; a maior parte da informação é mantida no encéfalo apenas temporariamente, na ordem de horas; • Pode ser apagada por um trauma na cabeça ou por eletroconvulsoterapia (ECT), que é usada para tratar doenças psiquiátricas; • Fatos e eventos são armazenados na memória de curto prazo, e um subconjunto deles é convertido em memórias de longo prazo por meio de um processo (consolidação da memória); Uma segunda forma de armazenamento da memória, com duração na ordem de segundos, é a memória de trabalho; • As memórias de trabalho são limitadas de forma aguda em sua capacidade e requerem ensaio; • Diz-se frequentemente que a memória de trabalho é aquela informação que retemos “na mente”; • Quando alguém lhe diz seu número de telefone, você pode retê-lo por um tempo limitado, repetindo o número para si mesmo. Manter uma memória viva pela repetição é o apanágio da memória de trabalho. Esse número pode ser, eventualmente, consolidado em uma memória de longo prazo; • A memória de trabalho é comumente estudada medindo-se o span de dígitos de uma pessoa, o máximo de números escolhidos ao acaso que uma pessoa pode repetir após ouvir a lista ser lida; • O span de dígitos normalmente é sete, mais ou menos dois; • A memória de trabalho distingue-se da memória de curto prazo por sua capacidade muito limitada, a necessidade de repetição e a duração muito curta. Amnésia Amnésia: certas doenças e lesões do encéfalo causam uma perda séria da memória e/ou da capacidade de aprender; Concussão, alcoolismo crônico, encefalite, tumor cerebral e acidente vascular encefálico, todas essas condições podem causar prejuízos à memória; Amnésia dissociativa Quando a amnésia não é acompanhada por qualquer outro déficit cognitivo; os problemas de memória estão dissociados de quaisquer outros problemas; Após um trauma encefálico, podem ocorrer 2 tipos distintos de perda de memória: amnésia retrógrada e amnésia anterógrada; • Amnésia retrógrada: é caracterizada por perda de memórias de eventos que ocorreram antes do trauma; esquece coisas que já sabia. Em casos graves, pode haver completa amnésia para toda informação declarativa aprendida antes do trauma; eventos ocorridos nos meses ou anos que precedem o trauma são esquecidos, porém a memória é progressivamente mais forte à medida que os fatos são mais antigos; • Amnésia anterógrada: a incapacidade de formar novas memórias após um trauma cerebral; pode ficar completamente incapaz de aprender e lembrar qualquer coisa nova. Em casos menos graves, o aprendizado torna-se lento e requer mais repetição do que o normal; Em casos clínicos, frequentemente há um misto de amnésias retrógradas e anterógradas de diferentes graus de gravidade; Lourrane Felício, Medicina UNICEPLAC, turma XXXVIII Amnésia global transitória Envolve um período de tempo muito mais curto; se dá com um ataque súbito de amnésia anterógrada, que dura apenas por um período de minutos a dias, frequentemente acompanhada por amnésia retrógrada para os eventos que precederam o ataque; A fala pode parecer desorientada, com constantes repetições da mesma questão, mas ele permanece consciente; o exame da memória de trabalho, como o teste da lista de números ao acaso, mostra resultados normais; Em questão de horas, esses sintomas normalmente cedem, restando uma lacuna permanente em sua memória. 2. Correlacionar os mecanismos da memória declarativa com as estruturas retiradas do paciente (lobo temporal, hipocampo, amígdala) As áreas corticais não contribuem todas igualmente para cada memória; Ainda ass im, todo o cór tex par t ic ipa do armazenamento da memória e o engrama pode estar amplamente distribuído no encéfalo. Ao considerar as regiões do encéfalo nos lobos temporal e parietal, que normalmenteprocessam a linguagem, uma lesão ali pode prejudicar a memória de um mundo estrangeiro, mas deixar intacta a memória da face de alguém que nasceu em outro país; Embora as memórias declarativas possam residir em muitas áreas do neocórtex, para ali chegar elas devem passar por estruturas nos lobos temporais mediais. Lobos Temporais Mediais Estruturas no lobo temporal medial são importantes para a consolidação e o armazenamento de memórias declarativas; O lobo temporal é importante para o registro de eventos passados; A porção medial do lobo temporal contém o neocórtex temporal, um sítio para o armazenamento da memória de longo prazo, e um grupo de estruturas interconectadas com o neocórtex, que são críticas para a formação de memórias declarativas; As estruturas-chave são o hipocampo, as áreas corticais próximas e as vias que conectam essas estruturas com outras partes do encéfalo; O lobo tempora l media l é cr í t ico para a consolidação da memória, mas não para a evocação; isso implica que as estruturas temporais mediais não armazenam todas as memórias, embora engramas para algumas delas possam estar localizados ali. Lesões no Lobo Temporal A remoção de boa parte dos lobos temporais apresenta pouco efeito sobre a percepção, a inteligência ou a personalidade, mas a cirurgia pode causar uma amnésia anterógrada profunda e debilitante; Há o esquecimento de eventos quase tão rapidamente quanto eles ocorrem; Com a repetição, pode-se lembrar um número durante um curto período, contudo, se for distraído, esquece o número e também que haviam lhe pedido que se lembrasse de um certo número; Além da amnésia anterógrada, tem-se certo grau de amnésia retrógrada; Pode-se reter algumas memórias da infância, mas lembra pouco ou nada dos eventos que ocorreram logo antes da cirurgia; Pode haver amnésia retrógrada para eventos que se estendiam por diversos anos antes da cirurgia; A memória de trabalho de pode ser basicamente normal; com o ensaio constante, pode-se lembrar de uma lista de seis números, embora qualquer interrupção o faz esquecer; Pode ser capaz de aprender um pequeno número de fatos após a cirurgia, como reconhecer e designar poucas pessoas que se tornaram famosas após a cirurgia; esses raros fatos dos quais consegue se lembrar provavelmente resultam de intensa repetição diária; Pode ser capaz de aprender novas tarefas (formar novas memórias procedurais), mas não tinha recordação alguma das experiências específicas. Lourrane Felício, Medicina UNICEPLAC, turma XXXVIII Sistema Hipocampal Evidências consideráveis apontam a importância do lobo temporal medial para a memória declarativa, e dentro dessa região do encéfalo, o hipocampo recebeu a maior atenção; O hipocampo está envolvido em várias funções relacionadas à memória, em múltiplas escalas de tempo: • Função crítica em unir a informação sensorial na consolidação da memória; • É essencial para a memória espacial da localização de objetos de significado para o comportamento; • Armazenamento de memórias durante um certo tempo, embora a duração desse tempo seja algo controverso; O que sugerem os estudos: • O hipocampo é crítico para a consolidação da memória de fatos e eventos; • É especialmente importante para a memória espacial; • Em registros de neurônios hipocampais humanos, se encontra surpreendente seletividade para pessoas ou objetos que são familiares; • As célu las h ipocampais parecem formar associações entre estímulos sensoriais, mesmo quando a informação não é espacial; • Pode ser essencial para construir ou tornar mais nítidas as memórias pela conexão de novos sinais de entrada sensoriais com o conhecimento preexistente; - Foi sugerido que os sinais que chegam das células de grade no córtex entorrinal fornecem para o hipocampo a informação de “onde”, ao passo que as outras aferências contêm informação acerca de “o quê”; - As associações neurais construídas e então consol idadas no h ipocampo poder iam efetivamente estabelecer memórias para “o que acontece onde”. Lesões do Hipocampo Amnésia anterógrada ocorre após lesões de longa duração do Hipocampo: em alguns pacientes, os dois hipocampos foram retirados para o tratamento de epilepsia: esse procedimento não afetou seriamente a memória do indivíduo para a informação armazenada antes da retirada dos hipocampos. Entretanto, depois da retirada, essas pessoas praticamente não têm mais capacidade de armazenar formas verbais e simbólicas de memórias (formas declarativas de memória) na memória a longo prazo, ou até na memória intermediária que dure mais do que alguns minutos; - Os hipocampos são importantes para ajudar no processo de armazenamento de novas memórias devido à: estímulos sensoriais ou pensamentos que causem dor ou aversão excitam os centros límbicos de punição, e os estímulos que causem prazer, felicidade ou sensação de recompensa, excitam os centros límbicos de recompensa, todos eles juntos fornecem o humor básico e as motivações da pessoa; entre essas motivações, está a força motriz do cérebro para lembrar as experiências e pensamentos que são agradáveis ou desagradáveis; - Especialmente, os hipocampos e, em menor grau, os núcleos mediodorsais do tálamo são importantes para tomar a decisão de quais dos nossos pensamentos são importantes o suficiente na base de recompensa ou punição para serem dignos da memória; Amnésia Retrógrada: em algumas pessoas que tiveram lesões hipocampais, algum grau de amnésia retrógrada ocorre junto com a amnésia anterógrada, o que sugere que esses dois tipos de amnésia sejam, pelo menos em parte, relacionados e que lesões hipocampais possam causar ambos; - Entretanto, danos em algumas áreas talâmicas podem levar especificamente à amnésia retrógrada, sem causar amnésia anterógrada significativa, o tálamo pode ter papel em ajudar a pessoa a “procurar” nos armazéns da memória e assim “ler” as memórias. Isto é, o processo de memória não só necessita do armazenamento das memórias, mas também de capacidade de procurar e encontrar posteriormente a memória; Lourrane Felício, Medicina UNICEPLAC, turma XXXVIII Não há danos para o aprendizado reflexivo: pessoas com lesões hipocâmpicas geralmente não têm dificuldades de aprender habilidades motoras que não envolvam verbalização ou formas simbólicas de inteligência; - Por exemplo, podem ainda aprender as habil idades de agil idade manual e f ísica necessárias em muitos esportes. 3. Estudar o envolvimento de outras áreas cerebrais (exceto o lobo temporal) e sua relação com a memória de trabalho Para atender a necessidades comportamentais imediatas, parte da informação sensorial adquirida é “mantida na mente” pela memória de trabalho, como um número de telefone, que lembra-se até fazer-se a chamada; De modo diferente da memória de longo prazo, a memória de trabalho tem uma capacidade muito pequena, como evidenciado; Há, contudo, sutilezas para a quantificação da capacidade da memória de trabalho: - Mais palavras podem ser mantidas na memória se forem palavras curtas e comuns; - Mais palavras e números podem ser mantidos na memória de trabalho se puderem ser ligados em grupos com significado; A memória de trabalho pode ser pensada como um recurso limitado, que pode ser utilizado de várias maneiras; a quantidade e a precisão da informação armazenada podem ser modificadas em função do significado comportamental da informação; A informação mantida na memória de trabalho pode ser convertida em memórias de longo prazo, mas a maior parte dela é descartada quando não mais for necessária; Como a informação é retida no encéfalo na memória de trabalho por tempo suficiente para ser útil? - A memória de trabalho não seria um sistema único, mas uma capacidade do neocórtex distribuída em muitos locais do encéfalo; Córtex Pré-Frontal e Memória de Trabalho Algumas das evidências, sugerindo que o lobo frontal,é importante para o aprendizado e a memória vieram de experimentos realizados na década de 1930; O córtex pré-frontal pode normalmente estar envolvido: • Na retenção de informações na memória de trabalho; • Na memória de trabalho para a resolução de problemas e o planejamento do comportamento; Lesões significativas no córtex pré-frontal prejudicam o desempenho em tarefas de resposta com retardo, assim como em outras tarefas que incluam um período de intervalo; Tendo sofrido uma grave lesão no lobo frontal, um paciente tinha dificuldades de manter um comportamento em curso e, embora pudesse apresentar comportamentos apropriados para diversas situações, ele tinha dificuldade de planejar e organizar esses comportamentos. Parece que eles têm um problema na memória de trabalho, que limita sua capacidade de utilizar informações recentes para mudar o comportamento; • Esses pac ientes não aprendem com a experiência recente da mesma maneira que uma pessoa normal, sugerindo um déficit na memória de trabalho; Teste de ordenação de cartas de Wisconsin: pode detectar problemas associados com lesões no córtex pré-frontal; pede-se a uma pessoa que ela selecione cartas de um baralho com um número variável de formas geométricas coloridas; as cartas podem ser ordenadas por cor, forma ou número de símbolos, porém, no início de cada teste, o participante não é informado a respeito de qual categoria ele deve utilizar. O participante começa a separar cartas em grupos e é informado quando ocorrer um erro, e, assim, ele aprende qual categoria deve utilizar na separação das cartas. Então, após dez separações corretas terem sido realizadas, a categoria utilizada muda, e o sujeito começa novamente. Para um bom desempenho nesse teste, a pessoa deve utilizar a Lourrane Felício, Medicina UNICEPLAC, turma XXXVIII memória das cartas e dos erros prévios, a fim de planejar a posição da próxima carta. Córtex lateral intraparietal (área LIP) Acredita-se que a área LIP esteja envolvida na orientação dos movimentos oculares e em um tipo de memória de trabalho; A r e s p o s t a d o n e u r ô n i o L I P e n v o l v e o armazenamento temporário de informação que será utilizada para produzir os movimentos; Demonstrou-se que outras áreas dos córtices parietal e temporal apresentam respostas análogas, relacionadas com a memória de trabalho; Essas áreas parecem específicas para determinadas modalidades, assim como as respostas na área LIP são específicas para a visão; Isso é consistente com observações clínicas de que há, em seres humanos, déficits distintos de memória de trabalho auditiva e visual, produzidos por lesões corticais. Referências bibliográficas: 1. BEAR, M F; Connors, BW; Paradiso, MA. Neurociências - Desvendando o Sistema Nervoso. 4ª Edição, Artmed, 2017; 2. GUYTON, A.C. e Hall J.E.– Tratado de Fisiologia Médica. Editora Elsevier. 13ª ed., 2017.