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Capítulo 6 Citogenética Clínica: Distúrbios dos Autossomos e dos Cromossomos Sexuais No Capítulo 5, introduzimos os princípios gerais de citogenética clínica e os diferentes tipos de anormalidades detectadas na prática clínica. Neste capítulo, apresentaremos mais detalhes sobre vários distúrbios cromossômicos específicos, suas causas e conseqüências. Primeiro, discutiremos as anormalidades autossômicas mais comuns, incluindo a síndrome de Down, seguida por considerações sobre os cromossomos X e Y, sua biologia ímpar, e suas anormalidades. Como a determinação sexual é definida cromossomicamente, nós incluímos neste capítulo distúrbios do desenvolvimento gonadal e da diferenciação sexual. Mesmo que muitos de tais distúrbios sejam determinados por genes únicos, a abordagem clínica da avaliação da genitália ambígua geralmente inclui uma análise citogenética detalhada. DISTÚRBIOS AUTOSSÔMICOS Nesta seção, são descritos os principais distúrbios de relevância clínica. Embora existam numerosos distúrbios cromossômicos raros em que a perda ou ganho de um cromossomo inteiro ou de um segmento cromossômico tenham sido relatados, muitos deles vêm sendo descritos apenas em fetos abortados espontaneamente ou envolvem segmentos relativamente curtos de um cromossomo. Existem apenas três distúrbios cromossômicos bem definidos, sem mosaico, compatíveis com a sobrevida pós-natal em que ocorre a trissomia de um autossomo inteiro: trissomia do 21 (síndrome de Down) trissomia do 18 e trissomia do 13. Cada uma destas trissomias autossômicas está associada a retardo do desenvolvimento, retardo mental e anomalias congênitas múltiplas. Apesar disso, cada uma tem seu fenótipo claramente distinto. As anormalidades do desenvolvimento características de qualquer estado trissômico são determinadas pela dose extra de genes específicos do cromossomo adicional. O conhecimento sobre a relação específica entre o cromossomo extra e a conseqüente anormalidade no desenvolvimento tem sido limitado até o momento. Pesquisas recentes, no entanto, estão começando a mostrar que genes específicos do cromossomo extra, são responsáveis através de modulação direta ou indireta, pelas vias de desenvolvimento, por aspectos específicos do fenótipo anormal. De maneira geral, em qualquer desequilíbrio cromossômico que envolve a adição ou perda de genes, espera-se ter um efeito fenotípico específico determinado pela dosagem específica de genes no segmento cromossômico extra ou ausente. Síndrome de Down A síndrome de Down, ou trissomia do 21, é, de longe, o mais comum e mais bem conhecido distúrbio cromossômico e a causa genética mais comum de retardo mental moderado. A cada 800 nascimentos vivos, cerca de uma criança nasce com síndrome de Down (Tabela 5-3), e entre crianças nascidas vivas e fetos de mulheres com 35 anos de idade ou mais, a incidência é mais elevada (Fig. 6-1). Figura 6-1 Relação entre idade materna e incidência da trissomia do 21 ao nascimento e no momento da amnio-centese. Ver também o Capítulo 15. (Dados de Hook EB, Cross PK, Schreinemachers DM: Chromosomal abnormality rates at amniocentesis and in live-born infants. JAMA 249: 2034-2038, 1983.) A síndrome foi descrita clinicamente pela primeira vez por Langdon Down, em 1866, porém sua causa permaneceu como um profundo mistério por quase um século. Duas marcantes características chamaram a atenção nesta população: a idade materna aumentada e uma distribuição peculiar entre famílias — concordância entre gêmeos monozigóticos, porém quase completa discordância entre gêmeos dizigóticos e outros membros da família. Embora tenha sido reconhecido, no início de 1930, que uma anormalidade cromossômica poderia explicar estas observações, naquela época ninguém estava preparado para acreditar que humanos são realmente propensos a ter anormalidades cromossômicas. No entanto, quando técnicas para análise detalhada dos cromossomos humanos tornaram-se disponíveis, a síndrome de Down foi uma das primeiras condições a ser examinada cromossomicamente. Em 1959, ficou estabelecido que muitas crianças com síndrome de Down tinham 47 cromossomos, sendo o membro extra um cromossomo acrocêntrico pequeno, que desde então tem sido designado como cromossomo 21 (Fig. 5-6). Fenótipo A síndrome de Down pode geralmente ser diagnosticada ao nascimento ou logo após, por suas características dismórficas, que variam entre os pacientes, mas, entretanto, produzem um fenótipo distinto (Fig. 6-2). A hipotonia pode ser a primeira anormalidade observada no recém-nascido. Além dos aspectos faciais dismórficos característicos evidentes mesmo para o observador não treinado, os pacientes apresentam estatura reduzida e braquicefalia com a região occipital achatada. O pescoço é curto, com frouxidão da pele na nuca. A ponte nasal é baixa; as orelhas são de baixa implantação e têm uma aparência dobrada característica; os olhos apresentam as manchas de Brushfield que circundando a íris; e a boca é aberta, freqüentemente mostrando uma língua protrusa e sulcada. O epicanto típico e a inclinação da fissura palpebral para cima deram origem ao termo mongolismo, usado no passado para referir-se a esta condição, mas, atualmente, considerado inapropriado. As mãos são curtas e largas, freqüentemente com uma prega transversa palmar única (“prega simiesca”) e o quinto dedo encurvado, ou clinodactilia. Os dermatóglifos (padrões de linhas dermopapilares) são altamente característicos. Os pés apresentam uma maior separação entre o hálux e o segundo dedo, com um sulco estendendo-se proximalmente até a superfície plantar. Figura 6-2 Duas crianças com síndrome de Down (A Cortesia de David Patterson, Eleanor Roosevelt Institute, Denver. B De Jones KL: Smith’s Recognizable Patterns of Human Malformation, 4th ed. Philadelphia, WB Saunders, 1988.) A principal causa de interesse na síndrome de Down é o retardo mental. Mesmo durante a tenra infância, a criança pode não exibir atraso no desenvolvimento; o atraso é geralmente evidente ao final do primeiro ano de vida. O coeficiente de inteligência (QI) é geralmente entre 30 e 60, quando a criança tem idade suficiente para ser testada. Não obstante, muitas crianças com síndrome de Down tornam-se pessoas alegres, responsivas e autoconfiantes, apesar de suas limitações (Fig. 6-2). A cardiopatia congênita está presente em pelo menos um terço de todos os lactentes nascidos com síndrome de Down e em uma proporção algo mais alta nos abortos com a síndrome. Certas malformações, tais como atresia duodenal e fístula traqueoesofágica, são muito mais comuns na síndrome de Down do que em outros distúrbios. Há um alto grau de variabilidade no fenótipo de indivíduos com síndrome de Down; anormalidades específicas são detectadas em quase todos os pacientes, porém outras são observadas apenas em um subgrupo de casos. Cada um desses defeitos congênitos deve refletir algum grau de efeito direto ou indireto da expressão excedente de um ou mais genes do cromossomo 21 em eventos padronizados durante o início do desenvolvimento (Cap. 14). Estudos em larga escala de expressão de genes têm mostrado que uma proporção significativa de genes codificados no cromossomo 21 é expressa em níveis mais altos em amostras de cérebro e coração de indivíduos com síndrome de Down do que em amostras correspondentes em indivíduos euplóides. Como o catálogo completo dos genes do cromossomo 21 é conhecido, os esforços atuais estão direcionados para a determinação de quais genes são responsáveis por fenótipos específicos. Sobrevida Pré-natal e Pós-natal Em virtude de a síndrome de Down representar cerca da metade de todas as anormalidades identificadas no período pré-natal, a incidência de síndrome de Down observada em nascidos vivos, em amniocenteses e em amostras de vilosidades coriônicas em mães de diferentes idades, pode fornecer uma base para estimar a quantidade de perda fetal entre a 11a e 16a semanas de vida, e entre a 16a semana e o nascimento (Tabela 15-1). Em todas as idades maternas, ocorre alguma perda entre a 11ae 16a semanas (como seria esperado pela alta taxa de anormalidades cromossômicas vista em abortos espontâneos) e uma perda adicional posteriormente na gravidez. De fato, provavelmente, apenas 20% a 25% dos conceptos com trissomia do 21 sobrevivem ao nascimento (Tabela 5-5). Entre os conceptos com síndrome de Down, aqueles com menor probabilidade de sobreviver são os portadores de cardiopatia congênita; cerca de um quarto dos nascidos vivos com cardiopatia congênita morre antes do primeiro aniversário. Há um risco aumentado em 15 vezes para leucemia entre pacientes com síndrome de Down que sobrevivem ao período neonatal. Demência precoce associada a achados neuropatológicos de doença de Alzheimer (atrofia cortical, dilatação ventricular e emaranhado neurofibrilar) afeta aproximadamente todos os pacientes com síndrome de Down, ocorrendo várias décadas antes da idade inicial típica de surgimento da doença de Alzheimer na população em geral. Os Cromossomos na Síndrome de Down O diagnóstico clínico da síndrome de Down geralmente não apresenta nenhuma dificuldade em particular. No entanto, o cariótipo é necessário para confirmação e para fornecer a base para a informação genética. Embora o cariótipo anormal específico responsável pela síndrome de Down geralmente tenha pouco efeito sobre o fenótipo do paciente, ele é essencial para determinar o risco de recorrência. Trissomia do 21 Cerca de 95% de todos os pacientes com síndrome de Down possuem trissomia do cromossomo 21 (Fig. 5-6), resultado da não-disjunção meiótica do par de cromossomos 21, como discutido no capítulo anterior. Como já tinha sido notado, o risco de ter uma criança com trissomia do 21 aumenta com a idade materna, especialmente após os 30 anos (Fig. 6-1). O erro meiótico responsável pela trissomia geralmente ocorre durante a meiose materna (cerca de 90% dos casos), predominantemente na primeira divisão meiótica, porém aproximadamente 10% dos casos ocorrem na meiose paterna, geralmente na segunda divisão meiótica. Translocação Robertsoniana Cerca de 4% dos pacientes com síndrome de Down têm 46 cromossomos, com uma translocação robertsoniana envolvendo o cromossomo 21q e o braço longo de um outro cromossomo acrocêntrico (geralmente o cromossomo 14 ou 22). O cromossomo translocado substitui um dos cromossomos acrocêntricos normais e o cariótipo do paciente com síndrome de Down com translocação robertsoniana entre os cromossomos 14 e 21 é, portanto, 46,XX ou 46,XY,rob(14;21)(q10;q10),+21 (ver Tabela 5-2 para nomenclatura). Como um cromossomo também pode ser designado der(14;21), ambas as nomenclaturas são usadas na prática. De fato, pacientes com translocação robertsoniana envolvendo o cromossomo 21 são trissômicos para os genes do segmento 21q. Diferentemente da trissomia do 21 padrão, a síndrome de Down com translocação não evidencia relação com a idade materna, mas há uma recorrência relativamente alta em famílias nas quais um dos pais, especialmente a mãe, é um portador de translocação. Por esta razão, o cariótipo dos pais e, possivelmente, dos irmãos, é essencial antes de fornecer uma informação genética acurada. Um portador de translocação robertsoniana envolvendo os cromossomos 14 e 21 tem apenas 45 cromossomos; um cromossomo 14 e um cromossomo 21 são perdidos e substituídos pelo cromossomo translocado. Os gametas que podem ser formados por tal portador são mostrados na Figura 6-3. Teoricamente, há seis possíveis tipos de gametas, porém três deles parecem ser incapazes de levar a uma prole viável. Dos três tipos viáveis, um é normal, um é balanceado, e um é nãobalanceado, tendo tanto o cromossomo translocado como o cromossomo 21 normais. Em combinação com o gameta normal, isto geraria uma criança com síndrome de Down por translocação (Fig. 6-4). Teoricamente, os três tipos de gametas são produzidos em números iguais, e então, o risco teórico de ter uma criança com síndrome de Down seria de 1 em 3. No entanto, estudos populacionais extensivos têm mostrado que os complementos do cromossomo não-balanceado aparecem em apenas cerca de 10% a 15% da prole de mães portadoras e em apenas um pequeno percentual na prole de pais portadores de translocações envolvendo o cromossomo 21. Figura 6-3 Cromossomos de gametas que teoricamente podem ser produzidos por um portador de uma translocação robertsoniana, rob(14;21). A, Complementos normais e balanceados. B, Não- balanceado, um produto com cromossomo translocado e cromossomo 21 normal juntos, e o produto recíproco apenas com cromossomo 14. C, Não-balanceado, um produto com cromossomo translocado e cromossomo 14 juntos, e o produto recíproco apenas com cromossomo 21. Apenas os três gametas sombreados à esquerda podem levar a prole viável; ver o texto para uma descrição do destino eventual destes gametas. Figura 6-4 Translocação robertsoniana 14q21q transmitida por uma mãe portadora à sua filha, que tem síndrome de Down. Os cromossomos do pai são normais. Apenas os cromossomos 14, 21 e rob(14;21) são mostrados. t, translocação. (Cariótipo original, cortesia de R. G. Worton, The Hospital for Sick Children, Toronto.) Translocação 21q21q O cromossomo com translocação 21q21q é um cromossomo composto de dois braços longos do cromossomo 21; isto é visto em um pequeno percentual de pacientes com síndrome de Down. Acredita-se que sua origem seja um isocromossomo, em vez da translocação robertsoniana. Muitos desses casos parecem surgir após a formação do zigoto e, por conseguinte, o risco de recorrência é baixo. Apesar disso, é particularmente importante avaliar se um genitor é um portador (ou um mosaico), porque todos os gametas de um portador de tal cromossomo devem conter ou o cromossomo 21q21q, com sua dose dupla de material genético do cromossomo 21, ou sua falta, e, portanto, não ter cromossomo 21 representativo. A prole potencial, por conseguinte, tem ou síndrome de Down ou monossomia do 21, que é raramente viável. Portadores mosaicos apresentam risco de recorrência aumentado, e então o diagnóstico pré-natal deveria ser considerado em qualquer gravidez subseqüente. Síndrome de Down Mosaico Cerca de 2% dos pacientes com síndrome de Down são mosaicos, geralmente com um cariótipo formado por uma população de células normais ou com trissomia do 21. O fenótipo pode ser mais brando do que o de uma trissomia do 21 típica, porém há uma ampla variabilidade de fenótipos entre pacientes mosaicos, possivelmente refletindo a proporção variável de células com trissomia do 21 no embrião durante o início do desenvolvimento. Estes pacientes identificados como mosaicos de síndrome de Down provavelmente representam os casos mais severos clinicamente, porque pessoas levemente afetadas têm menor probabilidade de serem cariotipadas. Trissomia do 21 Parcial Muito raramente, a síndrome de Down é diagnosticada em um paciente em que apenas o braço longo do cromossomo 21 está triplicado, e um paciente com síndrome de Down com anormalidade cromossômica não visível citogeneticamente é ainda mais raramente identificado. Estes pacientes são de particular interesse, porque eles podem mostrar qual região do cromossomo 21 é provavelmente responsável por componentes específicos do fenótipo da síndrome de Down e quais regiões podem ser triplicadas sem causar aquele aspecto do fenótipo. Embora o cromossomo 21 contenha apenas uma pequena centena de genes (Fig. 2-8B), tentativas de correlacionar a dosagem tripla de genes específicos com aspectos específicos do fenótipo da síndrome de Down têm tido sucesso limitado até agora. O mais notável sucesso foi a identificação de uma região que é crítica para defeitos cardíacos vista em 40% dos pacientes com síndrome de Down. Separar os genes específicos cruciais para a expressão do fenótipo da síndrome de Down daqueles que meramente ocorrem para constituir o cromossomo 21 é um foco das investigações atuais, especialmente com o rato como modelo hospedeiro. O rato criado para conter dosagem extra de genes do cromossomo humano 21 (ou mesmo uma cópia quase completa do cromossomo21) pode exibir anormalidades fenotípicas no comportamento, funcionamento cerebral e desenvolvimento cardíaco, e isto é um campo potencialmente promissor de pesquisas. Etiologia da Trissomia do 21 Embora a base cromossômica da síndrome de Down esteja clara, a causa da anormalidade cromossômica ainda é pouco entendida. O alto percentual de casos de trissomia do 21 em que o gameta anormal origina-se durante a primeira divisão meiótica materna sugere que alguma coisa envolvendo a primeira divisão meiótica materna é a causa de base. Em virtude do risco aumentado de síndrome de Down para mães mais velhas (ver próxima seção), uma possibilidade óbvia é o modelo do “ovócito velho”; tem sido sugerido que quanto mais velho o ovócito, maior será a chance de ocorrer erro durante a disjunção dos cromossomos. Como mencionado no Capítulo 5, análises do cromossomo 21 (como também de outras trissomias autossômicas) têm implicado o número ou o arranjo de eventos de recombinação como um determinante de se o par de cromossomos realizará a disjunção adequadamente durante as duas divisões meióticas. Ovócitos velhos podem ser menos hábeis em superar a suscetibilidade à não-disjunção estabelecida pela maquinaria da recombinação. Uma característica marcante deste modelo (e uma que muito complica sua investigação) é que o evento etiológico que leva ao nascimento de uma criança com síndrome de Down hoje pode ter ocorrido há 35 ou 40 anos, quando a mãe da criança era ela própria um feto cujos ovócitos primários estavam na prófase da primeira divisão meiótica. Apesar do reconhecimento da importância da associação entre os padrões de recombinação e a segregação cromossômica, um completo entendimento da não-disjunção do cromossomo 21 e do efeito da idade materna continua sendo indescritível. Risco de Síndrome de Down Um problema freqüente na informação genética, especialmente na genética pré-natal, é como estimar o risco de nascer uma criança com síndrome de Down. A síndrome de Down pode ser detectada no período pré-natal por meio da análise citogenética ou por arranjo de hibridização genômica comparativa (CGH) das células das vilosidades coriônicas ou do líquido amniótico. De fato, cerca de 80% dos diagnósticos pré-natais são realizados devido à idade materna elevada ou triagem bioquímica pré-natal (Cap. 15), aumentando a preocupação quanto ao risco de síndrome de Down no feto. Uma norma de procedimento comumente aceita é que uma mulher é elegível para o diagnóstico pré-natal se o risco de ter um feto com síndrome de Down é maior que o risco do procedimento da amniocentese ou da biópsia de vilosidade coriônica usadas para obter tecido fetal para análise cromossômica, que poderão levar à perda fetal (Cap. 15). O risco depende principalmente da idade materna e do cariótipo de ambos os genitores. A incidência populacional de síndrome de Down em nascidos vivos é atualmente estimada em cerca de 1 em 800, refletindo a distribuição de idade materna para todos os nascimentos e a proporção de mães mais velhas que utilizaram o diagnóstico pré-natal e a interrupção seletiva. Por volta dos 30 anos de idade, o risco começa a subir agudamente, alcançando um em 25 nascimentos no grupo materno mais velho (Fig. 6-1). Ainda que mães mais jovens tenham um risco muito mais baixo, a taxa de nascimento é mais elevada, e, portanto, mais da metade das mães de todos os bebês com síndrome de Down tem menos de 35 anos de idade. O risco de síndrome de Down devido à translocação ou trissomia parcial não está relacionado com a idade materna. A idade paterna não parece ter influência sobre o risco. Nos Estados Unidos e no Canadá, 50% ou mais das grávidas com 35 anos de idade ou mais se submetem ao diagnóstico pré-natal para análise cromossômica fetal, porém apenas 1% dos fetos testados é portador da trissomia do 21. Abordagens atuais de maior precisão e eficiência para identificação dos fetos sob risco, por meio de triagem bioquímica e ultra-sonografia, são discutidas n o Capítulo 15. Métodos para examinar raras células fetais encontradas na circulação materna também estão sendo desenvolvidos. Risco de Recorrência O risco de recorrência da trissomia do 21 ou de alguma outra trissomia autossômica, após o nascimento de tal criança numa família, é de cerca de 1% no geral. O risco é cerca de 1,4% para mães com menos de 30 anos, e é o mesmo risco relacionado à idade para mães mais velhas; há um significativo aumento no risco para mães mais jovens, porém não para mães mais velhas, cujo risco já é elevado. A razão para elevação do risco de mães mais jovens não é conhecida. Uma possibilidade é que a não detecção da linhagem germinativa em mosaico em um dos pais portador de células trissômicas e células normais, pode ser um fator. Uma história de trissomia do 21 em outros membros da família, embora cause freqüentemente ansiedade materna, não parece aumentar significativamente o risco de ter uma criança com síndrome de Down. O risco de recorrência para síndrome de Down devido a uma translocação é muito mais alto, como descrito anteriormente. Trissomia do 18 O fenótipo de um bebê com trissomia do 18 é mostrado na Figura 6-5. As características da trissomia do 18 sempre incluem retardo mental e retardo do desenvolvimento, e freqüentemente incluem grave malformação cardíaca. Hipertonia é um achado típico. A cabeça tem um occipúcio proeminente e retrognatia. As orelhas são malformadas e de baixa implantação. O esterno é curto. As mãos ficam fechadas de um modo característico, com sobreposição do segundo e quinto dedos sobre o terceiro e quarto dedos (Fig. 6-5). Os pés têm uma aparência de “pé de cadeira de balanço”, com o calcâneo proeminente. Os dermatóglifos são característicos, com prega palmar única e padrão de arco em quase todos ou todos os dedos. As unhas são geralmente hipoplásicas. Figura 6-5 Um bebê com trissomia do 18. Note as mãos fechadas com sobreposição do segundo e quinto dedos sobre o terceiro e quarto dedos; pés em cadeira de balanço com calcâneo proeminente; e orelhas grandes, malformadas e de baixa implantação. (Cortesia de H. Medovy, Children’s Centre, Winnipeg, Canadá.) A incidência desta condição em nascidos vivos é cerca de 1 em 7.500 nascimentos (Tabela 5- 3). A incidência na concepção é muito mais alta, mas cerca de 95% dos conceptos com trissomia do 18 são abortados espontaneamente. A sobrevida no período pós-natal também é baixa, e a sobrevida por mais de uns poucos meses é rara. Pelo menos 60% dos pacientes são do sexo feminino, talvez devido a sua sobrevida preferencial. Como em muitas outras trissomias, idade materna elevada é um fator, e o risco de um bebê com trissomia do 18 é substancialmente maior para mulheres com idade acima de 35 anos. O fenótipo da trissomia do 18, tal como o da trissomia do 21, pode resultar de uma variedade de raros cariótipos além da trissomia completa, e cariotipagem dos bebês ou fetos afetados é essencial para a informação genética. Em cerca de 20% dos casos, há uma translocação envolvendo todo ou quase todo o cromossomo 18, que pode ser nova ou ter sido herdada de um dos genitores que é portador balanceado. A trissomia também pode estar presente na forma de mosaico, com expressão variável, mas geralmente algo mais branda. Trissomia do 13 O marcante fenótipo da trissomia do 13 é mostrado na Figura 6-6. Retardo do crescimento e retardo mental grave estão presentes, acompanhados de graves malformações do sistema nervoso central, tais como arrinencefalia e holoprosencefalia. A fronte é inclinada; há microcefalia com espaço amplo entre as suturas; e pode ocorrer microftalmia, coloboma de íris, ou mesmo ausência de olhos. As orelhas são malformadas. Lábio leporino e fenda palatina estão freqüentemente presentes. As mãos e pés podem exibir polidactilia pós-axial, e as mãos podem estar fechadas com sobreposição do segundo e quinto dedos sobre o terceiro e quarto dedos, como na trissomia do 18. Os pés, como na trissomia do 18, têm uma aparência de “pé de cadeira de balanço”. As palmas freqüentementetêm prega simiesca. Internamente, há comumente defeitos cardíacos congênitos (em particular, comunicação interventricular e persistência do canal arterial), e defeitos urogenitais, incluindo criptorquidismo em meninos e útero bicórneo e ovários hipoplásicos em meninas, e rins policísticos. Desta constelação de defeitos, os mais característicos são a aparência facial geral com lábio leporino, fenda palatina e anormalidades oculares, polidactilia, mãos fechadas, e pés em cadeira de balanço. Figura 6-6 Um bebê com trissomia do 13. Note particularmente o lábio leporino bilateral e a polidactilia. (Cortesia de P. E. Conen, The Hospital for Sick Children, Toronto.) A incidência da trissomia do 13 é cerca de 1 em 15.000 a 25.000 nascimentos. A trissomia do 13 é clinicamente grave, e cerca da metade de tais indivíduos morre no primeiro mês. Como muitas outras trissomias, esta está associada ao aumento da idade materna, e o cromossomo extra geralmente origina-se da não-disjunção durante a primeira divisão meiótica materna. A cariotipagem dos fetos ou bebês afetados está indicada para confirmar o diagnóstico clínico; cerca de 20% dos casos são causados por translocação não-balanceada. O risco de recorrência é baixo; mesmo quando um dos pais de um paciente com translocação é portador de translocação, o risco empírico para o nascimento subseqüente de uma criança com a síndrome é menor que 2%. Síndromes de Deleção Autossômica Existem muitos relatos de deleções detectáveis citogeneticamente em pacientes dismórficos, porém muitas destas deleções têm sido observadas em apenas uns poucos pacientes e não estão associadas a síndromes reconhecidas. No entanto, há um número de síndromes de deleção autossômica bem delineadas em que uma série de pacientes tem uma deleção igual ou similar, resultando em uma síndrome claramente reconhecível. No geral, deleções autossômicas citogeneticamente reconhecíveis ocorrem com uma incidência estimada de 1 para 7.000 nascimentos vivos. Síndrome do Cri du Chat Uma de tais síndromes é a síndrome do cri du chat, na qual ocorre uma deleção terminal ou intersticial de parte do braço curto do cromossomo 5. Esta síndrome de deleção recebeu este nome comum porque o choro dos bebês com este distúrbio lembra o miado do gato. Esta síndrome representa cerca de 1% de todos os pacientes com retardo mental institucionalizados. A aparência facial, mostrada na Figura 6-7A, é característica, com microcefalia, hipertelorismo, epicanto, orelhas de baixa implantação, às vezes com apêndices pré-auriculares, e micrognatia. Outras características incluem retardo mental de moderado a grave e defeitos cardíacos. Muitos casos de síndrome do cri du chat são esporádicos; 10% a 15% dos casos constituem prole de portadores de translocação. Os pontos de quebra e extensão do segmento deletado do cromossomo 5p variam em diferentes pacientes, porém a região crítica, ausente em todos os pacientes com o fenótipo, tem sido identificada como banda 5p15. Com o uso de hibridização in situ com fluorescência (FISH) e arranjo de CGH (Caps. 4 e 5), um número de genes foi identificado como deletado do segmento cromossômico del(5p), e a base da relação entre monossomia de tais genes e o fenótipo clínico está começando a ser elucidada. Muitas das características clínicas parecem ser devido à haploinsuficiência para um gene ou genes da banda 5p15.2, e o choro característico semelhante ao miado de gato parece resultar da deleção de um gene ou genes de uma pequena região na banda 5p15.3. O grau de retardo mental geralmente correlaciona-se com o tamanho da deleção, embora análises por arranjo de CGH sugiram que a haploinsuficiência de regiões específicas em 5p14-p15 possam contribuir desproporcionalmente para retardo mental severo. O mapa fenotípico mostrado na Figura 6-7B ilustra o crescente refinamento e precisão que a abordagem genômica pode trazer aos conceitos gerais de correlação entre cariótipo e fenótipo na genética clínica. Esta é uma importante meta das pesquisas em muitas anomalias cromossômicas recorrentes, tanto para entendimento das alterações fisiopatológicas como para consulta genética. Figura 6-7 A, Um bebê com síndrome do cri du chat, que resulta da deleção de parte do cromossomo 5p. Note as características faciais com hipertelorismo, epicanto e retrognatia. B, Mapa do fenótipo-cariótipo, baseado em análise cromossômica por arranjo da CGH da del(5p). (Baseado em dados de Zhang X, Snijders A, Segraves R, et al: High-resolution mapping of genotype-phenotype relationships in cri du chat syndrome using array comparative genome hybridization. Am J Hum Genet 76:312-326, 2005.) Distúrbios Genômicos: Síndromes de Microdeleção e Duplicação Síndromes com dismorfias severas estão associadas a pequenas, mas, às vezes, citogeneticamente visíveis deleções que levam a uma forma de desequilíbrio genético referido como aneusomia segmentar (Tabela 6-1). Estas deleções produzem síndromes que, geralmente, são reconhecidas clinicamente e que são detectadas por análise cromossômica de alta resolução, por FISH (Figs. 5-F e 5-I; ver inserto colorido) ou por arranjo de CGH. O termo síndrome de genes contíguos tem sido aplicado para muitas destas condições, sendo o fenótipo atribuível à haploinsuficiência de genes contíguos múltiplos da região deletada. Para outros distúrbios, o fenótipo é aparentemente devido à deleção de apenas um único gene, apesar da associação típica da deleção cromossômica com a condição. Tabela 6-1 Exemplos de Distúrbios Genômicos Envolvendo Recombinação Entre Seqüências de Repetições de Baixa Cópia Para cada síndrome, a extensão das deleções em diferentes pacientes é similar. De fato, para síndromes listadas na Tabela 6-1, estudos por análise molecular e por FISH têm demonstrado que os pontos de quebra centroméricos e teloméricos agrupam-se entre diferentes pacientes, sugerindo a existência de seqüências propensas à deleção. Um mapeamento fino em alguns desses distúrbios tem mostrado que os pontos de quebra localizam-se em seqüências repetidas de cópia deficiente e que recombinações aberrantes entre cópias próximas das repetições causam as deleções, que envolvem várias centenas a vários milhares de pares de bases. Este mecanismo geral seqüência-dependente tem sido implicado em várias síndromes envolvendo rearranjos de genes contíguos, que, conseqüentemente, têm sido nomeadas de distúrbios genômicos (Tabela 6-1). Várias deleções e duplicações mediadas por recombinações desiguais têm sido documentadas no braço curto proximal do cromossomo 17 e ilustram os conceitos gerais de distúrbios genômicos (Fig. 6-8). Por exemplo, um segmento visível citogeneticamente de 17p11.2 de aproximadamente 4 Mb é deletado de novo em cerca de 70% a 80% dos pacientes com síndrome de Smith-Magenis (SMS), uma condição geralmente esporádica caracterizada por anomalias congênitas múltiplas e retardo mental. Recombinação desigual entre grandes blocos de seqüências repetidas flanqueadas que são aproximadamente 99% idênticas em seqüência resulta na deleção da SMS, del(17) (p11.2p11.2), assim como duplicações recíprocas, dup(17)(p11.2p11.2), são vistas em pacientes com fenótipo neurocomportamental mais brando. Um pouco mais distalmente no cromossomo, duplicação ou deleção de uma região de 1.400 kb no cromossomo 17p11.2-p12, mediada por recombinação entre um grupo diferente de seqüências repetidas aproximadamente idênticas, leva a um outro par de distúrbios genômicos herdados. Duplicação da região entre as repetições leva a uma forma de doença de Charcot-Marie-Tooth (Caso 6); deleção leva a uma condição diferente, neuropatia hereditária com risco de paralisia de pressão (NHrPP) (Tabela 6-1). Estas duas neuropatias periféricas distintas resultam de diferentes dosagens de gene da proteína da mielina periférica que é codificada no segmento deletado ou duplicado. Figura 6-8 Modelo de rearranjo de base dos distúrbios genômicos. Crossing over desigual entre cromátides irmãs desalinhadas ou cromossomos homólogos contendo cópiasaltamente homólogas de uma longa seqüência repetida de DNA pode levar a produtos de deleção ou duplicação, que diferem em números de cópias da seqüência. O número de cópias de qualquer gene ou genes (tais como A, B e C) que se localiza entre as cópias que se repetem mudará como resultado destes rearranjos genômicos. Para exemplos de distúrbios genômicos, o tamanho das seqüências repetidas e o tamanho da região duplicada ou deletada, ver Tabela 6-1. Uma microdeleção particularmente comum que é freqüentemente avaliada em laboratórios de citogenética clínica envolve o cromossomo 22q11.2 e está associada ao diagnóstico de síndrome DiGeorge, síndrome velocardiofacial ou síndrome de anomalias faciais e conotruncais. Todas as três síndromes clínicas são condições autossômicas dominantes com expressividade variável, causadas por uma deleção na região 22q11.2, abarcando cerca de 3 Mb. Esta microdeleção, também mediada por recombinação homóloga entre seqüências repetidas de cópias deficientes, é uma das mais comuns deleções citogenéticas associadas a um fenótipo clínico importante, e é detectada em um para 2.000 a 4.000 nascidos vivos (Fig. 6-9). Os pacientes apresentam anomalias craniofaciais características, retardo mental e defeitos cardíacos. Acredita-se que a deleção nas síndromes de deleção de 22q11.2 responda por cerca de 5% dos defeitos cardíacos congênitos e é uma causa particularmente freqüente de certos defeitos. Por exemplo, mais de 40% dos pacientes com tetralogia de Fallot e atresia pulmonar e mais de 60% dos pacientes com tetralogia de Fallot e válvula pulmonar ausente têm esta microdeleção. A deleção típica remove aproximadamente 30 genes, embora uma deleção menor relacionada haja vista em 10% dos casos. Haploinsuficiência para ao menos um destes genes, TBX1, que codifica a transcrição do fator envolvido no desenvolvimento do sistema faríngeo, tem sido implicada no fenótipo; ela está contida na região deletada e é mutada em pacientes com um fenótipo similar, porém sem a deleção cromossômica. Figura 6-9 Deleções, duplicações e rearranjos cromossômicos em 22q11.2 mediados por recombinação homóloga. Cariótipos normais apresentam duas cópias de 22q11.2, cada uma contendo três cópias de um segmento repetido de aproximadamente 200kb (azul-escuro) em uma região genômica de 3 Mb, que é composta de dois segmentos duplicados (azul-claro e cinza). Na síndrome de DiGeorge (SDG) ou na síndrome velocardiofacial (SVCF), a região completa de 3 Mb (ou, menos freqüentemente, seu segmento proximal de 1,5 Mb) é deletada de um homólogo. A duplicação recíproca é vista em pacientes com dup(22)(q11.2q11.2). Tetrassomia para 22q11.2 é vista em pacientes com síndrome do olho-de-gato. Note que a região duplicada no cromossomo da síndrome do olho-de-gato está em uma orientação invertida relativa à duplicação vista em pacientes com dup(22). Em contraste com a deleção relativamente comum de 22q11.2, a duplicação recíproca de 22q11.2 é muito mais rara e leva a uma série de malformações dismórficas e defeitos congênitos, sendo chamada de síndrome de duplicação 22q11.2. O diagnóstico desta duplicação geralmente requer análise por FISH em células em interfase ou por arranjo de CGH. Alguns pacientes têm um complemento quádruplo deste segmento do cromossomo 22 e são ditos como tendo a síndrome do olho-de-gato, que é caracterizada clinicamente por coloboma ocular, defeitos cardíacos congênitos, anomalias craniofaciais e retardo mental moderado. O cariótipo da síndrome do olho-de-gato é 47,XX ou XY, +inv dup(22)(pter→q11.2). A constelação de diferentes distúrbios associados a dosagens variáveis de genes neste segmento do cromossomo 22 (Fig. 6-9) reflete dois princípios principais da citogenética clínica. Primeiro, com raras exceções, dosagem alterada de gene de qualquer extensão cromossômica ou região genômica provavelmente resultará em anormalidade clínica, e seu fenótipo irá, a princípio, depender da haploinsuficiência ou superexpressão de um ou mais genes codificados na região. Segundo, mesmo pacientes portadores que parecem ter a mesma deleção ou duplicação cromossômicas podem apresentar uma série de fenótipos variados. Embora a base precisa para esta variabilidade seja desconhecida, ela seria devida a causas não-genéticas ou a diferenças na seqüência do genoma entre indivíduos não relacionados. OS CROMOSSOMOS SEXUAIS E SEUS DISTÚRBIOS Há muito tempo, os cromossomos X e Y vêm atraindo interesse devido às suas diferenças entre os sexos, pelo fato de possuírem padrões específicos de herança e por serem envolvidos com a determinação primária do sexo. Eles são estruturalmente distintos e sujeitos a diferentes formas de regulação genética, ainda que pareiem na meiose masculina. Por todas estas razões, eles necessitam de atenção especial. Nesta seção, nós revisaremos as anormalidades dos cromossomos sexuais mais comuns e suas conseqüências clínicas, o estado atual do conhecimento sobre o controle da determinação sexual e anormalidades mendelianas de diferenciação sexual. A Base Cromossômica da Determinação Sexual A diferente constituição de cromossomos sexuais das células de um homem e de uma mulher normais tem sido apreciada por mais de 50 anos. Logo após a análise citogenética tornar-se possível, a base fundamental do sistema de determinação sexual XX/XY tornou-se clara. Homens com síndrome de Klinefelter são vistos como tendo 47 cromossomos com dois cromossomos X, como também um cromossomo Y (cariótipo 47,XXY), enquanto muitas mulheres com síndrome de Turner são vistas como tendo apenas 45 cromossomos com um único cromossomo X (cariótipo 45,X). Estes achados, pronta e definitivamente, estabeleceram o papel crucial do cromossomo Y no desenvolvimento masculino normal. Além disso, comparando-se com as marcantes conseqüências da aneuploidia autossômica, estes cariótipos salientaram os efeitos relativamente modestos quanto à variação do número de cromossomos X, tanto em mulheres quanto em homens. A base para ambas observações é agora entendida em termos da biologia única dos cromossomos X e Y. Considerando que os cromossomos sexuais desempenham um papel determinante na especificação sexual primária (gonadal), um número de genes localizados em ambos os cromossomos sexuais e autossomos está envolvido na determinação sexual e subseqüente diferenciação sexual. Muitas vezes, o papel destes genes veio à luz em virtude de pacientes com anormalidades no desenvolvimento sexual, quer pela citogenética, por herança mendeliana, ou casos esporádicos, e muitos deles são discutidos em uma seção posteriormente neste capítulo. O Cromossomo Y A estrutura do cromossomo Y e seu papel no desenvolvimento sexual têm sido determinados tanto nos níveis moleculares quanto genômicos (Fig. 6-10). Na meiose masculina, os cromossomos X e Y normalmente emparelham-se pelos segmentos terminais dos seus braços curtos (Cap. 2) e sofrem recombinação naquela região. Os segmentos pareados incluem a região pseudoautossômica dos cromossomos X e Y, assim chamada porque as cópias desta região ligadas ao X e Y são essencialmente idênticas entre si e sofrem recombinação homóloga na meiose I, como pares de autossomos (Cap. 7). (Um segundo pequeno segmento pseudoautossômico é localizado na extremidade de Xq e Yq.) Em comparação com autossomos e com o cromossomo X, o cromossomo Y é relativamente pobre em genes e contém apenas cerca de 50 genes (Fig. 2-8). Notavelmente, no entanto, as funções de alta proporção destes genes são relacionadas ao desenvolvimento gonadal e genital. Figura 6-10 O cromossomo Y na determinação sexual e nos distúrbios de diferenciação sexual. Genes individuais e regiões implicadas na determinação sexual, sexo invertido, e defeitos de espermatogênese estão indicados. Embriologia do Sistema Reprodutivo O efeito do cromossomo Y sobre o desenvolvimento embriológico do sistema reprodutivo de homens e mulheres está resumido na Figura 6-11. Pela 6a semana de desenvolvimento em ambos os sexos, as células germinativas primordiais migraramde sua localização extra-embrionária inicial para as saliências genitais, onde são circundadas pelos cordões sexuais para formar o par de gônadas primitivas. Até este momento, a gônada em desenvolvimento, seja cromossomicamente XX ou XY, é bipotencial e é freqüentemente referida como indiferenciada. Figura 6-11 Esquema de eventos do desenvolvimento na determinação e diferenciação sexual de gônadas masculina e feminina. Envolvimento de genes individuais nas etapas-chave do desenvolvimento ou em distúrbios genéticos está indicado nos quadros azuis. Ver texto para discussão. O atual conceito é que o desenvolvimento em ovário ou testículo é determinado pela ação coordenada de uma seqüência de genes que leva normalmente ao desenvolvimento ovariano quando o cromossomo Y está ausente ou ao desenvolvimento testicular quando o Y está presente. A rota ovariana é seguida a menos que um gene ligado ao Y, designado fator testículo-determinante ( TDF), aja como um interruptor, desviando o desenvolvimento para a rota masculina. Na presença do cromossomo Y (com o gene TDF), o tecido medular forma testículos típicos com túbulos seminíferos e células de Leydig que, sob a estimulação da gonadotrofina coriônica da placenta, se tornam capazes de secretar androgênio (Fig. 6-11). A espermatogônia derivada das células germinativas primordiais por sucessivas mitoses alinha-se nas paredes dos túbulos seminíferos, onde elas permanecem juntas com as células de Sertoli de sustentação. Se nenhum cromossomo Y está presente, a gônada começa a diferenciar-se para formar um ovário, começando logo na oitava semana de gestação e continuando por várias semanas; o córtex desenvolve-se, a medula regride, e a ovogônia começa a desenvolver-se em folículos (Fig. 6-11). Iniciando por volta do terceiro mês, a ovogônia entra na meiose I, mas (como descrito no Cap. 2) o processo é parado em dictióteno até a ovulação ocorrer muitos anos depois. Enquanto as células germinativas primordiais estão migrando para as saliências genitais, o espessamento dos cordões indica desenvolvimento dos ductos genitais, o ducto mesonéfrico (inicialmente chamado de wolffiano) e o ducto paramesonéfrico (inicialmente chamado de mülleriano). No homem, as células de Leydig dos testículos fetais produzem androgênio, que estimula os ductos mesonéfricos a formar os ductos genitais masculinos. As células de Sertoli produzem um hormônio (fator inibidor mülleriano) que suprime a formação dos ductos paramesonéfricos. Na mulher (ou em um embrião com gônadas ausentes), os ductos mesonéfricos regridem, e os ductos paramesonéfricos desenvolvem-se no sistema de ductos femininos. A formação de ductos geralmente está completa por volta do terceiro mês de gestação. No embrião primitivo, a genitália externa consiste em um tubérculo genital, saliências lábio- escrotais e pregas uretrais alinhadas lado a lado. Deste estado indiferenciado, a genitália externa masculina desenvolve-se sob a influência dos androgênios. Na ausência de testículos, a genitália externa feminina é formada independentemente de se um ovário está presente. Gene Testículo-determinante, SRY Os primeiros estudos citogenéticos estabeleceram a função testículo-determinante do cromossomo Y. Nas três décadas subseqüentes, diferentes deleções da região pseudo-autossômica e da região determinante do sexo do cromossomo Y em indivíduos com sexo invertido foram utilizadas para mapear a localização precisa da região testículo-determinante primária no Yp (Caso 36). Enquanto os cromossomos X e Y normalmente trocam, durante a meiose I, as regiões pseudo- autossômicas Xp/Yp, em raras ocasiões, a recombinação genética ocorre fora da região pseudo- autossômica (Fig. 6-12), levando a duas anormalidades raras, mas altamente informativas: homens XX e mulheres XY. Cada um desses distúrbios de sexo invertido ocorre com uma incidência de um em 20.000 nascimentos. Homens XX têm fenótipo masculino com cariótipo 46,XX, que, em geral, possui alguma seqüência do cromossomo Y translocado para o braço curto do X. De maneira similar, uma proporção de fenótipos femininos com um cariótipo 46,XY perdeu a região testículo- determinante do cromossomo Y. Figura 6-12 Fatores etiológicos de fenótipos femininos em XY e masculinos em XX por troca aberrante entre seqüências ligadas a X e Y. Cromossomos X e Y normalmente se recombinam no segmento pseudo-autossômico Xp/Yp na meiose masculina. Se a recombinação ocorre abaixo do limite da região pseudo-autossômica, entre porções X-específica e Y-específica dos cromossomos, seqüências responsáveis pela diferenciação sexual masculina (incluindo o gene SRY) podem ser translocadas de Y para X. A fertilização por um espermatozóide contendo tal cromossomo X resultará em um homem XX. Em contraposição, a fertilização por um espermatozóide contendo um cromossomo Y que perdeu o gene SRY levará a uma mulher XY. O gene SRY (do inglês, Sex-Determining Region on the Y, região determinante do sexo no Y) situa-se próximo à fronteira pseudo-autossômica do cromossomo Y, está presente em muitos homens 46,XX, e é deletado ou mutado em uma proporção de pacientes mulheres 46, XY, portanto implicando fortemente SRY na determinação sexual masculina. SRY expressa-se apenas brevemente no início do desenvolvimento nas células do cordão germinativo imediatamente antes da diferenciação dos testículos. SRY codifica uma proteína ligada ao DNA que provavelmente é um fator de transcrição, embora genes específicos que fazem esta regulação sejam desconhecidos. Então, por todos os critérios genéticos e de desenvolvimento, SRY é equivalente ao gene TDF no cromossomo Y. No entanto, a presença ou ausência do SRY não explica todos os casos de determinação sexual anormal. SRY não está presente em cerca de 10% de homens XX sem ambigüidade e em muitos casos de hermafroditas (ver adiante) verdadeiros XX ou homens XX com genitália ambígua. Além disso, mutações no gene SRY representam apenas cerca de 15% das mulheres 46,XY. Portanto, outros genes estão implicados na via de determinação sexual e são discutidos em seções posteriores deste capítulo. Genes Ligados ao Y na Espermatogênese Deleções intersticiais em Yq têm sido associadas com ao menos 10% dos casos de azoospermia (nenhum esperma detectado no sêmen) não-obstrutiva e com aproximadamente 6% dos casos de oligospermia severa (contagem baixa de esperma). Estes achados sugerem que um ou mais genes, chamados de fatores de azoospermia (AZF), são localizados no cromossomo Y, e três regiões não- sobrepostas em Yq (AZFa, AZFb e AZFc) foram definidas ( Fig. 6-10). Análise molecular destas deleções tem levado a identificação de uma série de genes que podem ser importantes na espermatogênese. Por exemplo, a deleção da região AZFc contém várias famílias de genes que se expressam nos testículos, incluindo o gene DAZ (deletado na azoospermia), que codifica proteínas ligadas ao RNA que se expressam apenas nas células germinativas pré-meióticas dos testículos. Deleções de novo de AZFc surgem em cerca de um em 4.000 homens e são mediadas por recombinação entre longas seqüências repetidas (Tabela 6-1). Deleções de AZFa e AZFb, embora menos comuns, também envolvem recombinação. A prevalência de mutações AZF, deleções e seqüências variantes na população masculina em geral, como também sua contribuição na deficiência espermatogênica, ainda estão por ser completamente elucidadas. Aproximadamente 2% de homens considerados saudáveis sob outros aspectos são inférteis devido a defeitos graves na produção de esperma, e parece provável que deleções ou mutações de novo respondam por, ao menos, uma parcela disto. Portanto, homens com infertilidade idiopática deveriam ser submetidos à realização de cariótipo e testes moleculares do cromossomo Y, e a informação genética pode ser conveniente antes de iniciar reprodução assistida para tais casais. Nem todos os casos de infertilidade masculina são devidos a deleções cromossômicas. Por exemplo, uma mutação de ponto de novo foi descrita em um gene ligado aoY, USP9Y, cuja função é desconhecida, mas deve ser necessária para a espermatogênese normal (Fig. 6-10). O Cromossomo X Como indicado no Capítulo 5, a aneuploidia do cromossomo X está entre as anormalidades citogenéticas mais comuns. A relativa tolerância do cariótipo humano para anormalidades do cromossomo X pode ser explicada em termos de inativação do cromossomo X, processo pelo qual muitos genes de um dos dois cromossomos X em mulheres são epigeneticamente silenciados e falham em produzir qualquer produto. A inativação do X e suas conseqüências em relação aos distúrbios ligados ao X são discutidas no Capítulo 7. Aqui nós discutiremos os mecanismos cromossômicos e moleculares da inativação do X. Inativação do Cromossomo X Como será discutida em maior profundidade no Capítulo 7, a teoria da inativação do X é que nas células somáticas em mulheres normais (mas não em homens normais), um dos cromossomos X é inativado em uma fase precoce do desenvolvimento, portanto igualando a expressão dos genes ligados ao X nos dois sexos. Nas células normais femininas, a escolha de qual cromossomo X deve ser inativado é aleatória, sendo mantido em cada linhagem clonada. Deste modo, mulheres são mosaicos no que diz respeito à expressão de genes ligados ao X; algumas células expressam alelos do X herdados do pai, mas não herdados da mãe, enquanto outras células fazem o oposto (Fig. 6-13). Este padrão de expressão de gene diferencia muitos genes ligados ao X dos genes “imprintados” (que também são expressão de apenas um alelo, porém determinados pela origem parental, e não aleatoriamente), como também da maioria dos genes autossômicos que são expressos de ambos alelos. Figura 6-13 Inativação aleatória do cromossomo X no início do desenvolvi-mento feminino. Logo após a concepção de um embrião feminino, ambos os cro-mossomos X herdados do pai e da mãe (pat e mat, respectivamente) estão ativos. Na primeira semana de embriogênese, um ou outro X é escolhido de forma aleatória para tornar-se o futuro X inativo, através de uma série de eventos envolven-do o centro de inativação do X em Xq13.2 (quadro preto). Aquele X então se torna o X inativo (Xi, indicado pelo som-breamento azul) naquela célula e na sua linhagem e forma o corpúsculo de Barr no núcleo em interfase. Embora o cromossomo X inativo tenha sido primeiramente identificado citologicamente pela presença de uma massa heterocromática (chamada de corpúsculo de Barr) na interfase celular, existem muitas características epigenéticas que distinguem os cromossomos X ativo e inativo (Tabela 6-2). Assim como proporcionam esclarecimento a respeito dos mecanismos de inativação do X, estas características podem ser úteis para fins de diagnóstico para identificação do cromossomo X inativo no material clínico (Fig. 6-14). Tabela 6-2 Características Cromossômicas da Inativação do X • Inativação de muitos genes ligados ao X no X inativo • Escolha aleatória de um dos dois cromossomos X em células femininas • Inativação do X: Replicação tardia na fase S Heterocromática (corpúsculo de Barr) Expressa RNA do XIST Associada a modificações de histona macroH2A na cromatina Figura 6-14 Detecção da variante histona macroH2A no núcleo em interfase de mulheres com cariótipos 46,XX, 47,XXX, 48,XXXX e 49,XXXXX. Regiões de fluorescência brilhante indicam a presença de macroH2A associada aos cromossomos X inativos e ilustrara que o número de cromossomos X inativos (Xi) é sempre um a menos que o número total de cromossomos X. (Cortesía de Brian Chadwick, Dulce University Medical Center.) A região promotora de muitos genes na inativação do cromossomo X é extensivamente modificada pela adição de um grupo metila à citosina (Fig. 2-2) pela enzima DNA metiltransferase. Como apresentado no contexto de imprinting genômico no Capítulo 5, tal metilação do DNA está restrita a dinucleotídeos CpG (Cap. 2) e contribui para a formação de um estado de uma cromatina inativa. Diferenças adicionais entre cromossomos X ativo e inativo envolvem códigos de histona e parecem ser uma parte essencial do mecanismo de inativação do X. Por exemplo, a histona variante macroH2A é altamente enriquecida com cromatina inativa X e distingue os dois X nas células femininas (Fig. 6-14). Nos pacientes com cromossomos X extras, qualquer cromossomo X que exceda um é inativado (Fig. 6-14 e Quadro). Desta forma, todas as células somáticas diplóides, tanto em homens como em mulheres, têm um único cromossomo X ativo, independente do número total de cromossomos X ou Y presente. Embora a inativação do cromossomo X seja claramente um fenômeno cromossômico, nem todos os genes no cromossomo X estão sujeitos a inativação (Fig. 6-15). Extensivas análises de expressão de aproximadamente todos os genes ligados ao X têm demonstrado que ao menos 15% dos genes escapam da inativação e são expressos tanto pelo cromossomo X ativo como pelo inativo. Além disso, outros 10% demonstram inativação do X variável ou seja, eles escapam da inativação em algumas mulheres, mas não em outras. Notavelmente, estes genes não são distribuídos aleatoriamente ao longo do X; muito mais genes escapam da inativação no terminal Xp (tanto quanto 50%) do que no Xq (apenas um pequeno percentual) (Fig. 6-15). Este achado tem importantes implicações para a informação genética em casos de aneuploidia parcial do cromossomo X, como o desequilíbrio de genes em Xp pode ter significado clínico maior do que um desequilíbrio em Xq. Figura 6-15 Perfil de expressão gênica do cromossomo X. Cada símbolo indica o estado de inativação do X dos genes ligados ao X. A localização de cada símbolo indica sua posição aproximada no mapa do cromossomo X. Genes não expressos do X inativo (sujeitos à inativação) estão à esquerda. Genes expressos do X inativo (que escapam à inativação) estão à direita; genes representados em azul-claro são aqueles que escaparam da inativação em apenas um subgrupo de mulheres testadas. A localização do gene XIST e a do centro de inativação do X (XIC) está indicada em Xq13.2. (Dados baseados em Carrel L, Willard HF: X inactivation profile reveals extensive variability in X-linked gene expression in females. Nature 434:400-404, 2005.) Cromossomos Sexuais e Inativação do X O Centro de Inativação do X e o Gene XIST Por meio de estudos de cromossomos X inativados, estruturalmente anormais, o centro de inativação do X foi mapeado próximo a Xq, na banda Xq13 (Figs. 6-13 e 6-15). O centro de inativação do X contém um gene incomum, o XIST, que parece ser a chave para o locus regulador principal para inativação do X. XIST, um acrônimo para o X inativado (Xi)-fator específico de transcrição, (do inglês, (Xi)-Specific Transcriptis), tem a característica recente que é a expressão de apenas um alelo do X inativado; é transcricionalmente silencioso no X ativo tanto em células masculinas quanto femininas. Embora o exato modo de ação do XIST seja desconhecido, a inativação do X não pode ocorrer na sua ausência. O produto do XIST é um RNA não codificado que permanece no núcleo em íntima associação com o cromossomo X inativo e o corpúsculo de Barr. Inativação do Cromossomo X Não-aleatória Como mostrado na Figura 6-13, a inativação do X é normalmente aleatória em células somáticas femininas e leva ao mosaicismo de duas populações de células que expressam alelos de um ou de outro X. No entanto, há exceções quando o cariótipo apresenta um X estruturalmente anormal. Por exemplo, em quase todos os pacientes com anormalidades estruturais não-balanceadas de um cromossomo X (incluindo deleções, duplicações e isocromossomos), o cromossomo estruturalmente anormal é sempre o X inativo, provavelmente refletindo seleção secundária contra células não-balanceadas geneticamente que poderiam levar a anormalidades clínicas significativas (Fig. 6-16). Devido a esta inativação preferencial do X anormal, tais anomalias do cromossomo X têm um menor impacto no fenótipo do que anomalias similares dos autossomos e conseqüentemente são observadas, com mais freqüência.Figura 6-16 Inativação do X não-aleatória em cariótipos com cromossomo X anormal ou translocações X;autossomo. Células femininas normais (46,XX) submetem-se a inativação aleatória; os tecidos resultantes são um mosaico de duas populações de células em que cada X paterno ou materno é o X inativo (Xi, indicado pelo quadro azul). Indivíduos carregando um X estruturalmente anormal (X an) ou translocação X;autossomo em um estado balanceado ou não- balanceado apresentam inativação do X não-aleatória em que virtualmente todas as células têm o mesmo X inativo. A outra população de células é inviável ou está em desvantagem de crescimento devido ao não-balanceamento genético e é então pouco representada ou ausente. Ver texto para mais discussão: der(X) e der(A) representam os dois cromossomos derivados da translocação X; autossomo. Inativação não-aleatória é também observada em muitos casos de translocações de X; autossomo (Fig. 6-16). Se uma translocação é balanceada, o cromossomo X normal é preferencialmente inativado, e as duas partes do cromossomo translocado permanecem ativas, de novo refletindo provavelmente seleção, ao contrário das células nas quais genes autossômicos têm sido inativados. Na prole não-balanceada de portadores balanceados, no entanto, apenas o produto da translocação que carrega o centro inativo do X está presente, e este cromossomo é invariavelmente inativado; o X normal é sempre ativo. Estes padrões não-aleatórios de inativação têm apenas, em geral, efeito de minimizar, mas não sempre de eliminar, as conseqüências clínicas de um defeito cromossômico em particular. Em virtude de os padrões de inativação do X estarem fortemente relacionados a conseqüências clínicas, a determinação de um padrão de inativação do X de um indivíduo por análise citogenética ou molecular está indicada em todos os casos que envolvem translocações de X;autossomo. Uma conseqüência às vezes observada em portadores não-balanceados de translocações X; autossomo é que a própria quebra pode causar mutação pela interrupção de um gene no cromossomo X no sítio da translocação. A única cópia normal do gene específico está inativada em muitas ou todas as células devido à inativação do X não-aleatória do X normal, permitindo assim a expressão de um traço ligado ao X em uma mulher que normalmente seria observado apenas em homens hemizogotos (Cap. 7). Vários genes ligados ao X têm sido identificados quando um fenótipo tipicamente ligado ao X é encontrado em uma mulher que tem documentada a translocação X;autossomo. A mensagem clínica geral destes achados é que se uma paciente mulher manifesta um fenótipo ligado ao X normalmente visto apenas em homens, a análise cromossômica de alta resolução está indicada. O achado de uma translocação balanceada pode explicar a expressão fenotípica e mostrar a provável posição do gene no mapa do cromossomo X. Retardo Mental Ligado ao X Uma característica adicional do cromossomo X é a alta freqüência de mutações, microdeleções, ou duplicações que causam retardo mental ligado ao X. A incidência coletiva de retardo mental ligado ao X foi estimada em um de 500 a 1.000 nascidos vivos. Muitas vezes, o retardo mental é uma das muitas características fenotípicas anormais que, juntas, definem uma síndrome ligada ao X, e mais de 50 genes ligados ao X foram identificados em famílias com tais distúrbios. No entanto, existem muitos outros genes cujas mutações levam ao retardo mental ligado ao X isolado ou não-sindrô-mico, freqüentemente do tipo grave a profundo. O número de tais genes é consistente com o encontrado em muitos levantamentos em larga escala de que existe um excesso de 20% a 40% de homens entre as pessoas com retardo mental. Análise cromossômica detalhada está indicada como avaliação inicial para descartar uma anormalidade citogenética óbvia, tal como uma deleção. Anormalidades Citogenéticas dos Cromossomos Sexuais As anormalidades dos cromossomos sexuais, semelhantes às anormalidades dos autossomos, podem ser tanto numéricas quanto estruturais e podem estar presentes em todas as células ou na forma de mosaico. Como um grupo, distúrbios dos cromossomos sexuais tendem a ocorrer como eventos isolados sem fatores predisponentes aparentes, exceto para o efeito da idade materna avançada nos casos que se originaram de erros na meiose I materna. Sua incidência em crianças nascidas vivas, em fetos examinados no pré-natal, e em abortos espontâneos foi comparada no Capítulo 5 com a incidência de anormalidades similares dos autossomos e está resumida na Tabela 6-3. Há uma série de sinais clínicos que levantam a possibilidade de anormalidades dos cromossomos sexuais e, conseqüentemente, a necessidade de estudos citogenéticos ou moleculares. Estes, especialmente, incluem atraso no início da puberdade, amenorréia primária ou secundária, infertilidade, e genitália ambígua. Tabela 6-3 Incidência de Anomalias Cromossômicas Sexuais Aneuploidia dos cromossomos X e Y é relativamente comum, e anormalidades dos cromossomos sexuais estão entre os mais comuns de todos os distúrbios genéticos humanos, com uma incidência global de cerca de um em 400 a 500 nascimentos. Os fenótipos associados a estes defeitos cromossômicos são, em geral, menos severos que aqueles associados a distúrbios autossômicos comparáveis, devido à inativação do cromossomo X, como também ao baixo conteúdo de genes de Y, minimizando as conseqüências clínicas do desequilíbrio do cromossomo sexual. De longe, os defeitos de cromossomo sexual mais comuns em bebês nascidos vivos e em fetos são os tipos trissômicos (XXY, XXX e XYY), porém todos os três são raros em abortos espontâneos. Em contraste, a monossomia do X (síndrome de Turner) é menos freqüente em bebês nascidos vivos, mas é a anomalia cromossômica mais comum relatada em abortos espontâneos (Tabela 5-4). Anormalidades estruturais dos cromossomos sexuais são menos comuns; o defeito mais freqüentemente observado é um isocromossomo do braço longo de X, i(Xq), encontrado nas formas completas ou mosaicos de, ao menos, 15% das mulheres com síndrome de Turner. Mosaicismo é mais comum entre as anormalidades dos cromossomos sexuais do que entre as anormalidades dos autossomos, e em alguns pacientes está relacionado a uma expressão relativamente branda do fenótipo associado. As quatro síndromes bem definidas associadas a aneuploidia dos cromossomos sexuais são importantes causas de infertilidade ou desenvolvimento anormal, ou ambos, e conseqüentemente permitem uma descrição mais detalhada. Os efeitos destas anormalidades cromossômicas no desenvolvimento foram analisados em estudos multicêntricos de longo prazo, em mais de 300 indivíduos afetados, sendo alguns deles monitorados por mais de 35 anos. Para evitar o viés inerente ao estudo de casos raros o suficiente para serem referidos para centros médicos de avaliação, apenas casos detectados por triagem neonatal ou por diagnóstico pré-natal foram usados. As principais conclusões deste importante estudo clínico estão resumidas na Tabela 6-4. Como um grupo, pessoas com aneuploidia de cromossomo sexual apresentam baixos níveis de adaptação psicológica, desempenho educacional, desempenho ocupacional e independência econômica, e, em média, elas obtêm uma pontuação ligeiramente mais baixa nos testes de inteligência (QI). No entanto, em cada grupo observou-se alta variabilidade, tornando-se impossível generalizar para casos específicos. De fato, a impressão geral é um alto grau de normalidade, particularmente na fase adulta, que é notável entre os indivíduos com anomalias cromossômicas. Em virtude de quase todos os pacientes com anormalidades dos cromossomos sexuais apresentarem apenas leves anormalidades no desenvolvimento, a decisão dos pais de interromper uma gravidez em que é encontrado um feto com este tipo de defeito pode ser muito difícil. Tabela 6-4 Observações no Seguimento de Pacientes com Aneuploidia dos Cromossomos Sexuais Síndrome de Klinefelter (47,XXY) O fenótipo Klinefelter, a primeira anormalidade de cromossomo sexualhumana relatada, é mostrado na Figura 6-17. Os pacientes são altos e magros e têm pernas relativamente longas. Eles parecem fisicamente normais até a puberdade, quando os sinais de hipogonadismo se tornam óbvios. A puberdade ocorre na idade normal, mas os testículos permanecem pequenos, e as características sexuais secundárias não se desenvolvem. Ginecomastia é uma característica em alguns pacientes; por isso, o risco de câncer de mama é 20 a 50 vezes maior do que em homens 46,XY. Os pacientes com Klinefelter quase sempre são inférteis devido à falha no desenvolvimento das células germinativas, e estes pacientes são com freqüência identificados clinicamente pela primeira vez devido à infertilidade. A síndrome de Klinefelter é relativamente comum entre homens inférteis (cerca de 3%) ou homens com oligospermia ou azoospermia (5% a 10%). Na vida adulta, a persistência da deficiência androgênica pode resultar em diminuição do tônus muscular, uma perda da libido e diminuição da densidade mineral óssea. Figura 6-17 Fenótipo de um homem adulto com síndrome de Klinefelter, 47,XXY. Note os membros longos, o dorso e o tórax estreitos e a genitália relativamente pequena. Ginecomastia, ausente neste paciente, é urna característica em alguns homens Klinefelter. (De Grumbach MM, Hughes IA, Conte FA: Disorders of sex differentiation. In Larsen PR, Kronenberg HM, Melmed S, Polonsky KS [eds]: Williams Textbook of Endocrinology, 10th ed. Philadelphia, WB Saunders, 2003.) A incidência é de pelo menos um em 1.000 homens nascidos vivos (um em 2.000 do total de nascimentos). Como discutido anteriormente, um dos dois cromossomos X está inativado. Em virtude do fenótipo relativamente brando e variável, presume-se que muitos casos não sejam detectados. Cerca da metade dos casos de síndrome de Klinefelter resulta de erros na meiose I paterna devido à falha na recombinação normal Xp/Yp na região pseudo-autossômica. Entre os casos de origem materna, muitos resultam de erros da meiose I materna e o restante de erros na meiose II ou de erros mitóticos pós-zigóticos que levam ao mosaicismo. A idade materna está aumentada nos casos associados a erros na meiose I materna. Cerca de 15% dos pacientes com Klinefelter têm cariótipos em mosaico. Como grupo, tais pacientes mosaicos têm fenótipos variáveis; alguns podem ter desenvolvimento testicular normal. O cariótipo em mosaico mais comum é o 46,XY/47XXY, provavelmente como conseqüência de perda de um cromossomo X em um concepto XXY durante uma divisão pós-zigótica inicial. Existem muitas variantes da síndrome de Klinefelter, com outros cariótipos além de 47,XXY, incluindo 48,XXYY, 48,XXXY e 49,XXXXY. Como regra, os cromossomos X adicionais (ainda que eles estejam inativados) causam um fenótipo correspondente mais grave, com um maior grau de dismorfismo, maior comprometimento do desenvolvimento sexual e déficit mental de maior gravidade. Embora exista ampla variação fenotípica entre pacientes com esta e outras aneuploidias dos cromossomos sexuais, algumas diferenças fenotípicas consistentes foram identificadas entre pacientes com síndrome de Klinefelter e homens cromossomicamente normais. Compreensão verbal e desempenho estão abaixo dos homens normais e a pontuação em certos testes de inteligência está discretamente abaixo da esperada. Pacientes com síndrome de Klinefelter têm um risco várias vezes aumentado para dificuldades de aprendizagem, especialmente na leitura, o que pode requerer intervenção educacional. A síndrome de Klinefelter representa um percentual significativo entre os meninos que necessitam de educação especial. Muitos dos meninos afetados têm relativas dificuldades de adequação psicossocial, em parte relacionada à baixa auto-estima. Dificuldades de linguagem podem levar a vergonha, insegurança e imaturidade. Síndrome 47,XYY Entre todos os homens nascidos vivos, a incidência de cariótipo 47,XYY é cerca de um para 1.000. A constituição cromossômica 47,XYY não está associada a um fenótipo evidentemente anormal, e homens com este cariótipo não podem ser distinguidos dos homens 46,XY normais por qualquer traço físico ou característica comportamental. A origem do erro que leva ao cariótipo XYY deve ser a não-disjunção paterna durante a meiose II, produzindo espermatozóide YY. As variantes menos comuns XXYY e XXXYY, que compartilham características da síndrome XYY e da síndrome de Klinefelter, provavelmente também têm origem paterna como resultado de não-disjunção seqüencial na meiose I e na meiose II. Homens XYY identificados em programas de triagem neonatal sem viés de averiguação são altos e têm risco aumentado para problemas educacionais ou comportamentais em comparação com homens cromossomicamente normais. Eles têm inteligência normal e não são dismórficos. A fertilidade é, geralmente, normal, e parece que homens 47,XYY não têm risco particularmente aumentado para gerar uma criança cromossomicamente anormal. Cerca de metade dos meninos 47,XYY necessita de intervenção educacional devido a atraso de linguagem e dificuldades de leitura e escrita. Suas pontuações em QI são cerca de 10 a 15 pontos abaixo da média. Pais cuja criança é diagnosticada na fase pré-natal ou pós-natal como sendo XYY são, com freqüência, extremamente preocupados quanto às implicações comportamentais. Déficit de atenção, hiperatividade e impulsividade têm sido documentados em homens XYY, porém agressão significativa ou comportamento psicopatológico não é uma característica comum da síndrome. Isto é um ponto importante a ser enfatizado devido a relatos nas décadas de 1960 e 1970 de que a proporção de homens XYY era elevada em prisões e hospitais psiquiátricos, especialmente entre os internos mais altos. Sabe-se atualmente que esta impressão é incorreta. No entanto, a inabilidade para predizer o resultado em casos individuais faz da identificação de um feto XYY um dos maiores problemas em informação genética em programas de diagnóstico pré- natal. Trissomia do X (47,XXX) Trissomia do X ocorre em uma incidência de uma em 1.000 mulheres nascidas vivas. Mulheres com trissomia do X, embora um pouco acima da média em estatura, não são fenotipicamente anormais. Algumas são inicialmente identificadas em clínicas de infertilidade, porém muitas permanecem sem diagnóstico. Estudos de seguimento mostraram que mulheres XXX desenvolvem a puberdade na idade apropriada e são geralmente férteis, embora com um certo risco aumentado de ter uma prole cromossomicamente anormal. Há um déficit significativo no desempenho em testes de QI, e cerca de 70% das pacientes têm alguma dificuldade de aprendizagem. Comportamentos psicopatológico e anti-social graves parecem ser raros; porém, comportamento anormal é observado, especialmente durante a transição da adolescência para adulto jovem. Nas células 47,XXX, dois dos cromossomos X são inativados. Quase todos os casos originam- se de erros na meiose materna, e destes, a maioria se dá durante a meiose I. Existe uma relação com idade materna aumentada, restrita àqueles pacientes cujos erros ocorreram durante a meiose materna I. A síndrome da tetrassomia do X (48,XXXX) está associada a retardo do desenvolvimento mais grave tanto físico quanto mental. A síndrome da pentassomia do X (49,XXXXX), apesar da presença de quatro cromossomos X inativos (Fig. 6-14), geralmente inclui retardo mental grave e múltiplos defeitos físicos. Síndrome de Turner (45,X e Variantes) Diferentes dos pacientes com outras aneuploidias dos cromossomos sexuais, mulheres com síndrome de Turner podem ser freqüentemente identificadas ao nascimento ou antes da puberdade por suas características fenotípicas distintas (Fig. 6-18). A síndrome de Turner é muito menos comum do que outras aneuploidias dos cromossomos sexuais. A incidência do fenótipo da síndrome de Turner é de aproximadamente uma em 4.000 mulheres nascidas vivas, embora números mais altos tenham sido relatados em algumas pesquisas (Caso 42). Figura 6-18 Fenótipo de mulheres com síndrome de Turner, 45,X. A, Bebê recém-nascido.Note o pescoço alado e o linfedema das mãos e pés. B, Uma menina de 13 anos de idade apresentando características clássicas da síndrome de Turner, incluindo baixa estatura, pescoço alado, atraso na maturação sexual e tórax amplo em escudo com hipertelorismo mamilar. (De Moore KL: The Sex Chromatin. Philadelphia, WB Saunders, 1966.) A constituição cromossômica mais freqüente na síndrome de Turner é 45,X (às vezes escrita erroneamente como 45,XO) sem o segundo cromossomo sexual. No entanto, cerca de 50% dos casos têm outros cariótipos. Aproximadamente um quarto dos casos de síndrome de Turner envolve cariótipos em mosaico, nos quais apenas uma proporção de células é 45,X. Os cariótipos mais comuns e suas prevalências relativas aproximadas são como se segue: 45,X 50% 46,X,i(Xq) 15% 45,X/46,XX mosaico 15% 45,X/46,X,i(Xq) mosaico cerca de 5% 45,X, outra anormalidade do X cerca de 5% Outra 45,X/? mosaico cerca de 5% A constituição cromossômica é clinicamente importante. Por exemplo, pacientes com i(Xq) são semelhantes aos clássicos pacientes 45,X, enquanto pacientes com uma deleção de Xp têm baixa estatura e malformações congênitas, e aqueles com deleção de Xq freqüentemente têm apenas disfunção gonadal. Anormalidades típicas na síndrome de Turner englobam baixa estatura, disgenesia gonadal (geralmente gônadas em fita, refletindo manutenção da insuficiência ovariana), face com características incomuns, pescoço alado, baixa implantação posterior de cabelos, tórax amplo com hipertelorismo mamário, e elevada incidência de anomalias renais e cardiovasculares. Ao nascimento, bebês com esta síndrome freqüentemente têm edema no dorso dos pés, um sinal diagnóstico útil (Fig. 6-18A). Muitos pacientes têm coarctação da aorta, e mulheres com síndrome de Turner estão sob risco particular para anormalidades cardiovasculares. Linfedema pode estar presente na vida fetal, causando higroma cístico (visível à ultra-sonografia), que é a causa do pescoço alado visto no período pós-natal. A síndrome de Turner deve ser suspeitada em qualquer recém-nascido do sexo feminino com edema de mãos e pés ou com hipoplasia do lado esquerdo do coração ou coarctação da aorta. O diagnóstico também deve ser considerado em adolescentes com amenorréia primária ou secundária, especialmente se apresentam baixa estatura. Terapia com hormônio de crescimento deve ser considerada para todas as meninas com síndrome de Turner, podendo resultar em ganhos de 6 a 12 cm na altura final. As mulheres com síndrome de Turner geralmente têm inteligência normal, embora aproximadamente 10% das pacientes apresentem atraso do desenvolvimento significativo, necessitando de educação especial. No entanto, mesmo entre aquelas com inteligência normal, freqüentemente as pacientes exibem uma deficiência na percepção espacial, na organização motora perceptual ou na execução motora fina. Como conseqüência, a pontuação do QI não-verbal é significativamente inferior à pontuação do QI verbal, e muitos pacientes necessitam de intervenção educacional, especialmente em matemática. Mulheres com síndrome de Turner têm um elevado risco para inadequação social. Uma comparação entre meninas 45,X com um X materno e com um X paterno forneceu evidências de habilidades cognitivas sociais significativamente inferiores naquelas com X de origem materna. Em virtude de o imprinting genômico poder explicar este efeito dependente do genitor, a possibilidade de um gene “imprintado” ligado ao X está sob investigação. A alta incidência de 45,X em abortos espontâneos já foi mencionada. Esta anormalidade única está presente em uma estimativa de 1% a 2% de todos os conceptos; sobreviver até o termo da gestação é um desfecho raro, e mais de 99% de tais fetos são abortados espontaneamente. O X único é de origem materna em 70% dos casos; em outras palavras, o erro cromossômico que leva a perda de um cromossomo sexual é geralmente paterno. A base para a incomum alta freqüência de perda do cromossomo X ou Y é desconhecida. Além disso, não está claro porque o cariótipo 45,X é usualmente letal in utero porém é, aparentemente, completamente compatível com a sobrevida pós- natal. Os genes “perdidos” responsáveis pelo fenótipo da síndrome de Turner devem se localizar em ambos cromossomos, X e Y. Foi sugerido que os genes responsáveis estão entre aqueles que escapam da inativação do cromossomo X, particularmente em Xp, incluindo aqueles da região pseudo-autossômica. Pequenos cromossomos X em anel são ocasionalmente observados em pacientes com baixa estatura, disgenesia gonadal e retardo mental. Como o retardo mental não é uma característica típica da síndrome de Turner, a presença de retardo mental com ou sem outras anomalias físicas associadas em indivíduos com um cariótipo 46,X,r(X) foi atribuída ao fato de que em pequenos cromossomos X em anel falta o centro de inativação do X. A falha da inativação do X em anel nestes pacientes leva a superexpressão de genes ligados ao X que são normalmente submetidos à inativação. A descoberta de um X em anel em um diagnóstico pré-natal pode levar a uma grande incerteza, e estudos de expressão do XIST estão indicados. Grandes anéis contendo o centro de inativação do X e expressando o XIST predizem um fenótipo de síndrome de Turner; um pequeno anel faltando ou não expressando o XIST prediz um fenótipo muito mais grave. DISTÚRBIOS DO DESENVOLVIMENTO SEXUAL E GONADAL O sexo genético de um embrião é estabelecido no momento da fertilização. Anteriormente neste capítulo, nós discutimos o papel principal do cromossomo Y e do gene SRY na determinação sexual. Aqui nós examinamos o papel de vários genes ligados ao X e autossômicos no desenvolvimento ovariano e testicular e no desenvolvimento da genitália externa masculina e feminina (Tabela 6-5). Tabela 6-5 Exemplos de Genes Envolvidos em Anormalidades da Determinação e Diferenciação Sexual Gene Locus Citogenético Fenótipo Sexual Anormal SRY Yp11.3 Feminino XY (mutação) Masculino XX (gene translocado para X) SOX9 17q24 Feminino XY (com displasia camptomélica) Masculino XX (duplicação de gene) SF1 9q33 XY com sexo invertido e insuficiência adrenal WT1 11p13 Feminino XY (síndrome de Frasier) ou masculino pseudo-hermafrodita (síndrome de Denys-Drash) DAX1 Xp21.3 Feminino XY (duplicação de gene) ATRX Xq13.3 XY com sexo invertido (variável) WNT4 1p35 Feminino XY, criptorquidismo (duplicação de gene) FOXL2 3q23 Insuficiência ovariana precoce Atualizado de Fleming A, Vilain E: The endless quest for sex determination genes. Clin Genet 67:15-25, 2004; and Grumbach MM, Hughes IA, Conte FA: Disorders of sex differentiation. In Larsen PR, Kronenberg HM, Melmed S, Polonsky KS (eds): Williams Textbook of Endocrinology, 10th ed. Philadelphia, WB Saunders, 2003. Para alguns recém-nascidos, a determinação do sexo é difícil ou impossível porque suas genitálias são ambíguas, com anomalias que tendem a fazer que pareçam com o oposto do sexo cromossômico (Caso 36). Tais anomalias podem variar desde leves hipospádias em homens (uma anomalia do desenvolvimento na qual a uretra se abre no lado de baixo do pênis ou no períneo) a um clitóris aumentado em mulheres. Em alguns pacientes, tanto o tecido testicular quanto o ovariano estão presentes, uma condição conhecida como hermafroditismo. Anormalidades tanto da genitália externa quanto da interna não indicam necessariamente uma anormalidade citogenética dos cromossomos sexuais, porém pode ser devido, por outro lado, a alterações cromossômicas no cariótipo, a defeitos de um único gene, ou a causas não-genéticas. No entanto, a determinação do cariótipo da criança é parte essencial da investigação de tais pacientes e pode ajudar na orientação do manejo cirúrgico e psicológico, como também na consulta genética. A detecção de anormalidades citogenéticas, especialmente quando observadas em múltiplos pacientes, pode também fornecer importantes pistas sobre a localização e natureza dos genes envolvidos na determinação sexual e na diferenciação sexual (Tabela 6-6). Tabela 6-6 Anormalidades
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