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POLÍTICA DE HABITAÇÃO Ana Cristina da Silva Gomes Nariana Rodrigues de Freitas G es tã o P O L ÍT IC A D E H A B IT A Ç Ã O A na C ris tin a d a S ilv a G om es N ar ia na R od rig ue s d e Fr ei ta s Curitiba 2021 Política de Habitação Ana Cristina da Silva Gomes Nariana Rodrigues de Freitas Ficha Catalográfica elaborada pela Editora Fael. G633p Gomes, Ana Cristina da Silva Política de habitação / Ana Cristina da Silva Gomes, Nariana Rodrigues de Freitas. – Curitiba: Fael, 2021. 259 p. il. ISBN 978-65-86557-46-6 1. Habitação 2. Política habitacional I. Freitas, Nariana Rodrigues de II. Título CDD 363.5 Direitos desta edição reservados à Fael. É proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem autorização expressa da Fael. FAEL Direção Acadêmica Francisco Carlos Sardo Coordenação Editorial Angela Krainski Dallabona Revisão Editora Coletânea Projeto Gráfico Sandro Niemicz Imagem da Capa Shutterstock.com/ Vinicius Bacarin Arte-Final Evelyn Caroline Betim Araujo Sumário Carta ao Aluno | 5 1. Urbanização: consequências do capitalismo | 7 2. Violência urbana e segregação ambiental | 35 3. Desenvolvimento Sustentável e Globalização | 63 4. Habitação no Brasil | 89 5. Direito à moradia | 117 6. Habitação: direito à moradia para todos? | 145 7. Participação e controle social | 163 8. Habitação e intersetorialidade | 179 9. Sustentabilidade e responsabilidade social | 195 10. Serviço Social e políticas de habitação e meio ambiente | 209 Gabarito | 223 Referências | 239 Prezado(a) aluno(a), É de suma importância compreendermos que todas as pes- soas têm o direito constitucional à moradia, porém, a moradia vai além da casa em que se habita – morar é ter acesso à cidade como um todo, ou seja, com educação, saúde, emprego, alimentação, transporte, lazer, meio ambiente, assistência social, infraestrutura e outros. Sendo assim, esta obra irá apresentar o processo histórico da implementação das políticas habitacionais brasileiras, as con- sequências decorrentes do processo de urbanização e os desafios encontrados até os dias atuais. O livro traz uma leitura necessá- ria para o desenvolvimento de uma análise crítica do acadêmico, diante da realidade que está imposta no cotidiano profissional do Assistente Social. Tenha uma excelente leitura e bons estudos. Carta ao Aluno 1 Urbanização: consequências do capitalismo Para entender o significado da urbanização é preciso pen- sar que o crescimento aconteceu tanto em população quanto em extensão territorial. Este capítulo propõe relatar as consequências da urbanização, portanto é importante destacar que isso signifi- cou a ascensão para a riqueza, ou seja, um forte crescimento do sistema capitalista, que consequentemente desencadeou o cresci- mento das expressões relacionadas à questão social. De acordo com Carvalho e Iamamoto (1983, p. 77), “a questão social não é senão as expressões do processo de formação e desenvolvi- mento da classe operária e de seu ingresso no cenário político da sociedade, exigindo seu reconhecimento como classe por parte do empresariado e do Estado”. O expressivo aumento da popu- lação urbana levou à diminuição da população rural, resultando na migração populacional e a intensificação do êxodo rural. É possível observar que as pessoas que viviam na zona rural, ao migrar para cidades, buscavam oportunidades para melhorar de vida e obter acesso a recursos básicos para sua família, como escola, saúde emprego entre outros, muitas vezes não encontra- dos no meio rural, ou com acesso limitado. Por sua vez, todas Política de Habitação – 8 – as demandas levantadas nos fazem refletir sobre como esse processo se desenvolveu até os dias atuais. 1.1 Ascensão do capitalismo O momento de afirmação da hegemonia do capitalismo foi por volta da segunda metade do século XIX. Embora a Revolução Industrial tivesse ocorrido já no século XVIII, nos anos de 1870 o sistema de produção capi- talista dá um salto qualitativo e quantitativo com o advento da Segunda Revolução Industrial ou Revolução Tecnológica, resultando na propaga- ção de descobertas e invenções, o que diminuiu distâncias e aumentou a velocidade de produção, interligando-se com todos os países. Segundo Bonamente e Souza (2012, p. 11), Os notáveis avanços tecnológicos oriundos da Revolução Indus- trial transformaram a civilização a partir de meados do século 18. A divisão do trabalho em operações realizadas por diferentes indi- víduos proposta por Taylor possibilitou o aumento da produção e o aperfeiçoamento de uma série de máquinas para substituir o traba- lho humano. A medicina conseguiu reduzir a taxa de mortalidade infantil e a taxa de mortalidade geral, tendo como consequências o grande crescimento populacional, acompanhado da migração do campo para as cidades. Nas áreas urbanas, as novas fábricas absor- veram esta mão de obra migrante Por sua vez, surgiam os “[...] veículos automotores, os transatlân- ticos, os aviões, o telégrafo, o telefone, a iluminação elétrica e a ampla gama de utensílios domésticos, a fotografia, o cinema, a radiodifusão, a televisão [...]” (NOVAIS, 1998, p. 9). Tal período se tornou transforma- dor, resultando nas expressões relacionadas à questão social, uma vez que a vida urbana se tornava mais difícil, com a falta de estrutura para uma grande maioria de pessoas, o que resultava na falta de educação, saúde e moradia. No entanto, essas alterações aconteciam em diferentes realida- des, como no Brasil, Europa e Estados Unidos. Infelizmente, a Revolução Industrial foi marcada pelo desencadeamento das classes sociais, de modo que a divisão mais conhecida foi: a dos donos dos meios de produção, ou seja, de um lado os industriários e os grandes proprietários de terras, mais conhecidos como burguesia, e, do outro, os detentores da força de trabalho, ou seja, o proletariado, o trabalhador, o assalariado, atuando por – 9 – Urbanização: consequências do capitalismo meio da venda da sua força de trabalho. A classe burguesa e a classe traba- lhadora são os principais personagens do cenário que levou à ascensão do capitalismo naquele século. Deste modo, a partir da Revolução Industrial, o processo de crescimento das cidades acelerou, tendo como principal necessidade a mão de obra nas cidades, o que esvaziou o campo, tornando a cidade mais atrativa, uma vez que esta última necessitava de mão de obra para as indústrias. É evidente que esse processo ocorrido no século XX exacerbou a superioridade da cidade sobre o campo, ocorrendo a transição do trabalho humano para o trabalho automatizado. Cabe ressaltar que, em paralelo ao modelo capitalista da época, os autores Karl Marx e Friedrich Engels fizeram diversas críticas ao modo de produção capitalista. Segundo Sant’Ana (2014, p. 726), Historicamente, os homens foram desenvolvendo diferentes for- mas de produzir e se relacionar. O capitalismo é mais uma dessas formas e que tem como base a apropriação privada dos frutos do trabalho por parte do capital, o que faz com que este se expanda cada vez mais. Em contrapartida, expressa uma contradição fun- damental: a crescente pauperização (relativa ou absoluta) daquele que produziu os produtos em forma de trabalho assalariado. Tal crescimento revela o quanto o capitalismo é racional, pautado somente na ideia de acumulação dos meios de produção. Segundo Bona- mente e Souza, (2012, p. 12), O inchaço das cidades, somado ao adensamento excessivo, aumentou o grau de insalubridade e as condições de habitação tornaram-se crí- ticas: esgoto corria a céu aberto, lixo acumulava-se nas ruas estreitas, as famílias amontoavam-se em cômodos sem ventilação natural e a fumaça das fábricas enegrecia o ar, sem falar nos incêndios e epide- mias, que ocorriam com frequência, destruindo bairros inteiros. O historiador Lewis Mumford (1991, p. 484) afirmou que o “indus- trialismo, a principal força criadora do século XIX, produziu omais degradado ambiente urbano que o mundo jamais vira”. Na perspectiva de compreender esse sistema capitalista, tomaremos para análise as divisões de trabalho e a reprodução social, no que tange ao homem como um ser social, que transforma a natureza em bens necessários para a reprodução social, demonstrando sua relação com o trabalho, ou seja, o uso da terra e dos bens materiais a serem transformados (CRUZ, 2012). Política de Habitação – 10 – Anterior ao sistema capitalismo industrial, (...) “nasce na Inglaterra, a partir do século XVIII, determinada forma hegemônica de apropriação privada do principal meio de trabalho na época: a terra [...]” (CRUZ, 2012, p. 243). Neste sentido, a produção de alimentos se tornava essencial e dominadora na época, sendo considerado o principal meio de consumo e força de trabalho humana. Marx (1984) enaltece que o percurso de acu- mulação primitiva, sendo executado com condições favoráveis ao capital, torna-se propício a uma nova propriedade privada, e, consequentemente, resulta na divisão entre o produtor e os meios de produção. “Vale dizer, que o trabalho assalariado não é criado em sua plenitude senão pela ação do capital sobre a propriedade. da terra” (MARX, 1980 apud Iamamoto, 2001, p. 64). Neste contexto, a reprodução social e o trabalho constroem a for- mação do regime capitalista socioeconômico, mostrando a dominação de classes por meio da apropriação da terra, revelando que o acúmulo do capital se dá por meio da produção do excedente e da exploração, trans- formando o valor de uso em valor de troca. Segundo Cruz, (2012, p. 244): [...] em função da perda da propriedade dos meios de sobrevivên- cia (terra) ou a insuficiência dos mesmos houve um abandono do campo e migração para as cidades, onde a generalização das rela- ções mercantis e, portanto, da proletarização avançada. Entretanto, a forma não assalariada de trabalho no campo permanece até o pre- sente, devendo-se compreender as estratégias que os agricultores encontram para a permanência e em que medida são capturados e/ ou resistem à dinâmica do capital [...]. Hoje em dia, o manuseio da terra por pequenos agricultores é muito baixo, pois o custo da manutenção desta é acessível àqueles que possuem o poder, ou seja, a lógica do capital é intuitiva a forçar o trabalhador do campo a se desestimular da agricultura e ir ser mão de obra nas áreas urba- nas. É uma questão de sobrevivência. Neste contexto, à medida que há um domínio econômico e político da burguesia, esta contribui para o fim da estrutura social dos pequenos donos de terras, de modo que estes últimos são dominados pelo capital, ou seja, tornam-se reféns do capital, sendo esta sua única opção de sobrevivência. A importância deste capítulo está no fato de indagar como esse capital se tornou poderoso e monopolizado, paralelo ao crescimento das cidades – 11 – Urbanização: consequências do capitalismo e da perda de posse da terra por parte dos pequenos e médios agricultores, Vale ressaltar que a proposta de construção de indústrias e fábricas se tor- nou atrativa a partir do momento que não havia interesse do mercado em aderir às mercadorias dos pequenos proprietários de terra, cuja produção era somente para se vestir e se alimentar. “O modo de produção capitalista racionalizou a produção agrícola às custas da total pauperização dos pro- dutores diretos” (CRUZ, 2012, p. 245). Ou seja, os pequenos agricultores foram obrigados a se tornar assalariados dos arrendatários. Por sua vez, estes últimos pagavam pelo uso da terra, mas não o que esta valia após a sua produção, e sim o que era vantajoso para o capital. Destarte, o cres- cimento da industrialização urbana implica a diminuição da população rural, pois o camponês precisa sobreviver e se torna dependente financei- ramente do capital, diminuindo a grande família camponesa, pois não há possibilidade de expansão de sua propriedade, o que aumenta as dificul- dades de sua sobrevivência, fazendo-o recorrer a atividades assalariadas. Segundo Kautsky (1986, p. 21), esse processo Produz entre os pequenos camponeses a necessidade de um ren- dimento suplementar além daquele que lhe oferece o estabeleci- mento agrícola de sua propriedade. A área de plantio do pequeno agricultor é excessivamente restrita e não permite produção que exceda a demanda de sua própria família; dele não tem produtos agrícolas que possa levar ao mercado. A única mercadoria que lhe resta então para vender é a própria energia de trabalho, que excede a requerida temporiamente pelo próprio estabelecimento. Um dos modos de aproveitá-la é a sua transformação em trabalho assala- riado, a serviço de estabelecimentos maiores. Desse modo, dessa transformação resultou o camponês assalariado, e, do capital, o patrão, preconizando as condições dos trabalhadores com longas jornadas de trabalho, exploração do trabalho infantil, distancia- mento do acesso à educação, tornando-se um monopólio de poder. Des- taca-se ainda que o campesinato foi de suma importância para o cresci- mento do capital desde o seu nascimento. Para um maior entendimento do processo de industrialização/urba- nização do Brasil e seus impactos socioambientais, é preciso considerar seus aspectos desde a colonização até as suas transformações econômicas, sociais, culturais, políticas e ambientais, destacando sua origem – quando Política de Habitação – 12 – a Coroa portuguesa realizava a exploração dos recursos naturais e execu- tava a exterminação dos povos que habitavam naquela época em deter- minada propriedade – e revelando, tanto no período da Colônia (1500) quanto do Império (1822), que a economia prevalecente era executada com base na mão de obra escrava. O marco jurídico da época foi a criação de uma lei que determinou a institucionalização da propriedade privada, no ano de 1850 – a Lei de Ter- ras. Já em 1888 aconteceu a abolição da escravatura, porém o contingente de mão de obra escrava, ou seja, os ex-escravos não possuíam meios de compra de terras, tornando-se assalariados. Em 1889, a partir da República Velha, o Estado brasileiro vivenciou a crise entre os interesses econômicos coloniais e imperiais, que divergiam entre si, e cujo objetivo era a modernização do país. Com isso, iniciou-se o processo de industrialização (CRUZ, 2012). No início do século XX, diante da crise econômica mundial, a eco- nomia agroexportadora no estado do Rio de Janeiro agoniza. Nesse sentido, a “Revolução de 30” abre caminho para uma mudança na base econômica brasileira que o Estado Novo dá continuidade, redirecionando o uso do solo que anteriormente se voltava para a produção agrícola e que passa a servir à ocupação industrial e urbana (CRUZ, 2012, p. 249). Com isso, o estudo da Revolução de 1930 reflete sobre o uso e a apropriação da terra, o surgimento industrial, o fortalecimento do capi- talismo e a expansão da riqueza por meio do acúmulo do excedente (ou seja, o excedente é a parcela das riquezas produzidas que remanescem das riquezas consumidas durante o processo de produção capitalista) e o surgimento das cidades. 1.1.1 Êxodo rural, definição e contribuição para o processo de urbanização O êxodo rural foi a migração da população rural para as cidades, ocorrido em nível mundial, “em função da transição da economia de base agroexportadora para uma economia urbano-industrial” (PRIORI, A., et al. 2012, p. 115). Surgiu a partir da crise do café, em 1929, quando o Estado atendia aos interesses das oligarquias cafeeiras, cujo objetivo era aumentar a produção nacional. No entanto, em consequência ocorreram os – 13 – Urbanização: consequências do capitalismo conflitos com os donos das terras, problemas sociais, concentração fundiá- ria e desemprego no campo. Segundo Priori et al (2012, p. 116), A partir de 1850, a implantação da Lei de Terras no Brasil e a proi- bição do tráfico negreiro (que resultaria na implantação do trabalho livre no país) marcaram transformações profundasna economia agrícola, principalmente com a consolidação do café, como princi- pal produto exportador, e a incorporação, a partir de 1870, de um novo sistema de trabalho: o colonato, com o estabelecimento de unidades familiares, formadas por imigrantes, no Oeste do Estado de São Paulo. A formação do complexo cafeeiro aumentou a divi- são social do trabalho e estimulou a divisão entre campo/cidade e agricultura/indústria na economia brasileira. Diante do exposto, é evidente que a produção do café estimulou a divisão social do trabalho, estimulando o crescimento das cidades e a ascensão do capital. Porém, cabe ressaltar que no ano de 1929 aconteceu a quebra da Bolsa de Valores de Nova York, e isto afetou diretamente a economia cafeeira no Brasil, resultando em uma industrialização tardia. Priori et al (2012) retratou que nesse momento o Estado assumiu um papel de regulador na economia brasileira, com as transformações em razão da transição de um economia agrário-exportadora para uma economia urbana e industrial. O autor ainda acrescenta que Nos anos entre 1940 e 1960 a economia brasileira caracterizou- -se pela industrialização substitutiva das importações, por uma revalorização do café em âmbito internacional, seguida de uma supervalorização da moeda nacional e da concentração industrial na região Sudeste do país. Principalmente nos Estados de São Paulo e Paraná, desenvolveu-se o cultivo do café, impulsionado pela procura deste produto no mercado mundial daquele momento. O modelo de substituição das importações fez com que o Brasil alcançasse o capitalismo industrial. Esse processo foi decorrente da diminuição do valor e o volume das exportações desde a crise econômica de 1929, obrigando a se produzir localmente os pro- dutos que antes eram importados. Essas alterações modificaram o contexto político nacional, e os trabalhadores urbanos ganharam maior importância. O que marcou essa transformação foi a passa- gem de um sistema de base agroexportadora para uma sociedade urbana e industrial (PRIORI et al, 2012, p. 117) Destarte ainda, que esse foi nesse período que que houve o fortale- cimento da indústria e da modernização econômica, com todas as trans- Política de Habitação – 14 – formações decorrente ao processo de modernização agrícola, a técnica de produção foi substituída, por meio da mecanização, irrigação conservação e utilização de fertilizantes, e entre outros, resultando na diminuição de tratores, arados, consumo de óleo diesel e consumo de energia elétrica., resultando na eliminação de muitos empregos no campo, acelerando as migrações para as cidades, intensificando o êxodo rural, com uma popula- ção excluída. (Ainda Priori, A, et al, 2012). É importante reconhecer que: (...) a transferência da população do campo para a cidade não foi um fenômeno provocado apenas pela modernização agrícola. A substituição do café por culturas oleaginosas diminuiu signifi- cativamente a utilização de mão de obra no meio rural, já que a soja e o trigo, por exemplo, não eram plantações permanentes, pois estavam inclusas no sistema de rotação de culturas, além de contarem com um elevado nível de mecanização, dispensando a utilização de grande quantidade de mão de obra (PRIORI et al, 2012, p. 123). Entende-se que a transição do campo para a cidade envolve as esfe- ras econômica, política e cultural, assim, a modernização agrícola resul- tou nas maiores mazelas sociais vivenciadas até os dias de hoje, com o desemprego no campo, a migração para outros Estados e até mesmo paí- ses, a mão de obra de boias-frias, os trabalhadores sem-terra nos assenta- mentos em áreas rurais e a legislação que privilegia a classe dominante e gera maior conflito de classes. Cabe lembrar que no ano de 1995 houve a implantação do Programa Vilas Rurais, pelo governo do Paraná, cuja meta era amenizar as expressões da questão social deixadas pelo êxodo rural e proporcionar possibilidades de produção em pequenos lotes, bem como a geração de renda por meio da agricultura familiar, mas isto não foi sufi- ciente para sanar a exclusão e a desigualdade social deixada pela migração do campo para a cidade e pela luta por terras, por parte dos grandes indus- triários e da burguesia. No caso das Vilas Rurais, o trabalho árduo e a baixa renda finan- ceira força o trabalhador ou seus familiares a complementar sua renda em empregos na área urbana. Dessa forma, os beneficiados por esse programa acabam se constituindo em uma massa de tra- balhadores volantes, que se identificam, muitas vezes, mais com o modo de vida urbano do que rural. (Priori, A, et al, 2012, p. 125). – 15 – Urbanização: consequências do capitalismo Mesmo com a criação do Programa Vilas Rurais, o trabalhador ainda necessitava buscar alternativa de renda, ou seja, a produção em seu pequeno lote não era suficiente. Há de se considerar que o processo de modernização trouxe diversos benefícios, especialmente para o setor eco- nômico. Com o passar dos anos, o processo foi se aprimorando com as diversas tecnologias, e isso resultou em aumento da produtividade. No entanto, a mudança foi rápida, pois a matéria-prima, os recursos naturais, ou seja, a cultura, foi adaptada à mecanização com excelência, como a soja, a cana-de-açúcar, entre outras culturas. Diante das transformações, somos levados a refletir que a mecanização como algo amplo, não apenas no aspecto rural, mas como um avanço tecnológico, é necessário para a produção mundial, pois as novas tecnologias reduzem o tempo de produ- ção e aceleram a produção em massa. Sendo assim, o processo de êxodo rural necessita ser analisado como uma migração de território que trouxe vantagens e desvantagens para a sociedade civil. 1.2 Processo de crescimento das cidades De acordo com o Dicionário Escolar (2009), a palavra crescimento, significa ato ou efeito de crescer, desenvolvimento. Portanto, um conceito paralelo ao capítulo é a expansão, ou seja, o aumento das cidades, signi- ficando aglomeração urbana de porte. Pois bem, para compreendermos como correu o processo de crescimentos das cidades, vale destacar que, para se tornar um integrante da sociedade urbana, é necessário ter uma moradia, seja ela em casa de alvenaria, madeira, debaixo de uma ponte ou até mesmo coberta por um papelão. O crescimento do capital possibilitou a evolução das cidades, porém é correto afirmar que esse crescimento foi excludente, decorrente da sua estruturação por meio do processo de industrialização ocorrido entre as décadas de 1930 e 1980, e que envolve a história social, cultural, eco- nômica e política da época. Tal crescimento decorreu por cinco décadas, sendo lembrado como um período negativo e marcado por crises do capital internacional, alto índice de desigualdade social, saturação nos sistemas de abastecimento de água, dificuldades no trânsito, problemas dos rejeitos e suas formas de descante e elevado tempo de viagem dos trabalhadores Política de Habitação – 16 – até a chegada à sua residência, se que essa problemática permanece até os dias atuais, porém com nova rotulagem e abordagem. Cabe destacar que a segregação urbana é oriunda do crescimento desordenado das cidades, as quais são expandidas sem planejamento. Com relação ao tema, a figura abaixo nos mostra a cidade de São Paulo. Nela, a diferença social é nítida e preocupante, pois a qualquer momento as moradias precárias podem ser destruídas, seja por acidente, calamidade pública ou ação do homem representante do Estado. Souza (2019) relata que Paraisópolis fica em uma região que ainda era uma zona rural da cidade no iní- cio do século passado. Hoje, vivem na comunidade cerca de 100 mil pessoas, e Paraisópolis continua a crescer, mesmo com graves problemas de sanea- mento, mobilidade e segurança. No mês de dezembro de 2019, uma ação da Polícia Militar no Baile da 17, neste local, terminou com nove jovens mortos. Muitos dos seus moradores atualmente são da terceira, quarta ou até quinta geraçãodas famílias dos primeiros moradores. Sua ocupação se deu no ano de 1950, de forma irregular, quando São Paulo começou a se industrializar e recebia muitos imigrantes pobres do interior do estado, Minas Gerais e Nordeste. Figura 1.1 – Vista da comunidade de Paraisópolis, na zona sul de São Paulo Fonte: Imagem: TIAGO QUEIROZ/ ESTADÃO. Ao avaliar as grandes cidades do Brasil, considerando as áreas cons- truídas em todo seu território, constata-se que o uso ilegal da terra e a ilegalidade das construções e edificações em solo urbano podem alcançar – 17 – Urbanização: consequências do capitalismo mais de 50% da área já construída. Podemos refletir, então, como estão os documentos de cadastro de imóveis de cada cidade, para obter o resultado da realidade brasileira (WEGRZYNOVSKI, 2016). A busca pela atuação do governo diante da realidade fiscal nos remete à irregularidade e à falta de interesse, por parte do Estado, em fiscalizar, porém o que é estabele- cido em legislação magna é que o Estado seja punitivo, fiscalizador e o garantidor da segurança e acesso ao básico, ou seja o fundamental para a sociedade civil, ou seja, o Estado tem a responsabilidade de prover os meios para a garantia do direito à moradia, previsto na Constituição Fede- ral. Desse modo, se o Estado assim fizesse, não haveria as irregularidades e desastres ambientais, mas o que se vê é um jogo de interesse entre bur- guesia e Estado. De acordo com Wegrzynovski (2016, p.), As cidades vêm desenvolvendo e avançando nos cadastros das áreas de ocupação irregular, através de setores de monitora- mento que têm como objetivo fiscalizar os loteamentos clandes- tinos, invasões de áreas públicas, construções em áreas de risco e núcleos de favelas. Porém ainda existem muitas cidades brasileiras que não possuem nenhuma ação para esse monitoramento, onde os cadastros municipais estão incompletos e defasados. A falta de um cadastro dessas áreas gera uma cidade ilegal e inexistente, pois o poder público não pode intervir nessas áreas. Nesse sentido ela existe como espaço, mas inexiste como cidade legal, onde a população que reside neste espaço não possui o direito de ter um endereço fixo e o poder público não pode intervir de forma oficial. A problemática exposta na citação da autora Wegrzynovski nos indaga sobre as formas de acesso e garantias de direitos sociais a essa população que reside de forma ilegal. Alguns tipos de benefícios socioassistenciais são administrados pelos municípios (em cooperação nas três esferas, ou seja, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário), porém alguns cabem à lei municipal, como os programas de complementação alimentar. Inclusive, as secretarias municipais de habitação contam com Assistentes Sociais nas equipes, no sentido de garantir elaboração de critérios apropriados e atendimento que vise à garantia de direitos da população alcançada. É evidente pensar que, surgindo desvantagens e perdas por parte do trabalhador, decorrente ao processo capitalista, a atitude seria congelar as atividades e buscar outras localidades que atendem ao capital e não prejudicam o trabalhador, quando nos referimos à sociedade civil, mas Política de Habitação – 18 – isso não ocorre, pois os dados apresentados nos mostram o contrário – as cidades em expansão e o acelerado crescimento de indústrias, bem como a degradação ambiental. Segundo Instituto de Pesquisa Econômica Apli- cadas – IPEA (2006, p. 7), Um dos problemas mais complexos da moradia na cidade é a ocu- pação de áreas de preservação ambiental e/ou áreas onde a fixação de moradias é proibida por lei. Muitos loteamentos, favelas e até mesmo alguns conjuntos habitacionais situam-se nas proximida- des ou dentro de áreas de proteção ambiental. Neste sentido, pode-se afirmar algumas consequências da urbaniza- ção, como expansão populacional; pressão do comércio imobiliário, cujo objetivo é o acúmulo da riqueza e o acesso somente àquelas pessoas que possuem posses; crescimento do número de pessoas em busca de uma moradia própria e melhores condições de vida; aumento da violência urbana; e crescente o número de solicitações dos benefícios socioassisten- ciais. De acordo com Wegrzynovski, (2016, p. 5), O planejamento urbano tem se tornado uma prática que vem con- siderando cada vez mais o mercado imobiliário, através de leis que regulamentam o uso e o zoneamento do solo. Essas propostas, chamadas de “solo criado”, vêm desde a década de 1970 e 1980, envolvendo diversos pensadores com as mais diferentes ideolo- gias, refletindo sobre o acúmulo de análises e de soluções para a resolutividade de vários conflitos, que são gerados entre a pro- priedade privada e a ocupação ilegal e irregular das áreas urbanas. Neste sentido, cabe entender como o planejamento urbano está sendo monopolizado pelos burgueses imobiliários que estão em debate com a meta de busca e resolutividade dos problemas urbanos, ambientais e da popula- ção. A efetivação da primeira Norma foi no ano de 1990, por meio do Planos Diretores (PDs), os quais fixam, no item 3.3 – função social da cidade, as condições para orientar a elaboração do Plano Diretor de cada município: Função que deve cumprir a cidade a fim de assegurar as condições gerais para o desenvolvimento da produção, do comércio e dos serviços, e, particularmente, para a plena realização dos direitos dos cidadãos, como o direito à saúde, ao saneamento básico, à edu- cação, ao trabalho, à moradia, ao transporte coletivo, à segurança, à informação, ao lazer, à qualidade ambiental e à participação no planejamento. (ABNT – Normas Plano Diretor, 1991). – 19 – Urbanização: consequências do capitalismo Conforme Bonamente e Souza (2012, p. 20) “Ressalta-se que a ela- boração de planos diretores para cidades com mais de 20 mil habitantes é uma exigência constitucional tanto em nível federal, como também é exigência de alguns estados brasileiros”. Sendo assim, essa Norma é um Instrumento básico de um processo de planejamento municipal para a implantação da política de desenvolvimento urbano, norteando a ação dos agentes, ou seja, o que pode ser realizado e não em determinado território. Ainda segundo os mesmos autores, Os planos diretores, enquanto documentos de ordenamento do espaço urbano, surgiram na esteira do desenvolvimento das pri- meiras legislações urbanísticas. O Estado (aqui entendido como governos federal, estaduais e municipais), a partir da Revolução Industrial e de suas consequências também nefastas ao espaço urbano, sentiu-se na obrigação de controlar a deterioração da qua- lidade de vida nas cidades. Passou-se a regular principalmente a construção de edificações particulares, que surgiram no afã de prover habitação à população migrante em busca de trabalho nos grandes centros (BONAMENTE; SOUZA, 2012, p. 22). No entanto, o autor Maricato (1995, p. 5) menciona que tais nor- mas muita das vezes são “[...] dissolvidas ou diluídas pelas práticas do favoritismo e do pragmatismo dos interesses individuais e são mediadas pela corrupção, que, infelizmente, acaba denegrindo a imagem do poder público [...]”. Considerando ainda Mariacato (1995. p. 23), A legislação detalhista e “rigorosa” contribui para a prática de corrupção e constitui um exemplo paradigmático da contradição entre a cidade do direito e a cidade do fato. Pois em um ambiente onde ‘a infração, além de infração, é norma, e a norma, além de norma, é infração, como se deveria esperar de uma contravenção sistemática?’, qual é o papel das leis que pretendem regulamentar procedimentos detalhados do universo individual do interior da moradia, quando a maior parte das moradias e do contexto urbano constitui um imenso universo clandestino que ignora normas mais gerais e básicas? Tal afirmação mencionada pelo autor se caracteriza pelo famoso “jei- tinho” brasileiro, voltado ao cunho político eleitoral, perpassando o os poderes Executivo e Legislativo, dos quais, ao último compete ajustar a legislaçãoconforme o planejamento e a realidade, pautado na legalidade. O não favorecimento aos burgueses privilegiaria a classe trabalhadora, Política de Habitação – 20 – promovendo habitação legal, e não estruturas desprovidas do básico para sua moradia. Não havendo práticas ilegais, a população não teria de ficar à mercê do poder público. Vale lembrar que a população sem ocupação legal são trabalhadores excluídos da sociedade capitalista, os quais buscam um espaço na sociedade, ficando com as migalhas do capital. Tais habitações não possuem documentação para esse ocupante, e, por essa razão, este não terá acesso a uma escritura legal e à tranquilidade diária. Toda essa exclusão resulta na sabotagem dos ocupantes, que acabam praticando irre- gularidades para garantir a sua sobrevivência e o bem-estar social de sua família, como a instalação de rede elétrica de energia irregular (puxando energia do vizinho – ação que pode resultar um alto consumo de energia e possíveis acidentes, como curto-circuito). Segundo Wegrzynovski (2016), não há interesse por parte do Estado em fiscalizar tal ato irregular, pois estes servem para a prática do clientelismo em período eleitoral, sendo praticado há muitos anos no Brasil. Ao profissional da área, que irá atuar diretamente com a demanda, é necessário comunicar os direitos sociais e fundamentais, conforme está preconizado na Constituição Federativa do Brasil, em seu art. 6: São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição (BRASIL, 1998). A moradia, como direito constitucional, se refere aos mínimos sociais; é necessário que haja habitabilidade, e não somente mínimos de existên- cia. Concebida como direito, a moradia não é assistencialismo ou campa- nha eleitoral de qualquer esfera de governo. Segundo Engels (2015, p. 17), o Estado burguês não quer e não pode eliminar a miséria habitacional, pois o Estado nada mais é que a totalidade do poder organizado das classes possuidoras, dos proprietários de terras e dos capitalis- tas em confronto com as classes espoliadas, os agricultores e os trabalhadores. O autor Engels, crítico ao sistema capitalista e autor de obras relacio- nadas à habitação, nos faz pensar sobre os interesses e o acesso à habitação, sendo que sua afirmação é que o Estado não tem interesse em eliminar a questão da moradia, sendo contrário à legislação magna. No entanto, a ques- tão de ocupação no meio urbano vem ganhando mais destaque de atuação – 21 – Urbanização: consequências do capitalismo por parte do Poder Judiciário e do Ministério Público, por meio de nego- ciações e processos judiciais que envolvem o nível municipal e estadual, estadual e judiciário por longos períodos (WEGRZYNOVSKI, 2016). Em se tratando de Ministério Público, cabe ressaltar que, em muitos casos, este é um facilitador para a garantia e acesso aos direitos sociais, sendo reque- rido, muitas vezes, pelo departamento social dos municípios e em casos de calamidade pública. De acordo com Wegrzynovski, (2016, p. 7), O senso comum afirma que o Poder Judiciário vem atuando de forma flexível nas questões urbanas e nos casos de ocupações de terras, porém este conceito, desde os anos de 1980, mostra que não é real, pois vários casos que aparecem diariamente na mídia levam para outras conclusões. É importante, diante disso, analisar os intransigentes conflitos nas disputas pelas terras urbanas entre os poderes Judiciário e Executivo. Em muitos casos de ocupações irregulares do solo urbano, a atuação do Poder Judi- ciário torna a negociação pacífica entre ocupantes e proprietários. Porém, em outros casos, onde existe uma ação de despejo, muitos proprietários não são sensíveis às questões sociais, e utilizam meios mecânicos para destruir as construções edificadas em seus terrenos, com ou sem morado- res dentro. Em casos de ocupações em áreas particulares, o poder púbico não pode intervir. Certamente, o Poder Judiciário, em sua atuação profissional, atende de forma diferenciada, sendo flexível nos casos de ocupação das terras, e, em algumas vezes pacíficas, mas, dependendo do nível de invasão a terras, age de forma racional e destruidora. Em paralelo às áreas particulares, este não intervém, sendo tal fato excludente e desigual, retratando a verda- deira expressão da questão social. Um caso real e relevante ao estudo foi o ocorrido em uma área conhecida como “Pinheirinho”, gleba localizada na região sul da cidade de São José dos Campos/SP (SJC/SP), a qual perma- neceu inutilizada por 30 anos, até ser ocupada por 1.789 famílias em 2004 (CASTRO; SOUZA 2019). Segundo Wegrzynovski (2016), Pinheirinhos, possuía um dos maiores orçamentos per capita do Brasil, ou seja, o fato ocorrido foi considerado uma agressão aos Direitos Humanos em nosso país. Seguindo a uma ordem do Supremo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, foi realizada a reintegração de posse e a remoção das famílias do terreno, com auxílio da força policial e Guarda Municipal, composta Política de Habitação – 22 – por 2 mil policiais militares. No momento da remoção houve confronto entre moradores e Polícia Militar, resultando prisões, violações dos direi- tos humanos e vários feridos (CASTRO; SOUZA 2019). Figura 1.2 – Mulheres com crianças no colo deixam suas casas com o fogo das barricadas atrás Fonte: Foto de RDTEIXEIRA para o blog Vírus Planetário, sob licença CC. Perante a situação relatada, o Poder Judiciário não consegue aten- der às leis universais, pois, antes de sua aplicação, realiza acordos como mecanismos de negociação. “a decisão judicial vem de encontro com o fim do clientelismo, já mencionado anteriormente” (WEGRZYNOVSKI, 2016, p. 8). Segundo Castro e Souza (2019, p. 14), Em decorrência da forma como se deu a desocupação, sem a oferta de alternativas ou assistência apropriada às famílias e com desres- peito ao princípio da dignidade da pessoa humana, a Defensoria Pública de SJC/SP entrou com cerca de 1.150 ações na Justiça, solicitando indenizações aos ex-moradores do Pinheirinho por danos morais e materiais. Nesses casos, o impacto social e psicológico é imensurável. Se faz necessária uma política de habitação que atenda às necessidades da popu- lação, e essa necessidade é urgente. O que se constatou no caso do Pinhei- rinho foi a falta de mediação pacífica, de articulação e negociação com os moradores, resultando na desocupação violenta, que contraria todas as legislações. A reflexão deixada pelos autores que escreveram sobre o mas- – 23 – Urbanização: consequências do capitalismo sacre é que o fato não deve ser analisado isoladamente, pois o acesso à moradia é um direito em crise no país, o que nos faz lembrar que o Brasil passou por diferentes momentos em relação ao crescimento de favelas (WEGRZYNOVSKI, 2016, p. 8), e este se deve à falta de terrenos legais e apropriados para a criação de cidades, ou seja, um espaço necessário para a sociedade civil menos favorecida habitar de forma legal e confortável, podendo criar sua família sem medo e com os direitos básicos adquiridos. Segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA (2006, p. 1), Hoje em dia é uma prática comum nas grandes cidades brasileiras relacionar a pobreza e a violência. Porém, muitas vezes, a variável usada para representar a pobreza nessa associação não é a renda, mas sim o local de moradia. Com efeito, nas grandes cidades mui- tas favelas e bairros populares apresentam taxas de homicídios extremamente elevadas e muito superiores às dos bairros de classe média ou alta. Por outro lado, há centenas de municípios brasilei- ros bastante pobres em termos de renda que apresentam baixos níveis de violência. Daí a importância do local de moradia para a relação entre a pobreza e a violência urbana no Brasil: embora a pobreza de renda não sirva comoguia para o crime e a violência, um conjunto de fatores contribuiu para tornar os locais de moradia dos pobres nas grandes cidades ambientes de violência extrema. A falta de acesso a moradia adequada é uma forma de exclusão social. Desde o início do século XX, as políticas públicas, no Brasil, são voltadas apenas para o planejamento urbano, cujo objetivo é resolver a questão das favelas e cortiços por meio da remoção da população das áreas con- sideradas ricas pelo mercado imobiliário, sem relevar a questão social. Ainda segundo o IPEA 2014, foi realizada uma comparação direta entre os censos 2000 e 2010, a qual indicou que “o número de domicílios nas áreas de favelas teria dobrado, passando de 1,6 milhão para 3,2 milhões, e a população residente em favelas teria crescido 75%, passando de 6,50 milhões em 2000 para 11,4 milhões em 2010”. Neste caso, os números de moradores em favelas cresceram, sendo quase impossível reduzir a pobreza e as desigualdades sociais registradas na última década. Segundo a autora (WEGRZYNOVSKI, 2016, p. 9), “o interesse econômico é o principal foco das questões das ocupações ilegais onde o jogo de poder é nítido e sem muita flexibilidade”. Outro ponto a se destacar é a omissão Política de Habitação – 24 – das questões sociais, por falta de informação dos representantes das enti- dades ambientais, de modo que muitos desses representantes são contra o mercado imobiliário, a urbanização e a regularização das áreas ocupadas ilegais, e, de forma direta e indireta, contribuem para a remoção das famí- lias nessa área ilegal. Segundo Maricato (1995, p. 14), Podemos afirmar, entretanto, sem temer exageros, que a abstra- ção em relação à realidade urbana brasileira, que está presente em toda a sociedade, está também, fortemente presente, nas entidades ecológicas, que, embora reconhecendo os males de uma concen- tração demográfica considerada “excessiva”, desconhecem a real dimensão da ocupação anárquica do solo e as contradições que são inerentes a esse processo. Esse “desconhecimento” sobre a reali- dade próxima é acompanhado de uma construção ideológica da representação sobre o urbano, que repete a marca das “ideias fora do lugar”, também entre muitas das entidades ambientalistas, atra- sando a urgente e necessária defesa do meio ambiente. Há que se considerar que os fenômenos ambientais vêm causando situações de calamidade pública, grande parte pela expansão desordenada, ocupações irregulares e por apropriação das terras por latifundiários (bar- ragens, mineradoras etc.) que ocasionam acidentes ambientais e desalo- jam milhares de pessoas. Existem os dois lados: a população à margem da sociedade, que se encontra sem alternativas legais, e os burgueses, que se apropriam da terra para produzir riqueza por meio da exploração do trabalho e da apropriação da terra (pois sãos os detentores dos meios de produção). Hoje em dia, a mídia nos proporciona a transmissão das tra- gédias em tempo real, como foi o fato ocorrido em Brumadinho, com o rompimento de barragem no dia 25 de janeiro de 2019, sendo considerado o maior acidente de trabalho no Brasil, em perda de vidas humanas, e o segundo maior desastre industrial do século (Wikipédia, 2019). Maior que o desastre ambiental, foi o social, “além de matar centenas de pessoas, essa lama soterrou tudo o que encontrou pela frente, destruindo plantações, vidas e os sonhos das pessoas que estavam em seu caminho”. (OLIVEIRA; OLIVEIRA, 2019, p. 15). No entanto, a empresa Vale pro- porcionava geração de renda para a sociedade, empregos e desenvolvi- mento do turismo local, mas o que há de reflexão é referente ao conceito de sustentabilidade e preservação ambiental: tal área construída poderia estar lá? Será que a ganância da burguesia não extrapolou as legislações – 25 – Urbanização: consequências do capitalismo ambientais? Será que os donos dos meios de produção seguiram as nor- mas e a legislação ambiental, ou simplesmente utilizaram o solo de forma descontrolada, sem mesmo realizar uma análise da conjuntura das famílias que ali residiam? Tal fato foi irreversível e totalmente cruel. Infelizmente, a classe social mais afetada é a população de baixa renda que necessita morar nas encostas. No que diz respeito à compreensão da história de formação das cida- des, fica evidente enaltecer os movimentos urbanos que tiveram destaque durante os anos 1970 no Brasil, quando estes tinham apoio dos movimentos intelectuais, com objetivo de transformar as cidades por meio das ideias da Assembleia Nacional Constituinte, e lutavam por uma Reforma Urbana. A autora Wegrzynovski (2016, p. 11) retrata que tal Reforma Urbana Teve início em 1960, através dos setores progressistas da socie- dade que exigiam propostas de mudanças estruturais das questões fundiárias, e que focavam na concretização da Reforma Agrária. Sendo constituída a proposta inicial da reforma urbana em 1963, através do Instituto dos Arquitetos do Brasil (Observatório Inter- nacional do Direito à Cidade), porém não foi viabilizada em decor- rência do golpe militar de 1964. Certamente a reforma urbana do Brasil, teve uma defesa metódica oriunda dos movimentos sociais da década, participando dos debates e discussões sobre a Reforma Agrária. No entanto, com o golpe de 1964, o movimento foi adiado, sendo retomado a partir da redemocratização, perí- odo durante o qual o movimento ganhou mais força, pois, nesse período, se discutia a Constituição Federal de 1988. Cabe destacar que a luta pela Reforma Urbana perpassa não somente a distribuição de moradias, mas a democratização das condições sociais nos espaços das cidades, por meio de políticas públicas para reestruturá- -las, ou seja, propõe melhoria nas regiões periféricas, reaproveitamento de espaços subutilizados e melhores condições às classes inferiores (PENA, 2020). Sendo assim, a reforma urbana não concedeu, simplesmente, moradia à população mais pauperizada; sua essência nos mostra a pre- conização de infraestrutura básica, como saneamento básico e ambiental, maior número de escolas, melhores condições de segurança, asfalto de Política de Habitação – 26 – qualidade, entre outros serviços públicos. Pena (2020) enumera quais são os objetivos da reforma urbana: a) combate à especulação imobiliária; b) diminuição do número de grandes propriedades pouco ou não utilizadas; c) combate a práticas de especulação, sobretudo através da dimi- nuição do número de lotes vagos; d) contenção do crescimento desordenado das áreas urbanas; e) ampliação das condições de infraestrutura para áreas periféricas e com pouca atenção do Estado; f) facilitar o deslocamento, melhorando as condições de trânsito e, principalmente, a qualidade do transporte público. Figura 1.3 – Foto ilustrativa da Reforma Urbana no Brasil Fonte: Rodolfo F. Alves Pena. Disponível em: https://mundoeducacao.uol.com.br/ geografia/reforma-urbana.htm. Nas décadas de 1970 e 1980, a reforma urbana reaparece unida aos movimentos populares de luta pela moradia, se consolidando e fortale- cendo na década de 1980, na qual ganhou mais visibilidade nas decisões políticas. A reforma urbana no Brasil teve uma crescente necessidade – 27 – Urbanização: consequências do capitalismo devido à ampliação das cidades brasileiras em função da industrialização acelerada e do forte êxodo rural. A Igreja católica teve um importante papel, implantando o que seriam os primórdios das políticas públicas na área da Infância, da Assistência Social e Habitação, as quais deram ori- gem à primeira escola de Serviço Social em São Paulo: “contribuiu com o lançamento do documento ‘Ação Pastoral e o Solo’, onde defendia a função social da propriedade urbana, se tornando um referencial na luta pela reforma urbana” (WEGRZYNOVSKI, 2016, p. 11). No ano de 1985 foi elucidado o principal movimento sobre a questão de moradia no Brasil, no qual reuniram-se vários grupos, como arquitetos, federações, sindicatos e intelectuaisda época, denominado Movimento Nacional pela Reforma Urbana, o qual solicitava melhores condições de moradia, participação democrática, luta pelo acesso a educação, cultura, infraestrutura, saúde e segurança. Cabe ressaltar que, com a promulgação da Constituição Federal, as reivindicações e a pressão popular se inten- sificaram, por meio de Fórum Nacional e luta da sociedade civil. Com isso, uma das conquistas foi o Estatuto das Cidades, sancionado em 2001. Maricato (1995) e Wegrzynovski (2016, p. 12) mencionam que A expectativa em torno do desenvolvimento e evolução urbana no Brasil foi cenário para a superação do modelo arcaico, antigo, pelo sistema capitalista. A urbanização foi marcada pelo modelo acelerado e concretado do desenvolvimento moderno, que a partir dos anos 80, com o crescimento econômico, teve diversas sequelas negativas, como, por exemplo: a baixa qualidade de vida, a pre- dação do meio ambiente, aumento da miséria social, da violência urbana, entre outros. A autora continua apontando que o desenvol- vimento industrial no Brasil, se assegurou categoricamente a par- tir da chamada Revolução de 1930, convencionou o crescimento urbano com o industrial através dos regimes arcaicos de produção agrícola. O chamado “pacto estrutural”, entre antigos proprietários rurais e a burguesia urbana, aprovou mudanças sem rupturas e a convivência de políticas contraditórias. Torna-se perceptível que os movimentos sociais pressionam para a criação e ampliação das políticas públicas na área da habitação. Segundo Camarano e Abramovay (1999, p. 1) “É bastante difundida e não só entre os especialistas da área a informação de que, entre 1960 e 1980, o êxodo rural brasileiro alcançou um total de 27 milhões de pessoas.” Política de Habitação – 28 – Na figura 1.4, podemos observar a invasão da cidade no meio rural, ilustrando a beleza dos grande prédios e o percurso da globalização, ao mostrar a figura do avião sobre a cidade. O êxodo rural, nada mais é que a migração do homem pobre, ou pequeno agricultor, por motivos econômicos, sociais e a ascensão mais vantajosa para o capital. De todos os problemas sociais já citados, cabe ressaltar também a falta de qualificação profissional para o manuseio das máqui- nas, exigidos pelo mercado de trabalho, gerando uma competividade àqueles que tinham uma qualificação a mais que o outro. Consequentemente, houve um aumento do desemprego e de subempregos, como vendedores ambulantes, catadores de material reciclável, morado- res de ruas, flanelinhas, entre outros. Esses problemas são enfrentados até os dias atuais e atingem toda a sociedade, principalmente aqueles que, ilusoriamente, deixaram o campo com intuito de obter condições de vida digna nas cidades, atraídos, muitas das vezes, pelo capitalismo cruel e excludente. 1.3 Consequências da urbanização A busca desenfreada pelo acúmulo do capital e poder da burguesia, por meio da urbanização e industrialização, fez com que tais atividades econômicas atingissem, de forma direta e indireta, os recursos naturais, ocasionando degradação do meio ambiente, poluição, escassez da maté- ria-prima e recursos naturais. Cabe destacar que as consequências só se Figura 1.4 – O fenômeno do êxodo rural ocorre em escala mundial Fonte: FRANCISCO, W. de C. E. “Êxodo Rural”. Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol. com.br/geografia/exodo-rural.htm. Acesso em: 8 set. 2020. – 29 – Urbanização: consequências do capitalismo tornaram reflexivas em decorrência das mudanças climáticas. A criação de conselhos, fóruns de debates, legislações e políticas públicas sobre a cons- cientização no meio ambiente e crescimento sustentável, como também a atuação dos profissionais na área trabalhando em prol da preservação ambiental teve o seu marco na Primeira Convenção Internacional, deno- minada Conferência de Estocolmo, que ocorreu no dia 5 de junho de 1972, sendo um marco para o meio ambiente, de modo que atualmente se come- mora o Dia Mundial do Meio Ambiente, data estabelecida juntamente com a Assembleia Geral das Nações Unidas. Neste contexto, o Dia Mundial do Meio Ambiente propõe ações e busca chamar atenção do poder público para aumentar a conscientização e preservação ambiental da sociedade civil (COSTA; VIVIANI, 2012). De acordo com Reigota (2007, p. 9), na [...] Conferência de Estocolmo em 1972, a problemática ambiental passou a ser analisada na sua dimensão planetária. Uma das reso- luções da Conferência de Estocolmo apontava para necessidade de se realizar a educação ambiental tendo em vista a participação dos cidadãos na solução dos problemas ambientais [...]. As práticas ambientais devem ser enaltecidas todos os dias, por meio da educação, para isso o Estado também deveria ser o garantidor da disse- minação da educação ambiental nos ensinos básicos e superiores. Figura 1.5 – Processo de educação ambiental nas redes de ensino Fonte: elaborada pela autora. Política de Habitação – 30 – Vale destacar que a educação ambiental, de forma isolada, não atinge o nosso planeta; seu processo é moroso e depende da participação da sociedade civil, do Estado e da burguesia, pois o homem compõe a socie- dade, sendo o autor de sua própria história e agindo de acordo com sua ética, moral e valores. Segundo as autoras Viviani e Costa (2012, p. 15), A alfabetização ecológica é o processo de aprendizagem dos prin- cípios de organização dos ecossistemas que constituem a vida na Terra. Ensinar e aprender os princípios básicos da ecologia para nos tornarmos “ecologicamente alfabetizados”, conhecendo as diversas redes de interações, que constituem a teia da vida, são objetivos da alfabetização ecológica. Através dela é possível entender as múltiplas relações que se estabelecem entre todos os seres e o ambiente onde vivem, e como tais relações se configuram na teia que sustenta a vida no planeta. Segundo Paulo Freire, é por meio da educação que o homem adquire conhecimento e consegue discernir o certo do errado, portanto, a contri- buição ao meio ambiente realizada hoje será colhida e vivida no futuro. Friederich Engels, em seu livro A questão da habitação, descreveu que [...] a precariedade da vida urbana no período industrial, men- cionou os bairros operários com ruas não calçadas e estreitas, podendo se passar da janela de uma casa para a do vizinho oposto, e edificações que eram tão altas que a luz solar mal podia penetrar nas vielas entre elas. Sem esgotos, o lixo e os excrementos eram jogados nas ruas diariamente, formando uma imundície que não apenas ofendia a vista e o olfato, mas também colocava em risco a saúde dos moradores (BONAMENTE; SOUZA, 2012, p. 12). Figura 1.6 – charges sobre o atual cenário ambiental Fonte: COSTA; VIVIANI, 2012. – 31 – Urbanização: consequências do capitalismo De acordo com as autoras, Costa e Viviani (2012, p. 70-71), O mundo passa por uma crise ambiental com raízes localizadas basicamente no excesso de consumo dos recursos naturais. E é nas cidades que se manifesta a maior demanda pela oferta de alimen- tos, transporte, moradia, recursos hídricos, saneamento básico e energia. No Brasil, em 2000, 81,2% da população já vivia em áreas urbanas. A previsão para 2030 é que cerca de 60% das pessoas viverão em áreas urbanas do planeta. Os impactos da complexi- dade do metabolismo urbano produzem efeitos dramáticos sobre diversos aspectos da saúde e sustentabilidade, tanto local como regional e mesmo em escala global. A pressão da urbanização sobre o ambiente varia de acordo com o tipo das cidades. Deste modo, é correto afirmar a importância das legislações e da consciência do homem, como poder sobre as leis, construções etc., sendo necessário que o Poder Público fiscalize as práticas industriárias e seja rigorosa no que remete às legislações. Outra vertente a ser levantada em relação às consequências da urbanização, é criação das moradias, como também os planos diretores em consonânciacom a questão social e ambiental, a utilização da área automobilística acompanhada pela indus- trialização e o consumo acelerado dos descartáveis. No entanto, o acesso a toda essa modernização era para poucos, ou seja, aqueles que tinham condições financeiras de utilizá-la. A reflexão exposta neste capítulo é que, com todo o avanço, os tra- balhadores necessitavam de moradia na cidade, porém esta era escassa. Segundo Engels (2015, p. 29), “o cerne da solução para a ‘questão da mora- dia’, apresentada tanto pela grande quanto pela pequena burguesia, é que o trabalhador tivesse a propriedade de sua habitação”. Porém, ter a casa própria, na época, não era tão simples para o proletariado; o custo era muito alto para se ter a posse da habitação. Engels (2005, p. 38) completa que a Chamada escassez de moradia, que desempenha um papel tão importante na impressa atual, não consiste em que a classe dos trabalhadores esteja vivendo, de modo geral, em moradias ruins, superlotadas e insalubres. Essa escassez de moradia não é peculiar da época atual; ela não é nem mesmo um dos sofrimentos peculia- res do proletariado moderno em comparação com todas as classes oprimidas anteriores; pelo contrário, ela atingiu todas as classes oprimidas de todos os tempos de modo bastante homogêneo. Para pôr um fim a essa escassez de moradia só existe um meio: eliminar totalmente a espoliação e a opressão da classe trabalhadora pela classe dominante. – O que hoje se entende por escassez de moradia é o peculiar agravamento das más condições de moradia dos traba- lhadores em razão da repentina afluência da população às metró- poles; é o aumento colossal dos preços de aluguel; é a aglomeração ainda maior de moradores nas casas particulares; e, para alguns, é a total impossibilidade de encontrar alojamento. Nota-se que a escassez de moradia está voltada às classes oprimidas e à pequena burguesia; a espoliação é o mal necessário, de modo que a Revo- lução Social quer abolir o modo de produção econômico atual, no entanto o capitalismo proporciona ao capitalista comprar sua habitação, enquanto o trabalhador vende sua força de trabalho, sendo um agente de transformação da natureza, sem poder se apropriar da habitação própria, e o capital se enri- quece da mais valia juntamente aos proprietários das terras (IAMAMOTO, 2015). Marx, em uma de suas obras, O capital, descreve assertivamente sobre esse modo de exploração. Engels (2015, p. 39): “todos que traba- lham só podem viver dos restos desse mais-valor que fluem até eles de uma maneira ou outra”. Esse mais-valor, mencionado, reflete sobre a divisão dos integrantes da classe capitalista, proprietários das terras, servidores pagos e cargos de liderança, portanto o mais-valor é produzido pelo trabalhador e subtraído deste e direcionado à classe dominante. Segundo Reigota (2007, p. 11), “A educação ambiental tem sido realizada a partir da concepção que se tem de meio ambiente. Mas o que significa meio ambiente? Trata-se de um conceito científico ou de uma representação social? O que é um conceito científico? O que é uma representação social?”. O autor nos faz analisar o significado científico da expressão meio ambiente em sua totalidade universal, comparando as representações sociais que estão relacionadas com as pessoas que atuam na comunidade científica. A expressão meio ambiente possui várias definições de ecólo- gos; geógrafos; dicionários francês, enciclopédico, entre outros; mas o destaque, aqui, é dizer sobre o meio ambiente que o homem está inserido, ou seja, qual ação humana está envolvida na questão ambiental, pois o homem é o protagonista que pode modificá-lo e transformá-lo. Finalizamos dizendo que a ocupação irregular nas cidades gera ambientes cada vez mais desprovidos de áreas vegetadas, provocando alterações impactantes no meio ambiente urbano. A poluição e as ilhas de Políticas de habitação – 33 – Urbanização: consequências do capitalismo calor são exemplos de impactos das ações humanas. Segundo o Conselho Nacional do Meio Ambiente - Conama, os impactos ambientais são: qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente causada por qualquer forma de matéria ou ener- gia resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente, afetam: I- a saúde, a segurança e o bem-estar da população; II- as atividades sociais e econômicas; III- a biota; IV- as condições esté- ticas e sanitárias do meio ambiente; V- a qualidade dos recursos ambientais (Conama, 1986). Sendo assim, o meio ambiente precisa ser preservado e cuidado, pois é ele quem transforma a matéria-prima, produz energia, alimentos para toda a sociedade, mas o manuseio de forma irregular só tende a ser dimi- nuído com o passar dos anos, por isso faz-se necessário estudar a inclusão da Educação Ambiental em todos os espaços de saber e cabe aos gover- nantes criar políticas públicas voltadas à preservação e manutenção do meio ambiente. Síntese A história da urbanização é a base da constituição do capitalismo e sua ascensão, e o modo de produção capitalista é formado pelo capi- tal x trabalho, ou seja, a venda da força de trabalho do cidadão ao capi- tal, e o acúmulo de riqueza da burguesia, pela produção do excedente. É de fundamental importância estudarmos a história da urbanização para entendermos as desigualdades dentro da política de habitação, como tam- bém o surgimento das mazelas sociais e ambientais, como o desemprego, a migração e o êxodo rural. Dessa forma, entendemos, neste capítulo, o quanto é importante a realização de um planejamento antes da implanta- ção da urbanização, mas, muitas vezes, as ações são executadas de forma racional e cruel, de forma não planejada e estruturada, mas improvisada e imediata. Finalizamos abordando as consequências ambientais e sociais decorrentes do aumento populacional, perpassando diversas tragédias ocorridas devido à falta de planejamento, o que resultou em impactos irreversíveis à população mais pobre. A reflexão ilustrada também nos mostrou evoluções em sua trajetória, como os movimentos sociais, Plano Diretor e até a Constituição Federativa do Brasil de 1988. Deixamos, aqui, Política de Habitação – 34 – uma reflexão a você, profissional da área, sobre o êxodo rural, onde tudo se iniciou, e se o processo foi bom ou ruim para os pequenos camponeses e a sociedade capitalista. Atividades 1. Discorra sobre o processo de crescimento das cidades. Faça uma análise dos desastres ambientais e sociais ocorridos no Bra- sil, relacionando os municípios de Paraisópolis, Pinheirinho e Brumadinho. Reflita sobre o que ocorreu em cada município e explore o conteúdo de forma crítica, fazendo uma analogia sobre quais direitos dos moradores foram violados, com base na Cons- tituição Federativa do Brasil de 1988. 2. Relate sobre o que foi a Reforma Urbana, contextualizando o motivo pelo qual esta surgiu, em qual período político, quais foram seus objetivos e a quem ela atendeu. 3. Diante do estudo da ascensão do capitalismo, discorra sobre o que foi a Revolução Industrial e quais foram os pontos negativos de tal ascensão; explique também a propagação de descobertas e invenções, que diminuiu distâncias e aumentou a velocidade de produção. 4. Considere a educação ambiental sendo executada nas escolas regulares. Disserte sobre a importância disso para as cidades. 2 Violência urbana e segregação ambiental Quando falamos sobre violência, ampliamos sua conotação, na medida em que tentamos entender determinados conceitos, sendo que esses podem ter significados diferentes, dependendo das formas de violência que se pretende compreender. Nesse sentido, é necessário estarmos preparados para compreender as novas configurações de violência na contemporaneidade. No entanto, os conceitos de violência podem variar de acordo com a realidade de cada um, de cada espaço, de cada situação. Assim sendo, o estudo dessa obra vai abordar a violência urbana,em seu conceito, e como ela está relacionada ao tema desse capítulo, com o objetivo de compreender a sua existência em conjunto com a segregação social e ambiental, a qual será explicada por meio da ecologia. Primeiramente, serão abordados os significados de cidades − legal, ilegal, oculta − e o que elas têm em comum com a segrega- ção social e ambiental. Cabe ressaltar que a história do surgimento das cidades teve início com o êxodo rural, a ascensão do sistema capitalista, o aumento das indústrias automobilísticas, o desem- prego, por meio da substituição da mão humana pela mecanizada, Política de Habitação – 36 – a degradação ambiental, o surgimento das ocupações irregulares (que resul- taram no expressivo aumento das expressões das questões sociais) e, conse- quentemente, com o crescimento da violência no meio urbano. 2.1 Conceitos de cidades Em decorrência do processo de crescimento das cidades, anterior às leis, decretos, normativas e outras legislações, é preciso fundamentar os conceitos de legalidade e ilegalidade. Ao falarmos sobre o que é legal e ile- gal, é necessário reforçar que a Constituição Federativa do Brasil, de 1988, mostra que todo cidadão tem direito à moradia, seguindo todas as legali- dades e funcionalidades, para sua qualidade de vida e garantia dos direitos mínimos sociais. Tal acesso é considerado um direito social e também está expresso nas políticas públicas básicas, ou seja, é um direito fundamental. No entanto, Engels (2015) expõe que a questão da moradia não é interes- sante para o Estado e que este não tem interesse em resolver a questão social na área de habitação, já que o que preconiza é a massa organizada dos capi- talistas (WEGRZYNOVSKI, 2016). Os representantes brasileiros da elite política, nos anos de 1940, apontavam as cidades como um mecanismo de modernização e avanço sobre o modelo arcaico. Já nos anos de 1990, essas mesmas cidades potencializadoras, indústrias, resultavam em expressões da questão social, como a violência urbana, tráfico de drogas e de pessoas, poluição, desmatamento, entre outras questões sociais. Mesmo com toda a contrapartida gerada por meio da industrialização, sob o ideário positivista, cujo lema era “Ordem e Progresso”, acreditava-se, na época, que tal pro- cesso de industrialização possibilitaria a independência brasileira, a qual, por muitos séculos, esteve sob a dominação coronelista. Com o desenvolvimento econômico e o processo de urbanização, a evolução da sociedade sofreu o aumento da pobreza em todas as regiões do país. A sociedade, como um todo, passou a ser depen- dente do processo de urbanização e de progresso, deixando para trás o modelo da República Velha (WEGRZYNOVSKI, 2016, p. 18). Diante disso, o desenvolvimento urbano passou a ser visto como uma alternativa de sobrevivência e futuro das cidades, pois, com o aumento das indústrias e da população, no meio urbano, surgiriam empregos, lazer, cultura, espaço para constituição de família, ou seja, – 37 – Violência urbana e segregação ambiental um local para criação dos filhos e possibilidade de melhoria de vida. No entanto, a realidade foi ao contrário, isto é, não ocorreu o que era pre- visto. Ainda de acordo com Wegrzynovski: Nas primeiras décadas do século XX, o Brasil conseguia atender as demandas que existiam para os imigrantes e migrantes, através da inserção econômica e da melhoria da qualidade de vida, entretanto, essas possibilidades foram extintas. Como consequência da extin- ção dessas oportunidades sociais, culturais e econômicas, aumen- tou consideravelmente a exclusão social da população em situação de vulnerabilidade social (WEGRZYNOVSKI, 2016, p. 18). Consequentemente, a população pobre foi a mais afetada na época, visto que teve de se isolar em locais inesperados, insalubres, irregula- res, denominados “bolsões de pobreza”, ou seja, “ilhas no meio urbano” (WEGRZYNOVSKI, 2016, p. 18). A expressão mais relevante desse processo de exclusão social foi a segregação ambiental. Assim sendo, o acesso aos serviços de infraestrutura era limitado para a população, devido ao desemprego, desigualdade social, escassez dos serviços básicos e buro- cracia para o acesso à justiça social. Diante das demandas acima citadas, não se consegue determinar um perímetro preciso entre a ‘população excluída’ e a ‘popula- ção incluída’. Essa dificuldade se estabelece no Brasil através dos trabalhadores do setor secundário, com as indústrias de modelo fordista, sendo eliminados do mercado imobiliário privado e pas- sando a habitar as favelas (WEGRZYNOVSKI, 2016, p. 18). Nessa linha de pensamento, destaca-se que o modelo de produção fordista “unificou as ações econômicas do modelo econômico keyne- siano, resultando em um equilíbrio do modo de acumulação capitalista, compreendido como fordista keynesiano” (WEGRZYNOVSKI, 2015, p. 12), ou seja, o modelo fordista foi adotado pelos Estados Unidos, que revolucionou a produção dos automóveis. Já no modelo keynesiano, havia interferência do Estado na economia, ou seja, no modelo capitalista, para não existir queda do lucro e do desemprego. Tal modelo também pode ser citado na produção em grande escala, na qual o trabalhador produz, vende sua força de trabalho, mas não sabe o valor desta. Nesse sentido, os bolsões de pobreza sinalizaram uma realidade, em que a população não conseguia suprir suas necessidades básicas, como se alimentar, vestir, ter acesso à saúde, ao lazer, entre outros direitos fundamentais da pessoa humana. Política de Habitação – 38 – Em paralelo com a atualidade, a exclusão social pode ser considerada como fruto da industrialização racio- nal e excludente, na qual se ofertam salários bai- xos e em que as cidades não possuem um planeja- mento de sua infraestrutura para receber o expressivo aumento populacional. Ao mesmo tempo, o Estado não executa seu papel, enquanto garantidor de políticas públicas, e não fornece acesso aos bene- fícios socioassistenciais, deixando a população à mercê da sociedade. Ela (a ordem social competitiva) reconhece a pluralização das estruturas econômicas, sociais e políticas como ‘fenômeno legal’. Todavia, não a aceita como ‘fenômeno social e, muito menos, como ‘fenômeno político’. Os que são excluídos do privilegia- mento econômico, sociocultural e político também são excluídos do ‘valimento social’ e do ‘valimento político’. Os excluídos são necessários para a existência do estilo de dominação burguesa, que se monta dessa maneira (FERNANDES, 2005, p. 222). Quando se trata dos termos “exclusão” e “capital”, cabe ressaltar que esses estão enraizados no processo de modernização e urbanização. A expansão do modelo de produção capitalista, denominada como apro- priação da mais-valia, é o valor total do trabalho executado, ou seja, é o trabalho excedente, não disponibilizado ao trabalhador. Essa exploração se torna o aumento da riqueza da classe dominante (burguesia) e fica para as regalias e vantagens do capital. De acordo com Bunde (et al., 2007), o termo mais-valia, defendido por Karl Marx, está relacionado à exploração capitalista, ou seja, a um sis- tema de desigualdade. A produção, fruto do trabalho, torna-se mercadoria, Figura 2.1 − Patrão versus Empregado Fonte: BUNDE, Mateus. Mais Valia. Todo Estudo. Disponível em: https://www.todoestudo.com.br/historia/mais- valia. Acesso em: 16 set. 2020. – 39 – Violência urbana e segregação ambiental gerando o lucro por meio do excedente, que faz o sistema capitalista girar. Diante disso, é importante destacar que: o trabalhador recebe um salário inferior ao resultando final do seu trabalho, não sendo igual ao esforço realizado. A riqueza produzida para o capital não é compartilhada igual- mente a todos os envolvidos, isto é, o trabalhador não ganha por aquilo que produz. Por sua vez, cabe enaltecer, nessa obra, que a exclusão social é imensurável: (...) é um processo através do qual certos indivíduos são empurra- dos para a margemda sociedade e impedidos de nela participarem plenamente, em virtude da sua pobreza ou a falta de competências básica e de oportunidades de aprendizagem ao longo da vida, ou ainda em resultado de discriminação (BORBA; LIMA, 2011, p. 221). Nesse sentido, pode-se dizer que esta é sinalizada por indicadores que apontam as irregularidades, a baixa escolaridade, o sexo, raça, níveis de pobreza e, principalmente, a ausência da cidadania e acesso aos direitos básicos, previsto na Constituição Federativa do Brasil. A questão da ilegalidade é um dos instrumentos que permite a cria- ção de critérios para impor conceitos fundamentais para a compre- ensão da conjuntura, como, por exemplo, o conceito de exclusão, de segregação social, ambiental, cultural, econômica, política. Esses conceitos acabam sendo utilizados pelos diversos grupos sociais, conforme o interesse de cada um. Como, por exemplo, um governo municipal pode desenvolver uma política de habitação municipal utilizando-se da sua realidade social, ambiental e outras (WEGRZYNOVSKI, 2016, p. 19). Historicamente, temos a questão da legalidade e da ilegalidade, como fator integrante da sociedade capitalista, ou seja, ela faz parte do processo constitutivo da sociedade, em que se manter na ilegalidade é mais fácil, rápido, menos oneroso e burocrático. Nesse sentido, a classe que se man- tém na ilegalidade, na maioria das vezes, é a classe baixa, pois não tem condições de pagar as custas do processo para a aquisição de uma moradia ou não se enquadra no perfil solicitado. Nessa mesma linha, quando buscamos o conceito da palavra ilega- lidade, no Dicionário Online de Português (2020), a resposta que temos Política de Habitação – 40 – é: “qualidade de ilegal, do que é contrário às leis, condição de quem não respeita as leis, age ou se opõe aos preceitos legais: prefere trabalhar na ilegalidade”. Fazendo um paralelo relevante: existe a questão da aliena- ção. Nem todos os indivíduos têm acesso à informação sobre o que seria legal ou ilegal. A irregularidade significa um meio de sobrevivência nessa sociedade capitalista. Relacionar a ilegalidade com a questão social, ou seja, a propriedade de terra, meio rural ou urbano, as questões ambientais, é uma pauta debatida e incluída como um eixo central na tomada das deci- sões para ambos, isto é, tanto o jurídico quanto o poder público estarão envolvidos na causa. Segundo o autor Baldez (2003), o direito à terra ou à posse de terra, no Brasil, concretizava-se por meio da ocupação, até os anos de 1850. O autor ainda reforça que a condição de subalternidade do trabalhador fazia com que este se tornasse refém do capitalismo; em contrapartida, ele teria um local para morar. Destaca-se que as legislações surgidas na época eram viáveis aos grupos do mercado imobiliário. Entretanto, no final do século passado, todos os municípios foram obrigados a elaborar o Código Muni- cipal de Posturas, que é um conjunto de normas que vão regulamentar o espaço urbano para os cidadãos. Cabe lembrar que a lei existe desde o período colonial, porém, não havia obrigatoriedade para sua elaboração. Com o expressivo aumento populacional, os Códigos de Posturas tiveram uma perda de sua exigência, não sendo importante para o mercado imobi- liário e para os gestores das cidades. Este Código resultou na expulsão da classe trabalhadora pobre do centro da cidade. Os códigos de posturas assumem uma postura correlacional, uma postura preventiva da ordem e da segurança pública, um conjunto de normas que estabeleciam regras de comportamento e convívio de uma determinada comunidade e sociedade, portanto, assumem tam- bém uma esfera normativa (SCHMACHTENBERG, 2008, p. 1). Entretanto, o Código de Postura inibe a população em geral de come- ter anomalias que possam colocar a cidade em risco. De uma outra forma, é possível dizer que é uma prevenção e coerção, com a finalidade de coibir a desordem e possibilitar uma nova ordem de convívio social, ao mesmo tempo. Conforme expõe Wegrzynovski (2016), o Código de Posturas se consolidou com a Constituição Federal de 1988, na qual os municípios passaram a assumir funções na política nacional. Diante disso, o Código – 41 – Violência urbana e segregação ambiental teve um papel importante e fundamental na segregação do espaço urbano, considerado como um “causador de problemas humanos, que será alvo de legisladores, engenheiros, médicos e sanitaristas que criaram códigos e leis para coibir a proliferação de doenças e disciplinar o ambiente e a população” (SCHMACHTENBERG, 2008, p.1). O espaço urbano ascendeu, devido às transformações sociais, nor- mas, regulamentação do convívio social e organização da vida urbana. Consequentemente, a Medicina Social surgiu. Esta se preocupava com a saúde pública no espaço urbano, fazendo parte das ações entre Estado e cidade, ficando evidente que a população urbana trabalhadora necessitava de cuidados, para ser mais explorada pela burguesia, já que o surgimento das expressões da questão social são consequências do sistema capitalista até os dias de hoje. Segundo Vilhaça (2011, p. 37), “o espaço urbano é socialmente produzido, ou seja, não é dado pela natureza, mas é produto produzido pelo trabalho humano”. Todo o contexto diante das questões existentes entre mercado fundi- ário, legislação e exclusão social que se evidenciavam nas grandes metrópoles está cada vez mais visível em todas as cidades brasilei- ras, através da ocupação desordenada em áreas rejeitadas pelo mer- cado imobiliário, independentemente de ser área privada ou pública, situadas nas encostas dos morros, na beira de córregos, nas áreas em quota de enchente ou de risco, regiões completamente poluídas ou áreas de proteção ambiental (WEGRZYNOVSKI, 2016, p. 20). Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no ano de dezembro de 2010, havia 3,22 milhões de lares nos chamados “aglomerados subnormais” − que são formas de ocupação irregular de terrenos de propriedade alheia, para fins de habitação, caracterizados por um local irregular sem serviços essenciais para a população. Em 2019, os números chegaram a, aproximadamente, 5,12 milhões. Isso nos mostra como o tema é atual e intrigante ao mesmo tempo, ou seja, não houve redução, mas aumento de 59% ao longo de nove anos. Segundo Vasconce- los e Rosas (2020), em dezembro de 2019, estima-se que 734 municípios brasileiros, ou 13,2% deles, possuíam aglomerados subnormais, mais que o dobro do número de cidades apontadas com exatidão no censo de 2010; isto é, 323 municípios ou 7,8% do total. O IBGE estima que o número total de áreas desse tipo chegue a 13.151, novamente, mais que o dobro do Política de Habitação – 42 – número verificado há dez anos (6.329). Conclui-se, com o exposto acima, que há falta de interesse do poder público em resolver a questão da mora- dia no Brasil. Analisando os números, é nítido como o problema está pre- sente na população brasileira até os dias atuais. Retomando o termo iniciado acima, sobre a legalidade e a ilegali- dade, podemos dizer que a realidade é intrínseca, ou seja, o Estado não se posiciona frente à mazela social e esse problema envolve toda a sociedade civil e a classe de baixa renda. É notório que a riqueza do sistema capita- lista foi conquistada por meio da urbanização, globalização e industriali- zação. Consequentemente, esta deixou sequelas sociais, mesmo com toda a legislação regularizada ao longo dos anos. Wegrzynovski (2016) reforça que nunca vamos conseguir evoluir nesta questão, pois não é interessante tal resolução para o poder capitalista, mesmo estando previsto em Carta Magna, para todos os cidadãos brasileiros que vivem em uma democra- cia. Infelizmente, o conceito de direito à cidade, ou seja, a moradia, é meramente uma troca de interesses políticos e partidários. Nesse sentido, a ilegalidade sobre o poder da terra se torna exclusivamente uma questão de exclusão social. Realizando uma analogia
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