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6 09 ET Equação de Bernoulli e escoamento em dutos

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MECÂNICA DOS FLUIDOS 
Crisley de Souza Peixoto 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
, 
 
 
76 
 
 
6 EQUAÇÃO DE BERNOULLI E ESCOAMENTO EM DUTOS 
 
Neste bloco será apresentada a Equação de Bernoulli. Esta equação pode ser deduzida 
de diversas maneiras. As formas mais comuns são desenvolvidas a partir de um 
balanço de energia mecânica diferencial, através da equação de Navier-Stokes ou 
ainda por meio da Equação da Conservação da Energia, descrita no bloco 4, 
introduzindo hipóteses simplificadoras. Ao invés de deduzir esta conhecida equação, o 
foco será direcionado à sua apresentação, significado físico, domínio de validade e 
como ela pode ser aplicada. 
Embora simples, esta equação tem inúmeras aplicações como no estudo de tubos de 
Pitot para medir velocidades no fluido, no fenômeno de Venturi (muito utilizado na 
aspiração de fluidos) e também na medição de velocidades, sifões, velocidade de 
escoamento em tanques etc. 
Em seguida, será introduzida a análise de escoamento em dutos, evidenciando 
conceitos fundamentais, como condutos livres e forçados, desenvolvimento de perfil 
de velocidade durante a entrada no duto, regimes de escoamento laminar, transicional 
e turbulento, além do parâmetro adimensional utilizado para sua identificação, o 
número de Reynolds. 
Na seção 6.3 é realizada uma breve discussão sobre o conceito de perda de carga. A 
análise de escoamento em tubulações é fundamental no dimensionamento de 
tubulações e seleção de equipamentos capazes de ceder energia para o transporte de 
fluidos como bombas e ventiladores 
 
 
 
, 
 
 
77 
 
6.1 Equação de Bernoulli 
A Equação de Bernoulli, Equação (1), é uma expressão da conservação da energia 
mecânica no escoamento de um fluido. Ela afirma que a soma das energias cinética, 
potencial gravitacional e de pressão de uma partícula de fluido se mantém constante 
ao longo de uma linha de corrente, desde que algumas hipóteses sejam satisfeitas. 
 
 
1
2
𝜌𝑉2���
1
+ 𝜌𝑔𝑧�
2
+ 𝑝⏟
3
= 𝐶⏟
4
 (1) 
Em que (1) é a energia cinética por unidade de volume 1
2
𝜌𝑉2 = 1
2
𝑑𝑚
𝑑𝑉
𝑉2, (2) é a energia 
potencial gravitacional por unidade de volume 𝜌𝑔𝑧 = 𝑑𝑚
𝑑𝑉
𝑔𝑧 e 𝑝 é a pressão. Além 
disso, é importante mencionar que a soma dessas quantidades se conserva ao longo 
de uma linha de corrente, conceito definido no primeiro bloco. 
Linhas de corrente são linhas tangentes aos vetores do campo de velocidades em cada 
ponto e instante. A Equação (1) poderia ser aplicada na linha entre os pontos verdes 
da Figura 6.1, por exemplo. 
 
Figura 6.1 – Linhas de corrente em volta de carro do tipo Fórmula 1. 
 
 
, 
 
 
78 
 
Em geral, a dedução da Equação (1) se baseia na análise de um volume de controle 
diferencial, chamado de tubo de corrente seguindo linhas de corrente, como na Figura 
6.2, por isso ela é válida para este tipo de condição. 
 
Fonte: FOX et al., 2018, p. 112 
Figura 6.2 – Tubo de corrente. 
 
Porém, algumas hipóteses devem ser satisfeitas, como as seguintes: 
1) Escoamento em regime permanente; 
2) Fluido incompressível; 
3) Efeitos viscosos (atrito) desprezíveis; 
4) Sem trabalho de eixo na região de aplicação da equação: pode ser utilizada 
antes ou depois, mas não na região em que há trabalho de eixo como contendo 
um ventilador, bomba ou turbina, por exemplo, pois as linhas de corrente não 
sofrem grandes perturbações nessas regiões. Nessas situações, é mais indicado 
a utilização da Equação da Conservação da Energia Geral, definida no bloco 4. 
A Equação de Bernoulli não poderia ser aplicada entre os pontos vermelhos da Figura 
6.1, pois em boa parte das aplicações, nas regiões de escoamento próximas às paredes 
(superfícies externas ou internas), os efeitos viscosos são consideráveis. 
, 
 
 
79 
 
O trabalho realizado pelas forças de pressão, somado ao trabalho das forças 
gravitacionais está diretamente relacionado à aceleração do fluido (pois a energia 
cinética pode variar e, consequentemente, a velocidade varia). Essas três formas de 
energia podem ser convertidas umas nas outras durante o escoamento em uma linha 
de corrente, pois sua soma é sempre constante, desde que, principalmente, os efeitos 
de compressibilidade e atrito sejam pequenos. 
Por fim, outra informação importante é que existem outras formas da Equação de 
Bernoulli com menos restrições, porém mais complexas, como em regime transiente e 
para fluidos compressíveis. 
Exemplo 1 
Na Figura 6.3 há um tubo de Venturi. O fluido entra pela seção mais larga à esquerda, 
seção (1), passa pela seção (2) em que o diâmetro é reduzido (estrangulamento) e sai 
pela seção (3). Desde o bloco 3 sabe-se que em um tubo com diferentes diâmetros, a 
velocidade é maior nas regiões de menor área. O tubo está conectado a um 
manômetro em forma de U que mede uma diferença de pressão entre as seções (1) e 
(2), Δ𝑝 = 𝑝1 − 𝑝2 = 2000 𝑃𝑎. O fluido, que escoa a baixa velocidade no tubo, é o ar 
com massa específica 𝜌 = 1,2 𝑘𝑔
𝑚3
. A área da seção (2) é três vezes menor do que a área 
da seção (1). Determine a velocidade média do fluido na seção (1). Considere regime 
permanente, forças viscosas desprezíveis e massa específica do ar constante. 
 
 Fonte: elaborado pelo autor. 
Figura 6.3 – Tubo de Venturi 
, 
 
 
80 
 
Dados: 
Δp = 2000 Pa 
𝜌1 = 𝜌2 = 𝜌 = 1,2
𝑘𝑔
𝑚3
 
𝐴2 =
𝐴1
3
 
No escoamento de gases em baixas velocidades, a massa específica varia muito pouco, 
portanto, mesmo que o ar seja um fluido compressível, pode ser considerado 
incompressível. O parâmetro geralmente utilizado para definir isso é o número de 
Mach (𝑀), que é a razão da velocidade do fluido relativa ao tubo dividida pela 
velocidade média do som nesse meio. Se 𝑀 < 0.3, um fluido compressível deve escoar 
como incompressível, como boa aproximação. 
A Equação de Bernoulli é: 
1
2
𝜌𝑉2 + 𝜌𝑔𝑧 + 𝑝 = 𝐶 
Como a soma das energias é constante ao longo de toda a linha de corrente podemos 
selecionar um ponto da seção (1) e outro na seção (2) e a soma das quantidades é a 
mesma, portanto: 
 
A diferença de altura entre as linhas de corrente é pequena. Ao selecionar a linha de 
corrente central, a diferença é nula, logo: 𝜌𝑔𝑧1 = 𝜌𝑔𝑧2. 
Rearranjando os termos: 
Δ𝑝 = 𝑝1 − 𝑝2 =
1
2
𝜌(𝑉22 − 𝑉12) 
, 
 
 
81 
 
Pela conservação da massa sabe-se que: 
 
Em que 𝐴2 =
𝐴1
3
, de maneira que: 
𝑉2 = 3𝑉1 
Perceba que a velocidade na seção (2) é três vezes a velocidade na seção (1). Logo, na 
equação abaixo: 
𝑝1 − 𝑝2 =
1
2
𝜌(𝑉22 − 𝑉12) 
 
o lado direito será positivo nos informando que 𝑝2 < 𝑝1. Este é o efeito de Venturi, 
que afirma que nas regiões onde há estrangulamento, em que a velocidade no tubo é 
maior, a pressão será consequentemente menor. 
Em seguida, substitui-se a velocidade 𝑉2 = 3𝑉1 na equação de Bernoulli para obter: 
1
2
𝜌(9 − 1)𝑉12 = Δ𝑝 
4𝜌𝑉12 = Δ𝑝 
𝑉1 = �
Δ𝑝
4𝜌
 
Substituindo os dados: 
𝑉1 = �
2000 Pa
4.1,2 𝑘𝑔/𝑚3
 
𝑉1 = 20,41
𝑚
𝑠
 
, 
 
 
82 
 
Com o valor dessa velocidade média seria possível calcular a vazão no tubo somente 
pela diferença de pressão. 
O tubo de Venturi muitas vezes é utilizado para aspiração de algum fluido. Um 
exemplo é na combustão de gases em que é preciso misturar o gás combustível com 
um gás comburente. O combustível escoa ao longo do tubo de diferentes seções. 
Outro tubo é conectado na região de estrangulamento e como nessa região a pressão 
é baixa, mais baixa do que no resto da tubulação, por diferença de pressão aspira-se o 
comburente. Na seção (3), de maior diâmetro, os gases se misturam e se direcionam à 
região do queimador. 
 
6.2 Escoamento em tubos 
No transporte de fluidos há uma distinção entre as estruturas utilizadas para levar o 
fluido de um ponto a outro. Essas estruturas sólidas são chamadas muitas vezes de 
condutos. Os condutos podem ser forçados quando o fluido escoa no duto 
preenchendo todo o seu volume, Figura 6.4-a,ou livres quando a estrutura possui 
superfície livre, em contato com a atmosfera (BRUNETTI, 2008). 
Imagine um conduto forçado conectado a um reservatório de líquido. Por exemplo, um 
sistema com uma bomba hidráulica que transporta água de um reservatório a outro. 
Quando o fluido entra no conduto forçado, ele tem uma velocidade aproximadamente 
uniforme, Figura 6.5. 
 
Fonte: BRUNETTI, 2008, p. 164 
, 
 
 
83 
 
Figura 6.4 – Condutos livres e forçados. 
Pela condição de não deslizamento, o fluido adjacente à superfície sólida tem 
velocidade nula, portanto deve desacelerar do centro até as regiões próximas às 
paredes. Pela conservação da massa, a vazão mássica de fluido que entra é a mesma 
em todas as seções, logo, para a massa se conservar, algumas regiões do fluido devem 
ser aceleradas, como pode ser visto na Figura 6.1. A parte central do fluido aumenta 
de velocidade enquanto a região próxima à parede tem sua velocidade reduzida. 
Em um fluido real há viscosidade e seus efeitos são observados. Na medida em que o 
perfil de velocidade se desenvolve, existem duas regiões. A região de camada limite 
(região teórica em que os efeitos viscosos são significativos) e uma região de 
escoamento potencial em que os efeitos da viscosidade são desprezíveis (as linhas de 
velocidades são praticamente uniformes). 
A região de camada limite aumenta partindo de uma fina camada em contato com a 
parede até atingir o centro do tubo, de maneira que todo o tubo percebe os efeitos 
viscosos. O campo de velocidades se desenvolve até atingir um perfil completamente 
desenvolvido. A distância que o fluido tem que percorrer para se desenvolver 
completamente é conhecida como comprimento de entrada. 
Como mencionado no bloco 1, dois comportamentos distintos de escoamento do 
fluido são laminar e turbulento. O escoamento laminar é caracterizado por linhas de 
corrente ordenadas e suaves, enquanto no escoamento turbulento há flutuações 
aleatórias nas velocidades e turbilhões de diferentes escalas. Há também uma região 
de transição em que o fluido passa por algumas etapas de maneira a mudar de estado 
laminar para turbulento ou o contrário. 
 
, 
 
 
84 
 
Fonte: BRUNETTI, 2008, p. 167 
Figura 6.5 – Entrada de fluido em conduto forçado. 
Este fenômeno pode ser verificado em várias situações de aplicação tecnológica e na 
vida cotidiana. A Figura 6.6 ilustra o escoamento de fumaça, pode-se observar que na 
região inferior há um escoamento laminar, em seguida há uma região de transição 
curta e atinge-se um escoamento completamente turbulento. 
 
Figura 6.6 – Fumaça 
Em grande parte das aplicações de engenharia em tubulações, o escoamento é 
turbulento (ÇENGEL; CIMBALA, 2007). É preciso, portanto, uma maneira de 
caracterizar o escoamento para entender qual é o seu regime, pois isso influencia no 
entendimento e nos modelos utilizados em projetos e operação de equipamentos. 
O parâmetro utilizado para determinar o regime de escoamento é um número 
adimensional conhecido como número de Reynolds. O número de Reynolds, Equação 
(2), é uma razão de termos que representa a relação entre as forças inerciais e 
viscosas. As primeiras estão associadas ao movimento do fluido, uma alta massa 
específica e altas velocidades produzem forças inerciais maiores, por exemplo. No 
denominador, tem-se a viscosidade que quantifica o efeito das forças viscosas, quanto 
maior a viscosidade (𝜇), maiores as forças viscosas. 
 
 
𝑅𝑒 =
𝜌𝑈𝐿
𝜇
 (2) 
, 
 
 
85 
 
 
Para um duto, 𝑈 representa a velocidade média no tubo, 𝐿 é a dimensão característica, 
que é uma convenção de comprimento representativo. Para um duto circular, é o 
diâmetro da estrutura, para dutos de diferentes formatos é preciso utilizar um 
diâmetro efetivo chamado de diâmetro hidráulico 𝐷𝐻. Para mais informações, vide 
BRUNETTI, 2008, p. 164. 
Experimentalmente, na maioria das aplicações práticas, se observa que, para um duto 
circular, um número de Reynolds aproximadamente abaixo de 2.300 caracteriza um 
escoamento laminar, entre 2.300 e 4.000, tem-se um escoamento transicional e para 
um número de Reynolds maior do que 4.000 tem-se um escoamento completamente 
turbulento (ÇENGEL; CIMBALA, 2007). 
É importante mencionar que a transição entre regimes de escoamento pode ser 
alterada com base em alguns fatores como a rugosidade da superfície em que ocorre o 
escoamento, vibrações no tubo, flutuação de operação de equipamentos, mistura 
entre diferentes fluidos, entre outros (ÇENGEL; CIMBALA, 2007). 
6.3 Perda de carga 
Uma das consequências da avaliação do fluido real é que este é viscoso, portanto, há 
dissipação de energia por meio de atrito. A energia mecânica do escoamento é 
convertida em calor que é perdido através das paredes na tubulação. O balanço de 
energia realizado se torna: 
 𝐸𝑖 = 𝐸𝑓 + 𝐸𝑝 (2) 
Em que a energia inicial 𝐸𝑖 é igual à energia final 𝐸𝑓 adicionada de um termo de perda 
de carga para contabilizar a energia perdida. Perceba que na Equação de Bernoulli 
todos os termos têm unidade de energia por unidade de volume, inclusive a pressão. 
Ao dividir todos os termos por 𝜌𝑔, todos os termos ainda estão associados à energia, 
mas têm unidade de comprimento: 
, 
 
 
86 
 
 
 
𝑉2
2𝑔
+ 𝑧 +
𝑝
𝜌𝑔
= 𝐻 
(X) 
𝐻 é conhecida como a altura de carga total do escoamento. Na medida em que o 
fluido se movimenta nos condutos, ele vai perdendo energia e diz-se que vai perdendo 
carga, a quantidade 𝐻 diminui. 
Perdas são adicionadas devido a várias características dos condutos, incluindo o 
próprio escoamento dentro da tubulação, entrada e saída do duto, acessórios na 
tubulação como joelhos, expansões e reduções e válvulas. 
Os cálculos de perda de carga são fortemente dependentes do número de Reynolds, 
comprimento e diâmetro do conduto e da rugosidade (irregularidades na superfície 
que não é perfeitamente lisa e sim composta de picos e vales distribuídos 
aleatoriamente). 
Uma abordagem comum é determinar a perda de carga total do sistema de tubulação 
e os parâmetros de escoamento adequados. Em seguida, é realizada a escolha do 
equipamento que vai ser capaz de ceder a energia necessária para que o fluido, 
mesmo perdendo carga, se movimente dentro dos pré-requisitos, incluindo vazão e 
pressão, por exemplo. 
Conclusão 
Neste bloco foi introduzida a Equação de Bernoulli abordando os detalhes de sua 
aplicabilidade e seu significado físico. Através, de uma aplicação, no tubo de Venturi é 
possível perceber que, mesmo com uma série de aproximações, a equação tem sua 
utilidade, ajuda a explicar fenômenos em fluidos e quantificar grandezas de interesse. 
Quando o fluido escoa em condutos, sua dinâmica tem características específicas. Na 
seção 6.2 foram introduzidos vários conceitos desde a entrada do fluido, o 
desenvolvimento de seu escoamento e seus regimes de escoamento, que são 
importantes, pois a determinação de grandezas como a perda de carga depende 
dessas características. 
, 
 
 
87 
 
 
Por fim, o conceito de perda de carga foi definido. Quando o fluido se movimenta nos 
condutos, vai perdendo energia devido aos efeitos viscosos no escoamento. A 
determinação de perdas de carga é fundamental para definir a quantidade de energia 
que deverá ser adicionada para o transporte adequado do fluido. Isso é importante no 
dimensionamento de condutos e seleção de equipamentos utilizados para as mais 
diversas aplicações incluindo bombeamento de água e sistemas de ventilação. 
 
REFERÊNCIAS 
BRUNETTI, F. Mecânica dos Fluidos. 2. ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2008. 
Recurso online. 
ÇENGEL, Y.U., CIMBALA, J.M. Mecânica dos Fluidos: fundamentos e aplicações. Porto 
Alegre: Mc Graw Hill, 2007. 
FOX, R. W. et al. Introdução à mecânica dos fluidos. 9. ed. São Paulo: LTC, 2018. 
Recurso online.

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