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Taninos . Historicamente, a importância das plantas ricas em taninos está ligada às suas propriedades de transformar a pele animal em couro. Hoje, o curtimento da pele também é industrialmente conseguido com substâncias minerais, porém, ao longo de vários milênios, esse processo requeria exclusivamente o uso de plantas taníferas. . Durante o curtimento, são formadas ligações entre as fibras de colágeno na pele animal, a qual adquire resistência ao calor, água e abrasivos. Essa capacidade dos taninos em combinar-se com macromoléculas explica a capacidade de precipitarem celulose, pectinas e proteínas. . Tais propriedades são a base da definição clássica dos taninos: substâncias fenólicas solúveis em água com massa molecular entre 500 e cerca de 3.000dáltons, as quais apresentam a habilidade de formar complexos insolúveis em água com alcaloides, gelatina e outras proteínas. . Essas substâncias são, particularmente, importantes componentes gustativos, sendo responsáveis pela adstringência de muitos frutos e vegetais. A complexação entre taninos e proteínas é a base para suas propriedades como fatores de controle de insetos, fungos e bactérias tanto quanto para suas atividades farmacológicas. Classificação Tradicionalmente, os taninos são classificados segundo sua estrutura química em dois grupos: taninos hidrolisáveis e taninos condensados. Ambos os tipos se acumulam em quase todas as partes das plantas: raízes, rizomas, lenho, cascas, sementes, frutos e folhas. . Os taninos condensados são amplamente distribuídos em plantas lenhosas, tanto em angiospermas quanto em gimnospermas. Já os taninos hidrolisáveis ocorrem em dicotiledôneas herbáceas e lenhosas, porém dentro de limites taxonômicos bem definidos, sendo encontrados em algumas famílias das subclasses do sistema de Cronquist: Hamamelidae, Dileniidae, Rosidae, Magnoliidae e Caryophiliidae. . Os taninos hidrolisáveis são caracterizados por um poliol central, em geral β-D-glicose, cujas hidroxilas são esterificadas com o ácido gálico (ácido 3,4,5-tri-hidroxibenzoico), formado na via do chiquimato. A susbtância β- 1,2,3,4,6-pentagaloil-D-glicose representa o padrão máximo de substituição alcançado, sendo considerado o precursor imediato para ambas as classes de taninos hidrolisáveis: galotaninos e elagitaninos. . Os galotaninos resultam da união entre unidades de ácido gálico via ligações denominadas meta-depsídicas. O grau de substituição total de 10 a 12 resíduos de ácido gálico por molécula de glicose pode ser alcançado, como relatado para os galotaninos encontrados em galhas de Rhus chinensis Mill., citada sob o nome Rhus semialata Murray, chamados de ácido tânico. . Os elagitaninos possuem um ou dois resíduos de hexa-hidroxidifenoil-D- glicose (HHDP), os quais são obtidos pelo acoplamento oxidativo C-C entre dois resíduos de ácido gálico espacialmente adjacentes. . Após hidrólise ácida das ligações éster, ocorre a liberação do ácido difênico, que se rearranja de forma espontânea para ácido elágico. A partir do isolamento de numerosos monômeros e oligômeros de elagitaninos (cerca de 1.000), pôde-se conhecer a diversidade de variações estruturais que surgiram como resultado de reações de desidrogenação e oxidação. . Os taninos condensados são oligômeros e polímeros formados pela policondensação de duas ou mais unidades flavan-3-ol e flavan-3,4-diol. Essa classe de taninos também é denominada de proantocianidinas, devido ao fato de os taninos condensados produzirem pigmentos avermelhados da classe das antocianidinas, como cianidina e delfinidina, após degradação com ácido mineral diluído a quente. . As unidades flavan-3-ol, que são produtos finais da rota biossintética dos flavonoides, podem diferir no padrão de hidroxilação dos anéis A e B e na estereoquímica do C-3, sendo que os mais comuns são os diastereômeros: (+)- catequina/(-)epicatequina e (-)- galocatequina/(-)-epigalocatequina . Os dímeros de procianidinas foram divididos em dois grupos, designados por A (C30 H24 O12) e B (C30 H26 O12). As procianidinas do grupo B (9, 10, 11) são aquelas que possuem uma ligação C- C entre C-4 da unidade “superior” e C-8 ou C-6 da unidade “inferior”, enquanto os representantes do grupo A possuem complementarmente uma ligação do tipo éter. Proantocianidinas oligoméricas ou poliméricas adotam a estereoquímica 3,4-trans durante a formação das ligações entre as unidades flavan-3-ol. Análise . Análises qualitativas e/ou quantitativas de taninos requerem inicialmente a extração dessas substâncias do material vegetal, que em geral deve estar seco. . A secagem deve ser feita a temperatura ambiente ou, de preferência, por liofilização para evitar alterações nos teores de taninos e outras substâncias fenólicas. A seleção do solvente de extração vai depender da finalidade da análise; por exemplo, utiliza-se acetona/água, de 50 a 80%, quando se pretende isolar e identificar taninos puros. . Para o isolamento dos taninos, condensados ou hidrolisáveis, deve-se eliminar do extrato a acetona em evaporador rotatório, sob pressão reduzida, em temperatura abaixo de 40 °C. A fase aquosa restante é filtrada, para retirar as substâncias de baixa polaridade, e pode ser liofilizada ou submetida a uma partição líquido-líquido com solventes como acetato de etila e n- butanol. As frações obtidas são evaporadas e liofilizadas. . Análises qualitativas e quantitativas de taninos em extratos brutos também podem ser realizadas. Alguns testes tradicionais de precipitação com solução de gelatina a 1%, contendo 10% de cloreto de sódio ou com soluções de cinchonina, cafeína ou estricnina de 1 a 2%, podem indicar a presença de taninos. Testes colorimétricos com solução de FeCl3, vanilina-HCl ou dimetilaminobenzaldeído podem diferenciar os tipos de taninos. Aplicações . Plantas ricas em taninos são empregadas na medicina tradicional para o tratamento de diversas moléstias, como diarreias, pressão alta, reumatismo, hemorragias, feridas, queimaduras, problemas estomacais (azia, náusea, gastrite e úlcera gástrica), problemas renais e do sistema urinário e processos inflamatórios em geral. . Testes in vitro realizados com extratos ricos em taninos ou com taninos puros detectaram diversas atividades farmacológicas para essa classe de substâncias. Dentre elas, podem-se citar as ações bactericida, fungicida, antiviral, citotóxica, cicatrizante, antimutagênica inibitória de várias enzimas e da peroxidação lipídica e sequestradora de radicais livres. Revisões podem ser consultadas sobre esse assunto. . Acredita-se que as atividades farmacológicas dos taninos são devidas, pelo menos em parte, a três características gerais que são comuns, em maior ou menor grau, aos dois grupos de taninos, os condensados e os hidrolisáveis: I. complexação com íons metálicos (ferro, manganês, vanádio, cobre, alumínio, cálcio, entre outros); II. atividades antioxidante e sequestradora de radicais livres; III. complexação com outras moléculas, incluindo macromoléculas, como proteínas e polissacarídeos. A capacidade dos taninos e de outras substâncias fenólicas de serem antioxidantes é frequentemente citada como uma propriedade-chave na prevenção e/ou redução de doenças crônicas e ligadas ao envelhecimento, que estão relacionadas com o estresse oxidativo, como doenças cardiovasculares, câncer e doenças neurodegenerativas. . Acreditava-se que a capacidade dos taninos de se complexarem com proteínas não era seletiva e acontecia de forma não específica; entretanto, várias evidências sugerem que os mecanismos pelos quais os taninos exercem suas ações de proteção contra diabetes,aterosclerose, câncer e doenças ligadas ao envelhecimento (Parkinson e Alzheimer) não se devem somente à atividade antioxidante, mas sobretudo à capacidade dessas substâncias de se ligarem diretamente a proteínas ou peptídeos específicos. . Esse modo de ação pode induzir inibição de enzimas, modulação de receptores celulares ou de fatores transcricionais, além de perturbar agregados de proteínas, que podem regular funções celulares ligadas ao crescimento e proliferação celulares, inflamação, apoptose, angiogênese, metástase, bem como respostas imunológicas. . Várias enzimas de relevância terapêutica são inibidas por taninos, podendo-se citar COX e LOX, CYP, proteínaquinases, xantino-oxidase, NADH-oxidase, adenosina-desaminase, topoisomerases, metil transferases e uroquinase, uma enzima requerida por tumores humanos para formar metástases e que é fortemente inibida pela epigalocatequina-3-O-galato, encontrada em grande quantidade no chá-verde. Biodisponibilidade . As atividades biológicas in vitro que foram confirmadas para os taninos têm sido associadas com os efeitos farmacológicos in vivo de plantas medicinais e alimentos ricos nesses polifenóis. Contudo, se faz necessário considerar o destino dos taninos e de seus metabólitos no trato gastrintestinal, além de se conhecer sua absorção, distribuição, metabolismo e biodisponibilidade tecidual. Somente com esses dados é possível um completo entendimento do real papel fisiológico dos taninos e de seus metabólitos. . Vários estudos em ratos e humanos já confirmaram a absorção e metabolização no intestino delgado e no fígado de taninos condensados monoméricos, onde catequina e epicatequina são Ometilados ou conjugados com ácido glicurônico. . Uma pequena parte do ácido elágico também é absorvida pelas células intestinais no jejuno e íleo, sendo prontamente metabolizada para os produtos mono e dimetoxilados e/ou conjugada com ácido glicurônico, que são detectados na bile, no plasma e na urina. O restante do ácido elágico é degradado pelas bactérias presentes na microflora intestinal, formando as urolitinas, que são dibenzopiranonas hidroxiladas. Drogas vegetais . Hamamélis . Vários estudos in vitro e in vivo avaliaram as atividades farmacológicas dos extratos de cascas e folhas. As ações relatadas foram de inibição da 5- lipoxigenase e liso-PAF-acetil-CoA e antiviral contra o herpes-vírus simples do tipo 1 para as frações enriquecidas com proantocianidinas e diminuição da formação de radicais de ânion superóxido para as frações ricas em elagitaninos; os taninos condensados com grupos galoil inibiram a proliferação de células de câncer de colo humano, HT29 e HCT116 . Ratânia . Nome científico: Krameria triandra Ruiz & Pav. . Família botânica: Krameriaceae . Partes utilizadas: raízes A planta é originária dos Andes e, por isso, também é conhecida como ratânia-do-peru. Os taninos extraídos são denominados vermelho de ratânia, pela sua coloração característica. Na medicina popular do Peru e da Bolívia, ela tem sido usada para problemas intestinais e estomacais pelas suas propriedades adstringentes, antidiarreicas e antimicrobianas. As monografias da planta e da tintura de ratânia constam na FB 5 . Esta droga vegetal possui propriedades adstringentes em virtude do seu conteúdo em taninos condensados, sendo utilizada para a obtenção de tinturas, administradas sob a forma de colutórios no tratamento de afecções da região orofaríngea, ou topicamente no tratamento de hemorroidas. . Cratego . Nome científico: Crataegus monogyna Jacq. e Crataegus laevigata (Poir.) DC. Família botânica: Rosaceae Partes utilizadas: flores, folhas e frutos Estas espécies são amplamente distribuídas em zonas temperadas do hemisfério norte, incluindo a região mediterrânea. Suas folhas, flores e frutos são utilizados na medicina popular europeia como adstringente, antiespasmódico, cardiotônico, diurético e hipotensivo. O suco dos frutos verdes ou maduros é aplicado sobre a pele para aliviar dores musculares e artrite. A monografia destas espécies consta na FB 5. . Experimentos in vivo mostraram que o extrato dos frutos do cratego inibiu a oxidação da lipoproteína de baixa densidade (LDL) humana, além de ter efeitos expressivos no sistema cardiovascular, como no tratamento da insuficiência cardíaca e na redução da mortalidade após ter sido provocada isquemia em animais. Sua ação cardiotônica deve-se, provavelmente, às atividades anti-isquêmica, antiarrítmica, hipolipidêmica e hipotensora, que já foram comprovadas para esta espécie. Comparação entre extratos de diferentes partes de C. monogyna mostrou propriedades antioxidantes, que decrescem na seguinte ordem: folhas > flores > frutos, sendo que essa atividade foi correlacionada diretamente com os teores totais de proantocianidinas e flavonoides.
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