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Seção 1 ESPELHO DE CORREÇÃO DIREITO CIVIL 2 Vamos agora à resolução do caso prático, no qual Quinzinho Machado de Assis e Capitu são partes da demanda. Como já deve ter verificado, a peça processual adequada é a petição inicial de usucapião especial rural. Os arts. 319 e 321 do CPC orientam que a petição inicial indicará o juízo (Vara de Registros Públicos do Rio de Janeiro – vide art. 47 do CPC), a qualificação das partes (somente as já apresentadas), os fatos alegados no caso (transcrever parafraseando), os fundamentos jurídicos (art. 1.239 do CC c/c art. 191 da CRFB), o pedido e o valor da causa (vide art. 291 do CPC). Para qualificação das partes, transcrever da forma como lançada no enunciado (nome, prenome, estado civil, casado/união estável, CPF, CNPJ, e-mail, domicílio e residência). Por ser idoso, cabe apontar a tramitação prioritária (art. 71 da Lei nº 10.741/03). Neste caso, por versar sobre direito real, a esposa deve figurar no polo ativo da ação. Quanto às provas (documental, pericial e testemunhal), cabe ao aluno provar os requisitos da usucapião rural (art. 1.239 do CC): não possuir outro imóvel; tempo de posse em área rural de até 50 ha; de forma ininterrupta e sem oposição; ânimo de dono; terra produtiva e residência no local (vide art. 320, art. 373 e art. 429 do CPC). A usucapião não reclama procedimento especial, estando abarcada na regra geral do art. 318 do CPC. Essa espécie de usucapião não exige justo título, portanto o documento de cessão só servirá para o cômputo de posse do antecessor (vide art. 1.243 do CC). O interesse de agir está demonstrado na pretensão (ser declarado dono da área) e na utilidade da ação (usucapião como um meio de aquisição da propriedade). Assim, o pedido deve ser certo (vide art. 322 e art. 324 do CPC), expresso, identificando o gênero, de forma clara, respeitando o princípio da consubstanciação, referindo-se à causa de pedir próxima (os fatos) e remota (consequências jurídicas). Como não foi informado, o valor da causa deve apenas ser mencionado na inicial (vide art. 291 do CPC), fazendo remissão junto à data e deixando espaço para assinatura, como se fosse real a pretensão, evitando a identificação do candidato. Foi apresentada a declaração de pobreza, assim você poderá pedir a gratuidade da justiça, fulcro nos arts. 98 a 102 c/c inciso LXXIV do art. 5º da CRFB. Seção 1 DIREITO CIVIL Na prática! 3 Cabe ao aluno, ainda, demonstrar conhecimento sobre a Lei nº 14.010/20 (Regime Jurídico Emergencial), a qual considera, no cálculo do período aquisitivo da usucapião, a suspensão do prazo ocorrido na pandemia do coronavírus. O enunciado informou risco iminente quando Capitu se apresentou como titular do domínio, razão que deve ser requerida tutela de urgência cautelar, liminarmente (§2º do art. 300 do CPC c/c parágrafo único do inciso I do art. 9º), além de justificar previamente o fumus boni iuris e o periculum in mora. Observe que o problema menciona a agricultura familiar, daí lembrar de todos os direitos constitucionalmente amparados para situação, tais como as exegeses do inciso XXIII do art. 5º, do art. 191 e do inciso III do art. 170, todos da CRFB, assim como da Lei nº 11.326/06. Quanto à citação, os confinantes têm endereço certo, portanto serão citados pessoalmente (vide §3º do art. 246 do CPC e Súmula 391 do STF). Nesta ação de usucapião de bem imóvel, é importante a publicação de edital para citação de eventuais interessados incertos e desconhecidos (vide art. 259 do CPC). Para não incorrer em risco de não localizar alguém, sempre proteste pelo §1º do art. 319 do CPC, buscando eventuais diligências. Não há se falar em ação de proteção possessória, uma vez que o problema relata que Quinzinho pretende decisão declaratória para fins de adquirir a propriedade, até mesmo porque a usucapião pode ser alegada como defesa em ações reivindicatórias (Súmula 237 do STF), contra quem tem domínio (mas não tem posse). E em razão da contenda informada no problema, não serão possíveis as vias administrativas para tutelar a usucapião por cartório (vide art. 1071 do CPC e art. 216-A da Lei nº 6.015/73). Quanto à estrutura da peça, atenção para: endereçamento e nomes das partes (sempre em caixa alta); pule sempre uma linha entre os parágrafos; sinalize com reticências as informações e qualificações essenciais não informadas; nos fatos, prefira parafrasear a transcrever, mas não invente informação; no fechamento da petição, apenas escreva valor da causa, local, data, nome assinatura e inscrição na OAB. Lembre-se de que você tem 150 linhas (treine sempre escrevendo, nunca no computador). EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) DOUTOR(A) JUIZ(A) DA __ VARA DE REGISTROS PÚBLICOS DA COMARCA DO RIO DE JANEIRO/RJ QUINZINHO MACHADO DE ASSIS, (nacionalidade), casado, agricultor, inscrito no Cadastro de Pessoas Físicas sob o nº ..., e-mail ..., junto a CAROLINA ..., (nacionalidade), casada, (profissão), inscrita no Cadastro de Pessoas Físicas sob o nº ..., e-mail ..., ambos residentes e domiciliados na Questão de ordem! 4 rua ..., sem número, Bairro Quincas Borba, zona rural do Rio de Janeiro/RJ, por meio de seu advogado regularmente constituído, e-mail ..., cuja qualificação e indicação do escritório constam na procuração anexa, na qual consta o endereço para receber notificações e intimações, vem propor AÇÃO DE USUCAPIÃO ESPECIAL RURAL, COM PEDIDIO LIMINAR DE TUTELA DE URGÊNCIA, em face de CAPITU ..., (nacionalidade), (estado civil), (profissão), inscrita no Cadastro de Pessoas Físicas sob o nº ..., e-mail ..., domiciliada na rua ..., na cidade de ..., fulcro no art. 1.239 do CC c/c art. 191 da Constituição Federal, seguindo o rito comum do art. 318 do Código de Processo Civil, pelos fatos e fundamentos a seguir expostos: DA SUSPENSÃO DE PRAZO NA PANDEMIA Registra-se, neste ato, as disposições da Lei nº 14.010/20, que instituiu o Regime Jurídico Emergencial e Transitório, a qual considera, no cálculo do período aquisitivo da usucapião, a suspensão do prazo ocorrido na pandemia do coronavírus. TRAMITAÇÃO PRIORITÁRIA Por Quinzinho ser idoso, cabe apontar a tramitação prioritária para o curso processual (art. 71 da Lei nº 10.741/03). DA JUSTIÇA GRATUITA Junta-se a declaração de pobreza, assinada por duas testemunhas para confirmar o alegado, a fim de justificar a concessão da gratuidade da justiça, nos moldes dos arts. 98 a 102 c/c inciso LXXIV do art. 5º da CRFB. DOS FATOS Tem-se que os autores possuem o imóvel localizado no Bairro Quincas Borba, s/n, zona rural da cidade do Rio de Janeiro/RJ, desde 10 de fevereiro de 2006, advinda por meio de instrumento particular de cessão de direitos possessórios a eles transmitido por Brás Cubas, antigo possuidor que ocupava o terreno por dois anos. O referido imóvel é localizado na área rural e tem extensão de dois ha. A ré é a nua-proprietária, titular de domínio, conforme consta na certidão de registro juntada, cujo bem confrontante com Esaú e Jacó. Os autores nunca sofreram qualquer tipo de reivindicação ou impugnação por parte de quem quer que seja, sem oposição e de forma ininterrupta durante todo esse tempo, somente em data ....... a Sra. Capitu se apresentou exigindo sua propriedade, que ora se defende opondo a prescrição aquisitiva como defesa. Os possuidores não são proprietários de nenhum outro imóvel e, desde que ingressaram na área, agiram como donos, tendo nela fixada a moradia da família, tornando a terra produtiva, mediante o trabalho da agricultura familiar. 5 DA TUTELA EMERGENTE CAUTELAR Como a ré Capitu reclama a propriedade, exigindo a desocupação do imóvel, apresentando-se como titular de domínio, razão assiste aos autores para requerem a tutela de urgência cautelar, liminarmente, fulcro no §2º do art. 300 c/c parágrafo único do inciso I do art.9º do CPC, por justificarem previamente o fumus boni iuris, com o cumprimento dos requisitos gerais e específicos da usucapião rural do art. 1.239 do Código Civil, bem como por existir o periculum in mora, caso não seja resguardado o direito à decisão de declaração de prescrição aquisitiva de usucapião. DO DIREITO A presente ação tem a finalidade de declarar o domínio do imóvel aos possuidores, assegurado no art. 191 da CRFB e no art. 1.239 do Código Civil, mediante usucapião rural, com a junção dos elementos fundamentais. Atende aos requisitos específicos para a ação de usucapião rural, elencado no art. 1.239 do Código Civil, por ter posse em período maior que cinco anos; por utilizar a área como moradia familiar, por não possuir outro imóvel; por ter a posse de área rural de dois ha; por ter a terra produtiva fundada na agricultura familiar, abrangida pela Lei nº 11.326/06 c/c inciso XXIII do art. 5º, art. 191 e inciso III do art. 170, todos da CRFB. A jurisprudência apresenta o enquadramento do caso em usucapião especial rural, conforme julgado a seguir: DIREITO CIVIL – USUCAPIÃO PRO LABORE – REQUISITOS – ART. 191 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL – MORADIA E TRABALHO – SUSTENTO DA FAMÍLIA – AUSÊNCIA. -Para que se adquira a propriedade pela usucapião pró-labore, mister que se preencham os seguintes requisitos [1] – posse usucapionem; [2] – imóvel rural de no máximo cinquenta hectares; [3] – ser o imóvel explorado pela família, servindo- lhe de moradia; [4] – não ser o requerente proprietário de outro imóvel. – Não demonstrando o requerente que necessita do imóvel usucapiendo para moradia e sustento seu e de sua família, não há como fazer jus ao benefício previsto na Constituição Federal, que reduz o prazo para aquisição da propriedade pelo uso para 5 anos. (TJMG – Número do processo: 2.0000.00.424027-1/000 1. Relator: SEBASTIAO PEREIRA DE SOUZA Data do acordão: 17/09/2004. Data da publicação: 30/09/2004) A jurisprudência é pacífica quanto à apreciação do animus domini, conforme decisão: USUCAPIÃO – ANIMUS DOMINI – AUSÊNCIA. Não sendo a posse exercida com animus domini, não há que se falar em prescrição aquisitiva de imóvel por usucapião especial rural. (TJMG – Número do processo: 2.0000.00.469064-6/000 1. Relator: JOSÉ FLÁVIO DE ALMEIDA. Data do acordão: 05/10/2005. Data da publicação: 12/11/2005). Os autores preenchem os requisitos para usucapião, com o ânimo de dono, além da posse ininterrupta, sem oposição de terceiros e até mesmo da titular de domínio desde 10 de fevereiro de 2006, inclusive apontam a prescrição aquisitiva da usucapião como forma de defesa, nos termos da Súmula 237 do STF. 6 Apesar de esta modalidade não exigir título, existe uma cessão de direito possessórios que demonstram a boa-fé, além de somar o cômputo de posse do antecessor (vide art. 1.243 do CC c/c Súmula 545 do STF). DO PEDIDO Ante o exposto, pedem que seja julgada procedente a presente ação declaratória, concedendo aos autores o domínio útil do imóvel em questão, sendo a sentença transcrita no Registro de Imóveis por mandado. Espera-se a concessão da tramitação prioritária, nos termos do art. 71 da Lei nº 10.741/03, bem como da gratuidade da justiça, nos moldes dos arts. 98 a 102 c/c inciso LXXIV do art. 5º da CRFB. Para tanto, requer a citação da ré, que é a titular de domínio do imóvel, objeto desta demanda, para responder à presente ação. Requer a citação pessoal dos confinantes Jacó e Esaú por endereço certo, nos termos do §3º do art. 246 do CPC e da Súmula 391 do STF, bem como seja citada a fazenda pública, a fim de verificar eventual interesse na presente pretensão, conforme as especificações já citadas, além da intimação do Ministério Público, cuja manifestação se faz obrigatória no presente feito. Aguarda a publicação de edital para citação de eventuais interessados incertos e desconhecidos, consoante art. 259 do CPC, além de protestar por diligências no caso da não localização da ré, confinantes e interessados, na forma do §1º do art. 319 do CPC. Pretende o autor provar os fatos apresentando por todos os meios de prova em direito admitidos, em especial, a testemunhal, documental e pericial, protestando, ainda, pela produção das demais provas que eventualmente se fizerem necessárias no curso da lide. Dá-se à causa o valor de R$ ...... Nestes termos, pede e espera deferimento. Rio de Janeiro, data. Assinatura, nome do advogado e inscrição da OAB. 1. Como identificar a espécie de usucapião? 2. Qual é a diferença entre ação de direito real e pessoal? 3. Qual é a diferença entre Tutela de Urgência e Tutela de Evidência? 4. Por que idoso tem tramitação prioritária? 5. Como identificar o rito processual para as ações? Resolução comentada 7 Referências BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Presidência da República, [2021]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 1º jun. 2021. BRASIL. Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973. Dispõe sobre os registros públicos, e dá outras providências. Brasília, DF: Presidência da República, [2021]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6015compilada.htm.htm. Acesso em: 1º jun. 2021. BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Brasília, DF: Presidência da República, [2021]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm. Acesso em: 1º jun. 2021. BRASIL. Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003. Dispõe sobre o Estatuto do Idoso e dá outras providências. Brasília, DF: Presidência da República, [2021]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.741.htm. Acesso em: 1º jun. 2021. BRASIL. Lei nº 11.326, de 24 de julho de 2006. Estabelece as diretrizes para a formulação da Política Nacional da Agricultura Familiar e Empreendimentos Familiares Rurais. Brasília, DF: Presidência da República, [2021]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004- 2006/2006/lei/l11326.htm. Acesso em: 1º jun. 2021. BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Brasília, DF: Presidência da República, [2021]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015- 2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em: 1º jun. 2021. BRASIL. Lei nº 14.010, de 10 de junho de 2020. Dispõe sobre o Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado (RJET) no período da pandemia do coronavírus (Covid-19). Brasília, DF: Presidência da República, [2021]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/lei/L14010.htm. Acesso em: 1º jun. 2021. BRASIL. Superior Tribunal Federal. Súmula 237. O usucapião pode ser arguido em defesa. Brasília, DF: STF, 1963. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/menuSumarioSumulas.asp?sumula=4155. Acesso em: 1º jun. 2021. BRASIL. Superior Tribunal Federal. Súmula 391. O confinante certo deve ser citado, pessoalmente, para a ação de usucapião. Brasília, DF: STF, 1964. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/menuSumarioSumulas.asp?sumula=4066. Acesso em: 1º jun. 2021. BRASIL. Superior Tribunal Federal. Súmula 545. Preços de serviços públicos e taxas não se confundem, porque estas, diferentemente daqueles, são compulsórias e têm sua cobrança condicionada à prévia autorização orçamentária, em relação à lei que as instituiu. Brasília, DF: STF, 1969. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/menuSumarioSumulas.asp?sumula=2346. Acesso em: 1º jun. 2021. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/menuSumarioSumulas.asp?sumula=4066
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