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Furniss - Abuso Sexual Da Crianca - Uma Abordagem Multidisciplinar

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Prévia do material em texto

ABUSO SEXUAL DA CRIANÇA UMA ABORDAGEM MULTIDISCIPLINAR
Aviso ao leitor
A capa original deste livro foi substituída por esta nova versão. Alertamos para o fato de que o conteúdo é o 
mesmo e que esta nova versão da capa decorre da alteração da razão social desta editora e da atualização da 
linha de ctes/gn da nossa já consagrada qualidade editorial.
ARÜVED editora s.a.
Tilman Furniss
Abuso sexual da criança: uma abordagem multidisciplinar / Tilman Furniss; trad. Maria Adriana Veríssimo 
Veronese. — Porto Alegre: Artes Médicas, 1993.
1. Abuso sexual da criança. I. Título.
CDU 159.922:37.03
Catalogação na publicação: Mônica Ballejo Canto - CRB 10/1023 ISBN 85-7307-863-4
ABUSO SEXUAL DA CRIANÇA
UMA ABORDAGEM MULTIDISCIPLINAR
TILmAN FURNISS
MARIA
Tradução: ADRIANA VERÍSSIMO VERONESE
Revisão Técnica da Tradução:
Consultoria, Supervisão e
ADRIANE KIPERMAN ROJAS Pslc61oga. Mestre em Psicologia Clímca pela PUCRS
1} reimpressão
2002
Sociedade Unificada Paulista da
mreutv t ----
......
da Chamada
Kegistrado poi
Obra originalmente publicada em inglês sob o título Tlie Multiprofessional Handbook of Child Sexual Abuse: 
Integrated Management, Therapy & Legal Intervention Copyright by Tilman Furniss, 1991
Capa: Joaquim da Fonseca
Supervisão editorial: Delmar Paulsen
Editoração eletrônica: GRAFLINE — Assessoria Gráfica e Editorial Ltda.
Reservados todos os direitos de publicação, em língua portuguesa, à ARTMED® EDITORA S.A. Av. Jerônimo 
de Orneias, 670 - Santana 90040-340 Porto Alegre RS Fone (51) 3330-3444 Fax (51) 3330-2378
É proibida a duplicação ou reprodução deste volume, no todo ou em parte, sob quaisquer formas ou por 
quaisquer meios (eletrônico, mecânico, gravação, fotocópia, distribuição na Web e outros), sem permissão 
expressa da Editora.
SÃO PAULO Av. Rebouças, 1073 - Jardins 05401-150 São Paulo SP Fone (11) 3062-3757* Fax (11) 3062-
2487
SAC 0800 703-3444
IMPRESSO NO BRASIL PRINTED IN BRAZIL
I
Aos meus pais
Abuso Sexual da Criança Uma Abordagem Multidisciplinar
Oabuso sexual da criança é um verdadeiro campo minado para todas as pessoas envolvidas — as que sofreram 
abuso, as que abusaram e os profissionais envolvidos no tratamento e no cuidado. É um problema genuinamente 
multidisciplinar, requerendo a cooperação de uma ampla gama de profissionais com diferentes 
capacidades.Tilman Furniss, uma figura importantíssima no tratamento do abuso sexual da criança, escreveu um 
manual prático, sem paralelo, destinado a todos os profissionais envolvidos no tratamento e no cuidado das 
crianças que sofreram abuso sexual e de suas famílias. Este manual possibilitará que eles desenvolvam o 
conhecimento e as capacidades para lidar com sua tarefa específica, e ao mesmo tempo os ajudará a 
compreender os efeitos de suas ações no trabalho de outros.
Enfocando o abuso sexual da criança como uma síndrome de segredo e adição, Furniss mostra como os passos 
práticos na terapia e no manejo influenciam diretamente uns aos outros. Na primeira parte do livro ele delineia 
os princípios de procedimento e os conceitos básicos utilizados para lidar com o abuso sexual da criança. Na 
segunda parte, ele coloca os muitos problemas práticos e os incontáveis obstáculos que surgem na prática 
cotidiana, pondo em perigo o sucesso da terapia e do manejo multidisciplinar. Referências entre as duas partes 
permitem ao leitor concentrar-se nos problemas práticos imediatos e específicos, sem jamais perder de vista as 
questões subjacentes envolvidas.
Baseado em quinze anos de trabalho prático inovador do autor, este livro é uma leitura essencial para todos os 
profissionais envolvidos na intervenção inicial e no manejo do abuso sexual da criança: estes incluem os 
advogados, a polícia, assistentes sociais, pediatras e inspetores de saúde. Ele é igualmente destinado a 
psiquiatras, psicólogos, aconselhadores e terapeutas envolvidos no tratamento das crianças que sofreram abuso 
sexual e de suas famílias, para os quais será de imenso valor prático.
Sumário
Lista das figuras....................................................................................................xiii
Prefácio.....................................................................................................................1
Introdução.................................................................................................................5
PRIMEIRA PARTE PRINCÍPIOS DE PROCEDIMENTO
1 Da loucura à maldade: ponto de partida multidisciplinar e 
metassistêmico........................................................................................11
1.1 Abuso legal e dano psicológico.................................................................11
1.2 Responsabilidade, participação, culpa, poder e acusação..........................15
1.3 Implicações para a prática..........................................................................20
1.4 Dano primário e secundário.......................................................................23
1.5 Reconhecimento e crença, admissão e assunção da autoria.......................25
2 0 processo individual........................................................................29
2.1 Abuso sexual da criança como síndrome de segredo para a criança.........29
2.2 Abuso sexual da criança como síndrome de adição...................................37
2.3 O processo de entrosamento entre segredo e adição..................................40
2.4 O processo individual no contexto.............................................................41
3 0 processo familiar..........................................................................50
3.1 Confusão nos diferentes níveis de dependência.........................................50
3.2 Padrão familiar...........................................................................................51
3.3 Função familiar do abuso sexual da criança..............................................58
4 A família e a rede profissional...........................................................63
4.1 Três tipos básicos de intervenção ..............................................................63
4.2 Influência e entrosamento mútuos do processo profissional-família.........67
5 A rede profissional............................................................................82
5.1 O processo interdisciplinar........................................................................82
5.2 O processo interdisciplinar no contexto.....................................................93
5.3 Modificando a cooperação interdisciplinar e institucional......................101
5.4 Terapia e consulta....................................................................................109
6 A Intervenção Terapêutica Primária......................................................113
6.1 Terapia familiar e abordagem familiar.....................................................113
6.2 Objetivos e etapas da intervenção terapêutica primária...........................116
6.3 Mecanismos básicos no processo terapêutico..........................................126
6.4 Do segredo à privacidade.........................................................................128
7 Diferentes modos de terapia na Intervenção
Terapêutica Primária..............................................................................132
7.1 Formas concomitantes de terapia.............................................................132
7.2 Trabalho de grupo com crianças..............................................................136
7.3 Aconselhamento e terapia individual.......................................................149
7.4 Trabalhando com os que abusam sexualmente........................................155
SEGUNDA PARTE PROBLEMAS PRÁTICOS
8 Preparação para a revelação.................................................................167
8.1 A crise da revelação - crise dos profissionais e crise familiar.................167
8.2 Etapas da intervenção na crise da revelação............................................169
8.3 Suspeitade primeira-linha, suspeita de segunda-linha
e revelação parcial...................................................................................170
8.4 CIDA e CIDP: Consulta Interdisciplinar
Diagnostica Anônima e Personalizada.....................................................174
8.5 Permissão terapêutica explícita para a revelação.....................................177
8.6 O uso da "pessoa de confiança"...............................................................183
8.7 O encontro de pré-intervenção.................................................................184
8.8 Alegações de crianças em lares para crianças, em
famílias reconstruídas e em famílias de separação e divórcio.................185
8.9 Suspeita de abuso sexual durante aconselhamento e terapia individual.....186
8.10 Suspeita de abuso sexual durante sessões familiares...............................188
8.11 Suspeita de abuso sexual após visita de acesso ao pai.............................190
8.12 O uso de filmes de prevenção como instrumento
diagnóstico na suspeita e na revelação....................................................191
8.13 Preparando colegas profissionais para a revelação iminente...................193
9 Revelação................................................................................................195
9.1 O processo de entrosamento entre a permissão terapêutica
explícita para comunicar e a entrevista legal...........................................195
9.2 Entrevista legal com a criança.................................................................196
9.3 Organizando a entrevista de revelação ....................................................198
9.4 O uso de bonecas anatomicamente exatas, desenhos e
outros materiais diagnósticos...................................................................202
9.5 Prova forense e exame médico................................................................205
9.6 Revelação pela criança.............................................................................206
9.7 Revelação pelas mães..............................................................................208
9.8 Revelação pelos profissionais..................................................................208
9.9 Revelação na escola.................................................................................209
9.10 Suspeita e revelação em ambientes de internação
e nos lares de crianças..............................................................................210
9.11 O primeiro encontro familiar como um encontro
criador de realidade e responsabilidade...................................................214
9.12 Organizando o primeiro encontro familiar..............................................217
9.13 A família e a sessão-de-responsabilkfadc-por-pcocuração.......................219
9.14 A entrevista de encaminhamento ... ............................220
10 Depois da revelação...........................--.....................223
10.1 A pessoa que abusa deixa a casa......................-.........223
10.2 Colocação em lares para crianças.....................--224
10.3 Colocação com pais adotivos..................................-226
10.4 Colocação com parentes...........................................-227
10.5 Mães que desejam divórcio imediato............................-227
10.6 Manejando a negação primária.........................................-229
11 Problemas interdisciplinares.....................................................-242
11.1 Encontrando a linguagem sexual apropriada para
comunicar sobre o abuso....................................................................... ---
11.2 Profissionais que sofreram abuso sexual................................................ 243
11.3 Apoio interdisciplinar............................................................................. 243
11.4 O problema do "especialista" ..................................................................24
11.5 Problemas práticos nas consultas.............................................................241
11.6 Manejando hierarquias profissionais nas consultas.................................249
11.7 Preparando relatórios para o tribunal.......................................................250
11.8 Questões especiais nas reuniões de caso..................................................253
11.9 Os "bonzinhos" e os "malvados": clivagens na rede profissional...........256
11.10 Manejando hierarquias estatutárias nos
encontros profissional-família.................................................................258
11.11 Transformando uma Intervenção Punitiva Primária (IPP) e uma Intervenção Primária Protetora da Criança
(IPC) em uma Intervenção Terapêutica Primária (ITP)...........................260
12 Questões do tratamento........................................................................262
12.1 Criando um subsistema terapêutico.........................................................262
12.2 Colhendo fragmentos em terapia.............................................................263
12.3 Da intervenção na crise à terapia a longo prazo......................................264
12.4 A necessidade de avaliações psiquiátricas da criança..............................266
12.5 Trabalho mínimo com os pais num contexto estatutário.........................267
12.6 Formando grupos.....................................................................................268
12.7 Unindo tratamento grupai e sessões individuais
com encontros familiares.........................................................................272
12.8 Problemas especiais no aconselhamento e terapia individual..................273
12.9 O problema de reintroduzir o decoro.......................................................277
12.10 O uso de diferentes técnicas de terapia familiar......................................278
12.11 Ajudando mães protetoras.......................................................................283
12.12 Mães que não conseguem reconhecer o abuso........................................285
12.13 Recaída no segredo e na negação secundária..........................................286
12.14 Negação terciária por parte do pai...........................................................290
12.15 O gênero do terapeuta é importante?.......................................................292
12.16 Terapia por ordem do tribunal .................................................................294
12.17 Trabalhando com pais adotivos...............................................................296
13 Abuso sexual extrafamiliar da criança..................................................301
13.1 Como distinguir entre abuso intrafamiliar e extrafamiliar
nos casos de negação...............................................................................301
13.2 Interrogatório traumático no abuso sexual extrafamiliar da criança..........302
13.3 Manejando o processo familiar no abuso sexual
prolongado extrafamiliar da criança........................................................304
13.4 Lidando com crianças que participaram de sexo grupai..........................306
14 Situações especiais................................................................................311
14.1 Os irmãos nas famílias em que ocorreu abuso sexual..............................311
14.2 A síndrome de João e Maria e o abuso sexual por irmãos mais velhos......313
14.3 Crianças e adolescentes que abusam sexualmente,
tendo sofrido eles próprios abuso sexual.................................................317
14.4 Filhos de incesto......................................................................................318
14.5 O problema do pai solteiro.......................................................................320
14.6 Síndrome-Munchausen-por-procuração nas mães
que sofreram abuso sexual.......................................................................321
14.7 Mães de crianças que sofreram abuso sexual,
tendo sofrido elas próprias abuso sexual.................................................32314.8 Trabalho com a família de origem nos casos de
adultos que sofreram abuso sexual..........................................................325
Referências Bibliográficas..................................................................................329
índice....................................................................................................................333
Figuras
1.1 Aspectos linear e circular da culpa............................................................19
1.2 Reconhecimento e crença, admissão e assunção
da autoria depois da revelação...................................................................28
2.1 A interação abusiva no abuso sexual da criança
como síndrome de sesredo_33
2.2 A natureza do i
2.3 A função da criança
2.4 O ciclo aditivo ■
2.5 O inconsciente o
3.1 Confusão de diíerenses
3.2 O processo familiar
3.3 Padrões familiares básicas
3.4 Reações da família à revelação e; 4.1 Intervenção Punitiva Primária
4.2 Intervenção Primária Protetora d& Lr^mi-J.
4.3 Intervenção Terapêutica Pimária...
4.4 Ação e reação entre a família P e a rede
5.1 Identificação profissional e confl::
5.2 Terapia e consulta.........................
6.1 Objetivos e etapas nas intervenções terapêuticas]
6.2 Mecanismos básicos do processo terapêutico nas famílias em que a criança sofreu abuso sexual —
7.1 Rituais de diferenciação nas formas concorrentes de letjpn-
7.2 Ansiedade no inconsciente e no segredo..................---
8.1 Equipamento para a Intervenção na Crise
do Abuso Sexual da Criança.........................................-Mi
8.2 Suspeita de primeira-linha e suspeita de segunda-linha---
8.3 Dando permissão para a revelação......................................-182
9.1 Confrontando a pessoa que supostamente cometeu o abuso---301
9.2 A entrevista de encaminhamento............................................---222
10.1 (a)+(b) Proteção que promove o abuso da criança e
prevenção do crime que promove o crime nos casos de negação . 231
10.2 Negação: conseqüências temidas de uma revelação......................... 233
11.1 Hierarquia da responsabilidade e influência profissional linear............. 2 5 1
11.2 Hierarquia profissional-família no trabalho terapêutico
estatutário, trabalho do tribunal e consulta..............................................259 12.1 Terapia e reabilitação por 
ordem do tribunal...........................................296
13.1 Preocupação parental e diferenciação diagnostica
entre abuso sexual intrafamiliar e extrafamiliar da criança.....................303
14.1 Adultos que cometem abuso e a síndrome de João e Maria....................315
Prefácio
Este livro reúne o trabalho realizado por mim sobre abuso sexual da criança, em Berlim, Amsterdã e Londres, 
nos últimos quinze anos. Eu atendi meu primeiro paciente que sofrera abuso sexual quando trabalhava em 
pediatria com Arend Koers, no sistema médico confidencial holandês contra o abuso e a negligência sofridos 
pela criança. Nós tratávamos crianças que haviam sofrido abuso físico e seus pais. O abuso sexual da criança 
não parecia existir e nós não procurávamos por ele. Ele chegou até nós primeiro através dos adultos. Deve ter 
acontecido uma mudança, na equipe da unidade pediátrica, na prontidão para ouvir e escutar, pois subitamente 
várias jovens mães que haviam trazido seus bebês maltratados começaram a falar sobre sua própria experiência, 
longa e freqüentemente grave, de abuso sexual quando crianças.
Meu trabalho com o abuso sexual da criança, conseqüentemente, começou com a geração dos pais, e eu devo 
grande parte daquilo que aprendi sobre o abuso sexual da criança à confiança dessas jovens mães, algumas da 
quais eram ainda quase crianças. Sua resposta a algumas mudanças na atitude da equipe, que as ajudaram a 
confiar e revelar, e minha própria resposta pessoal às suas revelações de abuso sexual ensinaram-me que a 
conduta em relação ao abuso sexual da criança começa, primeiramente, com os profissionais e com nossa 
própria atitude individual como pessoas. Eu aprendi que a intervenção na crise do abuso sexual de criança 
começa na crise dos profissionais.
Sobreviver ao abuso sexual da criança como uma pessoa intacta pode ser tão difícil para o profissional como é 
para a criança e para os membros da família. Só pense em como você reagiria se eu, encontrando-o pela 
primeira vez, lhe pedisse, depois de dois minutos: "Conte-me tudo a respeito do último contato sexual que você 
teve". Como você reagiria a isso? Como se sentiria falando para um estranho sobre sua vida sexual mais íntima? 
Você encontraria uma linguagem para falar a respeito disso de uma maneira aberta, mas ao mesmo tempo 
digna? A maioria das vezes nós simplesmente falamos sobre "isto". Trabalhando com crianças que sofreram 
abuso sexual, nós logo compreendemos a natureza interacional da motivação entre os profissionais e os clientes. 
Nós tanto podemos permitir aos nossos clientes e pacientes que revelem sua experiência de abuso sexual quando 
crianças quanto podemos, através de uma sutil comunicação interacional, evitar que façam isso. (Veja A 
Natureza Interacional da Motivação, Capítulo 2.4.1.)
Lembrando meu primeiro caso, pergunto-me como pude, eu, um homem em uma sessão de aconselhamento 
com uma linda mãe de dezoito anos de idade, cujo pai abusara sexualmente dela durante dez anos, ficar 
sexualmente excitado? Sentin-do-me confuso, envergonhado, em pânico, um inacreditável porco chauvinista, eu 
corri para Arend Koers, meu consultor e mentor em Amsterdã, em busca de supervisão e sobrevivência. Eu 
jamais esquecerei sua resposta divertida, que em seu
11
2
Prefácio
humor me ensinou tudo: Tudo bem, Tilman, você teve a sua ereção. É isso que Jane está provocando em você. 
Você captou a mensagem, e isso é bom. Só não aja. Quando Jane era pequena e queria carinho de seu pai, ela 
recebeu sexo. Agora ela lhe traz sexo, mas o que ela quer de você é carinho. A aceitação de minha reação 
pessoal e o apoio de meu supervisor ajudaram-me a recuperar meu auto-respeito pessoal e minha atitude 
profissional. Isso permitiu que eu mantivesse a franqueza para falar com Jane como um profissional e como um 
homem, a respeito de sua experiência de abuso sexual quando criança. Eu fui capaz de voltar para ela e fui 
ensinado, por ela e depois pelas outras mães, sobre a confusão entre abuso sexual e cuidado emocional.
Eu agora tenho esse pequeno interruptor dentro de mim quando lido com o abuso sexual da criança. Sempre que 
a mensagem "sexo" entra, o interruptor é acionado e a mensagem "carinho sai". Mas, pessoalmente e 
profissionalmente, nós temos que deixar que a mensagem "sexo" chegue primeiro, independentemente do que 
provoque em cada um de nós. "Carinho", no abuso sexual da criança, significa carinho com palavras e com 
comportamento, não carinho físico, que pode facilmente ser experienciado pela criança como um renovado 
abuso sexual. Carinho significa cuidado emocional. Era isso o que Jane queria, e que eu só pude lhe dar depois 
de ter manejado meu próprio pânico pessoal e minha reação pessoal à natureza sexual desse tipo de abuso.
O processo de descoberta das diferentes formas de abuso sexual da criança teve um rumo típico. Primeiro nós 
atendemos mães, depois filhas adolescentes, depois crianças pequenas entre 2 e 5 anos. Foi depois disso que 
atendemos meninos. Na última etapa nós aprendemos a ouvir as pessoas que cometiam o abuso, e não apenas a 
condená-las. Nós começamos a entender o abuso físico, emocional e sexual que muitas dessas pessoas que 
praticavam o abuso haviam sofrido.
Depois de termos sobrevivido ao nosso próprio pânico pessoal em relação ao abuso sexual da criança, nós 
precisamos desenvolver conhecimentos e capacidades para lidar com ele. Foi para me ajudar a sobreviver às 
mensagens complexas, confusas e freqüentemente esmagadoras, e à necessidade de ações aparentemente contra-
ditórias, que foram desenvolvidos os conceitos essenciais deste livro. Esses conceitos formaram a basede meu 
trabalho em Amsterdã, antes de eu trazê-los para Londres, quando comecei a trabalhar no Hospital for Sick 
Children, em Great Ormond Street. Trabalhar com Arnon Bentovim, Marianne Tranter, Liza Bingley-Miller e 
Danya Glaser mudou o abuso sexual da criança, de um diagnóstico psicossocial jamais visto anteriormente em 
um hospital, para uma ocorrência clínica cotidiana. Embora a esmagadora complexidade entre os problemas 
legais e terapêuticos pareça às vezes fazer com que esse trabalho seja deprimente e desanimador, ajudar crianças 
que sofreram abuso sexual e suas famílias também tem sido tremendamente recompensador, quando o abuso era 
o background para o sofrimento físico, psicossomático e psicológico continuado e não-diagnosticado, que não 
compreendíamos antes e que não éramos capazes de tratar. Nossa ignorância muitas vezes nos levou a repetidos 
fracassos no tratamento, até começarmos a aprender a ler os sinais.
Este livro é baseado no material de artigos previamente publicados, em palestras não publicadas realizadas em 
diferentes ambientes clínicos e científicos, em conferências apresentadas nos últimos anos e em meu trabalho 
clínico atual. A maior parte do capítulo sobre grupos de crianças é baseada no artigo escrito em co-autoria com 
Liza Bingley-Miller e Annemarie Van Elburg, no British Journal of Psychiatry. Minha gratidão e 
agradecimentos a Arend Koers e Arnon Bentovin, primeiro como mentores e agora como colegas. Eles me 
permitiram desenvolver este trabalho, que se tornou a base para muitos projetos de tratamento no ÜK e em 
outros lugares.
Prefácio
3
Também quero agradecer a Marianne Tranter e Liza Bingley-Miller, como colegas que ousaram juntar-se ao 
trabalho em Londres desde o início, suportando ambas o tremendo estresse oriundo das famílias e da rede 
profissional, mas também compartilhando a recompensa oriunda das crianças. Finalmente, quero agradecer a 
Liza, seu 1 marido Peter e ao pequeno Sam, como amigos queridos, pelos dois meses que pude passar com eles 
para escrever partes essenciais deste livro.
Introdução Como Usar Este Livro
Oabuso sexual da criança é tanto uma questão normativa e política quanto clínica. Possui importantes aspectos 
sociológicos e antropológicos. Como uma questão que envolve o sexo, é uma questão sexista e um campo de 
batalha para fortes opiniões. Para os profissionais, que precisam lidar com as conseqüências, o abuso sexual da 
criança é um pesadelo, um campo minado de complexidade e confusão, pessoalmente e profissionalmente, uma 
ameaça aos papéis profissionais tradicionais, um desafio às tradicionais estruturas de cooperação e uma 
constante zona de perigo de fracasso profissional. Este livro foi escrito para os profissionais de todas as 
diferentes profissões, dos policiais aos terapeutas, envolvidos no trabalho prático cotidiano com crianças que 
sofreram abuso sexual.
Trabalhar com crianças que sofreram abuso sexual e suas famílias é basicamente complicado por quatro fatores. 
Como um problema multidisciplinar genuíno e genérico, requer a estreita cooperação de uma ampla gama de 
diferentes profissionais com diferentes tarefas. Como um problema legal e terapêutico, requer, por parte de 
todos os profissionais envolvidos, o conhecimento dos aspectos criminais e de proteção da criança, assim como 
dos aspectos psicológicos. Envolve as crianças como seres humanos estruturalmente dependentes, que são 
pessoas com seus próprios direitos, mas que não podem exercer esse direito elas mesmas, precisando de prote-
ção e do cuidado dos pais. A natureza específica do abuso sexual da criança como uma síndrome conectadora de 
segredo para a criança, a pessoa que cometeu o abuso e a família, e como uma síndrome de adição para a pessoa 
que cometeu o abuso complica tanto a intervenção legal quanto a intervenção protetora da criança, assim como a 
própria terapia.
A revelação do abuso sexual da criança conduz a uma crise imediata nas famílias e nas redes profissionais, 
igualmente. Uma abordagem integrada à família, conseqüentemente, precisa prestar tanta atenção aos processos 
na rede profissional quanto aos acontecimentos na família. No abuso sexual da criança como uma síndrome de 
jpanza
Realce
segredo, a simples nomeação do abuso cria o abuso como um fato para a família. Isso freqüentemente parece 
refletir-se na rede profissional e no nosso próprio pânico e crise profissionais, quando intervimos cegamente em 
um processo que muitas vezes não compreendemos. Em uma abordagem familiar metassistêmica ao abuso 
sexual intrafamiliar e extrafamiliar da criança, os efeitos legal e linear do abuso sexual da criança como um 
crime e a necessidade de proteção da criança precisam ser integrados aos aspectos circulares psicológicos e de 
relacionamento das crianças que sofreram abuso e suas famílias.
Os profissionais de todas as áreas precisam aprender que o contexto em que um determinado ato profissional é 
realizado pode ser tão importante, ou ainda mais
14
14
Introdução
importante, na determinação do resultado global quanto o ato em si. Noções de "terapia antiterapêutica", 
"prevenção do crime promotora de crime" e proteção da criança promotora de abuso enfatizam a necessidade de 
os profissionais não apenas compreenderem o que estão fazendo, mas também que efeitos a ação de um profis-
sional tem sobre o trabalho de outros profissionais e sobre a direção geral da complexa intervenção global. 
Terapeutas e profissionais da saúde mental da criança precisam saber tanto sobre os aspectos de proteção à 
criança que sofreu abuso, quanto os policiais precisam entender os efeitos psicológicos de uma entrevista com as 
crianças que sofreram abuso, se quiserem realizar sua tarefa legal. Profissionais de todas as funções precisam 
reconhecer como a sua própria tarefa e ação influencia a tarefa dos profissionais colegas, e como, por sua vez, 
sua própria tarefa é afetada pelo processo em outras partes da rede profissional. Conceitos de "terapia não-
terapêutica" e "não-terapia terapêutica" ilustram a necessidade de se pensar em contextos mais amplos. Lidar 
com o abuso sexual da criança requer um reexame dos procedimentos legais, faz progredir rapidamente as áreas 
de psiquiatria infantil forense, coloca problemas de proteção até o momento desconhecidos para as agências de 
proteção da criança, promove e faz progredir aspectos de profissionalização no cuidado adotivo e desafia 
terapeutas de qualquer orientação e crença a reconsiderarem suas tarefas e a desenvolverem suas técnicas e 
abordagens. Além disso, novos profissionais que desempenhavam apenas papéis marginais no abuso físico, tais 
como professores e pessoas que trabalham com os jovens, tornam-se centrais na tarefa e precisam ser 
inteiramente integrados à rede profissional.
Este livro está dividido em duas partes. A primeira parte delineia os princípios de procedimento na 
conceitualização e ilustra as abordagens básicas para lidarmos com crianças que sofreram abuso sexual e suas 
famílias. Esta parte do livro foi tão resumida quanto possível, porque pode tornar a leitura difícil e um tanto 
monótona. Mais de 10 anos de experiência no trabalho com o abuso sexual da criança, contudo, ensinaram-me 
que todos os profissionais envolvidos, sem exceção, precisam saber a respeito dos princípios de procedimento e 
conceitos básicos ao lidar com o abuso sexual da criança, de modo a realizar bem sua específica tarefa 
profissional, assim como ajudar co-profissionais de outras funções a serem capazes de assumir sua parte na 
responsabilidade global da intervenção. Algumas das noções conceituais podem, a princípio, parecer 
acadêmicas, mas todas, sem exceção, são descritas aqui em função de sua relevância prática fundamental. Elas 
devem ajudar a clarificar áreas de confusão comum e freqüentemente desastrosas para os profissionais de vários 
backgrounds.
A segunda parte lida com alguns dos numerosos problemas práticos, que sempre garantem que a intervenção 
não funcione como deveria de acordo com a inteligenteteoria da primeira parte. A segunda parte trata de alguns 
dos incontáveis obstáculos à ajuda às crianças que sofreram abuso sexual e suas famílias, os quais fazem com 
que eu fique exultante quando erro em 8 e não em 9 em 10 casos.
O entendimento da complexidade dos processos interligados no abuso sexual da criança pode muitas vezes ser 
cansativo e trazer surpresas desagradáveis, especialmente para os profissionais que apenas precisam de 
assistência em um problema prático específico urgente. Os leitores que procuram este livro por essa razão 
podem ir primeiro para a segunda parte, começando com o problema prático específico. O perigo de causarmos 
um dano secundário às crianças que sofreram abuso sexual e suas famílias, no entanto, irá fazer com que o leitor 
volte à primeira parte antes de agir. A razão para isso está no fato de que a tarefa, no abuso sexual da criança, é 
mais ampla do que a tarefa, a responsabilidade e a capacidade profissional de qualquer profissional isolado 
envolvido. Isso torna necessário desenvolver uma ação
Introdução
14
profissional específica dentro do contexto global bem mais amplo do abuso sexual da criança como um 
problema genuíno, multidisciplinar e metassistêmico. O perigo de infligir um dano secundário considerável à 
criança deixa-nos com a responsabilidade de nos fazermos três perguntas em todos os estágios de nossa 
intervenção: O que eu quero realizar? O que estou fazendo para conseguir isso? O que eu penso estar realizando 
no contexto mais amplo da intervenção multidisciplinar amplificada, quando ajo de determinada maneira no 
contexto de minha estreita responsabilidade profissional? Conseqüentemente, nós precisamos de algumas idéias 
a respeito de como agir em situações específicas, mas também precisamos compreender nossas próprias ações 
no contexto mais amplo relativo ao que as outras pessoas fazem, tanto na família quanto na rede profissional. A 
primeira parte do livro mostra o caminho e a segunda parte nos ajuda a compreender por que isso nunca 
funciona como deveria e por que nós raramente chegamos lá.
Lendo as duas partes do livro, os profissionais logo perceberão que ele falha em ambas as áreas e em ambas as 
explicações. Logo se tornará óbvio que a parte conceituai é muito incompleta e geral, e que a parte clínica deixa 
a desejar em termos de integralidade, especificidade e diferenciação, deixando de lado um imenso número de 
questões conceituais e situações práticas com as quais nos deparamos em cada novo caso. Portanto, além de 
proporcionar uma orientação limitada, este livro deve. fundamentalmente, ajudar os colegas de todas as 
profissões envolvidas no trabalho com o abuso sexual da criança a desenvolver mais esses conceitos e a fazer 
progredir a nova prática clínica no contexto de uma abordagem de tratamento multidisciplinar.
Por razões práticas, são feitas referências no livro objetivando unir os "princípios de procedimento" aos 
"problemas práticos", o que deve possibilitar ao leitor iniciar no seu ponto específico de interesse profissional. 
Os efeitos individuais do abuso sexual da criança e o padrão familiar são descritos primeiro, de modo a 
estabelecer o enquadramento para delinearmos a estrutura e organização da rede profissional e do processo 
interdisciplinar na intervenção. Alternativamente, o livro poderia ter descrito primeiro o processo profissional, 
de modo a enfatizar a influência da rede profissional no indivíduo e na família.
"Estou vendo que você passou por um mau pedaço, sente-se e fume um cigarro", era a atitude de Henry Kempe 
com os pais que cometiam abuso físico, na década de sessenta. Revolucionária, na época, pela agudez do 
profundo entendimento de que as crianças que sofreram abuso sexual e seus pais responsáveis pelo abuso 
formam uma unidade entrosada. Nós, obviamente, precisamos aprender mais sobre as crianças que sofrem 
abuso sexual, mas também precisamos de uma revolução semelhante em nossa atitude e compreensão em 
relação à pessoa que comete abuso sexual. O processo familiar específico no abuso sexual da criança só mudará 
em resposta a uma mudança básica em nosso entendimento e abordagem às pessoas que cometem abuso sexual. 
Isso aponta para a natureza interacional da motivação que influencia as pessoas que cometem abuso sexual, 
levando-as a revelar o abuso e a buscar ajuda, ou levando-as a manter o segredo e a continuar abusando. Nos 
últimos 10 anos, nós aprendemos alguma coisa com a criança que sofreu abuso sexual como a vítima. Nós agora 
precisamos aprender com a pessoa que comete o abuso, uma tarefa emocionalmente ainda mais difícil.
No presente, os meio-cegos estão falando aos cegos. Uma das maiores causas de dano secundário nas crianças 
que sofreram abuso sexual e de fracasso profissional é a imensa pressão sobre os profissionais e o sentimento de 
que temos de fingir que conseguimos enxergar perfeitamente e que sabemos exatamente como agir. Mas 
nenhum de nós sabe ainda. Aprender a compreender e a lidar com o abuso sexual da criança leva tempo. As 
crianças, como pessoas estruturalmente dependentes,
B
Introdução
precisam de seus pais e famílias. Este livro, conseqüentemente, descreve uma abordagem familiar 
metassistêmica para lidarmos com o abuso sexual intrafamiliar e extrafamiliar da criança. Uma abordagem 
familiar metassistêmica não é uma abordagem de terapia familiar e não deve ser confundida com ela. Como uma 
abordagem de tratamento integrada, uma abordagem familiar conceitualiza intervenções sempre em termos de 
família, inclusive no abuso sexual extrafamiliar da criança. Isso baseia-se no fato de que as crianças precisam de 
cuidadores. O uso do termo "mãe" ou "pai" neste livro não se refere portanto a qualquer conceito biológico, mas 
representa qualquer adulto do sexo feminino ou masculino que esteja in loco parentis para a criança. Em termos 
das pessoas que cometem abuso isso pode incluir amigos do sexo masculino, padrastos, co-habitadores, avós, 
tios e irmãos bem mais velhos. Similarmente, eu não me refiro ao status legal quando falo sobre "marido" e 
"mulher". Estes termos representam qualquer parceiro do sexo masculino ou feminino que viva ou não sob o 
mesmo teto.
PRIMEIRA PARTE
Princípios de Procedimento
I
1
Da Loucura à Maldade: Ponto de Partida Multidisciplinar
e Metassistêmico
1.1. Abuso legal e dano psicológico
A consciência cada vez maior do abuso sexual da criança entre os profissionais tem sua origem em duas fontes 
relacionadas, mas muito diferentes. A primeira é o crescente movimento dos direitos da criança, que no contexto 
histórico do movimento dos direitos humanos está acompanhando 0 movimento dos direitos da mulher. A 
segunda fonte é o crescente conhecimento e preocupação com a saúde e a saúde mental da criança. O abuso 
sexual da criança deve ser visto tanto como uma questão dos direitos da criança quanto como um problema de 
saúde e de saúde mental (Beezley Mrazek, 1981b). As agências de proteção à criança e os profissionais da lei 
intervêm de uma perspectiva normativa para proteger as crianças do abuso e para punir os perpetradores pelo 
crime, enquanto os profissionais da saúde mental estabelecem programas de tratamento para lidar com as 
seqüelas psicológicas do abuso sexual da criança. As razões para intervir podem, portanto, ser puramente legais 
ou puramente terapêuticas, ou uma mistura de ambas, em cujo caso é absolutamente essencial distinguir entre os 
dois aspectos e clarificar o relacionamento entre ambos.
Tradicionalmente, as intervenções legais e normativas têm sido consideradas como sendo incompatíveis com as 
abordagens terapêuticas. Os princípios e objetivos aparentemente inconciliáveis das abordagens legal e 
terapêutica refletem-se numa divisão entre os profissionais destes dois domínios. Por um lado, nós encontramos 
profissionais qualificados e competentes, trabalhando no campo legal e nos serviços de proteção à criança, que, 
de um ponto de vista legal, são extremamente experientes no manejo de questões criminais e nosaspectos de 
proteção à criança que sofreu abuso sexual. Ao mesmo tempo, esses profissionais muitas vezes são incapazes de 
identificar os problemas psicológicos no abuso sexual da criança, como uma síndrome de segredo e adição 
conectadora.'Eles são incapazes de utilizar o potencial terapêutico da crise individual e familiar que criam ao 
intervir em nível legal. Isso não significa apenas perder a oportunidade de um grande potencial terapêutico. A 
falta de conhecimento psicológico na intervenção legal pode inclusive fazer malograr seu propósito, resultando 
na "prevenção do crime promotora de crime" ou na "proteção da criança promotora de abuso". A intervenção 
legal pode, conseqüentemente, não apenas falhar em relação ao seu objetivo, mas também infligir um dano 
psicológico adicional à criança. (Veja O processo interdisciplinar no contexto, 5.2.)
Por outro lado, nós encontramos terapeutas extremamente experientes que lidam com o dano psicológico nas 
crianças e com relacionamentos familiares disfun-
17
cionais. Os profissionais da saúde mental, no entanto, muitas vezes não sabem como lidar com aspectos 
normativos e com as tarefas linear e legal de proteção à criança e prevenção adicional do crime. Terapeutas 
individuais e de família muitas vezes negligenciam, ou inclusive não admitem, os aspectos legal e linear do 
caso. Eles positivamente se recusam a tratar pacientes e famílias quando a lei está envolvida, porque vêem 
qualquer envolvimento legal como incompatível com a posição terapêutica. Se chegam a se envolver, não sabem 
como lidar terapeuticamente com os aspectos legais. Geralmente eles tentam ignorar o processo legal.
O resultado dessa dicotomia é que ambos os lados não se encontram, não compreendem um ao outro e deixam 
de cooperar. Os terapeutas sentem que a polícia e os juízes "jogam muito duro", ao passo que a polícia e os 
serviços de proteção à criança podem achar que os terapeutas são "molóides que destroem evidências e não 
protegem adequadamente". Quando as exigências legais forçam os terapeutas a cooperar com agências 
estatutárias, isso tende a ser mantido em um mínimo formal e não favorece um entendimento integrado do 
processo global.
Quando os profissionais se envolvem no abuso sexual da criança, os aspectos normativos e de saúde mental 
precisam ser integrados e diferenciados numa abordagem global, na qual os terapeutas podem ter de confiar no 
apoio das agências legais para a terapia, tanto quanto os profissionais da lei podem ter que compreender a 
dimensão psicológica do abuso sexual da criança como uma síndrome de segredo e adição, de modo a fazer o 
seu próprio trabalho profissional. Ambos os lados precisam mudar sua maneira de trabalhar e ambos os lados 
precisam abandonar básicas e apreciadas noções de independência profissional.
Aspectos legais e linearidade
Em nível legal, o abuso sexual da criança é definido por afirmações normativas implícitas ou explícitas no 
contexto dos específicos sistemas cultural, social e legal. As definições normativas relacionam-se a práticas 
aceitáveis ou inaceitáveis de educação da criança e à posição das crianças em diferentes sociedades. Elas 
descrevem as normas, limites e fronteiras do comportamento apropriado e aceitável dos adultos em relação às 
crianças. Schechter e Roberge (1976: 129) ofereceram uma das mais conhecidas e mais úteis definições 
normativas: "A exploração sexual das crianças refere-se ao envolvimento de crianças e adolescentes 
dependentes, imaturos desen-volvimentalmente, em atividades sexuais que eles não compreendem totalmente, 
às quais são incapazes de dar um consentimento informado e que violam os tabus sociais dos papéis familiares." 
Eu acrescentaria a isso: "e que objetivam a gratificação das demandas e desejos sexuais da pessoa que comete o 
jpanza
Realce
abuso", de modo a incluir o elemento intencional crucial do abuso. Essa definição normativa destaca a noção de 
dependência estrutural das crianças e a incapacidade de dar consentimento informado a relacionamentos 
sexuais. Ela aponta para o direito das crianças de crescerem sem a interferência sexual dos adultos para a sua 
própria satisfação. Subjacente à maioria das definições normativas está a noção de que os relacionamentos 
sexuais entre adultos e crianças constituem abuso sexual da criança, porque os relacionamentos sexuais somente 
deveriam acontecer por livre vontade e por livre escolha, sem coerção. Além disso^mbos os parceiros sexuais 
devem ser capazes de dar consentimento total e informado a qualquer ato sexual em que venham a se envolver^ 
Ao diferenciar aspectos de direitos humanos e questões de saúde mental no abuso sexual da criança, nós não 
podemos, e não devemos, fazer a equação de que todas as crianças que sofreram abuso sexual ficam 
automaticamente perturbadas em
Abuso Sexual da Criança
18
termos psiquiátricos, embora todas possam ficar confusas, até certo grau, em virtude da experiência (Baker, 
1983) (Veja Terapia e trabalho de proteção, 7.2.2). Nós devemos ser extremamente cuidadosos quando 
interpretamos os números de incidentes e prevalência do abuso sexual da criança. Quando Russell (1983), em 
um estudo sobre o abuso sexual em São Francisco, descreve 38 por cento das mulheres como tendo sofrido 
abuso sexual, ao menos por uma vez, em torno dos dezoito anos, nós temos que estar conscientes de que esses 
números são baseados em uma definição normativa, e não em uma definição de saúde mental. Nós, 
conseqüentemente, não podemos concluir que 38 por cento das mulheres em São Francisco estão perturbadas 
psiquiatricamente por sua experiência de abuso sexual quando crianças. Mas isso também significa que 
independentemente do número de mulheres que sofreram dano psicológico nesse grupo de 38 por cento, o abuso 
ainda é abuso em termos normativos e não deveria acontecer. Nós precisamos ter muito cuidado para não 
confundir os dois elementos diferentes, julgando a severidade da violação das normas legais através das 
conseqüências de dano físico ou psicológico. Isso poderia querer dizer que o abuso sexual somente é abuso 
quando encontramos dano psicológico,, como se um roubo de banco somente fosse crime quando o gerente do 
banco tem um colapso nervoso. Reciprocamente, é muito inadequado utilizar o fato do abuso sexual da criança 
ser tão difundido em termos normativos para argumentar que não deveríamos nos preocupar com os efeitos na 
saúde ou na saúde mental uma vez que a experiência, numericamente, é quase "normal".
As discussões legais e de saúde mental são relacionadas, mas possuem raízes bastante separadas. A confusão, no 
abuso sexual da criança, entre definições legais e de saúde se origina da diferença na atitude social, em nossa 
sociedade, em relação à violação física e sexual da integridade das crianças. No abuso físico, um pouquinho de 
violência física é considerado aceitável, e somente as formas severas de violência ou punição física são 
identificadas como abuso. A definição normativa do abuso físico, portanto, equivale muito mais a um 
inaceitável grau de violência ou força física do que à sua presença em princípio.
Em contraste, qualquer violação sexual da integridade da criança é rotulada como abuso e a definição normativa 
é muito mais estreita para o abuso sexual do que para o abuso físico.jínquanto nenhum dos pais é levado ao 
tribunal e nenhuma criança recebe cuidados se eles dão uma palmada no traseiro da criança, um pai bem pode 
acabar na prisão por ter esfregado levemente os genitais da criança. Ao passo que "um pouquinho de violência é 
aceitável", "um pouquinho de sexo não é". Isso está relacionado ao fato de que, socialmente, é menos tolerável 
apresentar um comportamento sexual claro do que agir com violência física. No entanto, a definição normativa 
mais estreita do abuso sexual da criança também tem uma base lógica em termos de intervenção. Os problemas 
específicos no manejo do abuso sexual da criança como uma síndrome conectadora de segredo e adição faz com 
que o controle, a intervençãoprotetora e a terapia sejam muito mais difíceis e complexas do que no abuso físico. 
(Veja: O processo individual, Capítulo 2.)
Os atuais problemas legais e de proteção no abuso sexual da criança são compostos pelo fato de que, no 
crescente movimento dos direitos da criança, esta torna-se cada vez mais um sujeito com direitos perante a lei. 
A dependência estrutural das crianças, como resultado da falta de maturação biológica, impede que elas exerçam 
completamente seus direitos e tomem posição como sujeitos independentes perante a lei, que presentemente 
funciona para oferecer a justiça para adultos que são capazes de assumir responsabilidade pessoal completa e 
independente por suas ações. A posição legal incompatível da criança como um sujeito perante a lei sem ser
1J
1 Hint'" r-ur-niee
lui^lmunra capas de comprcmdn- Puto papei leva cada -v-c7- mm.-» ^ ......1-....,** ■>us
procodimentoa legai.i. qur Hrvr,.. 1~ . ~* wí. wuu u Ji.i/r.nlf-m ii i—.1 ' " ' iii -il <-li«v crlançac.
/\ tnlln hinliV" " ''"-<'"™v5" i'"o iiív..........k0tul » cognitivo rcouita
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como uma diferença qnnnlilnliv/i. l^hIiwhUu nuo lcjíuj i1*-......n(i_i, crlynçat
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lu, pulo quo col, pui yiUlls^"-"'-"w <-lil ^"z como terapeuta, na.~. „. ,ni;iu .,<iu u tunculro do que oo ndt-"" -1
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puwva t'ur apoiado por qualquer rvirf«.~i~ ,w%íui<iiUm Jcw prr-i «......» ■■ •=■■ "-■
baclco deve 3c ã rrdnrSn !■ i-n Ir- |i ■ li 'l-i illíurança qualliailvcl lld U > 1111J rilf-açao da enonen <-m 
imu .'ink.iiuy c|U11iultatlva da comumeocod anima madura. Kccuoar
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i|iife. Lima puttoa cega nao pode faTier um j 11 ■ n ■ ■ ■■—■ ■ I ■ > i.....i11^ nao c copas üc lei ui'1'*
Bftilla normal.
r..i«. kui^ow primariac legai» e piuieioras no aDuso sexual da criança nao estão relacionadas ao dano 
psicológico causado na mesma. O processo legal e a intervenção protetora da criança, portanto, prosseguem 
independentemente de ela ter sido ou não afetada psicologicamente pelo abuso. O dano psicológico secundário 
pode então ser facilmente infligido nas intervenções legais ou de proteção à criança, pois os conceitos 
psicológicos desenvolvimentais não são, verdadeiramente, parte do domínio legal e somente são levados em 
conta pelo tribunal ou outras agências legais na medida em que são admitidos pelos procedimentos legais.
1.1.2. Saúde mental e circularidade
O segundo grupo de profissionais que se envolvem no abuso sexual da criança são os que trabalham no campo 
da saúde física e da saúde mental da criança. Esses profissionais não estão primariamente interessados na noção 
da criança como um sujeito legal ou em questões dos direitos da criança. Os profissionais de saúde e de saúde 
mental tentam identificar e lidar com os fatores que levam ao danojísico e psicológico da criança.
As dermTçõSTda saúde mental do abuso sexual da criança dirigem-se aos aspectos psicológicos e aos fatores 
desenvolvimentais no desenvolvimento psicosse-xual da criança. Ajrna_ Ejgad dirige sua definição do abuso 
sexual da criança à descrição dos fatores, no desenvolvimento psicossocial e psicossexual da criança, que têm 
conseqüências nos processos normais de maturação. Ela afirma que "no abuso sexual da criança esta não pode 
evitar ficar sexualmente estimulada e essa experiência rompe desastrosamente a seqüência normal da sua 
organização sexual. Ela é forçada a um desenvolvimento fálico ou genital prematuro, enquanto as necessidades 
desenvolvimentais legítimas e as correspondentes expressões mentais são ignoradas e deixadas de lado."*(Anna 
Freud, 1981, p. 33-4). Essa citação faz parte de uma descrição mais longa. Não interessa se concordamos com o 
conteúdo desta definição de saúde mental ou com o conteúdo da definição normativa anterior. A diferença 
prática importante é que as definições normativas, como parte do domínio social, cultural e político podem ser 
definidas incondicionalmente de acordo com opiniões e crenças. As definições normativas, portanto, podem 
mudar, livre e rapidamente, com as mudanças culturais e políticas que estão representadas na lei. As definições 
da saúde e da saúde mental são parte do domínio científico que requer provas
'■iTXtstczl da í ' r ra rr i~a__- *?
atravco do cjtamc fioico c mcntr1 civxxiu^owt; wauiciu montai dovom cor oporá
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clu.fjao multo cuidndoca c muito preliminar, '1>J ^fíim-Hi i^t^ ..i.Ihhu pwl<_-(-»l<ãi4l(_-<_» xi«j citouoo 
ocKual dex enanca j~L«.iy i^i' liv ,imuinu rui^ciuicio aut coto tiogulntoc
fatores (Finkelhor, 1979,1980; Baker, 1983; Baker e Duncan, 1985; Oppenheimer e colaboradores, 1985; 
Furniss, 1988):
> 1) A idade do início do abuso. . 2) A duração do abuso.
3) O grau de violência ou ameaça de violência. .. 4) A diferença de idade entre a pessoa que cometeu o abuso e 
a criança que sofreu o abuso.
, 5) Quão estreitamente a pessoa que cometeu o abuso e a criança eram relacionadas.
6) A ausência de figuras parentais protetoras. ■ 7) O grau de segredo.
1.1.3. O processo de entrosamento
^ Nós precisamos unir os domínios legal, de saúde e de saúde mental. Em um contexto legal, a criança que 
sofreu abuso pode ser afastada dos pais porque a lei foi quebrada e a criança tem o direito legal de ser protegida 
de outros abusos. Em termos de saúde mental, contudo, essa proteção legal pode ser "um desserviço" para a 
criança, quando o abuso, por si próprio, não conduziu a um dano psicológico ou desenvol-vimental 
significativo, enquanto a remoção legal da criança e o possível colapso familiar como uma conseqüência do 
processo legal precipita o trauma psicológico e a perturbação psiquiátrica secundários na criança/ 
Reciprocamente, nos primeiros anos, eu próprio tentei evitar que os serviços de proteção interviessem. Eu tentei 
solucionar o problema terapêutico e de proteção à criança que sofrera abuso sexual puramente através de formas 
tradicionais de terapia e de terapia familiar. A análise metassistêmica dessa terapia revelou que eu, como 
terapeuta, havia me tornado parte do sistema familiar de segredo. A terapia tornou-se uma "terapia antiterapêu-
tica", com a criança permanecendo desprotegida. O abuso continuava com crescentes ameaças à criança e com o 
decrescente risco de revelação da pessoa que cometia o abuso, e era pior e mais prejudicial do que antes. §.
1.2. Responsabilidade, participação, culpa, poder e acusação
E extremamente útil examinar os diferentes conceitos de responsabilidade, participação, culpa, poder e acusação 
em um enquadramento metassistêmico de linearidade e circularidade, para ajudar a distinguir entre aspectos 
legais, terapêuticos e de proteção à criança no abuso sexual da criança. Um relacionamento linear é um 
relacionamento que não está aberto a qualquer forma de redefinição através de qualquer reinterpretação ou 
pontuação da interação. A circularidade define aspectos interacionais dos relacionamentos interpessoais que 
podem ser igualmente atribuídos a ambos os parceiros de acordo com o contexto (Selvini-Palazzoli e 
colaboradores, 1978). A distinção entre o conceito linear e legal de responsabilidade e o conceito
lo
Tilman Furniss
circular e psicológico de participação e os aspectos legal e psicológico do conceito de culpa são de grande 
importância prática e terapêutica no abuso sexualda criança.
1.2.1. Dependência estrutural e responsabilidade
Os fatores biológicos de maturação determinam o grau de dependência estrutural das crianças em relação às 
figuras parentais, começando pela total dependência nos bebês e conduzindo à independência e à total 
responsabilidade individual dos adultos. Em termos do desenvolvimento infantil normal, a criança cessa de ser 
uma criança no momento em que seu desenvolvimento físico, cognitivo, emocional e social atingiu o estágio 
que lhe permite tomar decisões independentes, assumir total responsabilidade por todas as atividades e 
potencialmente cuidar de si mesma e sustentar-se independentemente. A desigualdade legal entre os pais e as 
crianças, em que os pais são sempre, e as crianças nunca, responsáveis por aquilo que acontece na interação 
entre eles, baseia-se na imaturidade biológica da criança. A infância pode, conseqüentemente, ser definida em 
termos simples, mas operacionalmente claros, "como dependência estrutural em relação a algum adulto para 
cuidados físicos, emocionais, cognitivos e sociais e para proteção, devido à falta de maturação biológica". A 
dependência estrutural das crianças significa que elas devem ser capazes de confiar que tudo o que um 
progenitor faz é bom para a criança e vai ajudar o seu desenvolvimento.
1.2.2. Participação
A participação ativa no abuso sexual constitui o elemento circular e de relacionamento. A distinção entre o 
conceito legal de responsabilidade e o conceito psicológico de participação freqüentemente é confundida. A 
argumentação de que as crianças estão ativamente envolvidas no abuso é então erroneamente atacada, como se 
significasse que a criança, de alguma maneira, é responsável pelo abuso.
Nós precisamos distinguir entre duas formas de participação ativa. A vasta maioria das crianças que sofreram 
abuso sexual não toma nenhum papel ativo para iniciar o abuso sexual, mas todas as crianças são participantes 
ativas na interação abusiva, mesmo se são forçadas contra a sua vontade. E importante compreender que um 
papel passivo e não-iniciador, de vítima, na interação de abuso sexual progenitor-criança também constitui uma 
atividade de participação que é a base para a experiência de abuso que a criança sofre.
Assim como a aparente não-comunicação de duas pessoas em uma sala ainda é uma forma de comunicação, a 
passividade no papel de vítima também constitui, no nível interacional, uma participação ativa. Isso não deve ser 
confundido com iniciativa ou responsabilidade. Por exemplo, uma menina que sofreu abuso sexual relatou como 
seu pai costumava mandá-la levar chá para ele em sua oficina mecânica. Ela sabia exatamente o que isso 
realmente significava e que ele abusaria sexualmente dela quando ela chegasse na oficina. Ela ficava confusa e 
não queria ir, mas ia todas as vezes e sujeitava-se às exigências do pai. Embora não ocorresse nenhuma 
violência real, essa criança não tinha escolha e era forçada, por ameaças, a obedecer. Como uma participante 
forçada, essa menina foi uma parceira interacional ativa no abuso que ocorreu durante muitos anos e que 
constituiu a experiência de relacionamento mais importante e intensa de sua vida, e também a mais prejudicial 
(veja Abuso sexual da criança como uma síndrome de segredo, 2.1).
o ..poeto mtc««Ho.^i -i- r^cu^wie-^ ca ao "^'"'^SSS^S? cm"™"™ ™,"llc*xi> o fato de qu/a-i m^çac podem 
staitlr-eo rcopon,avr„ nli einLura, do fato. ;nmm-> j ->ci icjyullSdVflS.
a.2.3. Culpa.
a ailpa contem um ri..,-'.......culto, com U1I1 11 impnnpntc Içfcal c Ulll nimponente
pcicòlol.co M™. "il— -'.umbaMio do, e.PmPnmc Imoarc uiLuldr no ift» Sa >-,,oT..,^ - Pleura 1.11. l> li"«r 
dc ser cul,m.1.. - direta»
rJ™ntal, como um ™---II-. V. .1-. dapcndcncin ^ ,l........1 '■«anca no »h"L°'
do coto ir-«>----1 .Mi. 1 — lw «» violada, o pmg,.-..:i... i wor conoidcm.H.. . . .I| «rtor»-i.'
trnh„,„,. . _. ^HA»=la£ cstatutonn- (1 —pclcplocrion Hr - "ir""
i.j-^-u. w ^poao rcioaonai Ua puuiapação e resulta do rato de que a pessoa que cometeu o abuso e a criança 
estão igualmente envolvidas no abuso em termos interadonais. A distinção entre os aspectos legal e psicológico 
de culpa significa que apenas o progenitor pode ser considerado culpado. Mas a pessoa que cometeu o abuso e a 
criança podem sentir-se igualmente culpados, como uma expressão dos eventos psicológicos que se derivam da 
experiência na interação abusiva.
A experiência da criança como participante no abuso explica como as crianças que sofreram abuso prolongado 
freqüentemente expressam fortes sentimentos de culpa, independentemente do grau de cooperação e da vontade 
de participar do abuso. O sentimento de culpa da criança origina-se de seu senso equivocado de 
responsabilidade,que ela deriva do fato de ter sido uma participante no abuso. Essa confusão muitas vezes é 
reforçada pelas ameaças da pessoa que cometeu o abuso, de que a criança será responsável pelas conseqüências 
se revelar o abuso. A persistente experiência psicológica de participação e culpa também explica a baixa auto-
estima e o posterior comportamento de vítima dos adultos que sofreram abuso sexual quando crianças.
1.2.4. Poder
Os conceitos políticos, sociológicos, interacionais, psicológicos e físicos de poder foram freqüentemente 
confundidos na discussão do abuso sexual da criança e o resultado é que o uso do termo muitas vezes não tem 
realmente significado. A distinção crucial entre poder real e estrutural raramente é feita. A supersimplificação e 
as afirmações, às vezes inflamadas, sobre os conceitos de poder não são úteis quando lidamos com as questões 
clínicas do abuso sexual da criança. Isso não significa que o conceito de poder não poderia ser utilizado nem que 
as questões de poder não estejam envolvidas. Isso na verdade significa que o conceito deve estar claramente 
definido.
No abuso sexual da criança, as questões de poder estão envolvidas em um nível estrutural e em um nível 
interacional. Em nosso trabalho clínico com crianças que sofreram abuso e suas famílias nós podemos substituir 
o aspecto estrutural de poder pelo conceito de responsabilidade, desconsiderando totalmente a questão do poder 
no nível interacional. Eu gostaria de ilustrar isso com um exemplo de abuso físico: Quem é mais poderoso, um 
bebê de quatro semanas de idade que berra r_i_.jiilin.iü'ii<jnro por varino horao ou----"ia« do vinto anoc de 
idade, que tenta errt
vao acalma lo. co~- ° t,«t-"-í uiuranao cada voa maio, enquanto a mni- Ir-i-iln /ijmló-li n
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tem, devido à maturação e avançado desenvolvimento psicossocial, que lhe possibilitou assumir uma posição 
parental em relação à criança. As maiores capacidades, em todos os níveis, formam a base material para o fato 
da responsabilidade estrutural da mãe em relação ao bebê, devido à qual nós esperamos que ela proteja a criança 
e promova seu desenvolvimento.
No nível interacional, o conceito simplificado de poder não tem sentido. Tanto o bebê quanto a mãe são 
participantes iguais na interação. A mãe pode sentir-se tão desamparada e impotente para parar o choro quanto o 
bebê, e pode ficar cada vez mais infeliz e desesperada. O exemplo mostra que o conceito de poder não faz 
sentido no nível do relacionamento interacional. O maior "poder" da mãe, no nível estrutural, contudo, significa 
que ao contrário do bebê, a mãe tem a capacidade estrutural de deixar o círculo vicioso de eventos em que ela e 
o bebê se tornaram interligados. Ela pode deixar a interação e procurar ajuda fora da interação.A mãe é capaz 
de assumir responsabilidade pelos eventos na interação, coisa que o bebê não consegue fazer. No nível 
estrutural, conseqüentemente, nós podemos substituir o conceito muitas vezes emotivo de poder pelo mais 
preciso e científico conceito de responsabilidade.
O mesmo acontece com o abuso sexual da criança. Eu atendi pais que relatavam quão desesperadamente haviam 
tentado parar de abusar sexualmente de seus filhos, mas a qualidade aditiva do abuso sexual da criança como 
uma síndrome de adição fazia-os prosseguir (veja Abuso sexual da criança como síndrome de adição, 2.2). Um 
pai descreveu como havia tentado parar o abuso, mas sentia uma pressão, como um aro metálico em torno de 
sua cabeça, retornando repetidas vezes. Ele sabia, então, que iria abusar novamente de sua filha, embora se 
sentisse culpado e estivesse plenamente consciente de que estava agindo erradamente. Ele estava desesperada-
mente preso na interação abusiva. Esse pai, que por sua fraqueza sentia-se preso no processo interacional de 
adição no abuso sexual e que se sentia cada vez mais desamparado e desesperado, teve, não obstante, que 
assumir, no nível estrutural, total e única responsabilidade pelo abuso, sem qualquer motivo de desculpa.
O abuso sexual da criança pelo pai ou por figuras paternas origina-se menos no fato de um "poder" maior, e 
mais nas maiores capacidades físicas, sociais, psicológicas e legais que eles utilizam irresponsavelmente. 
Embora certamente pudesse ser usado um conceito claramente definido de poder, eu considerei muito mais útil 
falar, primeiro, sobre a noção de responsabilidade parental e, depois, sobre a dependência estrutural das crianças 
no contexto das diferenças estruturais nas capacidades físicas, mentais e sociais entre a pessoa que comete o 
abuso e a criança imatura. Isso torna obsoleto o conceito bastante confuso e emocionalmente carregado de 
"poder", quando lidamos clinicamente com o abuso sexual da criança.
1.2.5. Acusação
"Acusação é o nome do jogo" e no abuso sexual da criança as questões de acusação estão sempre muito 
próximas na família, e muitas vezes, também nas redes profis-
LINEARIDADE (legal)
Responsabilidade
Fato da culpa i
(1) Imaturidade biológica das crianças
(6) A pessoa que cometeu o abuso é unicamente responsável e pode ser considerada culpada no tribunal
HiáommtC
(6)
A criifipr« seiir-ít tã es-ponswl: rioada \n,U i pessoa qmoiaj o aio ca-versaa CHièirii
cii» :iw'\:di;n irai)
íkt)
(2) Dependência estrutural de cuidadores adultos
(5) A pessoa que cometeu o abuso é legalmente responsável
(3) Responsabilidade estrutural pais-
dos
(4) Fato da responsabilidade sempre com a pessoa que cometeu o abuso
(5) Capaaèisitrapipil-ment xaklm ska enx;-soa qiMoiiij o ru»
(4) SentiiBlcceKSDrsHlkt; culpacrocoKijieKi diape riênci -«-
ACHíKíptíioiijurtlíu :<;1>.k
páíip-naiceiiiiorii tin-— çe erjpí&i tíccrttic aso
Figura II- Aspectos linear e circular da culpa.
22
Tilman Furniss
sionais. O dicionário Oxford define acusação como "colocar a responsabilidade em uma outra pessoa". No uso 
cotidiano parece que a acusação está principalmente relacionada à condenação moral. No trabalho terapêutico 
com crianças que sofreram abuso sexual é inútil e desnecessário fazer qualquer tipo de acusação. O uso do 
conceito estrutural de responsabilidade e o aspecto legal e psicológico da culpa tornou desnecessário e 
positivamente inútil o conceito de "acusação". Além disso, utilizar a categoria moral de acusação é totalmente 
inadequado em qualquer contexto profissional e terapêutico.Isso provavelmente nos conduzirá apenas ao jogo 
de acusação familiar, cujo objetivo é recusar-se a assumir a responsabilidade devida e evitar ser considerado 
culpado ou sentir-se culpado. A acusação na rede profissional geralmente indica "conflito-çor-çrocuração", que 
necessita çré-resolução urgente nas resoluções-do-conflito-por-procuração. (Veja O processo interdisciplinar, 
5.1; Processo familiar, Capítulo 3.)
1.3. Implicações para a prática
1.3.1. Rejeitando a experiência, rejeitando a criança
Por um bem-intencionado senso de proteção em relação à criança que sofreu abuso, os adultos e profissionais 
freqüentemente dizem ou transmitem a seguinte mensagem à criança: "é tudo culpa de seu pai, isso não tem 
nada a ver com você". Depois eles tentam falar o mínimo possível sobre o abuso, esperando dessa maneira 
ajudar a criança a esquecer o que aconteceu. Essa medida aparentemente protetora de não falar sobre a 
experiência de abuso sexual na verdade freqüentemente transmite uma mensagem muito diferente para a 
criança.
A primeira parte da frase, "é tudo culpa de seu pai", reflete a confusão básica dos conceitos de responsabilidade, 
participação, culpa, poder e acusação. Os profissionais querem transmitir à criança que ela não é responsável 
pelo abuso e essa parte da mensagem refere-se ao aspecto legal da responsabilidade parental por aquilo que 
aconteceu. Ao acrescentar "isso não tem nada a ver com você", a mensagem inclui o aspecto psicológico e 
relacional do envolvimento da criança, e nós retiramos o" importante fato da experiência da criança e de sua 
participação no abuso. Ao fazer isso, nós negamos a própria experiência da criança, e ao negar e rejeitar a 
experiência de abuso sexual sofrida pela criança, nós rejeitamos a própria criança. O que a criança sente é que o 
adulto não quer ouvir sobre sua experiência, da mesma maneira como as pessoas não queriam acreditar no abuso 
ou saber dele antes.
Ainda que o abuso tenha sido muito prejudicial à criança, o relacionamento com a pessoa que cometeu o abuso, 
o apego a ela e a interação de abuso sexual podem, não obstante, ter sido a experiência mais intensa e 
importante na vida da criança. Ao deixar de considerar e examinar essa experiência, por razões protetoras, os 
profissionais repetem exatamente a experiência traumática do abuso sexual da criança como uma síndrome de 
segredo. (Veja Abuso sexual da criança como síndrome de segredo, 2.1.)
O que nós queremos dizer à criança é: "é tudo responsabilidade de seu pai (aspecto legal), mas você foi 
envolvida, e pode me contar como foi isso (aspecto interacional) ?" Essa diferenciação tem sido extremamente 
útil para as crianças que sofreram abuso sexual. Permite que se rompa o círculo de segredo e permite que as 
jpanza
Realce
crianças falem sobre sua experiência. Elas podem falar como se sentem responsáveis ou culpadas. Isso nos dá a 
oportunidade de diferenciar e mostrar à criança que "o
(*) O termo aqui refere-se ao progenitor do sexo masculino. (N.T.)
_2.1
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11lci1 It' 1 " ril /l i I ri -
íneiiie bexudl, Lumpondineniu que caüa vez mais aprendemos a ver como resultado de abuso sexual anterior e 
não como ponto departida, e mesmo que/as crianças fossem abertamente sedutoras e tentassem iniciar o abuso 
sexual, como por exemplo entrando no quarto do pai de modo sexualmente convidativo, seria sempre respon-
sabilidade do pai estabelecer limites. Nem mesmo o mais sexualizado ou sedutor comportamento jamais poderia 
tomar a criança responsável pela resposta adulta de abuso sexual, em que-a pessoa que comete o abuso satisfaz 
seu próprio desejo sexual em resposta à necessidade da criança de cuidado emocional. Ao mesmo tempo, nós 
não podemos esperar que um pai seja capaz de lidar sozinho com a situação. Como no abuso físico, seria então 
responsabilidade dele sair da situação e procurar ajuda.
1.3.3. Compreendendo a pessoa que comete o abuso
Expressar empatia e compreensão para pessoas que cometeram abuso sexual freqüentemente provoca fortes 
respostas irracionais e de raiva entre o público e os profissionais da área/ Essa resposta se origina de uma 
confusão, em que as pessoas pensam que compreender e mostrar empatia em relação às pessoas que cometem 
abuso significa desculpá-las e acusar a criança. A distinção entre os elementos inte-racionais e estruturais da 
responsabilidade, participação e culpa/no abuso sexual da criança permite-nos demonstrar empatia e tentar 
compreender por que pais, padrastos e outros tornaram-se pessoas capazes de cometer abuso sexual. Neste 
processo, nós podemos aprender sobre eventos de vida traumáticos na história da pessoa que comete abuso, 
incluindo abuso físico e sexual grave em sua própria infância. Nós podemos compreender como o abuso 
aconteceu e como se pode evitar sua continuação.
Mostrar empatia e compreensão em relação a pessoas que cometeram abuso sexual não tira nem um pouquinho 
de sua responsabilidade total pelo abuso que cometeram. A distinção legal e psicológica entre responsabilidade 
e participação torna mais fácil modificar a posição de vingança e rejeição em relação às pessoas que cometeram 
abuso para um modo terapêutico de entendimento e empatia pela própria experiência de vida dessas pessoas, 
mantendo, ao mesmo tempo, uma clara noção de sua total responsabilidade pelo abuso.
Abuso Sexual da Criança
23
1.4. Dano primário e secundário
A revelação do abuso sexual da criança geralmente conduz ao envolvimento de um grande número de diferentes 
profissionais e agências. A avaliação de 64 casos clínicos revelou que, na média, 8.2 agências diferentes, com 
muitos mais profissionais individuais, haviam se envolvido (Furniss, 1988). A revelação do abuso sexual fre-
qüentemente leva a uma crise na rede profissional, que pode ser maior e, às vezes, mais complexa e 
perturbadora do que a crise na família. Abordagens não-coordena-das freqüentemente não conseguem resolver 
problemas e resultam em conflitos-por-procuração e respostas de ação não-terapêuticas. Intervenções não-
coordenadas podem conduzir a um dano e traumatismo maior nos relacionamentos familiares e nas crianças 
individualmente do que o abuso original. (Veja O processo interdisciplinar, 5.1.)
No abuso sexual da criança como uma síndrome conectadora de segredo e adição nós precisamos distinguir, 
mais do que em qualquer outra área do trabalho com a criança e a família, entre o dano primário pelo próprio 
abuso e o dano secundário pela intervenção profissional. Essa noção leva em conta o fato de que, no abuso 
sexual da criança como um problema normativo de direitos humanos, nem todas as crianças ficam perturbadas 
psiquiatricamente, embora todas as crianças sejam afetadas e fiquem confusas pelos efeitos do abuso sexual 
como uma síndrome de segredo. Isso conduz à necessária diferenciação entre "trabalho de proteção" e "terapia" 
(veja Terapia e trabalho de proteção, 7.2.2). No abuso sexual da criança, qualquer intervenção profissional deve, 
conseqüentemente, ter como objetivo principal evitar o dano secundário pela intervenção, antes de se dedicar à 
tarefa terapêutica primária de tratar o trauma decorrente do próprio abuso sexual.
O dano secundário e a vitimização das crianças que sofreram abuso sexual acontece em cinco níveis.
1) Estigmatização social. As crianças que sofreram abuso sexual e suas famílias podem se tornar socialmente 
estigmatizadas pela reação dos vizinhos, escolas e companheiros. A criança muitas vezes também é vitimizada 
pelas conseqüências da separação familiar. Dificuldades materiais e sociais tra-
k zem problemas adicionais quando as pessoas que cometeram o abuso dei-"Xam a família nnjfão para a 
ppsãn_______________ ^
2) Traumatização secundária no processo interdisciplinar. As crianças que sofreram abuso sexual podem ficar 
perturbadas pela vitimização secundária quando são arrastadas para conflitos institucionais estruturais e 
conflitos-por-procuração nas redes profissionais (veja O processo interdisciplinar, 5.1). A traumatização 
secundária pelos conflitos institucionais estruturais acontece mais freqüentemente nos conflitos entre o sistema 
legal e as necessidades psicológicas e de proteção da criança. Isso baseia-se no fato de que o sistema legal ainda 
não se adaptou completamente ao aspecto dos direitos humanos da criança como um sujeito perante a lei, que 
não obstante é estruturalmente dependente do cuidado adulto. Conflitos-por-procura-ção nas redes profissionais 
ocorrem em todos os níveis e conduzem a respostas de ação não-terapêuticas, resultando em terapia 
antiterapêutica, proteção da criança promotora-de-abuso e prevenção de crime promotora-de-crime, que podem 
todas resultar em grave trauma secundário na criança. (Veja O processo interdisciplinar no contexto, 5.2.)
3) Traumatização secundária no processo família-profissional. No processo família-profissional, a traumatização 
secundária acontece como um resultado da escolha da intervenção profissional básica e através de mudanças da 
forma
24
Tilman Furniss
básica da intervenção pelas tamílias e membros da família. Os profissionais podem escolher uma Intervenção 
Punitiva Primária ou uma Intervenção Primária Protetora da Criança, em primeiro lugar, tanto quanto as famílias 
e membros da família podem conseguir influenciar a rede profissional de uma maneira que transforma uma 
Intervenção Terapêutica Primária em uma Intervenção Punitiva Primária ou em uma Intervenção Primária Pro-
tetora da Criança. Se, no processo interacional família-profissional, as famílias ou os profissionais impedem 
uma Intervenção Terapêutica Primária, um dano secundário semelhante pode ser infligido à criança em uma 
Intervenção Punitiva Primária ou em uma Intervenção Primária Protetora ^ Criança. (Veja Três tipos básicos de 
intervenção, 4.1.)
4) Traumatização secundária no processo familiar. A falta de crença na cr::", a negação por parte das pessoas 
que cometeram o abuso e dos menÉB família, em casos não comprovados de abuso sexual da crianç levar ao 
dano secundário na criança, o que também pode acor.
pais, irmãos e outros membros da família usarem a criança cc expiatório, castigando-a e acusando-a por todos os 
problemas como um resultado da,revelação.
5) Traumatização secundária no processo individual. As crianças que abuso sexual podem finalmente induzir 
traumatização secund' de seu próprio comportamento. Elas freqüentemente provocam punição ou novo abuso 
através de comportamento sexualizado ou ma que as torna mais vulneráveis e incapazes de se protegerem das 
qüências de sua própria comunicação sexualizada e mensagens de Esse processo pode facilmente conduzir à 
indução de ciclos inte' novos de vitimização secundária e abuso.
Profissionais altamente competentes muitas vezes intervêm no contexto erra* infligindo dano secundário 
quando intervêm prematuramente e fora do conte: Pais são presos apenas para serem libertados, sem se levar em 
consideração o efe promotor-de-crime de tal intervenção evitadora-de-crime. Crianças são removidas esmo, com 
resultados a longo prazo dessa proteção à criança promotora-de-abuso, quando finalmente retornam à família 
sem qualquer trabalho de proteção ou tratamento sendo realizado com

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