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MEDICINA LEGAL – LESOES CONCEITO : A Traumatologia ou Lesonologia Médico-legal estuda as lesões e estados patológicos, imediatos ou tardios, produzidos por violência sobre o corpo humano, nos seus aspectos do diagnóstico, do prognóstico e das suas implicações legais e socioeconômicas. Trata também do estudo das diversas modalidades de energias causadoras desses danos. A convivência no meio ambiental pode causar ao homem as mais variadas formas de lesões produzidas por diversos tipos de energias. Essas energias dividem-se em: energias de ordem mecânica energias de ordem física energias de ordem química energias de ordem físico-química energias de ordem bioquímica energias de ordem biodinâmica energias de ordem mista. ORDEM MECANICA Causadas por armas propriamente ditas (punhais, revólveres, soqueiras), armas eventuais (faca, navalha, foice, facão, machado), armas naturais (punhos, pés, dentes), até os mais diversos meios imagináveis (máquinas, animais, veículos, quedas, explosões, precipitações). Esses meios atuam por pressão, percussão, tração, torção, compressão, descompressão, explosão, deslizamento e contrachoque. De conformidade com as características que imprimem às lesões, os meios mecânicos classificam-se em: perfurantes (feridas puntiformes) cortantes ( feridas cortantes) contundentes ( feridas contusas) perfurocortantes ( feridas perfurocortantes) Perfurocontundentes( feridas perfurocontusas) Cortocontundentes. ( feridas cortocontusas) Lesões produzidas por ação perfurante As lesões causadas por meios ou instrumentos perfurantes, de aspecto pontiagudo, alongado e fino, e de diâmetro transverso reduzido, têm características bem próprias. Como exemplos mais comuns destes instrumentos apontam-se o estilete, a sovela, a agulha, o florete e o furador de gelo, os quais quase sempre atuam por percussão ou pressão, afastando as fibras do tecido e, muito raramente, seccionando-as. Têm como características a abertura estreita; são de raro sangramento, de pouca nocividade na superfície e, às vezes, de certa gravidade na profundidade, em face desse ou daquele órgão atingido; e, por fim, quase sempre de menor diâmetro que o do instrumento causador, graças à elasticidade e à retratilidade dos tecidos cutâneos. As lesões produzidas nos órgãos profundos assumem forma de acordo com sua estrutura fibrosa, cartilaginosa, óssea etc. Nos órgãos constituídos de várias túnicas, como, por exemplo, o estômago, as lesões são orientadas em sentidos diversos: a serosa se mostra com a solução de continuidade alongada; a túnica muscular tem o ferimento em direção às próprias fibras musculares; e, na mucosa, há uma terceira direção, distinta das outras. Em seu trajeto, os instrumentos perfurantes podem produzir ferimentos que terminam em fundo de saco, em uma cavidade, ou podem transfixar um segmento, redundando assim em dois orifícios: um de entrada e outro de saída, além de um trajeto. O orifício de entrada, como já se disse, tem formato de ponto, de reduzidas dimensões e pouco sangrante. O orifício de saída, quando existe, é muito parecido com o de entrada, apresentando, no entanto, suas bordas discretamente evertidas. O trajeto dependerá, no que diz respeito à sua profundidade, do tamanho do instrumento ou da pressão utilizada pelo agressor. No entanto, não se pode estabelecer o comprimento do meio perfurante pela profundidade de penetração. Além de nem sempre penetrar em toda a sua extensão, pode ainda variar essa profundidade com a posição da vítima. Pode acontecer de a profundidade de penetração ser maior que o próprio comprimento da arma quando esta, por exemplo, atinge uma região onde haja depressibilidade dos tecidos superficiais, como no ventre. Lacassagne chamou essas lesões de “feridas em acordeão”. Lesões produzidas por ação cortante Os meios ou instrumentos de ação cortante agem através de um gume mais ou menos afiado, por um mecanismo de deslizamento sobre os tecidos e, na maioria das vezes, em sentido linear. A navalha, a lâmina de barbear e o bisturi são exemplos de agentes produtores dessas ações. Se em determinada perícia encontram-se ferimentos produzidos por arma branca e outros provenientes de incisões cirúrgicas, temos de fazer a diferença entre eles. A ferida da incisão cirúrgica começa e termina a pique, em uma mesma profundidade que se estende de um extremo ao outro. Tem bordas bem regulares e excepcionalmente apresenta cauda de escoriação. Já as feridas cortantes têm suas extremidades mais superficiais e a parte mediana mais profunda, nem sempre se apresentando de forma regular. Tem como característica principal a chamada “cauda de escoriação”. São também conhecidas como feridas fusiformes (em forma de fuso). Essas feridas diferenciam-se das demais lesões pelas seguintes características: forma linear regularidade das bordas regularidade do fundo da lesão ausência de vestígios traumáticos em torno da ferida hemorragia quase sempre abundante predominância do comprimento sobre a profundidade afastamento das bordas da ferida presença de cauda de escoriação voltada para o lado onde terminou a ação do instrumento Há regularidade das bordas e do fundo da lesão. Nesses tipos de ferimentos, não há vestígios de outra ação traumática, em virtude da ação rápida e deslizante do instrumento e, ainda, pelo fio de gume, que não permite uma forma de pressão mais intensa sobre os tecidos lesados. Quase sempre a hemorragia é vultosa, devido à fácil secção dos vasos, que, não sofrendo hemostasia traumática, deixam seus orifícios naturalmente permeáveis. O início do ferimento é mais brusco e mais fundo: portanto, não pode apresentar-se em forma de cauda. Ao determinar-se cauda de escoriação, subentende-se que é a parte final da ação que provocou a lesão, caracterizada pelo traço escoriado superficial da epiderme. Esse elemento tem grande importância no diagnóstico da direção do ferimento, na diferença entre homicídio e suicídio, na forma de crime e na posição do agressor. O prognóstico desses ferimentos é, em geral, de pouca gravidade, a não ser que sejam eles profundos e venham a atingir vasos ou nervos, e até mesmo órgãos, como no esgorjamento, levando a vítima, em muitas ocasiões, à morte. Dentro do conjunto das lesões produzidas por ação cortante, existe o que se chama de esquartejamento, traduzido pelo ato de dividir o corpo em partes (quartos), por amputação ou desarticulação, quase sempre como modalidade de o autor livrar-se criminosamente do cadáver ou impedir sua identificação. A castração é também uma lesão produzida por ação cortante e tem na maioria das vezes a finalidade e o instinto de vingança. As feridas profundas da parede abdominal, conhecidas sob o rótulo de haraquiri, ainda que fortuitas, não se pode dizer que elas não ocorram, principalmente levando-se em conta as colônias japonesas entre nós. As lesões mais comuns nesses episódios são o amplo ferimento, as grandes hemorragias, as eventrações e as eviscerações. Essas feridas podem ainda ser produzidas como forma de estigmatizar a vítima, viva ou depois da morte, para enfeiá-la ou deixar a marca de seus executores ou de suas facções. Finalmente, neste contexto há ainda um tipo de lesão conhecida por esgorjamento e que se caracteriza por uma longa ferida transversal do pescoço, de significativa profundidade, lesando além dos planos cutâneos, vasculonervosos e musculares, órgãos mais internos como esôfago, laringe e traqueia. Sua etiologia pode ser homicida ou suicida. Nos casos de suicídio, quando o indivíduo é destro, o ferimento se dá da esquerda para a direita, sua localização é mais anterolateral esquerda e termina ligeiramente voltada para baixo. Sua profundidade é maior no início da lesão, pois no final da ação a vítima começa a perder asforças. Nos casos de homicídio, há características bem diversas que podem fazer a diferença com o suicídio. O autor desta ocorrência homicida sempre se coloca por trás da vítima, provocando um ferimento da esquerda para direita, em sentido horizontal, uniforme, terminando com a mesma profundidade do seu início, mas ligeiramente voltada para cima, atingindo algumas vezes a coluna vertebral, onde é comum ficar a marca do instrumento usado. Lesões produzidas por ação contundente Entre os agentes mecânicos, os instrumentos contundentes são os maiores causadores de dano. Sua ação é quase sempre produzida por um corpo de superfície, e suas lesões mais comuns se verificam externamente, embora possam repercutir na profundidade. Agem por pressão, explosão, deslizamento, percussão, compressão, descompressão, distensão, torção, fricção, por contragolpe ou de forma mista. São meios ou instrumentos geralmente com uma superfície plana, a qual atua sobre o corpo humano, produzindo as mais diversas modalidades de lesões. Essa superfície pode ser lisa, áspera, anfratuosa ou irregular. Geralmente esses meios são sólidos e, com maior frequência, líquidos ou gasosos. As lesões produzidas por essa forma de energia mecânica sofrem uma incrível variação. Entre elas, distinguem-se as variedades descritas a seguir. ▶ Rubefação. Não chega a ser uma lesão, sob o ponto de vista anatomopatológico, por não apresentar significativas e permanentes modificações de ordem estrutural, mas o é sob o ângulo da Medicina Legal. Qualquer alteração da normalidade individual de origem violenta interessa ao estudo e à análise técnico-pericial. A rubefação caracteriza-se pela congestão repentina e momentânea de uma região do corpo atingida pelo traumatismo, evidenciada por uma mancha avermelhada, efêmera e fugaz, que desaparece em alguns minutos, daí sua necessidade de averiguação exigir brevidade. A rubefação é a mais humilde e transitória de todas as lesões produzidas por ação contundente. ▶ Escoriação. Tem quase sempre como origem a ação tangencial dos meios contundentes. Pode ser encontrada isolada ou associada a outras modalidades de lesões contusas mais graves. Tem pouco significado clínico, mas assume um valor indiscutível na perícia médico-legal. Define-se, de forma mais simples, como o arrancamento da epiderme e o desnudamento da derme, de onde fluem serosidade e sangue. Escoriação típica é aquela em que apenas a epiderme sofre a ação da violência. Quando a derme é atingida, não é mais escoriação, e sim uma ferida. A escoriação não cicatriza, não deixa marcas. A regeneração da área lesada é por reepitelização. Nas escoriações produzidas post mortem, não há formação de crosta; a derme é branca e não sugila serosidade nem sangue de suas papilas. O leito da escoriação produzida depois da morte é seco, descorado e apergaminhado. ▶ Equimose. Trata-se de lesões que se traduzem por infiltração hemorrágica nas malhas dos tecidos. Para que ela se verifique, é necessária a presença de um plano mais resistente abaixo da região traumatizada e de ruptura capilar, permitindo, assim, o extravasamento sanguíneo. Em geral, são superficiais, mas podem surgir nas massas musculares, nas vísceras e no periósteo. Quando se apresenta em forma de pequenos grãos, recebe o nome de sugilação e, quando em forma de estrias, toma a denominação de víbice . E petéquias, pequenas equimoses, quase sempre agrupadas e caracterizadas por um pontilhado hemorrágico. As equimoses nem sempre surgem de imediato ou nos locais de traumatismo. Não é muito raro, nos traumatismos cranioencefálicos mais graves, surgirem tardiamente equimoses palpebrais, subconjuntivas, mastóideas, faríngeas e, com menos frequência, cervicais. Quando a equimose é produzida por objetos cilíndricos, como bastões, cassetetes, bengalas, deixa, em vez de uma marca, duas equimoses longas e paralelas, conhecidas por víbices, em virtude de o extravasamento do sangue verificar-se ao lado do traumatismo e não na sua linha de impacto. A tonalidade da equimose é outro aspecto de grande interesse médico-pericial. De início, é sempre avermelhada . Depois, com o correr do tempo, ela se apresenta vermelhoescura, violácea, azulada, esverdeada e, finalmente, amarelada, desaparecendo, em média, entre 15 e 20 dias. As equimoses profundas mais habituais são as petéquias pequeninas e arredondadas, vistas por transparência através das serosas das vísceras ou de certas regiões, como as equimoses subpleurais e subpericárdicas (sinal de Tardieu), ou no tecido subpalpebral, quando das asfixias mecânicas. Não confundir a hipóstase visceral com equimose. ▶ Edema. É o acúmulo de líquido no espaço intersticial e é constituído por uma solução aquosa de sais e proteínas do plasma, variando de acordo com sua etiologia. Quando aparece em determinado local e circunscrito a pequenos volumes chama-se de edema localizado. No estudo das lesões decorrentes da ação contundente interessa mais o chamado “edema por ação mecânica direta”, que tem como causas principais a torção, a percussão ou a pressão. Em muitos casos, o edema é agravado pela ação endógena da histamina. Hematoma. O maior extravasamento de sangue de um vaso bastante calibroso e a sua não difusão nas malhas dos tecidos moles dão, em consequência, um hematoma. Formam-se, no interior dos tecidos, verdadeiras cavidades, onde surge uma coleção sanguínea. Pela palpação da região afetada, percebe-se a sensação de flutuação. O hematoma, em geral, faz relevo na pele, tem delimitação mais ou menos nítida e é de absorção mais demorada que a equimose. Pode também ser profundo e encontrado nas cavidades ou dentro dos órgãos, e, por isso, é chamado de hematoma intraparenquimatoso. ▶ Bossa sanguínea. A bossa sanguínea diferencia-se do hematoma por apresentar-se sempre sobre um plano ósseo e pela sua saliência bem pronunciada na superfície cutânea. É muito comum nos traumatismos do couro cabeludo e é vulgarmente conhecida por “galo”. ▶ Ferida contusa. Trata-se de lesões abertas cuja ação contundente foi capaz de vencer a resistência e a elasticidade dos planos moles. São produzidas por compressão, pressão, percussão, arrastamento, explosão e tração. Como as feridas contusas são produzidas por meios ou instrumentos de superfície e não de gume, mais ou menos afiados, apresentam elas as seguintes características: forma estrelada, sinuosa ou retilínea bordas irregulares, escoriadas e equimosadas fundo irregular vertentes irregulares pontes de tecido íntegro ligando as vertentes retração das bordas da ferida pouco sangrantes integridade de vasos, nervos e tendões As vertentes são irregulares, pois o meio traumático, atingindo de maneira disforme e não alcançando ele próprio a profundidade, torna essas margens irregulares. Não é muito raro existirem, entre uma borda e outra da ferida, pontes de tecido íntegro constituídas principalmente de fibras elásticas da derme que distenderam durante a contusão, mas não chegaram a se romper. As feridas contusas são menos sangrantes que as cortantes, pois a compressão exercida pelo meio ou instrumento esmaga a luz dos vasos lesados, levando, por assim dizer, a uma hemostasia traumática. ▶ Fraturas. Decorrem dos mecanismos de compressão, flexão ou torção e caracterizam-se pela solução de continuidade dos ossos. São chamadas de diretas, quando se verificam no próprio local do traumatismo, e indiretas, quando provêm de violência em uma região mais ou menos distante do local fraturado. Estas últimas têm como exemplo o indivíduo que cai de uma certa altura em pé e fratura a base do crânio por contragolpe. No que diz respeito à orientação das fraturas, elas classificam-se em: transversais, longitudinais, oblíquas, espiraladas, em hélice, em passo de parafuso,em galho verde, em T e em Y. Na produção das fraturas, incidem os seguintes elementos: violência da ação do agente traumático, local onde se exerce a ação e causas predisponentes. Além das fraturas da calvária, há uma forma especial que deve ter a devida atenção da perícia: a fratura da base do crânio. De acordo com o mecanismo compressivo de ação, agindo com potência ou resistência, teremos a direção da linha da fratura: longitudinal – quando a incidência da força é anteroposterior; transversal – quando a incidência é laterolateral; circular – quando, por exemplo, em redor do buraco occipital, provocada por queda em que o indivíduo cai em pé, ajoelhado ou sentado, pelo impacto da coluna vertebral sobre o crânio. Ou, ainda, em volta da apófise crista galli, com o seu afundamento, nas quedas sobre o nariz ou o mento. ▶ Empalamento. Essa forma especial de encravamento caracteriza-se pela penetração de um objeto de grande eixo longitudinal, na maioria das vezes consistente e delgado, no ânus ou na região perineal. As lesões são sempre múltiplas e variadas, sua profundidade varia de acordo com o impacto e as dimensões do objeto contusivo. Lesões produzidas por ação perfurocortante As lesões perfurocortantes são provocadas por instrumentos de ponta e gume, atuando por um mecanismo misto: penetram perfurando com a ponta e cortam com a borda afiada os planos superficiais e profundos do corpo da vítima. Agem, portanto, por pressão e por secção. Há os de um só gume (faca- peixeira, canivete, espada), os de dois gumes (punhal, faca “vazada”) e os de três gumes ou triangulares (lima). O trajeto das feridas produzidas por esses instrumentos tem as características das resultantes da ação dos meios perfurantes. A perícia, diante dessas lesões, entre outros problemas, tem de levar em conta a identificação da arma usada, a gravidade dos ferimentos, o tempo da lesão, se esta foi produzida em vida ou depois da morte, sua causa jurídica, a posição da vítima e do agressor, a ordem das lesões e o número de agressores. A posição da vítima e a do agressor pode ser ressaltada pelo estudo da localização e da direção dos ferimentos. As feridas dorsais indicam, quase sempre, que a vítima estava de costas para o agressor. O trajeto, a profundidade e a cauda de escoriação voltada para esse ou aquele lado levam à conclusão da direção que tomou o instrumento, de cima para baixo ou de baixo para cima, se da direita para a esquerda ou vice-versa. Em geral, o agressor usa a arma de características perfurocortantes com o gume voltado para dentro ou para baixo. Lesões produzidas por ação perfurocontundente As feridas perfurocontusas são produzidas por um mecanismo de ação que perfura e contunde ao mesmo tempo. Na maioria das vezes, esses instrumentos são mais perfurantes que contundentes. Esses ferimentos são produzidos quase sempre por projéteis de arma de fogo; no entanto, podem estar representados por meios semelhantes, como, por exemplo, a ponta de um guarda-chuva. No estudo das lesões produzidas por projéteis de arma de fogo (balística dos efeitos), devem-se considerar o ferimento de entrada, o ferimento de saída e o trajeto. massa, largura, profundidade e inclinação dos ressaltos e cavados. Em forma de probabilidade, quando os projéteis comparados apresentem poucos microelementos coincidentes. E o resultado de certeza, quando existam elementos quantitativos e qualitativos que possam afirmar ou negar com convicção a identidade ou a não identidade da arma em questão. Na arma, outros exames podem ser realizados, como: determinação da precisão da pontaria, determinação da distância de um certo tiro, alteração das suas características originais, condições de funcionamento, ocorrência de tiro acidental e deformações anteriores, contemporâneas ou posteriores ao evento. Na munição, podem ser examinados os cartuchos em sua composição ou alteração de suas características originais, os estojos quanto ao tipo, marca e calibre e quanto às suas características originais. No projétil, para determinar seu tipo e calibre, número e orientação dos ressaltos e cavados, além das deformações acidentais, exame microscópico de comparação e outras consequências do impacto, em que se possa identificar o tipo de estrutura atingido. Nas espingardas, podem-se também examinar os chumbos dos cartuchos quanto à sua classificação e ao número de esferas; e o exame na bucha e nos discos divisórios dos cartuchos, a fim de identificar seu calibre e tipo de material utilizado na sua confecção. Por fim, podem-se examinar ainda a pólvora, quanto à sua origem e à sua composição e quanto ao formato de seus grãos, e também as espoletas dos cartuchos, podendo-se determinar o tipo de fabricante e a data de fabricação. Lesões No estudo das lesões produzidas por projéteis de arma de fogo (balística dos efeitos), devem-se considerar o ferimento de entrada, o ferimento de saída e o trajeto. Ferimento deentrada Pode ser resultante de tiro encostado, a curta distância ou a distância. ▶ Ferimentos de entrada nos tiros encostados. Estes ferimentos, com plano ósseo logo abaixo, têm forma irregular, denteada ou com entalhes, devido à ação resultante dos gases que descolam e dilaceram os tecidos. Isso ocorre porque os gases da explosão penetram no ferimento e refluem ao encontrar a resistência do plano ósseo. É muito comum nos tiros encostados na fronte e chama-se câmara de mina de Hof mann. A expressão melhor seria golpe de mina. Na redondeza do ferimento, nota-se crepitação gasosa da tela subcutânea proveniente da infiltração dos gases. Em geral, não há zona de tatuagem nem de esfumaçamento, pois todos os elementos da carga penetram pelo orifício da bala e, por isso, suas vertentes mostram-se enegrecidas e desgarradas, com aspecto de cratera de mina. Nos tiros dados no crânio, costelas e escápulas, principalmente quando a arma está sobre a pele, pode-se encontrar um halo fuliginoso na lâmina externa do osso referente ao orifício de entrada (sinal de Benassi ou de Benassi-Cueli. ▶ Ferimentos de entrada nos tiros a curta distância. Estes ferimentos podem mostrar: forma arredondada ou elíptica, orla de escoriação, bordas invertidas, halo de enxugo, halo ou zona de tatuagem, orla ou zona de esfumaçamento, zona de queimadura, aréola equimótica e zona de compressão de gases. Diz-se que um tiro é a curta distância quando, desferido contra um alvo, além da lesão de entrada produzida pelo impacto do projétil (efeito primário) são encontradas manifestações provocadas pela ação dos resíduos de combustão ou semicombustão da pólvora e das partículas sólidas do próprio projétil expelido pelo cano da arma (efeitos secundários). A forma dos ferimentos de entrada em tiros a curta distância é geralmente arredondada ou elíptica, dependendo da incidência do projétil. Quanto maior a inclinação do tiro sobre o alvo, maior será o eixo longitudinal do ferimento. O ferimento de entrada, quando produzido por projéteis de alta energia, é sempre maior que o diâmetro destes. ▶ Ferimentos de entrada nos tiros a distância. Os ferimentos de entrada de bala, nos tiros a distância, têm as seguintes características: diâmetro menor que o do projétil, forma arredondada ou elíptica, orla de escoriação, halo de enxugo, aréola equimótica e bordas reviradas para dentro.Diz-se que uma lesão tem as características das produzidas por tiro a distância quando ela não apresenta os efeitos secundários do tiro, e por isso não se pode padronizar essa ou aquela distância. Nesses tipos de lesões, quando o tiro é dado em perpendicular, o diâmetro da ferida é quase sempre menor que o do projétil, explicado pela elasticidade e retratilidade dos tecidos cutâneos. Essa diferença será mais acentuada quanto maior for a elasticidade dos tecidos da região atingida, mais pontiagudafor a ogiva do projétil e maior for a sua velocidade. Por outro lado, quando o projétil se mostra com deformações do tipo acidental, tanto pela alteração da velocidade como pelas modificações de seu formato cilindro- cônico, as dimensões do ferimento tendem a aumentar. No entanto, os projéteis de alta energia, pela capacidade de poderem girar 90° sobre si mesmos, são capazes, por isso, de provocarem um orifício de entrada muito maior que o seu diâmetro, chegando até ao seu comprimento total. Trajeto É o caminho percorrido pelo projétil no interior do corpo. Quando o ferimento é transfixante, seria teoricamente traçado por uma linha reta, ligando a ferida de entrada à da saída. Pode terminar em fundo cego ou perder-se dentro de uma cavidade. Alguns usam a expressão trajetória para todo o percurso do projétil, desde a sua saída da boca do cano até o local de sua parada final. A luz do canal formado pelo trajeto sempre apresenta sangue coagulado – sinal valioso de reação vital; tecidos lacerados, desorganizados e infiltrados por sangue; corpos estranhos provenientes de outras regiões, como esquírolas ósseas. Para rastrear um projétil, basta seguir a infiltração de sangue. Não é raro o projétil desviar-se por encontrar um órgão móvel. Uma bala que entre no coração, seu movimento poderá dar a esse projétil o destino mais desconcertante possível. Não se diga que é absurdo uma bala penetrar no coração e ser levada pela corrente circulatória até a bifurcação das artérias ilíacas. Finalmente, jamais deve esquecer o perito que esses projéteis, ao serem encontrados, não podem ser retirados com ajuda de instrumental metálico, a fim de não lhes causar qualquer alteração que possa falsear um resultado no exame de balística. Usar sempre as mãos para retirar o projétil e, mesmo que sua retirada seja dificultada, por exemplo, pelo encravamento em uma estrutura óssea, ainda assim deve ser libertado por manobras que não venham a atingi-lo. Lesões produzidas por ação cortocontundente São ferimentos produzidos por instrumentos que, mesmo sendo portadores de gume, são influenciados pela ação contundente, quer pelo seu próprio peso, quer pela força ativa de quem os maneja. Sua ação tanto se faz pelo deslizamento, pela percussão, como pela pressão. São exemplos desse tipo de instrumento: a foice, o facão, o machado, a enxada, a guilhotina, a serra elétrica, as rodas de um trem, a tesoura, as unhas e os dentes. As lesões verificadas por essa forma de energia são chamadas cortocontusas. Têm forma bem variável, dependendo da região atingida e da inclinação, do peso, do gume e da força viva que atua. Sendo o instrumento mais afiado, predominam as características dos ferimentos cortantes. Quando o fio de corte não for vivo, prevalecem os caracteres de contusão nos tecidos. São lesões quase sempre graves, fundas, alcançando mais profundamente os planos interiores e determinando as mais variadas formas de ferimentos, inclusive fraturas. Não apresentam cauda de escoriação nem pontes de tecidos íntegros entre as vertentes da ferida, o que as diferencia das feridas cortantes e contusas, respectivamente. Pode-se incluir dentro do conjunto destas lesões um quadro representado pela redução do corpo a fragmentos diversos e irregulares, mais comuns nas mortes por acidentes ferroviários, denominado espostejamento . Esta ocorrência, no entanto, pode ser usada como forma de dissimular uma morte por homicídio, quando o cadáver é colocado na via férrea para confundir com suicídio ou acidente, mas que a perícia tem condições de evidenciar as características vitais dos ferimentos, a verdadeira causa da morte e outros achados que possam desqualificar aqueles intentos. A tesoura, quando utilizada de forma convencional, é um instrumento de ação cortocontundente. No entanto, quando é usada de modo agressivo, produz lesões cutâneas de entrada de acordo com a disposição de suas lâminas. Quando introduzida com as lâminas fechadas produz uma ferida única, de forma ovalar, semelhante às produzidas por instrumentos perfurantes de médio calibre. Quando produzida com as lâminas abertas produz quase sempre duas feridas. As extremidades proximais das feridas, correspondentes às produzidas pelas bordas cortantes da tesoura, têm formato de ângulo agudo e podem apresentar pequenas caudas de escoriação, e as extremidades distais têm ângulos arredondados. Mordeduras Um exemplo bem peculiar dessas lesões cortocontundentes, que se apresentam com características próprias, é a mordedura ou dentada, produzida pelo homem ou por animais, que são sempre pesquisadas na pele humana, em alimentos e em objetos. Tem por ação uma forma de mecanismo que atua por pressão e secção, principalmente quando provocada pelos dentes incisivos. O mesmo se diga dos animais herbívoros, cujas peças dentárias anteriores se assemelham aos incisivos humanos. Por outro lado, os dentes dos animais carnívoros são mais perfurantes. Dessa forma, as marcas de mordidas produzidas por mordeduras de pouca violência se apresentam em forma de equimoses e escoriações. As produzidas com maior violência são representadas por feridas, lacerações e em algumas oportunidades acompanhadas de arrancamento de tecidos, muitas delas mutilantes, como na orelha, nariz ou papila mamilar Podem-se dividir essas lesões em quatro graus: 1 o grau: equimoses e escoriações representadas por mossas superficiais, com reais possibilidades de identificar as arcadas do agressor; 2 o grau: equimoses e escoriações mais nítidas e profundas, prestando-se melhor à identificação do seu autor; 3 o grau: feridas contusas comprometendo a pele e a tela subcutânea e a musculatura, porém sem avulsões de tecidos; 4 o grau: lacerações com perda razoável de tecidos e possíveis alterações estéticas (orelhas, nariz e lábios), que, na sua maioria das vezes, não permitem uma identificação com os dentes do autor da dentada.
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