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04- Instrumento de intervenção e Benzodiazepínicos

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Daniel V. Rodrigues-M33
1. Definir o papel da APS (Atenção Primária de Saúde) no seguimento de longo prazo e reabilitação psicossocial.
Definida pela Organização Panamericana de Saúde (OPAS) como elemento fundamental na construção de modelos de assistência mais equânimes e eficazes, a Atenção Primária à Saúde (APS) – representada pelas Unidades Básicas de Saúde (UBS), Núcleos de Apoio a Saúde da Família, Consultórios de Rua, Centros de Convivência e Cultura, entre outros – configura não só uma porta de entrada no sistema, mas um espaço privilegiado para o acolhimento da pessoa em sofrimento e para a construção de vínculo longitudinal, ambas diretrizes estabelecidas pela Política Nacional de Humanização (2003). 
A APS tem como um de seus atributos caracterizar-se como a porta de entrada preferencial do SUS, formando um conjunto de ações de saúde, no âmbito individual, familiar e coletivo, que abrange promoção e proteção da saúde, prevenção de agravos, diagnóstico, tratamento, reabilitação, redução de danos, cuidados paliativos, vigilância em saúde e a manutenção da saúde com o objetivo de desenvolver uma atenção integral que impacte na situação de saúde e autonomia das pessoas e nos determinantes e condicionantes de saúde das coletividades, possibilitando o primeiro acesso das pessoas ao cuidado, inclusive daquelas que demandam um cuidado em saúde mental.
Um olhar às diretrizes na APS definidas na Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) já esclarece muito sobre o trabalho realizado neste componente. A PNAB elenca e define as seguintes diretrizes:
· Regionalização e Hierarquização: Considera-se regiões de saúde como um recorte espacial estratégico para fins de planejamento, organização e gestão de redes de ações e serviços de saúde em determinada localidade, e a hierarquização como forma de organização de pontos de atenção da Rede de Atenção à Saúde (RAS) entre si, com fluxos e referências estabelecidos.
· Territorialização: Considera-se Território a unidade geográfica única, de construção descentralizada do SUS na execução das ações estratégicas destinadas à vigilância, promoção, prevenção, proteção e recuperação da saúde. Os Territórios são destinados para dinamizar a ação em saúde pública, o estudo social, econômico, epidemiológico, assistencial, cultural e identitário, possibilitando uma ampla visão de cada unidade geográfica e subsidiando a atuação na Atenção Básica, de forma que atendam a necessidade da população adscrita e ou as populações específicas.
· População adscrita: População que está presente no território da UBS, de forma a estimular o desenvolvimento de relações de vínculo e responsabilização entre as equipes e a população, garantindo a continuidade das ações de saúde e a longitudinalidade do cuidado e com o objetivo de ser referência para o seu cuidado.
· Cuidado centrado na pessoa: Aponta para o desenvolvimento de ações de cuidado de forma singularizada, que auxilie as pessoas a desenvolverem os conhecimentos, aptidões, competências e a confiança necessária para gerir e tomar decisões embasadas sobre sua própria saúde e seu cuidado de saúde de forma mais efetiva. O cuidado é construído com as pessoas, de acordo com suas necessidades e potencialidades na busca de uma vida independente e plena. A família, a comunidade e outras formas de coletividade são elementos relevantes, muitas vezes condicionantes ou determinantes na vida das pessoas e, por consequência, no cuidado.
· Resolutividade: Reforça a importância da Atenção Básica ser resolutiva, utilizando e articulando diferentes tecnologias de cuidado individual e coletivo, por meio de uma clínica ampliada capaz de construir vínculos positivos e intervenções clínica e sanitariamente efetivas, centrada na pessoa, na perspectiva de ampliação dos graus de autonomia dos indivíduos e grupos sociais. Deve ser capaz de resolver a grande maioria dos problemas de saúde da população, coordenando o cuidado do usuário em outros pontos da RAS, quando necessário.
· Longitudinalidade do cuidado: Pressupõe a continuidade da relação de cuidado, com construção de vínculo e responsabilização entre profissionais e usuários ao longo do tempo e de modo permanente e consistente, acompanhando os efeitos das intervenções em saúde e de outros elementos na vida das pessoas, evitando a perda de referências e diminuindo os riscos de iatrogenia que são decorrentes do desconhecimento das histórias de vida e da falta de coordenação do cuidado.
· Coordenação do cuidado: Coordenar o cuidado implica elaborar, acompanhar e organizar o fluxo dos usuários entre os pontos de atenção das RAS. Atuando como o centro de comunicação entre os diversos pontos de atenção, responsabilizando-se pelo cuidado dos usuários em qualquer destes pontos através de uma relação horizontal, contínua e integrada, com objetivo de produzir a gestão compartilhada da atenção integral. Articulando também as outras estruturas das redes de saúde e intersetoriais, públicas, comunitárias e sociais.
· Ordenação da rede: Reconhecimento das necessidades de saúde da população sob sua responsabilidade, organizando as necessidades desta população em relação aos outros pontos de atenção à saúde, contribuindo para que o planejamento das ações, assim como, a programação dos serviços de saúde, parta das necessidades de saúde das pessoas.
· Participação da comunidade: estimular a participação das pessoas, a orientação comunitária das ações de saúde na Atenção Básica e a competência cultural no cuidado, como forma de ampliar sua autonomia e capacidade na construção do cuidado à sua saúde e das pessoas e coletividades do território. Considerando ainda o enfrentamento dos determinantes e condicionantes de saúde, através de articulação e integração das ações intersetoriais na organização e orientação dos serviços de saúde, a partir de lógicas mais centradas nas pessoas e no exercício do controle social.
As demandas em saúde mental são muito comuns na atenção primária. Uma investigação conduzida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) na década de 1990, confirmou uma alta prevalência dos chamados Transtornos Mentais Comuns – quadros diferentes dos comumente atendidos em ambulatórios especializados – no nível primário
Considerando a posição estratégica que a APS ocupa em um modelo de atenção à saúde que organiza seus serviços a partir do território em que eles se inserem, adaptando os serviços às necessidades da população, e não o contrário; o nível primário é fundamental no planejamento de ações em saúde mental eficazes e humanizadas, que estejam de acordo com os princípios do SUS e da Reforma Psiquiátrica, tendo sempre a desinstitucionalização e a autonomia do usuário como horizonte na construção de um modelo de assistência que compreenda os fenômenos de saúde e adoecimento como determinados por múltiplos fatores e por múltiplos agentes.
O acolhimento, nesse sentido, não corresponde somente a uma etapa inicial do atendimento, mas deve estar presente ao longo de todo o processo de atenção à saúde. Isso implica que a Atenção Primária se responsabilize pelo acompanhamento contínuo dos usuários e suas demandas, mesmo que se verifique a necessidade de encaminhamento. Ou seja, a existência da atenção primária não substitui os serviços de atenção secundária ou terciária; pelo contrário, entende-se que deve haver uma boa articulação entre todas as instâncias da rede a fim de efetivar o cuidado integral. Contudo, o referenciamento do usuário para um serviço especializado, como o Centro de Atenção Psicossocial, não deve resultar na perda de vínculo com a APS, com o território e com a comunidade.
Nos quadros psicóticos estáveis, mesmo em regiões com recursos suficientes, os generalistas podem compartilhar o cuidado do transtorno mental com o psiquiatra, diminuindo o número necessário de visitas ao psiquiatra. Na realidade atual do SUS, é grande o número de pacientes portadores de psicoses crônicas que são acompanhados quase que exclusivamente por generalistas.
O problema é que muitos se limitam ao fornecimento de medicação.Para ir, além disso, também é necessário apoio próximo de profissionais de Saúde Mental. Um pacote mínimo de cuidado na Atenção Básica deve incluir intervenções psicoeducacionais simples e, principalmente, a intermediação de ações intersetoriais. Essas visam aumentar a capacidade das pessoas que sofrem com transtornos mentais graves e persistentes de exercitarem sua cidadania.
Ou seja, estudar, trabalhar, ganhar dinheiro, fazer amigos, namorar, frequentar espaços públicos, participar das decisões que influenciam em sua vida. Essas são ações que dependem de inserção no território, e é por isso que a Atenção Básica tem tanto a contribuir e aprender com o trabalho dos Caps. 
O componente Reabilitação Psicossocial é composto por iniciativas de geração de trabalho e renda / empreendimentos solidários / cooperativas sociais. As ações de caráter intersetorial destinadas à reabilitação psicossocial devem ocorrer por meio de inclusão produtiva, formação e qualificação para o trabalho em iniciativas de geração de trabalho e renda / empreendimentos solidários / cooperativas sociais, articuladas sistematicamente as redes de saúde e de economia solidária com os recursos disponíveis no território para garantir a melhoria das condições concretas de vida, ampliação da autonomia, contratualidade e inclusão social de usuários da rede e seus familiares.
Além disso, há que prover cuidado para as comorbidades clínicas frequentes nessa população, um aspecto frequentemente negligenciado. Por sofrer em razão da esquizofrenia e da reação de exclusão social em sua comunidade, muitas pessoas parecem que perdem o direito aos cuidados de saúde integral. Hipertensão e diabetes, por exemplo, podem inclusive ser agravados por algumas das medicações mais usadas no tratamento das psicoses.
2. Conhecer os Instrumentos de intervenção psicossocial: ação terapêutica do vínculo, terapia interpessoal, terapia de reatribuição, terapia de solução de problemas, terapia focada em solução, grupos de apoio psicossocial e terapia comunitária.
a) Ação terapêutica do vínculo
Na abordagem dos pacientes com sofrimento emocional/transtorno mental na atenção primária, não há mais dúvida de que os profissionais podem e devem atuar nesse nível de atenção, exercendo algum grau de cuidado. Via de regra, desde o primeiro contato com o paciente os profissionais não sabem que podem ser terapêuticos e ignoram o poder terapêutico do vínculo. Na atenção primária, a facilidade de acesso aos profissionais de saúde e o cuidado longitudinal no decorrer do tempo fazem desse nível de cuidado um ótimo local para estreitamento do vínculo com o paciente
A ação terapêutica decorrente de vínculos de cuidado bem-estruturados sustenta-se em quatro pilares que permitem, de forma específica, a ação das diferentes técnicas psicoterápicas. Esses pilares são mecanismos presentes em qualquer relação terapêutica, podendo ser instrumentalizados por todos os profissionais de saúde.
Pilares da ação terapêutica do vínculo 
· O acolhimento – estabelece o vínculo e permite o cuidado. 
· A escuta – permite o desabafo (denominado catarse em termos psicológicos) e cria espaços para o paciente refletir sobre seu sofrimento e suas causas. 
· O suporte – representa continente para os sentimentos envolvidos, reforçando a segurança daquele que sofre, empoderando-o na busca de soluções para seus problemas.
· O esclarecimento – desfaz fantasias e aumenta informação, reduzindo a ansiedade e a depressão. Facilita a reflexão e permite uma reestruturação do pensamento com repercussões nos sintomas emocionais e até mesmo físicos.
b) Terapia interpessoal
A TIP baseia-se num modelo biopsicossocial para a compreensão do sofrimento emocional. O funcionamento do indivíduo é produto da interação de seu temperamento, sua personalidade e suas características de apego e vínculo estruturados na biologia e na genética, agindo conjuntamente na interação com o meio sociofamiliar e cultural. O objetivo da TIP é diminuir os sintomas psíquicos que interferem na socialização da pessoa, reestruturando o funcionamento interpessoal por meio do trabalho em focos determinados nos primeiros encontros da terapia.
Atualmente, a terapia interpessoal breve vem sendo aplicada para casos de depressão em todas as faixas etárias, transtorno bipolar, transtornos alimentares, transtornos de estresse pós-traumático.
Fases da terapia interpessoal 
1. Fase inicial – um ou dois encontros para levantar a história do sofrimento psíquico/emocional, realizar um inventário interpessoal, fazer uma psicoeducação e determinar o foco da intervenção.
2. Fase intermediária – cinco a oito encontros em que o indivíduo e o profissional mantêm foco na área interpessoal e nos quais se detectam problemas com a finalidade de melhorar o funcionamento interpessoal que desencadeia ou mantém o sofrimento. 
3. Fase final – um ou dois encontros destinados ao término da intervenção, em que é feito um levantamento dos progressos e mudanças ocorridos. É um momento de consolidação de ganhos, em que se discutem estratégias e cuidados de prevenção contra problemas futuros.
Os focos da terapia interpessoal breve são determinados junto ao indivíduo e encontram-se em quatro áreas de problemas interpessoais: luto: associado a perdas; disputas interpessoais: acentuam as dificuldades em desenvolver vínculos de confiança; transição de papéis: envolvem situações de mudança que podem ter sido ocasionadas por situações de rompimento dos papéis após um trauma; sensibilidade interpessoal: os sintomas intrusivos ou de evitação rompem o funcionamento interpessoal, levam a interações problemáticas ligadas a uma vulnerabilidade interpessoal anterior ao adoecimento.
c) Terapia de reatribuição
A reatribuição refere-se a um processo de abordagem de pacientes com sofrimento emocional/transtornos psíquicos que buscam cuidados na atenção primária, geralmente com sintomas físicos sem explicação médica. Essas queixas, apresentadas muito frequentemente, acabam por representar uma barreira para o cuidado adequado ao sofrimento emocional. Reatribuir, ou seja, construir uma conexão entre as queixas somáticas e o sofrimento psíquico é o primeiro passo para que os tratamentos psicossociais na atenção primária ou o encaminhamento para terapias especializadas sejam aceitos pelos pacientes. Uma vez que o processo seja realizado e o paciente entenda a conexão entre suas queixas físicas e seu sofrimento emocional, a abordagem, a elaboração e a resolução de seus problemas psicossociais se tornam o objetivo de seu tratamento, em vez das queixas físicas sem explicação.
Etapas da terapia de reatribuição
1. Sentindo-se compreendido – fazer anamnese ampliada e exame físico focado na queixa, com valorização das crenças da pessoa. 
2. Ampliando a agenda – dar feedback à pessoa, com recodificação dos sintomas e vinculação destes com eventos vitais e/ou psicológicos. 
3. Fazendo o vínculo – construir modelos explicativos que façam sentido para a pessoa. 
4. Negociando o tratamento – pactuar, em conjunto com a pessoa, um projeto terapêutico ampliado.
d) Terapia de solução de problemas 
É uma técnica psicoterápica do grupo das terapias cognitivas-comportamentais para estresse da vida cotidiana, tendo sido testada com médicos e enfermeiros.
Busca atingir diretamente os fatores relacionados ao sofrimento psíquico e é um ótimo recurso para aplicar na atenção primária devido aos seguintes fatores: independência da capacidade de resolução de problemas com a inteligência; forte associação entre adoecimento mental e conflitos vividos pelos indivíduos na atenção primária. A terapia de solução de problemas tem como objetivos principais: ajudar o paciente a identificar problemas ou conflitos como uma causa de sofrimento emocional; ensiná-lo a reconhecer os recursos que possui para resolver as suas dificuldades, aumentando a sensação de controle com as circunstâncias negativas; e, por último, ensinar às pessoas um método para apoiá-las na resolução de problemas futuros.
É uma terapia indicada para as seguintes situaçõesassociadas a transtornos mentais comuns: perda real ou temida (propriedade, status, relacionamentos etc.); adoecimento físico; dificuldades nas relações conjugais ou interpessoais; problemas de trabalho ou estudo; adaptação às situações de transtorno mental ou problema psicológico.
Devem ser excluídos da terapia de solução de problemas os pacientes portadores de transtornos psiquiátricos graves (esquizofrenia, abuso de substâncias ou transtornos de personalidade).
Etapas da metodologia de terapia de solução de problemas 
1. Identificar a necessidade de aplicabilidade 
2. Explicar o tratamento 
3. Listar e eleger problemas 
4. Pensar em metas alcançáveis 
5. Gerar soluções 
6. Eleger uma solução. 
7. Colocar solução em prática 
8. Avaliar e repetir o ciclo 
e) Terapia focada em soluções 
A terapia focada na solução (TFS) é um tipo de terapia breve que propõe não ser necessário entender um problema para resolvê-lo. Estabelecendo metas concretas, terapeuta e cliente buscam exceções ao problema, forças e recursos que ajudem o cliente a construir uma vida mais satisfatória para si mesmo. Essa terapia tem como chave central a utilização dos recursos trazidos pelo próprio cliente para responder às suas necessidades e atingir seus objetivos de uma forma que possa chegar a ter uma vida satisfatória para si mesmo tão rápido quanto possível. É interessante observar que, nesse processo, refere-se sempre a uma solução, em vez de a solução: não se pressupõe que seja a única ou a melhor a trata-se apenas de uma que se ajusta (fits) à construção da queixa naquele momento. 
f) Grupos de apoio psicossocial
Intervenção psicossocial normalmente envolve as modalidades individual, em grupo e familiar. 
O processo grupal, desde que bem pensado em sua finalidade, estrutura e manejo, permite uma poderosa e rica troca de experiências e transformações subjetivas que não seria alcançável em um atendimento de tipo individualizado. Isto se deve exatamente à pluralidade de seus integrantes, à diversidade de trocas de conhecimentos e possíveis identificações que apenas um grupo torna possível. Os grupos na Atenção Básica costumam ser orientados pelas ações programáticas, modelo hegemônico de organização da ESF, centrado nos grupos prioritários de doenças/ agravos: grupo para pessoas com diabetes, hipertensão; atividade física; planejamento familiar; grupos de adesão medicamentosa, entre outros. Os objetivos são de gerar impactos nos indicadores na perspectiva da educação em saúde, comumente baseada num paradigma de transmissão do saber-fazer profissional.
As propostas do grupo em saúde, partindo do reconhecimento da experiência do outro, seus territórios existenciais transversalizados por vetores sociais, culturais, políticos e outros, possibilitam a formação de um grupo-sujeito, no qual o sujeito é agente coletivo dos enunciados, pois “esforça-se para ter um controle sobre sua conduta” (GUATARRI, 1985). A direção do trabalho seria que o grupo se entendesse como permeável a outras possibilidades de discurso e encontros, articulando-se com um conjunto de discurso histórico produzido na família, escola, igreja, hospitais, centros de saúde. O grupo será uma oferta do serviço e mais um ponto da rede social de cuidado aos usuários no território de referência. A verdade do profissional em saúde deve estar em articulação com as várias verdade do território, coletivos, indivíduos. A perspectiva de grupos, desse modo, deve estar pautada em uma flutuação entre o normativo e o criativo e não somente no caráter normativo que vem tendo especial importância na conformação dessa oferta pelas equipes de Atenção Básica.
O grupo deve ser proposto de tal modo a permitir que seus integrantes tenham voz, espaço e corpos presentes; se sintam verdadeiramente como integrantes ativos de um grupo. Não há participação verdadeiramente ativa em um grupo sem que os sujeitos que se colocam tenham condição de ser ouvidos em suas demandas, para depois poder ouvir e colaborar com a demanda alheia e proposta geral; constituindo, somente a partir daí, um verdadeiro sentimento de pertencimento grupal.
g) Terapia comunitária
A Terapia Comunitária (TC) caracteriza-se como mais uma ferramenta à disposição dos profissionais da Atenção Básica no campo da Saúde Mental a ser utilizada no território de atuação. A atividade organiza-se como um espaço comunitário que possibilita a troca de experiências e de sabedorias de vida. A TC visa trabalhar de forma horizontal e circular ao propor que cada um que participe da sessão seja corresponsável no processo terapêutico que se realiza naquele momento e que produz efeitos tanto grupais quanto singulares. Para a realização da TC, um ou dois terapeutas comunitários com formação e um recinto que permita a realização da roda de conversa são suficientes. Qualquer pessoa que tenha interesse pode participar da TC: usuários portadores ou não de sofrimento e/ou patologia psíquica e/ou orgânica. O espaço é aberto e, para cada encontro, forma-se um grupo que dará conta da sessão do dia. A partir da apresentação das pessoas, exposição das regras da TC e da escolha do tema do dia, as pessoas relatam suas histórias pessoais e o grupo participa da discussão com perguntas e falas que objetivem a superação das dificuldades do dia a dia – tudo em um clima acolhedor e de empatia. O compartilhamento de vida produz a relação entre os sujeitos, que podem se reconhecer como uma rede de apoio.
Objetivos
· Fortalecer o processo psíquico de cada um ao favorecer o reconhecimento de seus valores e suas potencialidades. Objetiva-se a promoção de autonomia e independência dos sujeitos.
· Valorizar autoestima do indivíduo e do coletivo.
· Reforçar o papel da família e da comunidade – da rede de relações que envolve os sujeitos.
· Reafirmar as práticas culturais como fomentadoras do exercício da união na família e comunidade.
· Favorecer a identificação dos sujeitos envolvidos com os valores culturais compartilhados na comunidade, proporcionando melhor comunicação entre as formas de saber popular e científico.
Etapas da terapia comunitária 1. Acolhimento – momento de apresentação individual e das cinco regras. 2. Escolha do tema – as pessoas apresentam as questões e os temas sobre os quais querem falar. Vota-se o tema a ser abordado no dia. 3. Contextualização – momento em que o participante, com o tema escolhido, conta sua história. O grupo faz perguntas. 4. Problematização – o mote (questão chave para reflexão) do dia, relacionado ao tema, é jogado para o grupo. 5. Rituais de agregação e conotação positiva – com o grupo unido, cada integrante verbaliza o que mais o tocou em relação às histórias contadas 6. Avaliação – feita entre os terapeutas comunitários.
3. Caracterizar a Estrutura de atendimento da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS)
A rede de atenção psicossocial (RAPS) foi criada para dar mais potência ao cuidado de pessoas com transtornos mentais no país, passando a incluir diversas modalidades de serviços de atenção à saúde, como unidades básicas de saúde, centros de convivência (CeCCOS), centros de atenção psicossocial (CAPS), serviços de urgência e emergência, unidade de pronto atendimento 24 horas, residências terapêuticas e enfermarias especializadas em hospitais gerais.
A Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) estabelece os pontos de atenção para o atendimento de pessoas com problemas mentais, incluindo os efeitos nocivos do uso de crack, álcool e outras drogas. A Rede integra o Sistema Único de Saúde (SUS). A Rede é composta por serviços e equipamentos variados, tais como: os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS); os Serviços Residenciais Terapêuticos (SRT); os Centros de Convivência e Cultura, as Unidade de Acolhimento (UAs), e os leitos de atenção integral (em Hospitais Gerais, nos CAPS III).
A RAPS tem como objetivos gerais:
· Ampliar o acesso à atenção psicossocial da população em geral;
· Promover a vinculação das pessoas com transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas e de suas famílias aos pontosde atenção; e
· Garantir a articulação e a integração dos pontos de atenção das redes de saúde no território, qualificando o cuidado por meio do acolhimento, do acompanhamento contínuo e da atenção às urgências.
Além disso, destacam-se os seguintes objetivos específicos:
a) Promover cuidados em saúde especialmente a grupos mais vulneráveis (crianças, adolescentes, jovens, pessoas em situação de rua e populações indígenas);
b) Prevenir o consumo e a dependência de álcool e outras drogas e reduzir os danos provocados pelo consumo;
c) Promover a reabilitação e a reinserção das pessoas com transtorno mentais e com necessidades decorrentes do uso de álcool e outras drogas por meio do acesso ao trabalho, à renda e à moradia solidária;
d) Produzir e ofertar informações sobre os direitos das pessoas, as medidas de prevenção e cuidado e os serviços disponíveis na rede;
e) Regular e organizar as demandas e os fluxos assistenciais da Rede de Atenção Psicossocial;
f) Monitorar e avaliar a qualidade dos serviços mediante indicadores de efetividade e resolutividade da atenção.
4. Compreender a ação, indicação, meia vida, e efeito colaterais dos os benzodiazepínicos
a) Mecanismo de ação
Os alvos para as ações dos benzodiazepínicos são os receptores do ácido γ-aminobutírico tipo A GABAA. (Nota: o GABA é o principal neurotransmissor inibitório no sistema nervoso central [SNC].) Os receptores do GABAA são compostos de uma combinação, no somatório de cinco subunidades α, β e γ inseridas na membrana pós-sináptica. 
Tem como ação: 1. Redução da ansiedade: Em doses baixas, os benzodiazepínicos são ansiolíticos. A redução da ansiedade é atribuída à potenciação seletiva da transmissão gabaérgica em neurônios que têm a subunidade α2 em seus receptores GABAA, inibindo, assim, os circuitos neuronais no sistema límbico do cérebro. 2. Efeito hipnótico/sedativo: Todos os benzodiazepínicos têm propriedades sedativa e calmante, e alguns podem produzir hipnose (sono produzido “artificialmente”) em doses mais elevadas. O efeito hipnótico é mediado pelos receptores α1-GABAA. 3. Amnésia anterógrada: A perda temporária da memória com o uso de benzodiazepínicos também é mediada pelos receptores α1-GABAA. A capacidade de aprender e formar novas memórias também é reduzida. 4. Efeito anticonvulsivante: Vários benzodiazepínicos têm atividade anticonvulsivante. Esse efeito é parcialmente mediado pelos receptores α1-GABAA. 5. Relaxamento muscular: Em doses elevadas, os benzodiazepínicos diminuem a espasticidade do músculo esquelético, provavelmente aumentando a inibição pré-sináptica na medula espinal, onde predominam os receptores α2-GABAA. 
b) Indicação/Uso terapêutico 
I. Distúrbios de ansiedade: Os benzodiazepínicos são eficazes no tratamento dos sintomas da ansiedade secundária ao transtorno de pânico, do transtorno de ansiedade generalizada (TAG), do transtorno de ansiedade social e por performance, do transtorno de estresse pós-traumático, do transtorno obsessivo-compulsivo e da ansiedade extrema encontrada, às vezes, em fobias específicas, como o medo de voar. Os benzodiazepínicos também são úteis no tratamento da ansiedade relacionada com depressão e esquizofrenia. 
II. Distúrbios do sono: Poucos benzodiazepínicos são úteis como hipnóticos. Eles diminuem a latência para dormir e aumentam o estágio II do sono não REM (sem movimentos rápidos dos olhos). O sono REM e o sono de ondas lentas são diminuídos. No tratamento da insônia, é importante o equilíbrio entre o efeito sedativo necessário na hora de deitar e a sedação residual (“ressaca”) após o despertar. 
III. Amnésia: Em geral, os fármacos de ação curta são empregados como pré-medicação para procedimentos desconfortáveis e que provocam ansiedade, como endoscopias e procedimentos odontológicos e angioplastia. Eles causam uma forma de sedação consciente, permitindo ao paciente atender certas instruções durante esses procedimentos.
IV. Convulsões: Clonazepam é usado ocasionalmente como tratamento adjunto contra certos tipos de convulsões, e lorazepam e diazepam são fármacos de escolha no controle do estado epilético.
V. Distúrbios musculares: O diazepam é útil no tratamento de espasmos dos músculos esqueléticos, como os que ocorrem no estiramento, e no tratamento da espasticidade devida a doenças degenerativas, como esclerose múltipla e paralisia cerebral.
VI. Abstinência alcoólica: O tratamento da SAA pode ser dividido em duas fases: a desintoxicação e a manutenção, e incluem a farmacoterapia e outras modalidades de tratamento. Na fase de desintoxicação, os benzodiazepínicos (BZD) são os medicamentos de primeira escolha, enquanto na manutenção os medicamentos mais utilizados são o dissulfiram, a naltrexona e o acamprosato. No tratamento de abstinência alcoólica com ausência de sintomas psicóticos, o benzodiazepínico de escolha é o diazepam. Contudo, se o paciente ter insuficiência hepática, o benzodiazepínico de escolha é o lorazepam. 
c) Meia vida
A meia-vida (t 1/2): é o tempo gasto necessário para que a quantidade de uma matéria se reduza à metade. Mais especificamente, quando tratamos de medicamentos dizemos que a meia-vida é o tempo gasto para que a concentração plasmática de um fármaco no organismo se reduza à metade
A meia-vida dos benzodiazepínicos é importante clinicamente, pois a duração da ação pode determinar a utilidade terapêutica. Os benzodiazepínicos podem ser divididos em grupos de curta, média e longa ação. 
Diazepam, clordiazepóxido, clonazepam, clorazepato, flurazepam e quazepam têm meias-vidas plasmáticas de 30 horas a mais de 100 horas e, em termos técnicos, são descritos como benzodiazepínicos de ação prolongada. As meias-vidas plasmáticas desses compostos podem chegar a 200 horas em pessoas cujo metabolismo seja geneticamente lento. 
As meias-vidas de lorazepam, oxazepam, temazepam e estazolam estão entre 8 e 30 horas. O alprazolam tem meia-vida de 10 a 15 horas, e o triazolam apresenta a meia-vida mais breve (2 a 3 horas) de todos os benzodiazepínicos administrados por via oral.
O flurazepam, um benzodiazepínico lipossolúvel usado como hipnótico que tem uma meia-vida de eliminação curta, tem um metabólito ativo (desalquilflurazepam) com uma meia-vida superior a 100 horas. 
d) Efeitos colaterais 
Sedação/sonolência e confusão são os efeitos adversos mais comuns dos benzodiazepínicos. Ocorre ataxia em doses elevadas, impedindo as atividades que exigem coordenação motora fina, como dirigir automóvel ou operar maquinário perigoso. A sonolência, que ocorre em cerca de 10% de todas as pessoas, pode se manifestar durante o dia após o uso de um benzodiazepínico para insônia na noite anterior, a chamada sedação diurna residual.
Alguns indivíduos também experimentam ataxia (equilíbrio e coordenação motora prejudicados) (menos de 2%) e tontura (menos de 1%). Esses sintomas podem resultar em quedas e fraturas de quadril, sobretudo em idosos.
Pode ocorrer comprometimento cognitivo (diminuição da evocação de memória e da retenção de novos conhecimentos) com o uso dos benzodiazepínicos. O triazolam com frequência apresenta rápido desenvolvimento de tolerância, insônia da madrugada e ansiedade durante o dia, bem como amnésia anterógrada e confusão.
Indivíduos com doença hepática e idosos têm maior probabilidade de apresentar efeitos adversos e toxicidade relacionados a benzodiazepínicos, incluindo coma hepático, em particular quando são administrados de modo repetitivo ou em doses elevadas. Os sintomas de intoxicação por benzodiazepínicos incluem confusão, fala arrastada, ataxia, sonolência, dispneia e hiporreflexia.
Benzodiazepínicos podem produzir prejuízo clinicamente significativo de respiração em pessoas com doença pulmonar obstrutiva crônica e apneia do sono. O alprazolam pode exercer um efeito estimulador do apetite direto e pode causar ganho de peso. Os benzodiazepínicos devem ser usados com cautela por pessoas com história de abuso de substância, transtornos cognitivos, doença renal, doença hepática, porfiria, depressão do sistema nervoso central (SNC) ou miasteniagrave
5. Pesquisar dependência de benzodiazepínicos e estratégias para descontinuação de seu uso
O surgimento de uma síndrome de abstinência, também chamada de síndrome de descontinuação, depende da quantidade de tempo em que a pessoa foi medicada com benzodiazepínico, da dosagem, da velocidade de sua remoção gradativa e da meia-vida do composto. A síndrome de abstinência desses fármacos consiste em ansiedade, nervosismo, diaforese, inquietação, irritabilidade, fadiga, sensação de cabeça leve, tremor, insônia e fraqueza. O desenvolvimento de uma síndrome de abstinência grave é observado apenas em indivíduos que tomaram doses elevadas durante períodos longos. O surgimento da síndrome pode ser retardado durante 1 ou 2 semanas em pessoas que estavam sendo medicadas com benzodiazepínicos de meias-vidas longas.
Os benzodiazepínicos têm potencial de abuso: 50% dos pacientes que usam benzodiazepínicos por mais de 12 meses evoluem com síndrome de abstinência (provavelmente ainda mais em clínicas especializadas). Os sintomas começam progressivamente dentro de 2 a 3 dias após a parada de benzodiazepínicos de meia-vida curta e de 5 a 10 dias após a parada de benzodiazepínicos de meia-vida longa, podendo também ocorrer após a diminuição da dose. 
Estratégias para descontinuação
A retirada dos benzodiazepínicos
A melhor técnica e a mais amplamente reconhecida como a mais efetiva é a retirada gradual da medicação, sendo recomendada mesmo para pacientes que usam doses terapêuticas. Além das vantagens relacionadas ao menor índice de sintomas e maior possibilidade de sucesso, essa técnica é facilmente exequível e de baixo custo. Alguns médicos preferem reduzir um quarto da dose por semana. Já outros negociam com o paciente um prazo. Este gira em torno de 6 a 8 semanas. Os 50% iniciais da retirada são mais fáceis e plausíveis de serem concluídos nas primeiras duas semanas, ao passo que o restante da medicação pode requerer um tempo maior para a retirada satisfatória. É de grande valia oferecer esquemas de redução das doses por escrito, com desenhos dos comprimidos e datas subsequentes de redução. 
Quando for necessário descontinuar a medicação, o fármaco deve ser retirado bem devagar (25% por semana); caso contrário, recorrência ou rebote de sintomas são prováveis. O monitoramento de quaisquer sintomas de abstinência (talvez com uma escala de avaliação padronizada) e apoio psicológico para o indivíduo são úteis para obter sucesso na descontinuação de benzodiazepínicos.
Substituição por benzodiazepínicos de meia-vida longa
Pacientes que não conseguem concluir o plano de redução gradual podem se beneficiar da troca para um agente de meia-vida mais longa, como o diazepam ou clonazepam. Comparado a outros benzodiazepínicos e barbituratos, o diazepam mostrou ser a droga de escolha para tratar pacientes com dependência, por ser rapidamente absorvido e por ter um metabólito de longa duração – o desmetildiazepam – o que o torna a droga ideal para o esquema de redução gradual, pois apresenta uma redução mais suave nos níveis sanguíneos. 
Medidas não-farmacológicas
O tratamento da dependência dos benzodiazepínicos envolve uma série de medidas não-farmacológicas e de princípios de atendimento que podem aumentar a capacidade de lidar com a SAB e manter-se sem os benzodiazepínicos. O melhor local para tratamento é o ambulatorial, pois leva o maior engajamento do paciente e possibilita que, tanto mudanças farmacológicas quanto psicológicas, possam ocorrer ao mesmo tempo. Suporte psicológico deve ser oferecido e mantido tanto durante quanto após a redução da dose, incluindo informações sobre os benzodiazepínicos, reasseguramento, promoção de medidas não-farmacológicas para lidar com a ansiedade.
Manutenção sem benzodiazepínicos 
Nesta fase, o paciente deve receber reasseguramento da capacidade de lidar com estresse sem os benzodiazepínicos, bem como ênfase na melhora da qualidade de vida. Deve se oferecer apoio psicossocial, treinamento de habilidades para sobrepujar a ansiedade, psicoterapia formal e psicofarmacoterapia de estados depressivos subjacentes. Ajudá-lo a distinguir entre os sintomas de ansiedade e abstinência e oferecer suporte por longo praz. 
Referências
Kaplan, H.I; Sadock, B.J. Compêndio de. Psiquiatria- Ciências do Comportamento e. Psiquiatria Clínica. 11ª ed. Editora Artes Médicas
WHALEN, K.; FINKEL, R.; PANAVELIL, T. A. Farmacologia ilustrada. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2016.
https://www.informasus.ufscar.br/qual-o-papel-da-atencao-primaria-no-cuidado-da-saude-mental/ (Qual o papel da atenção primária no cuidado da saúde mental?)
https://saude.es.gov.br/Media/sesa/Protocolo/Diretrizes%20Clinicas%20em%20saude%20mental.pdf (Diretrizes Clínicas em Saúde Mental- Secretaria de Estado da Saúde do Espírito Santo)
https://www.conass.org.br/biblioteca/pdf/A-Atencao-Primaria-e-as-Redes-de-Atencao-a-Saude.pdf
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_pratico_matriciamento_saudemental.pdf
https://www.scielo.br/j/pcp/a/bc7hd4FXKt6tKFFJc9QJYxB/?lang=pt (Aproximações possíveis da terapia focada na solução aos contextos grupais)
https://www.saude.sc.gov.br/index.php/resultado-busca/redes-de-atencao-a-saude-cidadao/10244-rede-de-atencao-psicossocial-raps
https://amb.org.br/files/_BibliotecaAntiga/abuso-e-dependencia-dos-benzodiazepinicos.pdf

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