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1 DIREITO E RELAÇÕES INTERNACIONAIS 1 Sumário NOSSA HISTÓRIA ................................... Erro! Indicador não definido. INTRODUÇÃO..........................................................................................3 HISTÓRICO..............................................................................................4 FONTES...................................................................................................5 DESENVOLVIMENTO E TRATADOS.....................................................10 COSTUMES E PRINCÍPIOS...................................................................15 RELAÇÕES INTERNACIONAIS.............................................................31 REFERÊNCIAS.......................................................................................34 2 NOSSA HISTÓRIA A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de empresários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior. A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação. A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica, excelência no atendimento e valor do serviço oferecido. 3 INTRODUÇÃO Há um vínculo estreito entre o corpo jurídico que conforma o conjunto do que se conhece como ‘direitos humanos’ e o panorama das relações internacionais. Prova disso é, por um lado, que o referido corpo jurídico tem a sua origem intimamente ligada ao fenômeno jus- filosófico, qual quer ser uma realidade supranacional já desde a famosa Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão em 1789. E por outro lado, que, na verdade, a aplicação eficaz no seio dos Estados do conjunto dos direitos fundamentais, o qual todas as constituições se preocuparam em explicitar desde o século XVIII, só será possível após a Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948, impulsionada pela Organização das Nações Unidas. Quando, então, se criam mecanismos de proteção internacional, seja mediante a ratificação de tratados, seja mediante a instalação de tribunais de caráter supraestatal. 4 HISTÓRICO O surgimento do Direito Internacional como disciplina se deu a partir do século XVII, mas na prática já existia desde a antiguidade, como por exemplo o tratado atinente a fronteira comum entre Lagash e Umma – cidades da Mesopotâmia e o firmado entre Ramsés II do Egito e Hatusi III dos hititas, no século XIII a.C., denominado de Tratado de Kadesh (em razão da batalha ali firmada). O DIP regula as relações públicas exteriores dos sujeitos de DIP (os Estados, incluindo a Santa Sé, e as Organizações Internacionais) O Direito Internacional Público na sua versão clássica admite apenas os Estados e as Organizações Internacionais como sujeitos. Contudo Blocos Regionais também podem firmar tratados como é o caso do Mercosul em decorrência do art. 34 do Protocolo de Ouro Preto. Além disso, indivíduos e pessoas jurídicas têm capacidade postulatória. Por exemplo, indivíduos podem acionar a Comissão Interamericana de Direitos Humanos CIDH da Organização dos Estados Americanos OEA. Também na CIJ indivíduos podem postular e serem julgados como no caso, Guengueng et al. v. Senegal, no qual indivíduos torturados durante a administração do Habré em Chade acionaram o Senegal que alegava não ter jurisdição sobre o caso. Empresas também podem ter capacidade postulatória reconhecida como acontece nas ferramentas de solução de controvérsias previstas no Tratado Norte-americano de Livre Comércio NAFTA. 5 FONTES As fontes de DIP são estabelecidas no artigo 38 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça (principal órgão jurisdicional da Organização das Nações Unidas, também denominado Tribunal Internacional de Haia) Artigo 38 1. A Corte, cuja função seja decidir conforme o direito internacional as controvérsias que sejam submetidas, deverão aplicar; 2. as convenções internacionais, sejam gerais ou particulares, que estabeleçam regras expressamente reconhecidas pelos Estados litigantes; 3. o costume internacional como prova de uma prática geralmente aceita como direito; 4. os princípios gerais do direito reconhecidos pelas nações civilizadas; 5. as decisões judiciais e as doutrinas dos publicitários de maior competência das diversas nações, como meio auxiliar para a determinação das regras de direito, sem prejuízo do disposto no Artigo 59. 6 6. A presente disposição não restringe a faculdade da Corte para decidir um litígio ex aequo et bono, se convier às partes. São as fontes de DIP: os tratados, os costumes e os princípios gerais de direito A jurisprudência, doutrina e a equidade são meios de integração do direito. Alguns doutrinadores incluem entre as fontes os atos unilaterais e as decisões das organizações internacionais. Exemplo de ato unilateral que produz efeito no âmbito internacional são as leis de limite de mar territorial, de zona econômica exclusiva, que estabeleça o regime de administração dos portos e que proceda a franquia de águas interiores à navegação estrangeira. No que se refere à equidade, sua utilização somente poderá ocorrer caso as partes envolvidas no litígio concordem com sua aplicação, ou seja, se for “certo” e “bom” (“ex aequo et bono”) para a justiça do caso concreto e convier às partes. Fontes em espécie: Convenções internacionais: a principal e mais concreta fonte, com forte carga de segurança jurídica. Sem denominação específica, eis a razão de poderem ser denominadas como tratados, convenções, acordos, pactos etc. São elaborados de forma democrática, com a participação de todos os Estados, disciplinam matérias variadas e dão maior segurança, pois exigem a forma escrita. Costumes internacionais: segunda grande fonte. Há uma atual tendência de codificação das normas internacionais. Foi a primeira a aparecer, é, nessa linha, fonte-base anterior a todo Direito das Gentes. Nessa linha, para que um determinado comportamento omissivo ou comissivo configure costume internacional, fonte em sentido técnico, deve cumular dois elementos, quais sejam: 1 – O material ou objetivo (“prova de uma prática geral”); e 2 – O psicológico, subjetivo ou espiritual (“aceita como sendo o direito”), a "opinio juris". Caso configure regra aceita como sendo o direito, é uma fonte jurídica, cujo descumprimento é passível de sanção internacional. Resta 7 cristalino que sua conceituação faz emergir a ideia de uma prática constante, geral, uniforme e vinculativa. Dica importante: quem alega um costume tem o ônus de prová-lo. Princípios gerais do Direito: apesar de difícil identificação são fontes autônomas. A própria "pacta sunt servanda", a boa-fé e outras são exemplos. O Direito moderno passa a depender cada vez mais dos princípios. São modernamente classificados como fontes secundárias do Direito das Gentes. O fato de estarem previstos em tratados não tira sua característica de princípios. Novas fontes: Com exceçãoda equidade, as novas fontes do Direito das Gentes (ou Internacional) não estão previstas no rol art. 38 do Estatuto da CIJ. Analogia e equidade: são soluções eficientes para enfrentar o problema da falta de norma. Podem ser colocadas como formas de complementação do sistema jurídico. Analogia: é a aplicação a determinada situação de fato de uma norma jurídica feita para ser aplicada a um caso parecido ou semelhante. Equidade: ocorre nos casos em que a norma não existe ou nos casos em que ela existe, mas não é eficaz para solucionar coerentemente o caso "sub judice". OBS.: art. 38, § 2º, do Estatuto da CIJ – a aplicação da equidade (ex aequo et bono) pela CIJ depende de anuência expressa dos Estados envolvidos em um litígio. Atos unilaterais dos Estados: consistem em manifestação de vontade unilateral e inequívoca, formulada com a intenção de produzir efeitos jurídicos, com o conhecimento expresso dos demais integrantes da sociedade internacional. Decisões das organizações internacionais (OI): atos emanados das OI na sua condição de sujeitos de direito internacional, na qualidade de pessoa jurídica, ou seja, seus atos precisam ser internacionais, não meramente internos. Decisões unilaterais "externa coporis". 8 “Jus cogens”: é norma rígida, o oposto de "soft law". Estão previstas na Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados, de 1969, em seus arts. 53 e 64. São imperativas e inderrogáveis, opondo-se ao "jus dispositivm". Ainda que não haja hierarquia entre as fontes até aqui estudadas, há que se reconhecer que "jus cogens" é a exceção, estando acima de todas as outras. Versam normalmente sobre matérias atinentes à proteção aos direitos humanos, como a própria Declaração Universal de 1948. “Soft law”: direito flexível ou direito plástico, oposto de "jus cogens". Para alguns, ainda é cedo para considerá-lo fonte. Surgiu no século XX com o Direito Internacional do Meio Ambiente. Preveem um programa de ação para os Estados relativamente à determinada conduta em matéria ambiental ou econômica. 9 10 DESENVOLVIMENTO E TRATADOS Tratado é todo acordo formal e escrito, celebrado entre Estados e/ou organizações internacionais, que busca produzir efeitos numa ordem jurídica de direito internacional. 11 Tratado é todo acordo formal e escrito, celebrado entre Estados e/ou organizações internacionais, que busca produzir efeitos numa ordem jurídica de direito internacional. Sendo acordo, pressupõe manifestação de vontade bilateral ou multilateral. Formal, pois tem procedimento específico na sua elaboração, o qual pode decorrer de uma conferência internacional ou de um quadro normativo de uma organização internacional. Quadro normativo de uma organização internacional, que tem as suas regras, apresenta um processo legislativo já previsto, que vai estabelecer como se elabora uma convenção. Ex.: convenção da ONU sobre determinado assunto. Conferência é termo usado para indicar qualquer reunião. Mas, no caso, tem caráter “ad hoc” (tem um sentido determinado no tempo; é elaborado para aquele momento). Ex.: conferência para elaborar convenção sobre lixo atômico. Uma vez aprovada a convenção, extingue-se a conferência. Uma conferência pode durar anos. Engloba todo o processo de elaboração: a reunião de embaixadores, troca de notas diplomáticas, reuniões de funcionários/diplomatas. São negociações feitas no decorrer dos anos, até se chegar a um projeto de convenção. Nesse ponto já existe um texto elaborado, o qual, em uma “conferência” de três dias, como se notícia nos jornais, os representantes se reúnem apenas para assiná-lo ou para acertar uma emenda ou outra. É escrito, pois um tratado só é valido se dessa forma for. SOFT LAW = não cria direitos e obrigações internacionais Contratos (alguma das partes não tem direito de convenção) Ordem de Malta e indivíduos são exemplos de sujeitos de DIP que não possuem direito de convenção. MOU = Não é tratado = porque se não tiver animus contrahendi = será memorando de entendimento = MOU = Gentlements agreement) = criam condições/confiança para que as partes no futuro elaborem o Hard Law (enrijeçam as obrigações) 12 DEFINICAO MENOS ABRANGENTE = CONVENCAO DE VIENA DE 1969 = Sobre o direito dos tratados = art. 2, parag. 1 alínea a = definir um tratado = acordos internacionais celebrados por escrito entre Estados e regidos pelo DI quer constem de um instrumento único, quer constem de dois ou mais instrumento conexos, qualquer que seja a sua denominação especifica = só esses tratados serão regulados pelas normas dessa convenção. NÃO SE APLICA A CONVENCAO se o tratado não for escrito, mas isso não afasta a aplicabilidade do acordo = Art. 3, caput e alínea a = O fato da presente convenção não disciplinar acordos não concluídos por escrito não prejudicara a eficácia jurídica desses acordos. CONDICOES DE VALIDADE DOS TRATADOS 1. CAPACIDADE DAS PARTES CONTRATANTES = direito de convenção Contratos (alguma das partes não tem direito de convenção) Ordem de Malta e indivíduos são exemplos de sujeitos de DIP que não possuem direito de convenção. Para Nguyen Ouoc Dinh (jurista francês de origem vietnamita autor de um dos clássicos do Direito Internacional Público) = entende que capacidade das partes não é condição de validade, mas sim condição de existência ANULABILIDADE = ANFECHTIGKEIT = ex nunc 2. HABILITAÇÃO DOS AGENTES SIGNATÁRIOS = representantes de um Estado = art. 7 e 8 da Convenção de Viena de 1969 sobre direitos dos tratados = uma pessoa poderá ser considerada representante de um estado para a prática de quaisquer atos relativos a conclusão de um ato se apresentar plenos poderes para tal = há certas pessoas que devido as funções que exercem no seu estado que estão dispensadas da apresentação de plenos poderes = CHEFE DE ESTADO, CHEFE DE GOVERNO E MINISTRO DAS RELACOES EXTERIORES (só esses 3) o chefe de missão diplomática só pode praticar um ato sem os plenos poderes = chefe de missão diplomática e representante do estado numa organização podem apenas adotar tratado (não para aderir) Se ato não for feito por habilitado = não produz efeitos jurídicos = ato inválido= existe o acordo, mas não é valido = mas pode ser confirmado pelo 13 estado futuramente por alguém habilitado produzindo efeitos ex tunc (retroativos) desde a data de assinatura pela pessoa sem poderes. ANULABILIDADE = ANFECHTIGKEIT = ex nunc 3. OBJETO LÍCITO E POSSÍVEL = factível materialmente possível = tem de estar de acordo as normas imperativas de direito internacional geral art. 53 e 64 = se não estiver de acordo com a não agressão a proibição da pirataria do genocídio do apartheid = tratado será nulo. Art. 30 parágrafo 4 = tratado contrariar tratados antigos. NULIDADE = NULLIGKEIT = ex tunc 4. CONSENTIMENTO MÚTUO = vontade dos sujeitos de DIP deve ser livremente manifestada = se houver algum vicio na manifestação de um tratado pode haver a invalidade do tratado, se bilateral, ou saída do pais que houve vicio do consentimento de uma parte se o tratado for multilateral = erro, fraude, dolo, corrupção ou coação do representante do estado, atuação do próprio estado pela ameaça ou uso da força (art. 48 a 52) HIPÓTESE DA RATIFICAÇÃO IMPERFEITA = se estado desrespeitando direito interno formal de importância fundamental = estado pode requerer invalidade posterior do ato de adesão ou do próprio tratado se bilateral = exemplo se o congresso não for ouvido antes do Brasil assumir direitos e obrigações = só coação militar = coação econômica ou política não vale como invalidade NULIDADE = NULLIGKEIT = ex tunc EM DIREITO INTERNACIONAL = MESMO EM CASO DE NULIDADE = ATOS PRATICADOS DE BOA FE = CONTINUAM VALIDOS = isso diminui muito a diferença entre anulabilidade e nulidade em direito internacional FASES1. NEGOCIACAO 2. ADOCAO do texto do tratado só consentir com o texto negociado não é ato que manifesta vontade obrigatória 3. AUTENTICACAO = não pode mais mudar o texto do tratado = texto definitivo 14 4. ASSINATURA = manifesta consentimento definitivo se não for exigida ratificação (no caso do BRA se não houver obrigação nova e não criar direitos e obrigações não precisa de ratificação do congresso) 5. RATIFICACAO = manifesta consentimento definitivo (art. 11) TERMOS TÉCNICOS DA CONVENÇÃO DE VIENA (não existe estado signatário) 1. ESTADO NEGOCIADOR (participou das negociações) 2. ESTADO CONTRATANTE 3. ESTADO PARTE (para qual o estado é válido) PRINCIPIO DO ESTOPPEL ART 45 = Estado não pode invocar uma causa de anulabilidade, de extinção ou de suspensão de um tratado se após tomar conhecimento dos fatos tiver aceitado expressamente que o tratado é válido ou continua em execução ou em virtude de sua conduta, deva ser considerado como tendo concordado que o tratado é valido, ou continua em execução, conforme o caso. COSTUMES E PRINCÍPIOS Costume internacional = definição deve espelhar o reconhecimento generalizado por parte dos Estados e demais sujeitos de DIP de uma determinada prática como sendo obrigatória. Quais são os elementos constitutivos de um costume: elemento material: consuetudo/usum e necessária uma prática reiterada de comportamento elemento psicológico ou subjetivo: opinio juris convicção certeza por parte dos estados e demais sujeitos de DIP de que a prática em questão e obrigatória. Características do elemento material: DURACAO UNIFORMIDADE GENERALIDADE (diferente de unanimidade). “Artigo 38.º 1 – O Tribunal, cuja função é decidir em conformidade com o direito internacional as controvérsias que lhe forem submetidas, aplicará: 15 a) As convenções internacionais, quer gerais, quer especiais, que estabeleçam regras expressamente reconhecidas pelos Estados litigantes; b) O costume internacional como prova de uma prática geral aceite como direito; c) Os princípios gerais de direito reconhecidos pelas nações civilizadas; d) Com ressalva das disposições do artigo 59 as decisões judiciais e a doutrina dos publicistas mais qualificados das diferentes nações como meio auxiliar para a determinação das regras de direito. 2 – A presente disposição não prejudicará a faculdade do Tribunal (*) de decidir uma questão ex aequo et bono, se as partes assim convierem.” A doutrina é unânime ao dizer que o art. 38ª do ECIJ é o diploma que regulamenta as fontes do Direito Internacional, no entanto, é também de percepção geral que existem problemas com o fato de adotar a letra do Estatuto de uma Corte, ainda que da Corte Internacional de Justiça – CIJ, para definir quais são as fontes de Direito Internacional. Diz o professor Jorge Bacelar Gouveia que a adoção do art. 38ª do ETIJ está longe de ser a solução perfeita para a determinação das fontes de Direito Internacional, porque em si comporta deficiências como o fato de algumas das fontes não são certamente fontes de Direito, sua formulação contém erros técnicos, seu carácter exaustivo deixa de fora outras fontes relevantes, e por fim e mais importante o fato de não ter valor vinculativo internacional. Em seu “O Conceito de Direito”, Hart, quando trata do Direito Internacional, lança mão de questionar se seria o Direito Internacional um direito, e faz uma averiguação detalhada desta questão, mas não deixa de afirmar que a ausência de um poder legislativo internacional, de tribunais com jurisdição obrigatória, diz ainda que a ausência destas instituições impede que o Direito Internacional especifique suas fontes de direito e que estabeleça regras de identificação de seus institutos normativos. Segundo o Prof. Valério Mazzuoli, a Convenção da Haia, de 1907, foi que primeiro indicou o rol de fontes do DIP, ao estabelecer em seu art. 7º: 16 “Art. 7º– Se a questão de direito a resolver estiver prevista por uma convenção em vigor entre o beligerante captor e a Potência de que for parte do litígio, ou cujo nacional for parte dele, o Tribunal decidirá conforme as estipulações da mencionada convenção. Na falta dessas estipulações, o Tribunal aplicará as regras do Direito Internacional. Se não existirem regras internacionalmente conhecidas, o Tribunal decidirá de acordo com os princípios gerais de direito e da equidade.” Como podemos ver, a diferença é que os princípios gerais de direito aparecem logo a seguir a convenção em vigor. Em verdade, existe discussão doutrinária a respeito da hierarquia das fontes de Direito Internacional, e a maior parte crê não haver uma disposição taxativa, tampouco hierárquica: a jurisprudência tem demonstrado ao longo dos anos, que as fontes de Direito Internacional interagem dinâmica e constantemente, de acordo com o momento e lugar, razão pela qual, o artigo não deve ser lido estaticamente. Bem, se toda lei internacional, de uma forma ou de outra, deriva do consentimento do Estado, não deve haver uma hierarquia entre as fontes de direito internacional: se, em princípio elas (as leis internacionais) têm o mesmo caráter obrigatório não há que se falar em hierarquia. No entanto, o Prof. Eduardo Correia Baptista é correligionário da tese de que existe sim, hierarquia de fontes em DIP, e alega, nomeadamente que o ius cogens (de que trataremos a seguir), ocupa o topo da lista. A explicação decorre de que a hierarquia é caracterizada pela incapacidade de os atos decorrentes de fonte inferior revogarem os decorrentes de fonte superior, e cita como exemplo, a superioridade hierárquica do costume frente aos tratados. Diz ainda que a flexibilidade abre portas ao subjetivismo. Aliás, tendo em vista as características tão peculiares do Direito Internacional, assim como defende Jorge Miranda, mas com as reservas de Accioly, entendemos que se houvesse ordem, em primeiro lugar deveriam vir os princípios gerais de Direito Internacional. Princípios e os Princípios Gerais de Direito Internacional Princípio é sinônimo de início. A questão dos princípios se impõe no estudo de quaisquer dos ramos do direito, uma vez que, como ensina J.J. Gomes 17 Canotilho “a questão metodológica da concretização de normas é indissociável da filosofia hermenêutica e da teoria da extrinsecação-realização do direito”. Em outras palavras, os princípios são a via primeira de interpretação do direito. De maneira muito suscinta, e ainda sob o ensinar de Canotilho, o processo metodológico que se utiliza para diferenciar uma regra de um princípio é o de reconhecer que as regras se adaptam aos modelos tradicionais de interpretação, já os princípios apontam para os modelos de concretização e de ponderação. A recente produção massiva de normas afeta o sistema jurídico, entorpece a justiça e enfraquece a segurança jurídica. Os princípios são condensadores do direito, uma vez que, como disse São Tomás de Aquino, sem entender seus princípios não é possível entender a mais elementar de suas instituições. As leis tem por objetivo regular uma situação específica, a vida elementar do mundo jurídico em uma relação determinada, por exemplo, um contrato, o direito de propriedade, a alíquota do imposto sobre a renda, o regime de casamento, a pena aplicável ao homicida, entre outras muitas situações, sob a égide de um direito que evolui também diariamente; no entanto, cada uma dessas situações estão regulamentadas sobre os vários princípios gerais do direito, que organizam essas normas, que dão sentido e alcance à cada uma delas. Os princípios nos quais estão baseadas estas normas as transcendem, e tem como fim profícuo articular com o sistema jurídico, bem como protegê-las de eventual lacuna. Os princípios expressam sempre uma ordem de valores. Violar um princípio, segundo o Prof. Celso Antônio Bandeira de Mello,é muito mais grave do que transgredir uma norma, e continua: “… a desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo um sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade e inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio violado, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais…”. Há quem defenda que o sistema romano-germânico (da qual se assemelha o sistema do Direito Internacional) é superior aos demais sistemas jurídicos históricos, não pela perfeição da lei ou a qualidade de seus legisladores, 18 mas pelo fato de que os juristas deste sistemas foram os primeiros a interpretar a jurisprudência segundo princípios. Os princípios carregam em si funções integrativas e interpretativas do direito, como critério auxiliar de decisão e por vezes, de fundamentação de uma decisão. O significado e o alcance de uma norma jurídica em determinado contexto, devem ser amparados pela lógica de seu sistema, que é definido por seus princípios. O Direito Internacional é um fenômeno tão complexo, que vai além do fato e da regra de que pode ser aplicado num determinado lugar e num determinado momento; dizer dos princípios em Direito Internacional é dizer do sentido de buscar solução para o problema da pluralidade de fontes e sistemas. No entender de Jonas E.M. Machado, os princípios têm a função de estabelecer os limites do diálogo jurídico-interpretativo-internacional, a fim de garantir a unidade substancial entre o direito interno e o direito internacional. Os princípios que regem as Nações Unidas são aqueles dispostos no art. da Carta das Nações Unidas, e são eles: As Nações Unidas agem de acordo com os seguintes princípios: – A Organização se baseia no princípio da igualdade soberana de todos seus membros; – Todos os membros se obrigam a cumprir de boa-fé os compromissos da Carta; – Todos deverão resolver suas controvérsias internacionais por meios pacíficos, de modo que não sejam ameaçadas a paz, a segurança e a justiça internacionais; – Todos deverão abster-se em suas relações internacionais de recorrer à ameaça ou ao emprego da força contra outros Estados; – Todos deverão dar assistência às Nações Unidas em qualquer medida que a Organização tomar em conformidade com os preceitos da Carta, abstendo-se de prestar auxílio a qualquer Estado contra o qual as Nações Unidas agirem de modo preventivo ou coercitivo; 19 – Cabe às Nações Unidas fazer com que os Estados que não são membros da Organização ajam de acordo com esses princípios em tudo quanto for necessário à manutenção da paz e da segurança internacionais; – Nenhum preceito da Carta autoriza as Nações Unidas a intervir em assuntos que são essencialmente da alçada nacional de cada país. Como dito, são princípios inscritos na Carta das Nações Unidas e visam orientar as ações da ONU com relação a seus membros (a expressão parece redundante) e a seus membros entre si. Não são princípios gerais de Direito. No que diz respeito aos princípios gerais de direito na legislação internacional, o já visto art. 38º do ECIJ assim o coloca: “c) Os princípios gerais de direito reconhecidos pelas nações civilizadas;” Como se vê do texto do artigo, são os princípios fonte de direito em Direito Internacional. Vale dizer que, no que diz respeito ao comando do art. 38, os princípios consagrados pela doutrina como princípios de Direito Internacional são os princípios gerais do direito reconhecidos pelos Estados litigantes, que, por óbvio guarda em si a possibilidade de múltiplas interpretações, pelo que, bastava anunciar princípios gerais do direito. Aliás, para que fosse o bastante, seria também necessário dizer quais princípios, o que ficou por fazer. Não enumerar, ou indicar os princípios gerais de direito que sejam àqueles indicados ao Direito Internacional não só falta à Corte Internacional de Justiça para o sentido de suas decisões, faltou também ao Tribunal Penal Internacional, que em seu art. 21, prescreve: “Artigo 21.º Direito aplicável 1. – O Tribunal aplicará: a) Em primeiro lugar, o presente Estatuto, os elementos constitutivos do crime e o Regulamento Processual; b) Em segundo lugar, se for o caso, os tratados e os princípios e normas de direito internacional aplicáveis, incluindo os princípios estabelecidos no direito internacional dos conflitos armados; 20 c) Na falta destes, os princípios gerais do direito que o Tribunal retire do direito interno dos diferentes sistemas jurídicos existentes, incluindo, se for o caso, o direito interno dos Estados que exerceriam normalmente a sua jurisdição relativamente ao crime, sempre que esses princípios não sejam incompatíveis com o presente Estatuto, com o direito internacional nem com as normas e padrões internacionalmente reconhecidos. 2. – O Tribunal poderá aplicar princípios e normas de direito tal como já tenham sido por si interpretados em decisões anteriores. 3 – A aplicação e interpretação do direito, nos termos do presente artigo, deverá ser compatível com os direitos humanos internacionalmente reconhecidos, sem discriminação alguma baseada em motivos tais como o sexo, tal como definido no n.º 3 do artigo 7.º, a idade, a raça, a cor, a religião ou o credo, a opinião política ou outra, a origem nacional, étnica ou social, a situação económica, o nascimento ou outra condição.” grifo nosso Havemos de acrescentar uma questão de vital importância: qual é a função dos princípios como fonte de DIP? A função mais óbvia dos princípios em DIP é a de orientar a interpretação das normas convencionais e consuetudinárias e suprir eventuais lacunas que existam no Direito positivo. Para o presente trabalho, nosso esforço se traduz na tentativa de demonstração de que, ainda que não haja lacuna, as decisões internacionais devem basear-se no sentido de utilidade do sistema, que está de todo, demonstrado através dos princípios, como veremos no Capítulo III. O reconhecimento de uma lacuna legislativa no que diz respeito à definição dos princípios gerais de Direito Internacional foi tal que a Assembleia Geral das Nações Unidas, adotou em 1970 a Declaração Relativa aos Princípios do Direito Internacional Regendo as Relações Amistosas e Cooperação entre os Estados Conforme a Carta da ONU, que chegou ao consenso com relação aos seguintes princípios: a) Proibição do uso ameaça da força; b) Solução pacífica de controvérsias; c) Não intervenção nos assuntos internos dos Estados; 21 d) Dever de cooperação internacional; e) Igualdade de Direitos e Autodeterminação dos Povos; f) Igualdade soberana dos Estados; g) Boa-fé no cumprimento das obrigações internacionais. São, portanto, estes os princípios gerais de Direito Internacional. No entanto, a Declaração não constitui emenda à Carta das Nações Unidas, não tem caráter de tratado e não vincula os Estados, como bem pautado na sessão do Comitê Especial que elaborou a Carta, uma vez que um relatório da Assembleia não pode criar regras obrigatórias de direito internacional. Talvez por isso, algumas obras, sequer mencionam a Declaração, seja como fonte de direito internacional, seja como aliado interpretativo à CIJ. Em seu Princípios de Direito Internacional Público, Ian Brownlie dedica-se aos “Princípios Gerais de Direito na prática dos tribunais”, e aos “Princípios gerais do Direito Internacional”, e diz que são, exemplificativamente: princípio do consentimento, reciprocidade, igualdade dos Estados, carácter definitivo das decisões arbitrais e das resoluções de litígios, validade jurídica dos acordos, boa- fé, jurisdição interna e liberdade dos mares. Não há qualquer menção à Declaração Relativa aos Princípios do Direito Internacional Regendo as Relações Amistosas e Cooperação entre os Estados Conforme a Carta da ONU.Ao tratar dos princípios, Lênio Streck faz uma definição muito parecida com a conclusão de Hart: “Os princípios gerais do Direito adquirem um significado apenas quando considerados em conjunto com o restante do sistema jurídico: daí a necessidade de pressupô-lo como uma totalidade. No mínimo os princípios gerais, em seus mais variados conteúdos, podem servir – e têm servido cotidianamente – como um topo hermenêutico.” Significa dizer que não há sistema jurídico, seja interno ou internacional, que não seja modelado por princípios, sob pena de, não incorporando princípios, não ser possível interpretá-lo; não sendo possível interpretá-lo, tampouco será possível aplicá-lo. 22 Princípio da segurança jurídica Sobre a segurança, cumpre dizer que é das necessidades básicas do ser humano, é consagrado que o homem prefere segurança à liberdade, haja vista que essa foi uma das principais razões para a vida em sociedade. Já a segurança jurídica implica na garantia de efetivação de direitos declarados pelo Estado. Para a defesa do argumento de que o Princípio da Segurança Jurídica é mais do que um princípio, porque contém nele a razão de ser do Estado Democrático de Direito, não nos caberá fazer um estudo histórico evolutivo, mas situar o conceito: a expressão Estado de Direito, como conhecemos, é fruto das Revoluções Americana e Francesa, que consistia, basicamente na limitação do arbítrio dos detentores do poder a partir de princípios como o da legalidade, da liberdade e da igualdade. É o nascer do anseio pelo reconhecimento do Estado à dignidade humana, o início das teorias do Estado do Bem Estar Social, as reações pelo socialismo, comunismo. E mais, o Estado de Direito passa a ser associado com a democracia política. A Comunidade Internacional, através dos Estados que a compõe, tal seja, as Nações Unidas, tem o Estado de Direito como seu primado e a democracia se apresenta como valor a ser perseguido. Muito embora a Carta das Nações Unidas não traga em seu teor o termo “Democracia”, o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos sinaliza os fundamentos jurídicos e os princípios da democracia, notadamente em consonância com o direito internacional, tais como: – A liberdade de expressão (Artigo 19); – O direito de reunião pacífica (Artigo 21); – O direito de se associar livremente com outros (Artigo 22); – O direito de tomar parte na direção dos negócios políticos, diretamente ou por intermédio de representantes livremente eleitos, bem como o direito de votar e ser eleito, em eleições periódicas, honestas, por sufrágio universal e igual e por escrutínio secreto, assegurando a livre expressão da vontade dos eleitores (Artigo 25); 23 O último relatório publicado pela Freedom House, instituição dedicada à vigilância da liberdade e da democracia no mundo, indica que atualmente, de 193 países considerados, 118 são considerados como livres (democracia eleitoral), o restante, é parcialmente livre ou não livre. Em a Lei dos Povos, John Rawl defende idêntica concepção ao afirmar que sociedades de democracia constitucional tendem a ser mais seguros que sociedades não democráticas. Afirma também que muito embora sociedades democráticas tenham entrado em guerra, nenhuma das mais famosas guerras da história ocorreu entre povos democráticos e liberais estáveis. E o que o garante o Estado Democrático de Direito? É a Constituição. Aliás, o grande cerne das constituições do século XX é a organização do poder político, que, segundo o Prof. Jorge Miranda, “não se cuida apenas de realizar até ao fim, de qualquer forma e em qualquer momento, a vontade popular, cuida- se também de sujeitar a vontade popular à soberania do Direito e portanto, antes de mais nada, da própria Constituição.” Sobre o Estado de Direito e a democracia, nos ensina Jorge Reis Novais que a tensão instalada entre o Estado de Direito, garantidor dos direitos individuais, e da Democracia, na apreciação coletiva desses direitos, é a que fornece a junção ideal para o Estado Democrático de Direito. Ainda antes, o mesmo Jorge Reis Novais escreveu: “Tal como o temos visto caracterizar, o Estado de Direito da nossa época é, por definição, social e democrático, pelo que, em rigor, seria desnecessária, por sua pleonástica, a referida adjetivação. Todavia a sua utilidade reside na transparência com que elucida as dimensões essenciais de uma compreensão atualizada do velho ideal de limitação jurídica do Estado com vista à garantia dos direitos fundamentais dos cidadãos. De fato, ela surge imediatamente a confluência, no mesmo princípio estruturante da ordem constitucional, de três elementos que poderíamos sintetizar por: a segurança jurídica que resulta da proteção dos direitos fundamentais, a obrigação social de confirmação da sociedade por parte do Estado e a autodeterminação democrática.” Assim, o Princípio da Segurança Jurídica também é comumente citado na doutrina portuguesa como Princípio da Confiança, deriva de norma insculpida na Constituição e implica na certeza do direito. Diz Canotilho: 24 “Estes dois princípios – segurança jurídica e proteção da confiança – andam estreitamente associados a ponto de alguns dos autores considerarem o princípio da proteção da confiança como um subprincípio ou como uma dimensão específica da segurança jurídica. Em geral considera-se que a segurança jurídica está conexionada como elementos objetivos da ordem jurídica – garantia de estabilidade jurídica, segurança de orientação e realização do direito – enquanto a proteção da confiança se prende mais com as componentes subjetivas da segurança, designadamente a calculabilidade e a previsibilidade dos indivíduos em relação aos efeitos jurídicos dos atos dos poderes públicos.” Contrariamente, para Carlos Blanco de Morais, o princípio da segurança jurídica e o princípio da confiança são coisas distintas; para ele inclusive, o princípio da segurança jurídica não pode sequer ser chamado princípio, já que é um princípio sobre princípios, que “logra iluminar corolários como o da proibição da retroatividade de normas oneradas, proporcionalidade ou da confiança”. A divergência não é só acerca da denominação, uma vez que como podemos ver na referida obra, há uma defesa da dissociação dos termos segurança e justiça, bem como da desconstrução dos principais corolários da segurança jurídica, como por exemplo, a positividade do direito, a publicidade, a durabilidade, a existência de regras de soluções de conflitos informativos, a clareza e a não retroatividade de normas. Não deixamos de considerar esses argumentos, no entanto, não conseguimos identificar no argumento do autor em que pese o argumento de outros doutrinadores, se existe uma fundamental diferença entre o princípio da confiança e o da segurança jurídica em termos práticos. Antônio Cortês assinala que embora a segurança seja um valor jurídico secundário, que tem seu valor em função de um valor concreto, é certo dizer que sem a garantia desses valores não há Direito efetivo, razão pela qual poderíamos até falar de um princípio geral de efetividade dos direitos que implica instrumentalmente, a existência de garantias objetivas. Embora os textos constitucionais não mencionem expressamente “segurança jurídica”, tampouco “proteção da confiança”, adotamos a terminologia “princípio da segurança jurídica". É, portanto, o Princípio da Segurança Jurídica o corolário do Estado Democrático de Direito, porque dele deriva o fato de que todos os atos que 25 derivam do Estado, quer sejam eles da esfera administrativa, legislativa ou judiciária devem estar baseados num fundamento de legalidade, no caso, na Constituição. As intervenções do Estado na vida daqueles que lhe são subordinados (cidadãos) obedece a um quadro de limitações, qual seja, o respeito pelos direitose liberdades individuais, que são seus pressupostos, mas vai além, imputa aos Estados as obrigações do diploma que lhe confere status. Concordamos com o posicionamento do Prof. Jorge Reis Novais, que também explicitou opinião neste sentido: “Mesmo que a Constituição não institua expressamente um princípio da segurança jurídica e da proteção da confiança, ele é, seguramente, um princípio essencial na Constituição material do Estado de Direito, imprescindível como é, aos particulares, para a necessária estabilidade, autonomia e segurança na organização dos seus próprios planos de vida. De resto, a luta pela Constituição e pelo Estado de Direito era também, desde os primórdios das revoluções liberais, uma luta pela segurança jurídica no sentido de um projeto de organização racional do Estado e da sua atuação que mantivesse a esfera dos particulares, nomeadamente no domínio da sua atividade económica, ao abrigo das arbitrariedades típicas de um exercício ilimitados dos poderes de autoridade que caracteriza o Estado absoluto.” Assim, vemos que a segurança jurídica é uma condição do próprio direito, porque visa estabilizar a ordem jurídica para que esta seja efetiva e garanta a justiça, já que os elementos centrais da segurança jurídica são os valores de confiança, de calculabilidade e de cognoscibilidade sobre as normas ou sobre os fatos da vida. O Princípio da Segurança Jurídica é, portanto, mais do que um Princípio e que deve vigorar em Direito Internacional. A ideia vem exatamente do que diz respeito à soberania (que veremos mais adiante): a figura de um Estado se manifesta na escolha de sua forma de governo, na criação de suas leis, na garantia de execução de seus preceitos, na subsunção de sua autoridade aos seus nacionais, pelo uso que faz das competências que essas leis lhe conferem, de sua identidade, de seu relacionamento interestatal. Esse é justamente o critério de legitimação exigido pelo DIP para a aceitação de um Estado. Ousamos prosseguir e afirmar que o Estado reconhecido pelo Direito Internacional Público carrega em si não só a figura do Estado Democrático de Direito, mas da figura do Estado Democrático de Direitos Humanos. 26 Nesta linha de pensamento, podemos localizar o Princípio da Segurança Jurídica insculpido nos arts. 2°, 6°, 12°, entre outros, da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, na Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, no Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, de 1966, entre muitos outros, embora seu fundamento deva permear todos os sistemas jurídicos. O que queremos dizer é que, embora a expressão Segurança Jurídica não figure em nenhuma doutrina no que diz respeito à sua inclusão como princípio de DIP (exceto por referência, como demonstrado no parágrafo anterior), é o elo que une o DIP de seus principais atores, que são os Estados. Vale dizer com essa afirmação, que o que tem feito o DIP ao longo do seu período de evolução é induzir (ou eleger) entre seus atores e sujeitos, o Estado Democrático de Direito como modelo ideal de responsabilidade, a soberania então, como veremos a seguir, é mais do que uma liberdade, é uma responsabilidade. A ideia encontra algum respaldo na obra de Jónatas E. M. Machado, que anuncia: “… parece verificar-se uma tendência internacional no sentido de afirmação do modelo de “Estado de direito, democracia e direitos humanos”, como princípio de direito internacional. Alguma doutrina considera que, partindo da afirmação do indivíduo como unidade primária e sujeito por excelência do direito internacional, a qualidade de Estado de direito democrático de direitos fundamentais deveria ser considerada pela comunidade internacional, como critério de legitimação da própria existência de um Estado enquanto tal. Neste sentido aponta a concepção de soberania como responsabilidade.” Nesta mesma linha de pensamento, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos reiterou a intrínseca relação entre a democracia e o respeito aos direitos humanos na publicação do Relatório “Derecho a la verdad em América”. Diz o relatório de maneira clara e inequívoca que a democracia representativa é a forma de organização política adotada pelos Estados membros da OEA, bem como, que a CADH estabelece como princípios que a organização política dos Estados membros tenha como base o exercício efetivo da democracia, bem como elege a democracia como condição indispensável para a estabilidade, a paz e o desenvolvimento da região. 27 No Brasil, o princípio da segurança jurídica tem seu expoente processual na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, tendo em vista que, como destacado no voto na ministra Carmen Lúcia na ADPF 101/DF: “… é plausível admitir que o Tribunal deverá conhecer da arguição de descumprimento toda vez que o princípio da segurança jurídica restar seriamente ameaçado, especialmente em razão de conflitos de interpretação ou de incongruências hermenêuticas causadas pelo modelo pluralista de jurisdição constitucional, desde que presentes os demais pressupostos de admissibilidade.” Sob uma outra vertente, Radbruch desenvolveu uma Fórmula que consiste em três ingredientes que compõe para ele, a ideia de direito: a justiça, finalidade e a segurança jurídica. A princípio nos compete expor a hierarquia desses valores, uma vez que, embora haja antagonismos latentes entre eles, esses antagonismos precisam ser resolvidos antes que avancemos. A primeira contradição é aquela entre a justiça e a finalidade: se a justiça é a base do fundamento de direito, e a base da justiça é a igualdade, a igualdade é uma abstração que se afasta do individual, e a finalidade, por sua vez, exige que se individualize tanto quando possível, ou seja, se o bem do povo é o que interessa, significa dizer que só o fim importa, e essa ideia contradiz a ideia de justiça. A segunda contradição consiste em, se o direito positivo deve ser cumprido incondicionalmente ao custo de sacrificar os demais valores: em nome da segurança jurídica, a própria justiça estaria degenerada. Quanto a segurança jurídica, diz Radbruch, esta exige a positividade do direito, e, uma vez estabelecido, aspira a impor-se com uma incondicional validade e obrigatoriedade, independentemente de sua justiça ou mesmo de sua exata apropriação a quaisquer fins. Mesmo diante desses antagonismos, Radbruch, em síntese, diz que esses valores devem complementar-se mutuamente, e que portanto, a justiça está, ou deve estar, acima do fim, e deve anteceder o postulado da segurança jurídica, e se não é possível fixar uma utilidade com validade universal, essa adequação não deve ceder, sob nenhum pretexto à arbitrariedade. 28 RELAÇÕES INTERNACIONAIS Poder é a capacidade de fazer algo sem impedimentos. Em política, o poder é uma relação social em que um ator individual ou coletivo exerce comando com probabilidade de sucesso sobre outros atores, que podem ou não resistir. Portanto, o poder de uns encontra limite no poder dos demais. Os instrumentos e mecanismos de poder constituem um gradiente que vai da coerção e da dissuasão até a aquiescência e o consenso voluntário, passando pela autoridade. Em relações internacionais, o poder é predominantemente negativo, ou seja, é a capacidade de impor limites ao comportamento dos outros. Por exemplo, ser capaz de se defender contra a agressão e a conquista militar, ou dissuadir um país de usar armas nucleares por medo da retaliação nuclear. Por sua vez, segundo a definição sintética da Convenção de Montevidéu sobre os Direitos e Obrigações dos Estados (1933), três requisitos materiais e um subjetivo definem a personalidade jurídica internacional deste tipo de ator coletivo. Um Estado é composto por um território, uma população e um sistema de governo capaz de exercer a soberania sobreo território e conduzir relações internacionais com outros estados. O quarto elemento, de natureza, subjetiva, é o seu reconhecimento e aceitação por parte dos demais estados. Em 2015, existiam 195 estados independentes reconhecidos no mundo, sendo 193 membros da Organização das Nações Unidas e dois com status de observadores. Os Estados existentes são muito diferentes em relação ao grau em que cada requisito está presente, bem como nas proporções de território, população e capacidades que cada um concentra. Existem estados tão extensos territorialmente como a Federação Russa (17.075.400 km2), ou ainda menores do que a Holanda (42.508 km2). Tão populosos como a Indonésia 2 (255.461.700 habitantes), ou tão escassamente povoados como o Qatar (972 mil habitantes). Reconhecidos por todos, ou contestados por muitos, mais ou menos ricos, poderosos e desiguais. Ainda assim, com a exceção da Antártida, nenhum 29 outro território significativo do planeta terra está isento das pretensões de soberania dos diversos estados (terra nullis). As relações internacionais são constituídas pelos fluxos produzidos pelos humanos que atravessam as fronteiras entre os estados e os espaços comuns (a Antártida, os oceanos, o espaço sideral etc.). Fluxos materiais e imateriais, legais e ilegais, que abrangem relações de poder, trocas comerciais, turismo, finanças, esportes, notícias, cultura, conhecimentos, infraestrutura, tráfico de drogas, pessoas, armas etc. Neste sentido, as Relações Internacionais são o campo de estudos interdisciplinar que analisa tais fluxos. Um dos fluxos importantes que caracterizam as relações internacionais são os relacionamentos formais e informais, regulares ou esporádicos, que os estados desenvolvem entre si por meio da diplomacia. O instituto moderno da diplomacia envolve a acreditação de representantes oficiais (embaixadores e outros funcionários) de uns estados em outros e também junto às organizações internacionais para promover as relações pacíficas e os canais de diálogo (Convenção de Viena, de 1961). A diplomacia é, neste sentido, uma dimensão da política externa dos países com funções de negociação, representação e informação lícita. Desde 1961, há uma explícita separação no Direito Internacional Público entre as atividades de inteligência e de diplomacia, sendo vedado aos diplomatas a espionagem e o controle de fontes humanas nos Estados em que são acreditados. Arbitragens, mediações, conferências e negociações são exemplos de instrumentos diplomáticos. Um dos resultados possíveis da atividade diplomática é a formação de regimes internacionais. Considero a definição formulada por Stephen Krasner (1983) a mais adequada: “Princípios, normas, regras e procedimentos de tomada de decisão explícitos e implícitos em torno dos quais convergem as expectativas dos atores em uma dada área das relações internacionais”. Regimes são formados visando a coordenação de comportamentos em relação a um tema ou problema. Podem ser mais ou menos efetivos e legítimos. São exemplos de regimes internacionais a Convenção sobre a Proibição de Armas Biológicas, as instituições financeiras do sistema de Bretton Woods, a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre 30 a Mudança do Clima e a Organização para a Cooperação de Xangai. Finalmente, por ordem internacional entenda-se aqui qualquer distribuição de poder entre os atores em um determinado período histórico. Além da distribuição de poder (polaridade) e dos níveis de conflito (polarização), também são elementos importantes para caracterizar uma ordem internacional a sua configuração institucional e seu contexto (social, econômico, tecnológico e ambiental). Por exemplo, entendo que a ordem internacional contemporânea é caracterizada por uma distribuição tripolar de poder (Estados Unidos, China e Rússia), com crescente polarização entre as grandes potências e seus aliados regionais. A ordem internacional contemporânea é a mais institucionalizada desde o início da modernidade, mas ainda assim é predominantemente anárquica (ausência de governo mundial). Seu contexto é marcado por quatro grandes transições globais (demográfica, climática, energética e tecnológica) que estão modificando as condições sob as quais todos os atores interagem. Neste sentido, a ordem internacional atual é instável e tende a se reequilibrar sob novas bases até 2050. 31 REFERÊNCIAS MODELSKI, G.; THOMPSON, W.R. 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