Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
MARC CI – Síndrome de desconforto respiratório do RN e Cianose Introdução: As doenças respiratórias são as principais responsáveis pela morbidade e mortalidade durante o período neonatal, representando a causa mais comum de internação nessa faixa etária. A incorporação dos avanços tecnológicos nos cuidados prestados aos recém-nascidos (RN) criticamente doentes, assim como a utilização de novas abordagens diagnósticas e terapêuticas no manejo da doença respiratória neonatal, contribuíram para a elevação das taxas de sobrevida de bebês prematuros, particularmente os nascidos com muito baixo peso. As trocas gasosas que ocorrem intraútero são mediadas exclusivamente pela difusão placentária, já que os pulmões ainda não são funcionais. O processo de expansão pulmonar que ocorre ao nascimento, associado a outros fenômenos fisiológicos adaptativos, leva à redução da resistência vascular pulmonar (RVP), com consequente aumento no fluxo sanguíneo que chega aos pulmões, para que o RN inicie a troca gasosa diretamente com o meio externo. O RN normalmente apresenta cerca de 50 milhões de alvéolos ao nascimento, tendo potencial para adicionar mais 250 milhões e aumentar sua área de 3 para 70 m2 . Existem ainda cerca de quarenta tipos diferentes de células nos pulmões, cada qual com diferentes funções. O momento do nascimento representa um evento dramático de todo esse processo, pois o desenvolvimento dos pulmões continua acontecendo até por volta dos 8 anos, podendo se completar somente aos 25 anos de idade. Abordagem do RN com insuficiência respiratória aguda Existe uma grande variedade de causas de insuficiência respiratória no período neonatal (Figura 1). Embora a grande maioria das causas seja de origem pulmonar, deve-se sempre considerar a possibilidade de etiologias extra pulmonares, como as cardiopatias congênitas, as de origem central, as metabólicas e as hematológicas. Anamnese • Prematuridade – síndrome de desconforto respiratório; • febre materna, corioamnionite, perda de filho anterior com sofrimento respiratório – colonização por streptococcus do grupo B, deficiência de proteína B do complexo surfactante; • parto cesáreo em bebês prematuros limítrofes – taquipneia transitória do RN; • uso de anti-inflamatório não esteróide – hipertensão pulmonar; • sofrimento fetal agudo – síndrome de aspiração meconial (SAM). Exame físico • ESFORÇO RESPIRATÓRIO: TAQUIPNEIA, RETRAÇÃO COSTAL, ESTERNAL E DIAFRAGMÁTICA, BATIMENTOS DE ASA DE NARIZ, GEMÊNCIA; • cianose; • crises de apneia; • avaliação clínica do desconforto respiratório: – boletim de Silverman-Andersen: notas acima de 4 expressam dificuldade respiratória de moderada a grave (Figura 2); – sinais cardíacos: valorizar bradicardia ou taquicardia associada ou não a hipotensão; – sinais gerais: hipoatividade, palidez, sudorese, fadiga, convulsão, irritabilidade, coma, pele impregnada de mecônio, abdome escavado, estridor, hipoglicemia, anemia, acidose. Laboratório • Gasometria; • glicemia; • hemograma e proteína C reativa (PCR); • contagem de plaquetas; • exames específicos de acordo com cada caso. Avaliação radiológica As alterações radiológicas estão descritas na Tabela 1, e o diag- nóstico mais provável está estratificado pela idade gestacional em que se encontra o RN. PRINCIPAIS PATOLOGIAS RESPIRATÓRIAS NO PERÍODO NEONATAL DOENÇA DE MEMBRANA HIALINA (DMH) Doença respiratória que acomete cerca de 50% dos RN prematuros com peso de nascimento menor que 1.500 g e em torno de 80% dos prematuros com menos de 25 semanas. Resulta da imaturidade pulmonar pela deficiência e inatividade do surfactante, desenvolvimento pulmonar incompleto e com- placência exagerada da caixa torácica. O RN com membrana hialina apresenta DIFICULDADE RESPIRATÓRIA DESDE O MOMENTO DO NASCIMENTO, PIORANDO PROGRESSIVAMENTE NAS PRIMEIRAS 72 HORAS. Ao auscultar o tórax, encontra-se uma baixa entrada de ar, traduzida pela diminuição do murmúrio vesicular. Nos prematuros de muito baixo peso, a expressão clínica do desconforto respiratório pode ser pouco evidente, sendo frequente o aparecimento precoce de crises de apneia e cianose. A RADIOGRAFIA DE TÓRAX TÍPICA MOSTRA INFILTRADO RETÍCULOGRANULAR DIFUSO DISTRIBUÍDO DE MANEIRA UNIFORME (ASPECTO DE “VIDRO MOÍDO OU VIDRO FOSCO”), broncograma aéreo periférico e aumento de líquido pulmonar. Os prematuros de extremo baixo peso podem apresentar, no início, poucas alterações radiológicas, decorrente da imaturidade de seus pulmões, com número reduzido de alvéolos. A gasometria arterial revela hipoxemia importante em ar ambiente. Com a evolução do quadro há retenção de CO2, que pode estar inicialmente normal ou até diminuído em razão da taquipneia compensatória. A acidose, inicialmente do tipo respiratório, costuma progredir para acidose mista. O DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL deve ser feito com as pneumonias congênitas, em especial pelo estreptococo do grupo B, taquipneia transitória, cardiopatias congênitas e malformações pulmonares. Adequada assistência pré-natal para diminuir a incidência de parto prematuro, incentivo ao parto normal, não indicação de cesarianas eletivas sem comprovação da maturidade fetal e reanimação neonatal apropriada são estratégias para prevenir a ocorrência dessa doença. Além disso, é de eficácia comprovada, O USO DE CORTICOTERAPIA ANTENATAL, EM CURSO ÚNICO DE BETAMETASONA 12 MG INTRAMUSCULAR, 2 DOSES COM INTERVALO DE 24 HORAS, NAS GESTAÇÕES ENTRE 26 E 34 SEMANAS DE IDADE GESTACIO- NAL. Tratamento: O tratamento da SDR é multifatorial e inicia- se na prevenção com uso de corticosteróide antenatal, em gestante em trabalho de parto prematuro. A utilização de métodos de ventilação assistida, reposição de surfactante exógeno, medidas gerais de controle térmico, metabólico, hídrico e ainda a importância de um suporte nutricional agressivo e precoce são fundamentais para o sucesso do tratamento desses bebês. A meta primordial para essas crianças é manter uma boa oxigenação, e, para isso, é necessário um rápido e efetivo recrutamento de áreas colapsadas comum nessa patologia de- corrente da falta de surfactante. A intenção é diminuir a necessidade de suporte ventilatório, reduzir as necessidades de oxigênio e evitar uma maior agressão pulmonar. Reanimação adequada evitando minimizar a lesão pulmonar Dados referentes ao período de 2012 a 2014 da Rede Brasileira de Pesquisas Neonatais de 20 centros universitários demonstraram que 62% de bebês nascidos entre 23 e 34 semanas necessitam de uso de máscara ou cânula traqueal para iniciar a respiração, corroborando a importância de minimizar a agres- são pulmonar no auxílio à inicialização da respiração de prematuros. Nesse sentido, o programa de reanimação neonatal da SBP enfatiza em sala de parto a utilização de ventilador mecânico manual com peça T, pois possibilita o uso de pressão positiva final, facilitando não só a manutenção de unidades alveolares abertas, bem como um recrutamento mais adequado de áreas já colapsadas. Além disso, ele permite a utilização de pressão positiva contínua de vias aéreas (CPAP) desde o nascimento até a transferência para a UTI neonatal. Dados de metanálise de 3 ensaios clínicos que compararam CPAP versus entubação e ventilação na sala de parto mostraram que o grupo de CPAP necessitou de menor ventilação e menor necessidade de surfactante exógeno no período neonatal. Admissão na UTI neonatal e aquecimento, mantendo o bebê na zona térmica neutra Este tópico sobre a importância da manutenção adequada da temperatura corporal de prematuros à admissão na UTI neonatal é de extrema relevância e muito atual. O intervalode temperatura entre 36,5 e 37,5°C é considerado como normotermia, e valores diferentes desse padrão incorporam riscos aos RN, pois a temperatura adequada de admissão no berçário é atualmente considerada forte preditor de morbidade e mortalidade em todas as idades gestacionais. A recomendação atual para essa finalidade compreende al- gumas importantes ações: • pré-aquecer a sala de parto e mantê-la entre 23 e 26°C; • levar o bebê envolto em pano aquecido à mesa de reanimação também já previamente aquecida; • não secar o bebê e envolvê-lo em saco plástico transparente (exceto a cabeça). O saco plástico só será retirado após a esta- bilização na unidade neonatal; • utilizar touca dupla para reduzir a perda de calor na região da fontanela (cobrir o couro cabeludo com plástico e colocar por cima touca de lã ou algodão). Suporte respiratório - CPAP nasal (continuous positive airway pressure) Atualmente, a ventilação não invasiva (VNI) e a CPAP vêm sendo adotadas, em alguns casos, como métodos de primeira escolha para a assistência respiratória. Conforme comentado anteriormente, tem-se recomendado sua utilização precoce, muitas vezes na sala de parto, para prevenir colapso dos alvéolos ainda abertos e reduzir a necessidade de suporte ventilatório no curso da doença. Nesse contexto, o uso do CPAP nasal vem sendo muito estimulado, principalmente com o intuito de minimizar a lesão pulmonar. Exerce importante ação fisiológica, por meio do aumento da capacidade residual funcional e promoção do crescimento pulmonar do prematuro. Além disso, melhora a complacência pulmonar, reduz a resistência das vias aéreas, aumentando seu diâmetro e mantendo-as abertas, diminui a frequência respiratória, melhora a aposição do diafragma e a sua contratilidade e apresenta um papel na conservação do surfactante exógeno. Na prática, objetiva-se manter uma PaO2 entre 50 e 70 mmHg e, se necessário, realizam- se aumentos graduais da FiO2 (5 a 10%) até cerca de 80% e do CPAP até, no máximo, 10 cmH2 O. Naqueles casos com insuficiência respiratória grave, caracterizada por hipóxia acentuada e acidose respiratória grave (PCO2 > 60 mmHg), apesar do uso de CPAP nasal, a ventilação mecânica (VM) deve ser indicada. - Ventilação mecânica O uso da VM tem possibilitado a sobrevivência de RN pré-termos com doenças mais graves. Em nosso meio, a ventilação mandatória intermitente (VMI), por meio dos ventiladores convencionais ciclados a tempo, limitados a pressão, com fluxo contínuo, ainda é um modo bastante usado; no entanto, as evidências mais atuais têm demonstrado a preferência por modos sincronizados, os quais diminuem o trabalho respiratório do RN. - Surfactante exógeno TODAS AS EVIDÊNCIAS CIENTÍFICAS APONTAM PARA O BENEFÍCIO DO SEU USO PRECOCE, PRINCIPALMENTE QUANDO ADMINISTRADO NAS PRIMEIRAS 2 HORAS DE VIDA. O intervalo mínimo entre as doses deve ser de 6 horas, e os pacientes que permanecem entubados, com padrão radiológico apresentando pouca melhora e com dificuldade de diminuir os parâmetros do respirador, são os candidatos a novas doses da medicação. A dose inicial varia de 100 a 200 mg/kg e uma dose adicional (100 mg/kg) deve ser feita se, 6 horas após, continuar em VM e com FiO2 acima de 0,3. A eficácia da terapia com surfactante geralmente tem sido atribuída a sua composição de lípides e proteína, mas estudos têm demonstrado a importância da técnica de administração. Atualmente, observam-se estudos sobre estratégias de administração que otimizem a distribuição uniforme de surfactante pela via aérea a fim de maximizar seus efeitos benéficos. Os estudos mostram que a infusão lenta de surfactante, com intuito de amenizar efeitos colaterais, pode resultar em má distribuição nos pulmões. Além disso, o fracionamento em várias alíquotas para pré-termos extremos em VM e com os mesmos parâmetros pré-instilação da droga aumenta a chance de obstrução de vias aéreas. O método ideal de administração de surfactante ainda é muito discutido na literatura. Concluíram que a melhor maneira de administrar o surfactante seria em bolo associado a algumas estratégias ventilatórias antes e depois de seu uso. TAQUIPNEIA TRANSITÓRIA DO RECÉM-NASCIDO (TTRN) É uma condição comum, benigna e autolimitada que ocorre em cerca de 1 a 2% de todos os nascimentos, acometendo RN pré-termos tardios e a termo, que apresentam dificuldade respiratória logo após o nascimento, com resolução clínica em 3 a 5 dias. A causa ainda é discutida, porém três fatores estão associados: deficiência leve de surfactante, pequeno grau de imaturidade pulmonar e retardo na absorção de líquido pulmonar fetal. Os BEBÊS INICIAM COM TAQUIPNEIA LOGO APÓS O NASCIMENTO, COM UMA FREQUÊNCIA RESPIRATÓRIA QUE PODE CHEGAR A 100 A 120 MOVIMENTOS POR MINUTO, GEMÊNCIA, BATIMENTOS DE ASAS DE NARIZ, TIRAGEM INTERCOSTAL E AUMENTO DO DIÂMETRO ANTEROPOSTERIOR DO TÓRAX. As alterações gasométricas são raras, embora possa haver hipoxemia em ar ambiente, que melhora com uma FiO2 menor que 0,50. Podemos encontrar também hipercapnia e acidose respiratória nas primeiras horas de vida. O quadro radiológico característico mostra hiperinsuflação pulmonar, infiltrado difuso geralmente do hilo para a periferia (estrias perihilares proeminentes), leve a moderado aumento de área cardíaca, presença de líquido nas fissuras interlobares (―cisurite‖), marcas proeminentes da vasculatura pulmonar, inversão da cúpula diafragmática, herniação intercostal e derrame pleural. O diagnóstico diferencial mais frequente é com doença de membrana hialina (piora progressiva, quadro muito mais grave, necessidades crescentes de oxigênio), edema pulmonar de origem cardíaca ou linfática (apresenta alterações cardíacas e dos vasos da base concomitantes), pneumonia bacteriana e pneumonia de aspiração (mecônio ou líquido amniótico). A TTRN deve ser um diagnóstico de exclusão. O tratamento inclui medidas de suporte geral e oxigenoterapia através de capacete ou CPAP nasal. Ter sempre em mente os riscos do uso indevido de oxigênio e de antibióticos. A necessidade de VM é rara nessa doença e, caso isso ocorra, de- vem-se descartar outros diagnósticos mais compatíveis, como DMH, pneumonia e cardiopatia. SÍNDROME DE ASPIRAÇÃO MECONIAL A aspiração meconial é mais comum em RN a termo e pós-termo. Pode variar desde formas leves até quadros de insuficiência respiratória grave, com hipertensão pulmonar persistente (HPP). A incidência de mecônio no líquido amniótico varia de 5 até 25% de todas as gestações (média de 14%), podendo ocorrer em aproximadamente 30% das gestações com mais de 42 semanas. No entanto, apenas 5 a 10% desenvolvem SAM. Entre 30 e 50% necessitam de VM. Aproximadamente 30% desenvolvem HPP e 15 a 33% apresentam escape de ar, principalmente pneumotórax. A mortalidade fica em torno de 5%. A aspiração pode ocorrer intraútero ou, na maioria dos casos, durante os primeiros movimentos respiratórios. O MECÔNIO PODE PROVOCAR ALTERAÇÕES OBSTRUTIVAS E INFLAMATÓRIAS. AS VIAS AÉREAS COM OBSTRUÇÃO COMPLETA EVOLUEM COM ÁREAS DE ATELECTASIA, ALTERANDO A RELAÇÃO VENTILAÇÃO-PERFUSÃO (V/Q) E PROVOCANDO HIPÓXIA, COM POSTERIOR HIPERCAPNIA E ACIDOSE. Nos locais COM OBSTRUÇÃO PARCIAL, OBSERVA-SE UM MECANISMO VALVULAR, ONDE O AR ENTRA, MAS TEM DIFICULDADE PARA SAIR, OCASIONANDO ÁREAS HIPERINSUFLADAS, FACILITANDO O ESCAPE DE AR. O quadro de desconforto respiratório é precoce, mas de intensidade variável. Muitas vezes, a sintomatologia predominante é de depressão respiratória e neurológica pelo insulto hipóxico-isquêmico. O tórax pode apresentar aumento do seu diâmetro anteroposterior decorrente de hiperinsuflação pulmonar. Muitas vezes, essas criançasapresentam uma labilidade importante com hipóxia de difícil tratamento em função da HPP. Além disso, o mecônio pode alterar a função do surfactante existente nos alvéolos, provocando mais atelectasias, com redução da complacência pulmonar. O exame radiológico mostra opacidades irregulares, áreas de atelectasia, áreas hiperinsufladas, retificação do diafragma e aumento do diâmetro anteroposterior. Outros achados podem ser pneumotórax, pneumomediastino e cardiomegalia. A gasometria mostra um grau variável de hipoxemia e acidose respiratória ou mista. O ecocardiograma pode revelar disfunção miocárdica e sinais de hipertensão pulmonar. Apenas a presença de mecônio no pulmão não é suficiente para explicar todas as alterações histopatológicas da SAM, conforme mostra trabalho com animais recém-nascidos, em que os pulmões daqueles com aspiração meconial foi muito semelhante aos que aspiraram líquido amniótico claro. Posteriormente às alterações observadas pela lesão química nas vias aéreas, pode ocorrer infecção secundária, agravando ainda mais o quadro respiratório. A Figura 3 resume as alterações presentes na SAM. Tratamento - Na sala de parto Novas normas do Programa de Reanimação da SBP para sala de parto preconizam: 1. Papel do obstetra: a aspiração de vias aéreas feita pelo obstetra não é mais indicada, pois a metanálise mais recente mostrou que o procedimento não encontrou nível de evidência significativo que corroborasse seu uso. 2. Papel do pediatra segundo o Programa de Reanimação Neonatal: avaliar a vitalidade do RN. – chorando ou iniciou a respiração, tônus muscular em flexão, FC > 100 bpm? – casos de respiração irregular/ausente e/ou hipotonia e/ ou FC < 100 bpm. – colocar em calor radiante, e sob visualização direta da laringoscopia: aspirar boca e hipofaringe com sonda traqueal número 10 e aspirar traqueia com cânula endotraqueal. PNEUMONIA Os pulmões representam o sítio de estabelecimento mais comum da sepse neonatal. A natureza inespecífica de apresentação faz da suspeita clínica a chave para o diagnóstico precoce. A PRESENÇA DE TAQUIPNEIA, CIANOSE OU OUTROS SINAIS DE DESCONFORTO RESPIRATÓRIO SUGEREM O QUADRO PULMONAR. Em alguns casos, os sintomas respiratórios podem ser discretos, predominando quadro neurológico de intensidade variável, instabilidade térmica, apneia, distensão abdominal ou icterícia. O exame radiológico pode ser bastante diversificado, mostrando desde áreas de opacificação uni ou bilateral, até um padrão retículo-granular difuso com broncogramas aéreos, indistinguível do quadro de DMH. Distinguir pneumonia de taquipneia transitória é frequentemente uma tarefa difícil. Em razão da alta mortalidade da pneumonia bacteriana no RN, um alto grau de suspeição deve estar sempre presente nos RN com desconforto respiratório. Etiologia - Pneumonia bacteriana congênita: 1. Transmissão vertical transplacentária mãe-feto. 2. Infecção ascendente do trato genital — valorizar rotura de membranas por mais de 18 horas, não esquecendo que pode existir ascensão bacteriana para o feto mesmo com membrana amniótica íntegra e também que a colonização bacteriana quase sempre ocorre no momento do trabalho de parto vaginal. 3. Gasping durante o nascimento, resultante de processo asfíxico, pode predispor a aspiração de líquido amniótico contaminado. - Pneumonia adquirida: Após admissão na UTI neonatal, o risco de pneumonia adquirida será largamente influenciado pelas taxas de infecção relacionada à assistência em saúde de cada unidade neonatal. Estreptococo do grupo B 1. É o patógeno mais importante na pneumonia neonatal. 2. Adquirido através do trato genital durante o trabalho de parto, e, na ausência de profilaxia intraparto adequada, pode chegar à frequência de 1 a 4 por cada 1.000 nascidos vivos. 3. Os prematuros representam cerca de 1/3 dos bebês que apresentam bacteremia pelo estreptococo do grupo B. 4. Outras bactérias envolvidas na gênese da pneumonia bacteriana neonatal são: Escherichia coli, Klebsiella, Listeria, Ureaplasma e pneumococos. 5. Infecções tardias (mais de 7 dias): considerar pneumonia por Staphylococcus. 6. Pseudomonas e fungos. 7. Pneumonias virais não são frequentes no período neonatal, com exceção de surtos epidêmicos de vírus sincicial respiratório ou adenovírus, e em casos do grupo TORCH. Tratamento • Iniciar antibioticoterapia com AMPICILINA associada a um aminoglicosídio nos casos de início precoce (primeiras 72 horas de vida) e esquema adequado à microbiota prevalente específica de cada unidade neonatal para os casos de início tardio. Correlacionar os resultados das culturas e demais exames laboratoriais com a evolução clínica para avaliar o sucesso do esquema escolhido; • suporte hídrico e nutricional; • suporte ventilatório; • drenagens de efusões, se necessário. HIPERTENSÃO PULMONAR PERSISTENTE Descrita inicialmente como ―persistência da circulação fetal‖ por Gersony e Sinclair em 1969,26 a hipertensão pulmonar persistente do recém-nascido (HPPRN) geralmente é DECORRENTE DE UMA DESORDEM DO PROCESSO DE TRANSIÇÃO CIRCULATÓRIA DA VIDA FETAL PARA NEONATAL CARACTERIZADA POR MANUTENÇÃO DA RVP ELEVADA, EM GERAL ASSOCIADA A RESISTÊNCIA VASCULAR SISTÊMICA (RVS) NORMAL OU DIMINUÍDA. ISSO LEVA A SHUNT EXTRAPULMONAR DA DIREITA PARA A ESQUERDA ATRAVÉS DO CANAL ARTERIAL E FORAME OVAL, OCASIONANDO HIPOXEMIA. Pode ser secundária a doenças do parênquima pulmonar (SAM, síndrome do desconforto respiratório, pneumonia), desenvolvimento alterado da vascularização pulmonar, hipoplasia pulmonar ou obstrução vascular por policitemia com hiperviscosidade. O estímulo mais importante para promover a vasodilatação pulmonar parece ser a ventilação e o aumento da concentração alveolar de oxi- gênio. A produção de ON no endotélio pulmonar também au- menta de forma acentuada ao nascimento. O fluxo sanguíneo pulmonar aumenta, o que eleva a pressão no átrio esquerdo e fecha o forame oval. Incide em 0,4 a 6 de cada 1.000 nascidos vivos, sendo mais comum em RN a termo, pré- termo tardio e pós-termo. Muitas vezes, é refratária ao tratamento e associada a uma mortalidade que varia de 4 a 33%. Do ponto de vista fisiopatológico, existem duas formas de HPPRN, uma funcional, em que o aumento da RVP é decorrente somente da vasoconstrição arteriolar pulmonar, e outra orgânica, em que a vasoconstrição é causada por alterações estruturais no leito vascular pulmonar. A forma funcional idiopática é considerada como expressão de fatores constitucionais e genéticos que aumentam a sensibilidade das arteríolas pulmonares aos estímulos vasoconstritores, ou dificultam a ação vasodilatadora do ON endógeno. Na forma funcional secundária, a maior parte dos casos está associada à asfixia (80 a 90%) e sepse, quer pela ação vasoconstritora direta da hipóxia e acidose, ou indiretamente, pela liberação de substâncias vasoativas (leucotrienos, endotelina, tromboxane, radicais livres). Quando o processo asfíxico é prolongado, pode desencadear hipertrofia da parede muscular arteriolar. Entre as doenças parenquimatosas pulmonares associadas à asfixia perinatal, a mais frequentemente observada na HPPRN é a SAM, na qual a endotelina e a urotensina desempenham papel importante como poderosos agentes vasoconstritores pulmonares. Na forma orgânica, temos a hipertrofia da parede muscular arteriolar pulmonar idiopática ou secundária a eventos patológicos durante a gravidez, como a hipóxia crônica acentuada, o fechamento intraútero do canal arterial por uso de medicamentos na gestante (indometacina, salicilatos, lítio) e o uso de antidepressivos inibidores da recaptação da serotonina durante a gravidez. Outro tipode forma orgânica é o baixo grau de desenvolvimento do leito vascular pulmonar, típico da hipoplasia pulmonar associada à hérnia diafragmática congênita que, além da densidade reduzida de vasos, apresenta reatividade vascular aumentada aos estímulos vasoconstritores associados com a redução da ação da ON sintetase e a produção elevada de endotelina. Recém-nascidos de parto cesariano correm um risco cinco vezes maior de desenvolver HPPRN. A corioamnionite aumenta em três vezes o risco. A exposição in utero à aspirina aumenta o risco em cinco vezes, e a exposição a anti-inflamatórios não hormonais aumenta em seis vezes. O aumento do risco de HPPRN pelo uso de antidepressivos inibidores da recaptação da serotonina ainda é controverso, mas o uso dessas drogas na segunda metade da gravidez deve levar em consideração o risco-benefício em relação ao bem-estar materno e a possibilidade até seis vezes maior de desenvolver HPPRN. O uso de oxigênio em altas concentrações pode aumentar a resistência pulmonar pelo aumento do estresse oxidativo. Uma diferença da PaO2 ou oximetria avaliadas no pré-ductal (membro superior direito) e pós-ductal (membro inferior) é altamente sugestiva de HPPRN. Um gradiente maior que 20mmHg na PaO2 ou maior que 5 a 10% na oximetria sugere um shunt direito-esquerdo, responsável pela hipóxia nas crianças com HPPRN. Sempre que houver uma hipoxemia desproporcional à gravidade da doença primária pulmonar, deve-se considerar o diagnóstico de HPPRN. Os sintomas aparecem dentro das primeiras horas de vida. As crianças costumam ser extremamente lábeis a qualquer tipo de manuseio. Podem-se observar alterações cardíacas secundárias a isquemia, com disfunção do músculo papilar, regurgitação da mitral e tricúspide, e até mesmo choque cardiogênico, levando a diminuição do fluxo sanguíneo pulmonar, da perfusão tecidual e da oferta de oxi- gênio. A ECOCARDIOGRAFIA COM DOPPLER É CONSIDERADA O PADRÃO- OURO PARA O DIAGNÓSTICO DE HPPRN E PARA AFASTAR A POSSIBILIDADE DE CARDIOPATIA CONGÊNITA. O estudo de fluxo pelo Doppler de- monstra a direção do fluxo através do forame oval. Tratamento O manuseio da HPPRN evoluiu muito nas duas últimas décadas. O foco mudou de hiperoxigenação-hiperventilação-alcalose para estratégias de ventilação gentil a fim de otimizar o recrutamento pulmonar e minimizar barotrauma, volutrauma e efeitos tóxicos do oxigênio, associado a hipercapnia permissiva e o uso terapêutico do surfactante e do ON. A severidade da doença pode variar de hipoxemia leve com discreto desconforto respiratório até hipoxemia grave com instabilidade cardiorrespiratória. Suporte nutricional adequado, redução de ruídos e luminosidade, correção de distúrbios metabólicos, manutenção da normotermia, mínimo manuseio de analgesia e se- dação, se necessário, são a base inicial para o tratamento. Hiperventiliação e infusão de bicarbonato de sódio devem ser evitados, em razão dos efeitos adversos na perfusão cerebral e risco aumentado de surdez sensorioneural. Se uma pressão inspiratória maior que 28 cmH2O ou volume corrente maior que 6 mL/kg são necessários para manter a PaCO2 abaixo de 60 mmHg em ventilação convencional, recomenda-se mudar para a ventilação de alta frequência. O uso de óxido nítrico inalado (iNO) tem efeito direto e seletivo na vasculatura pulmonar, pois, uma vez na circulação, liga-se à hemoglobina formando meta-hemoglobina e sendo inativado. Sua ação se dá pelo aumento do GMP cíclico na parede arteriolar. Vários estudos têm mostrado uma melhora clínica significativa na oxigenação de crianças com HPPRN e uma importante redução no uso do ECMO e na mortalidade. Deve-se considerar o uso de iNO para os RN com mais de 34 semanas de idade gestacional e diagnóstico de HPPRN que persistem com hipoxemia após medidas gerais, suporte hemodinâmico e ventilação adequados. A dose inicial recomendada é de 20 ppm. A expectativa é de uma melhora na oxigenação em torno de 20% com 30 a 60 minutos do início da terapia. Aproximadamente 70% dos pacientes tratados mostram um aumento de 20 mmHg na PaO2 . O desmame deve ser iniciado quando a PaO2 estiver maior ou igual a 60 mmHg com uma FiO2 menor que 60%. Reduzir 5 ppm a cada 4 horas até atingir 5 ppm. Depois reduzir 1 ppm a cada 2 ou 4 horas, até a retirada completa, de acordo com a resposta clínica e laboratorial. Se o ON não melhorar a hipoxemia e a pressão arterial estiver estável, considere o uso de inibidores da fosfodiesterase 5. O sildenafil endovenoso é administrado em uma dose de ata- que de 0,42 mg/kg em 3 horas, seguido de uma dose de manutenção de 1,6 mg/kg/dia em infusão contínua (0,07 mg/ kg/h). A prostaciclina (PGI2, Iloprost) também pode ser utili- zada por via inalatória (1 a 2,5 µg/kg a cada 2 ou 4 horas) ou por via endovenosa (0,5 a 3 ng/kg/min). Se a pressão arterial está normal, mas existem evidências de disfunção ventricular, a milrinona pode ser a droga de escolha. Ela atua inibindo a fosfodiesterase 3, aumentando a concentração de AMP cíclico na musculatura lisa pulmonar e sistêmica além da musculatura cardíaca. Utiliza-se uma dose de ataque de 50 µg/kg em 30 a 60 minutos, seguida de uma dose de manutenção de 0,33 µg/kg/min (que pode chegar gradativamente até 1 µg/kg/min, de acordo com a resposta clínica). A dose de ataque não é recomendada na presença de hipotensão arterial. Uma etapa rápida em bolo de 10 mL/kg de Ringer lactato ou soro fisiológico antes da dose de ataque pode minimizar o risco de hipotensão. Em presença de hipotensão sistêmica mas com função cardíaca preservada, uma ou duas etapas expansoras em bolo (10 mL/kg de Ringer lactato ou soro fisiológico), seguidas de infusão de dopamina, norepinefrina ou vasopressina estão recomendadas. Se o uso de altas doses de vasopressores é necessário, considerar o uso de hidrocortisona se não houver infecção concomitante. O uso de sedativos e analgésicos é de grande importância e deve ser realizado de forma individualizada. O uso de surfactante, dependendo da doença parenquimatosa de base, pode atuar no recrutamento alveolar e, consequentemente, melhorar a oxigenação. Existem evidências de uma redução de L- arginina em RN com HPP quando comparada com outras causas de insuficiência respiratória grave. A infusão de L-arginina, um precursor do ON, tem como objetivo aumentar a sua formação. A adenosina causa vasodilatação pulmonar seletiva quando infundida venosa em baixas doses, pois é rapidamente captada e inativada pelo endotélio vascular pulmonar. Principais patologias respiratórias no período neonatal: • Doença de membrana hialina (DMH); • taquipneia transitória do recém-nascido (TTRN); • síndrome de aspiração meconial (SAM); • pneumonia; • hipertensão pulmonar persistente (HPP). CIANOSE A cianose corresponde a uma coloração azulada da pele e decorre da concentração elevada de hemoglobina reduzida – não ligada ao oxigênio – no sangue periférico. Concentrações acima de 5 g/dL de hemoglobina reduzida são capazes de gerar cianose. Esse detalhe é interessante e tem implicação clínica: para um mesmo grau da doença, é mais provável que um indivíduo com poliglobulia fique cianótico do que um paciente com anemia. Como denota uma coloração anormal do sangue, geralmente é mais bem avaliada nos segmentos periféricos e em mucosas. Dois fatores concorrem para o surgimento de cianose: deficiência em oxigenar o sangue no território capilar pulmonar, padrão conhecido como CIANOSE CENTRAL e, extração periférica excessiva de oxigênio, denominada CIANOSE PERIFÉRICA. A CIANOSE CENTRAL pode ser consequência de vários tipos de doenças pulmonares graves e de determinadas malformações vasculares e cardíacas que desviamo sangue da direita para a esquerda, o que é denominado shunt direito-esquerdo. A CIANOSE PERIFÉRICA pode decorrer de redução da velocidade do fluxo sanguíneo na periferia, com aumento da extração de oxigênio pelos tecidos, como visto nas tromboses arteriais ou venosas e nos estados de choque. Uma forma de diferenciar os dois tipos, é a extensão da cianose: enquanto a CENTRAL costuma ser identificada tanto na pele quanto nas mucosas, a PERIFÉRICA geralmente poupa as mucosas oral e labial. A cianose central habitualmente melhora com a administração de oxigênio, ao contrário da periférica. Outra forma de classificar a cianose é o local de manifestação. Assim, podemos encontrar dois padrões: cianose localizada – restrita a um segmento corpóreo – e cianose generalizada – acometimento difuso. É necessário cuidado para não confundir a classificação fisiopatológica com a distribuição da cianose: toda cianose central é generalizada, no entanto, nem toda cianose generalizada é central, pois pode ser vista também na periférica. Na presença de cianose, é necessário estimar a saturação de hemoglobina com oxigênio por meio de oxímetro de pulso e gasometria arterial. Algumas vezes, podem ser necessários radiografias, estudos do fluxo sanguíneo e provas de função pulmonar e cardíaca para determinar a causa da cianose. O tratamento será sempre dirigido à causa-base. Uma situação interessante, que por vezes intriga o clínico, é a de um paciente com cianose, mas sem hipoxemia identificada na gasometria arterial: a meta-hemoglobinemia. O distúrbio acontece por um estado alterado da hemoglobina, com o íon ferroso tornando-se oxidado a íon férrico, que é incapaz de ligar-se ao oxigênio. Assim, a curva de dissociação da hemoglobina é desviada para a esquerda, para tentar aumentar a afinidade da hemoglobina pelo oxigênio, mas a liberação tecidual do gás é reduzida. Há redução do conteúdo de oxigênio no sangue. Níveis de até 3% de meta-hemoglobina são considerados normais; pacientes com a doença crônica, mesmo com níveis próximos de 50%, podem ser assintomáticos, sendo cianose a única queixa. Quando aguda, surgem dispneia, letargia, cefaleia e fadiga, ou quadros mais graves, com convulsões, choque e coma. O grande problema diagnóstico da meta-hemoglobinemia. Para o diagnóstico, deve-se usar a espectrofotometria, que determina as concentrações de hemoglobina, oxi-hemoglobina, meta-hemoglobina e carboxi-hemoglobina. Pode- se inferir o diagnóstico, também, ao avaliar o sangue coletado, geralmente de aspecto marrom- chocolate. A doença pode ser hereditária ou estar associada a exposição a medicamentos – antimaláricos, nitratos, paracetamol, lidocaína –, substâncias industriais – naftaleno, nitrotolueno etc. –, alimentos em conserva – por conter nitrato e nitrito de sódio – etc. O tratamento é feito com azul de metileno na dose de 0,1 a 0,2 mL/Kg IV, por 5 minutos.
Compartilhar