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Historia e Historiografia da Educacao

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Prévia do material em texto

História e Historiografia 
da Educação no Brasil
Organizadoras
Cynthia Greive Veiga 
Thais Nivia de Lima e Fonseca
História e Historiografia 
da Educação no Brasil
1 ª edição 
1“ reimpressão
Copyright © 2003 by os autores
CAPA
Jairo Alvarenga Fonseca
(Sobre Uma senhora brasileira em seu lar. Ilustração: Jean-Baptiste Debret)
EDITORAÇÃO ELETRÔNICA
Waldênia Alvarenga Santos Ataíde
REVISÃO
Rosemara Dias
Vera Lúcia DeSimoni Castro
Fonseca, Thais Nívia de Lima e
F676h História e Historiografia da Educação no Brasil /Thais Nivia de Lima 
e Fonseca, Cynthia Greive Veiga . — 1. ed. 1. reimp. — Belo Horizonte: 
Autêntica, 2008.
288 p.
ISBN 978-85-7526-108-8
l.História-estudo e ensino. 2.Educação-História- Brasil. I.Título.
CDU 930.1
37(81X091)
2008
Todos os direitos reservados pela Autêntica Editora. 
Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida, seja 
por meios mecânicos, eletrônicos, seja via cópia xerográfica 
sem a autorização prévia da editora.
Autêntica Editora
Rua Aimorés, 981, 8° andar - Funcionários - 30140-071 
Belo Horizonte - MG - Tel: (55 31) 3222 6819 
www.autenticaeditora.com.br
http://www.autenticaeditora.com.br
Sumário
Apresentação....................................................................................... 7
1 • parte - Abordagens, conceitos, metodologias.............................. 11
História Política e História da Educação 
Cyntftia Greive Veiga...................................................................... 13
História da Educação e História Cultural 
Tte N ivia de Lima e Fonseca......................................................... 49
O processo de escolarização em Minas Gerais: 
questões teórico-metodológicas e perspectivas de análise
Luciíino Memtes de Farw Filho...................................................... 77
2* parte - Diálogos e interfaces.............................................................. 99
Imaginário científico e a História da Educação 
Bernardo lefferson de Oliveira........................................................101
História da Psicologia e História da Educação - conexões 
RfíjiMO HdfHO de Freitas Campos................................................ 129
3* parte - Campos de investigação: 
A História da Educaçào no Brasil...........................159
Manuais escolares e pesquisa em História
Amo Mario de Oliveira Galvão 
Antônio Augusto Gomes Batista.....................................................161
A escolarização da "meninice" nas Minas oitocentistas: 
a individualização do aluno
Maria Cristina Soares de Gouvêa.................................................. 189
História da alfabetização: perspectivas de análise 
Francisco Izabel Pereira Maciel....................................................227
Última década do oitocentos, primeira década da
Cymnastica na formação do professorado mineiro
Eustáquia Salvadora de Sousa 
Tarcísio Mauro Vago.......................................................................253
S AUTORES....................................................................................285
Apresentação
Leopoldo Pereira, em artigo da Revista do Ensino, de Minas Ge­
rais, por ocasião da comemoração do primeiro centenário do ensino 
primário no Brasil (outubro de 1927), narra suas memórias da época da 
"escola de antigamente"e vai dizendo,
o aprender era então um trabalho áspero, que as animadas gerações 
modernas não conhecem, e a escola o terror da meninada, porque o 
símbolo da autoridade do mestre era a palmatória. Na sala da esco­
la, bem a vista, pendurada de um prego na parede, lá estava ela todo 
ano desaparecendo só no período de férias, como vou contar:
Não se compreendia então a escola sem o castigo corporal: a féru- 
la era para o mestre como o cetro para o rei ou o cajado para o 
pastor. Até nas aulas de latim e francês, que nossas principais ci­
dades possuíram durante muitos anos, corria bem aceito o axio­
ma que o latim, quando não entra pelos olhos e ouvidos, devia 
entrar pelas unhas.
Na escola primária a palmatória chamava-se santa luzia. Por que 
este nome? Como se sabe, a crença popular venera Santa Luzia 
como a advogada da vista, e nossos pais entendiam que a férula é 
que devia dar aos cegos.
No dia do exame, a que compareciam as pessoas gradas do lugar, 
depois do café com biscoitos, em que a mestra se esmerava, a me­
ninada alegre e radiante se apoderava da palmatória e levava-a 
pelas ruas entre vaias e canções para solenemente a enterrar. Este 
enterro era uma das festas da aldeia, e toda a gente acudia às 
portas e janelas para ver passar o ruidoso préstito na satisfação de 
uma justa vingança. Mas, como a alegria é precária e enganadora 
na vida, não estava longe o primeiro dia de aula do ano seguinte 
e o desenterro também solene, mas já sem manifestações de pra­
zer, do amaldiçoado instrumento de suplício?
1 Revista do Ensino. Belo Horizonte: Estado de Minas Gerais, ano III, n.23, out. 1927, p. 525.
7
História e Historiografia da Educação no Brasil
Sabemos que a educação não se resume na experiência escolar e 
que também a escola é algo recente na história da sociedade brasileira. 
Entretanto, uma coisa é certa, sob as mais diferenciadas formas, na re­
lação entre os mais diferenciados sujeitos, em tempos e lugares distin­
tos, como dizia Carlos Rodrigues Brandão: "da educação ninguém es­
capa". Dessa maneira, podemos dizer que também ninguém escapa de 
uma história da educação, uma vez que somos todos sujeitos dela, de 
uma maneira ou de outra, freqüentando ou não a escola, nos cultos, 
nas igrejas, nas festas, na família, nas ruas, na roça, na cidade, com ami­
gos... Para nós, historiadores da educação, uma constatação evidente é 
a de que investigar os processos do aprender é fundamental para am­
pliarmos a compreensão das formas de como em tempos e espaços dis­
tintos, homens e mulheres organizaram sua vida, seus fazeres e suas 
idéias, enfim, seu modo de ser e estar no mundo.
Entretanto, sendo a educação um objeto da História de tão largo 
alcance, como estabelecer as inteligibilidades de suas especificidades e 
diferenças no tempo?Ou melhor, como produzir a educação como um 
objeto da História? Contribuir para essa discussão é o objetivo deste li­
vro que reúne pesquisadores do Centro de Alfabetização, Leitura e Es­
crita (CE ALE) e do Grupo de Estudos e Pesquisas em História da Educa­
ção (GEPHE) da Faculdade de Educação da Universidade Federal de 
Minas Gerais.2 O GEPHE, em funcionamento desde 1998, coordenado 
pelo professor Luciano Mendes de Faria Filho e composto por bolsistas 
de iniciação científica, mestrandos, doutorandos e professores de áreas 
distintas, vem possibilitando a ampliação dos debates sobre o fazer his- 
toriográfico no campo da história da educação. Por meio dessa produ­
ção, tem sido possível problematizar a educação em diferentes tempos 
históricos, em espaços escolares ou não, baseando-se em diferentes te­
mas (o corpo, o aluno, a leitura, as disciplinas escolares, a cidade, insti­
tuições, métodos de ensino, estatística, ofícios, materiais escolares, sabe- 
res...), em diferentes sujeitos (a criança, a mulher, o negro, o indígena, o 
aluno, o professor, os dirigentes escolares...), de diferentes fontes docu­
mentais (imprensa, periódicos, relatórios oficiais, correspondências, 
manuais escolares, inventários, livros de leitura, imagens...) e em dife­
rentes abordagens teórico-conceituais. Neste livro, apresentamos um pou­
co do que temos discutido e também produzido individualmente e como 
grupo. Para isso, organizamos os capítulos em três agrupamentos.
2 As pesquisas desses grupos contam com financiamento da FAPEM1G, do CNPq e da CAPES.
8
Apresentação
No primeiro, estão presentes os estudos que centram suas análises 
nas abordagens teórico-metodológicas da historiografia contemporâ­
nea e em discussões conceituais mais gerais da historiografia da educa­
ção. É dessa maneira que Cynthia Greive Veiga, no texto "História Po­
lítica e História da Educação",problematiza as dinâmicas políticas 
componentes do processo de escolarização da sociedade brasileira, seja 
através das discussões presentes na chamada "nova história política", 
seja através de estudos de campos conceituais possíveis de análise, com 
destaque para Norbert Elias. Thais Nivia de Lima e Fonseca, em "His­
tória da Educação e História Cultural", apresenta uma reflexão sobre o 
lugar da História da Educação no conjunto da historiografia e suas re­
lações com as possibilidades de abordagens apresentadas pela Histó­
ria Cultural. Luciano Mendes de Faria Filho aborda um dos campos 
mais férteis da historiografia contemporânea da Educação, o dos pro 
cessos de escolarização, por meio da análise conceituai da cultura esco­
lar, no texto "O processo de escolarização em Minas Gerais: questões 
teórico-metodológicas e perspectivas de análise".
O segundo conjunto de textos analisa as interfaces de outros co­
nhecimentos com a história da educação, demonstrando as possibili­
dades da abertura do diálogo com outros saberes. Bernardo Jefferson 
de Oliveira, em "Imaginário científico e a História da Educação", ex­
plora o entrecruzamento entre a historiografia das ciências e a historio­
grafia da educação, mediado pelas discussões sobre modelos de co­
nhecimento científico. No capítulo, "História da Psicologia e História 
da Educação - conexões", Regina Helena de Freitas Campos examina, 
valendo-se da história da psicologia, a interferência desse saber na or 
ganização do campo pedagógico.
Finalmente, o terceiro conjunto de textos analisa os procedimen­
tos metodológicos possíveis no estudo de diferentes temas da educa­
ção como objetos da história: manuais escolares, alfabetização, infância 
e a educação física. São textos que descortinam parte da vasta docu­
mentação existente em nossos arquivos, priorizando pesquisas realizadas 
no âmbito de Minas Gerais. Ana Maria de Oliveira Galvão e Antônio Au­
gusto Gomes Batista, em "Manuais escolares e pesquisa em História" 
ressaltam a importância da discussão sobre as fontes de investigação, 
sua natureza, as possibilidades de problematização e de abordagem, 
com base na análise dos manuais escolares. A percepção da infância 
como construção histórica c cultural, seu aparecimento como objeto de 
investigação na historiografia contemporânea e alguns indicativos para 
a pesquisa no Brasil fundamentam o texto "A escolarização da meninice 
9
História t Historiografia da EducaçAo no Brasil
nas Minas Geais oitocentistas: a individualização do aluno", de Maria 
Cristina Soares de Gouvêa. No texto "História da Alfabetização: pers­
pectivas de análise", Francisca Izabel Pereira Maciel procura, por meio 
de estudos sobre a história da alfabetização, analisar as características 
fundamentais desse campo de investigação, bem como apontar algu­
mas de suas principais tendências. Por fim, Eustáquia Salvadora de 
Sousa e Tardsio Mauro Vago, no texto "Última década do oitocentos, 
primeira década da Gymnastica na formação do professorado mineiro", 
mergulham na história escolar da Educação Física, explorando rica 
documentação que permite vislumbrar parte do processo de escolari- 
zação dessa disciplina em Minas Gerais.
Este livro, além de representar o esforço de reunião de trabalhos 
que resultam do amplo debate que viemos realizando como grupo de 
pesquisa nos últimos anos, pretende ser também um instrumento de 
retlexão para a comunidade de historiadores que, tendo ou não a edu­
cação como seu principal objeto de investigação, se interessem pela 
multiplicidade de suas faces, possíveis de serem percebidas não so­
mente no universo escolar, mas também para além dele. É, pois, com 
satisfação, que o apresentamos.
As organizadoras
10
História Política e História da Educação
Cynthia Greive Veiga
Os historiadores, na permanente busca de como produzir os "pro­
tocolos de verdade"1, há décadas vêm indicando para novos procedi­
mentos da escrita da História ao se desfazerem dos esquemas explicati­
vos, das certezas e racionalidades que predominaram na historiografia 
do século XIX e parte do século XX. O tema deste capítulo compartilha 
com este movimento, tendo como objetivo principal discutir os refe­
renciais teórico-metodológicos da chamada "nova história política" na 
perspectiva de contribuir para a ampliação das problematizações da 
educação como objeto histórico e, mais particularmente, da escola como 
um problema também do campo político. O que se pretende é, a partir 
de um diálogo com as formulações teórico-conceituais de história polí­
tica, precisar melhor o lugar do político e da política no momento do 
desenvolvimento da escolarização, em específico, no século XIX.
1 FALCON, 2002.
2 BURKE, 1992, p. 8.
Não se está compreendendo aqui a história política como uma com- 
partimentação a mais da história, mas como uma modalidade da práti­
ca social que demanda referencial teórico para dar intelegibilidade às 
relações de forças presentes nas sociedades em diferentes tempos e lu­
gares. Por outro lado, também não se está compreendendo a política 
como a última instância, ou instância única de explicação da socieda­
de. É preciso aceitar a provocação de Burke (1992), ao se referir à crise 
de identidade presente na historiografia: "se a política está em toda 
parte, será que há necessidade da história política?".1 2
Também não se pretende inaugurar uma nova modalidade de fron­
teiras, história da educação e história política, cabe, entretanto, pergun­
tar qual a natureza destas relações, entre temas/objetos e procedimento 
13
História e Historiografia da Educação no Brasil
teórico-metodológico ou entre campos de conhecimento e formulações 
conceituais metodológicas?
Ainda para precisar melhor as questões conceituais e metodológi­
cas da nova história política, será necessário interrogar sobre as relações 
entre esta e a história cultural, tendo-se em vista, principalmente, a uti­
lização de seus referenciais teóricos pelos historiadores da educação.
Para as discussões das questões aqui propostas, tomo como referen­
cial principal as reflexões de Peter Burke (2002) relativas às relações entre 
história, teorias, modelos e conceitos. Segundo este autor, "poucos histo­
riadores utilizam teoria no sentido estrito do termo, mas um número 
bem maior emprega modelos, enquanto os conceitos são praticamente 
indispensáveis."' Burke salienta ainda a necessidade do uso e explicita­
ção destes instrumentos de análise, mas também a especificidade da His­
tória em relação a eles. Destaca, por exemplo, a inaplicabilidade das teo­
rias sociais ao passado, pois os historiadores se utilizam delas mais para 
sugerir novas questões ou novas respostas a perguntas já bastante co­
nhecidas. Também observa que conceitos como cultura e poder, entre 
vários outros, devem ser tratados como problema e não como premissa. 
Finalmente, como questão fundamental, o historiador não pode perder 
de vista o seu objeto principal: as diferenças e mudanças ocorridas nas 
sociedades em lugares e tempos diversos.
Apresentadas as considerações iniciais, este capítulo pretende in­
dicar possíveis percursos teórico-conceituais do campo político que 
permitam problematizar a escola como inserida em relações de forças 
que objetivaram algo inusitado a partir do século XIX: a extensão do 
saber ler e escrever à grande parte da população livre brasileira.3 4 Antes 
de mais nada, é importante esclarecer como estão sendo entendidas 
aqui as relações entre história da educação e história política.
3 BURKE, 2002, p. 11.
4 De acordo com a Constituição de 1824, a interdição da escola elementar referia-se à condi­
ção jurídica (ser escravo).
A ainda problemática 
definição da história da educação
O debate aberto pelos historiadores dos Annales a respeito de no­
vos problemas, novas abordagens e novos objetos, indicou para uma 
abrangência de formulações e uma polifonia alargada nas formas de 
14
História Política e História da Educação
pensar e fazer história. Qual o lugar da históriada educação neste de­
bate? Na ordem dos problemas relativos a especificações, poderiamos 
pensar como Burke em relação a história política, se tudo é educação 
ou se a educação está em toda parte, será que há necessidade de uma 
história da educação? De imediato, afirmo serem profundas as diferen­
ças entre histórias e histórias de, em especial quando se trata da educa­
ção. Para essa discussão, seria interessante observar a maneira como 
vem sendo compreendido um diálogo mais consolidado, entre a histó­
ria da educação e a história cultural, mais no sentido de apresentar 
alguns problemas do que desenvolver questões mais aprofundadas.5
5 Veja neste livro o capítulo de Thais Nivia de Lima e Fonseca.
6 LYNNHUNT, 1992, p. 9.
7 NUNES e CARVALHO, 1992, p. 2.
8 LYNN HUNT, 1992, p. 12.
9 FRAGO, 1995, p. 64 (grifos meus).
10 LYNN HUNT, 1992, p. 13.
A chamada nova história cultural, de maneira bastante genérica, 
se distingue de outras abordagens por considerar "as relações econô­
micas e sociais como campos da prática cultural e produção cultural".6 
Segundo Hunt (1992), não é uma especialização da história e nem pro­
põem apenas um novo conjunto de temas para investigação, mas se 
apresenta como uma formulação téorico-metodológica. Nunes e Car­
valho (1992) observam que a produção do diálogo entre a história cul­
tural e a história da educação se deve em muito pelo fato da história 
cultural investigar "temas e objetos até então muito recentemente, prin­
cipalmente entre nós, como exclusivos de história da educação".7 Hunt 
(1992), por sua vez, afirma que Furet e Damton alertaram para o pro­
blema de desenvolvimento de uma história cultural definida apenas 
em termos de temas de pesquisa.8 9 
Outro autor, Frago (1995), na explicitação de seu estudo sobre as 
relações entre história da educação e história cultural, afirma que o seu 
trabalho "... pretende explorar algumas das possibilidades da história 
cultural em relação com a história da educação, outro fragmento a mais 
desta história parcelada”!9 Lynn Hunt (1992) apresenta uma questão, que 
para os propósitos deste texto é fundamental:
Onde estaremos quando todas as práticas sejam elas econômicas, 
intelectuais, políticas ou sociais, revelarem ser culturalmente con­
dicionadas?10
15
História e Historiografia da Educação no Brasil
O autor salienta que não há como fazer história cultural sem dis­
cussão teórica sobre as relações entre cultura e sociedade. É este apro­
fundamento teórico, em diálogo com outros campos de conhecimento, 
que nos permite produzir, como historiadores, a visibilidade das dife­
renças das várias formas de manifestações humanas e dar-lhes inteligi­
bilidade no tempo e espaço.
Atentos a essas observações, entendemos que as relações entre his­
tória da educação e história cultural não se estabelecem como partes de 
fragmentos de uma história parcelada, como quer Frago (1995), pois 
ambas são de naturezas distintas. A história cultural é um método, uma 
concepção de abordagem, ao passo que a história da educação tem sido 
compreendida como uma '"especialização" da história. Entretanto ob­
serva-se que não há um consenso sobre os procedimentos de adjetiva- 
ções da História, tendo em vista o desenvolvimento de instrumentos cada 
vez mais refinados para analisar os problemas humanos do passado e do 
presente. Por outro lado, tais procedimentos possuem uma historicida- 
de, além de identificarem lugares e competências acadêmicas.
De forma bastante sumária, pretende-se resgatar o movimento 
definidor das "especializações" da História, no sentido de organizar 
o entendimento das distinções entre problemas, abordagens e objetos 
da História. A história da educação, cuja origem e designação já fo­
ram amplamente desenvolvidas por alguns autores11, se estabeleceu 
no campo acadêmico com o estatuto de especialização da História. 
José Honório Rodrigues (1978), em Teoria da história do Brasil, cuja pri­
meira edição data de 1948, afirma, em sintonia com as discussões da 
época, que "O historiador de certos gêneros... não só mutila a unida­
de global da vida, como a vida histórica é ferida na unilateralidade 
de visão"11 12. Segundo este autor, a organização dos diversos gêneros 
ou especializações da História é herança das práticas classificatórias 
da botânica desenvolvidas por Lineu, revelando-se de forma infinita. 
Rodrigues (1978) afirma também que, no Brasil, esta prática foi regis­
trada primeiramente no "Catálogo de Exposição da História do Bra­
sil", de 1883, abarcando algumas especializações, que o autor amplia, 
levando em consideração as produções históricas de seu tempo. Na 
proposição de Rodrigues (1978), a história da educação é componente 
de um "ramo" da História por ele denominado de "História cultural, 
11 LOPES e GALVÀO (2001), NUNES e CARVALHO (1997), entre outros.
12 RODRIGUES, 1978, p. 145.
16
História Política e História da Educação
intelectual e das idéias"13 Observa-se que a classificação de Rodrigues 
se faz pelos diferentes temas e objetos em coerência com a sua concepção 
da existência de um método único de investigação histórica, cuja especi­
ficidade se reporta na análise documental. Por outro lado localiza a his­
tória da educação a partir dos estudos sobre a organização escolar e idéias 
pedagógicas, como objetos privilegiados de análise.
Em um outro lugar, Le Goff e Pierre Nora organizaram em 1974 a 
obra Novos problemas, novas abordagens e novos objetos, com o objetivo de 
sistematizar o desenvolvimento da historiografia. Esta obra não trata 
de "especializações" da História, no sentido classificatório de Lineu, 
mas trata de problemas, propondo questões teórico-metodológicas, de 
novas abordagens, indicando os diálogos conceituais com campos de 
conhecimento distintos, e de novos objetos de investigação. Observa- 
se que a educação não está presente em nenhum item; isto talvez por­
que sua identidade ainda estivesse colada à sua origem como discipli­
na escolar ou como "especialização" da História, relacionada às "velhas 
abordagens" da história das idéias pedagógicas. Por outro lado, Philli- 
pe Ariès investigou os colégios do Antigo Regime, a partir de um "novo 
objeto": as mentalidades.* 13 14
13 Além de história da educação compõem este "ramo": história literária e científica, a artísti­
ca, a da música, a da imprensa e opinião pública, a história da História e as histórias das 
idéias econômicas, sociais e políticas (RODRIGUES, 1978, p. 149).
14 LE GOFF e NORA, Novos Objetos, tradução brasileira, 1976.
Ainda como exemplo dos movimentos de explicitação de proble­
mas, abordagens e objetos da história, podemos analisar a estrutura do 
livro "Domínios da História", organizado por Cardoso e Vainfas (1997). 
Esta obra também se organiza em três itens, (evidentemente incorpo­
rando os avanços da historiografia desde a publicação de Le Goff e 
Nora), quais sejam: Territórios do Historiador: Áreas, Fronteiras e Dile­
mas (História das Mentalidades e História Cultural); Campos de inves­
tigação e linhas de pesquisa (História Agrária, História Urbana, Histó­
ria das Paisagens, História Empresarial, História da Família e Demografia 
Histórica, História do Cotidiano e da Vida Privada, História das Mulhe­
res, História e Sexualidade, História e Etnia, História das Religiões e Re­
ligiosidade); Modelos teóricos e novos instrumentos metodológicos: al­
guns exemplos (História e modelos, História e análise de textos, História e 
imagens, História e informática). Também, nesta obra, a educação não está 
presente, considerando-se, principalmente, o amplo desenvolvimento das 
pesquisas desta área nas décadas de 80 e 90. Nossa hipótese é que o 
problema não reside apenas na questão das disputas acadêmicas, mas 
17
História e Historiografia da EducaçAo no Brasil
talvez na maneira como os historiadores da educação continuam se 
auto-referindo: são historiadores de uma "especialização".
Isso se confirma na análise da estrutura de uma outra obra Historio­
grafia brasileira em perspectiva, organizadapor Freitas (1998). Para o mapea­
mento do campo da historiografia, o livro se organiza em duas partes: 
"Historiografia brasileira: os olhares sobre as fontes" (Aspectos da Histo­
riografia da Cultura sobre o Brasil Colonial; A sociedade brasileira e a his­
toriografia colonial; Sociabilidade sem história: votantes pobres do Impé­
rio; O Império da Revolução: matrizes interpretativas dos conflitos da 
sociedade monárquica; Escravidão negra em debate, o diálogo conver­
gente: políticos e historiadores no início da República; A historiografia da 
classe operária no Brasil: trajetórias e tendências; Anos 30 e política: histo­
riografia e história; Estado Novo: novas histórias) e a outra parte, "Histo­
riografia brasileira: novas fontes para novos olhares" (História das mulhe­
res: as vozes do silêncio; História e historiografia das cidades, um percurso; 
Sobre História, Braudel e os vaga-lumes; História que os livros didáticos 
contam, depois que acabou a ditadura no Brasil; Regionalismo e História 
da Literatura; A configuração da historiografia educacional brasileira, História 
dos intelectuais nos anos 50, a pintura e o olhar sobre si: Victor Meireles e 
a invenção de uma história visual no século XIX brasileiro; Iracema ou a 
fundação do Brasil). Para o organizador do livro, a historiografia da edu­
cação se localiza na segunda parte no objetivo de "trazer ao debate os 
processos de aquisição de novas fontes para a produção de novos olhares 
sobre o passado"15. Esta parte do livro apresenta dois desdobramentos: 
discussões relativas à configuração de "campos singulares na historiogra­
fia, como o de gênero, das artes e cidades"16, e "análises sobre a presença 
do conhecimento histórico na arquitetura teórica e metodológica de ou­
tros campos epistemológicos e disciplinares"17 , localizando aí a historio­
grafia da educação, com a seguinte questão:
15 FREITAS, 1998, p. 12.
16 Idem, p. 12.
17 Ibdem, p. 12.
18 Ibdem, p. 13
que configuração historiográfica confere (ou não) autonomia à 
história da educação em relação à história. É aquela um subcam- 
po desta?18
Observa-se que Marcus César Freitas, com este questionamento, apre­
senta-nos a confirmação de uma grande problemática no entendimento 
18
História Política e História da Educação
desta "especialização" da História. Pode-se discutir ainda que, apesar 
da consolidação recente da história da educação como campo de inves­
tigação científico, no Brasil, é pouco o diálogo entre historiadores e his­
toriadores da educação. Penso, como disse, que os problemas dessa 
ausência não se reduzem apenas a questões institucionais, mas ao pró­
prio entendimento da educação como objeto de investigação histórica. 
Sendo a educação um campo extremamente vasto de temáticas, não é 
possível tomá-la a partir de metodologias e conceituações únicas e muito 
menos como um subcampo ou especialização da História.
Retomando a questão da natureza das relações que estamos tratan­
do, a história da educação e a história política, afirmo serem estas rela­
ções caracterizadas como a relação entre um objeto, a educação e uma 
abordagem. Situo, portanto, a educação como objeto da História, aban­
donando definitivamente a possibilidade de uma história da educação 
como "especialização" da História, mesmo porque este tipo de classifi­
cação já foi renunciado pelos historiadores na medida em que rompeu- 
se com a idéia de um método único para a História. Por outro lado, a 
história da educação não se constitui enquanto abordagem por não pos­
suir referências teórico-conceituais próprias, se tomarmos o sentido da 
abordagem presente na obra de Le Goff e Nora (1976). A história da edu­
cação está sendo entendida aqui enquanto um campo de investigações 
em que se toma cada vez mais necessário dar visibilidade aos seus dife­
rentes objetos: a escola, o professor, os alunos, materiais escolares; proces­
sos e formas de aprendizagem, entre tantos outros. Nesse sentido, tam­
bém se toma cada vez mais necessário dar visibilidade aos procedimentos 
metodológicos e referenciais teóricos que produzem tais objetos como ob­
jetos da história cultural, política, econômica e social.
Finalizando esta ordem de questões, é preciso refletir, particular­
mente no Brasil, sobre o futuro de uma história que se escreve descon­
siderando-se as maneiras como as pessoas se educaram, bem como o 
futuro de uma história da educação, que se entende como apêndice ou 
reflexo da História. Portanto, não estamos indicando para uma relação 
entre história da educação e história política como relações entre "frag­
mentos da história", mas para a problematização de um tema da edu­
cação, a escola, a partir do referencial da nova história política.
E a história política?
Diferentes autores vêm ampliando as discussões relativas a uma 
"nova história política", mesmo que esta abordagem não tenha se 
19
História t Historiografia da EducaçAo no Brasil
consolidado como uma proposta metodológica clara, tal qual a "nova his­
tória cultural". Aliás, a tendência que se observa é mesmo a do entendi­
mento da história política a partir dos referenciais teóricos da história cul­
tural. Para escaparmos da armadilha da compreensão da história política 
como fragmento, nos valemos da afirmação de Burke (1992), relativo à 
impossibilidade de presumir que "as discussões econômicas, políticas e 
culturais em uma determinada sociedade necessariamente coincidam"19. 
Embora as manifestações e criações humanas possuam especificidades na 
produção de sua inteligibilidade, por não se coincidirem e por possuírem 
total autonomia, não podem ser tomadas como fragmentos.
Le Goff (1984) e Burke (2002), entre vários outros autores, observam 
que a historiografia que se consolidou no século XIX foi aquela caracteri­
zada pela narrativa dos eventos políticos, tendo como referência central o 
historiador alemão Leopoldo Van Rank. Burke (2002) e Furet (s.d.) afir­
mam que esta característica esteve relacionada ao contexto de formação 
dos Estados-nação, à organização da História como disciplina escolar na 
perspectiva pragmática da formação do cidadão, bem como na utilização 
dos registros oficiais para a escrita da História, como critério de cientifici- 
dade. Segundo Burke (2002), apesar da existência de estudos históricos 
que contemplavam outros objetos, "a história política era considerada (ao 
menos, no âmbito da profissão) mais real ou mais séria que o estudo da 
sociedade ou cultura"* 20. Ainda, de acordo com este autor, as divergências 
se localizavam essencialmente nas discussões relativas às dificuldades de 
estabelecimento de diálogos com teorias produzidas em outras áreas de 
conhecimento, bem como no entendimento do critério de cientificidade 
pelo uso de documentos oficiais. E foram exatamente as críticas a esse 
fazer historiográfico que possibilitaram lentamente a quebra do monopó­
lio da história política, produzindo um movimento em direção a uma nova 
história interessada nas mais diferenciadas atividades e manifestações 
humanas, desenvolvida principalmente a partir do diálogo com a antro­
pologia, a economia, a psicologia e a sociologia.
19 BURKE, 1992, p. 21.
20 BURKE, 2002, p. 18.
Jacques Julliard (1976) observa que, apesar do grande avanço da 
historiografia desde então, duas considerações merecem ser feitas. Em 
primeiro lugar, lembra que a tradição factualista não deixou de existir, 
pois é ainda nessa tradição que se constitui a base da forma mais aceita 
de estabelecimento dos períodos históricos. Outra questão importante re- 
fere-se à observação de Braudel de que a história política não é necessaria­
mente uma história factual. Assim Julliard problematiza:
20
História Política e História da EducaçAo
Ou bem existe com efeito, uma natureza própria dos fenômenos 
políticos [...] ou bem, ao contrário, o político, como o econômico, 
o social, o cultural, o religioso, acomoda-se aos métodos os mais 
diversos, inclusive os mais modernos, e, nesse caso, é tempo de 
aplicá-los ao político.21
21 JULLIARD,1976, p. 182.
22 FALCON, 1997, p. 76.
23 RICOEUR citado por JULLIARD, 1976, p. 183.
24 JULLIARD, 1976, p. 186.
Para Julliard (1976), não é possível fazer desaparecer um objeto pela 
insuficiência de seu método, tomando-se necessário a sua discussão. Neste 
sentido, a retomada de abordagem política refere-se à superação, tanto 
da tradição factualista como da abordagem marxista, de que os fenôme­
nos políticos são um reflexo das forças econômicas e sociais.
Em relação ao lugar do político, há formulações diferenciadas. Fran­
cisco Falcon (1997) identifica quatro orientações: aquela que se refere 
a interpretações onde a política está subsumida na esfera do poder; 
outra é a tendência que toma o poder como determinação social, subs­
tituindo a história política por história das formas de dominação (no 
caso, matrizes marxistas e weberianas); ainda, outra refere-se ao en­
tendimento da pulverização do poder e "sua redução a efeitos de sen­
tido produzidos em função de práticas discursivas específicas"* 22; fi­
nalmente, o autor apresenta uma outra orientação como um conjunto 
de tendências que vem organizando o campo da nova história políti­
ca, o que passaremos a desenvolver adiante. Os historiadores deste 
novo campo compartilham com a idéia da existência de uma certa 
autonomia do político em relação, por exemplo, às questões econômi­
cas e culturais da sociedade, podendo ele permanecer e resistir às mu­
danças nessas esferas. Julliard (1976), citando Paul Ricoeur, reafirma 
com este autor que o político "torna real uma relação humana irredu­
tível aos conflitos de classe e às tensões econômicas e sociais da so­
ciedade"23. O que Julliard (1976) quer enfatizar é que não há aconteci­
mentos políticos por natureza, mas se torna político pela repercussão 
que alcança na sociedade, ou melhor, pela sua repercussão pública, 
que precisa ser investigada no longo prazo, e também enfatiza a ne­
cessidade de renunciar a idéia de "continuidade histórica que se de­
senvolve ao longo de um tempo homogêneo"24, rompendo com as cau- 
salidades lineares e com a idéia de acontecimento político como produto 
de determinadas estruturas.
21
História e Historiografia da Educação no Brasil
Como qualquer outra abordagem, qual é a problemática central 
da história política? Segundo Julliard (1976), é o poder, não no sentido 
reducionista de sua relação com o Estado. Tomando como referência os 
estudos da antropologia política, este autor afirma não ser mais possí­
vel reduzir o fenômeno político à teoria do Estado, mas buscar compre­
ender a natureza social do poder político e as mudanças das próprias 
relações de poder e nào apenas dos sistemas políticos, de forma a via­
bilizar a captação das mais diferenciadas contradições presentes na 
sociedade. Nas palavras de Balandier, "...umas das tarefas da antro­
pologia política é a de mostrar as formas particulares assumidas pelo 
poder e as desigualdades sobre as quais ele se apóia..."25
25 BALANDIER. Antropologia política. In: A nova História, 1978, p. 63.
26 REMÓND, 1996, p. 24.
Outro autor que discute as inovações na abordagem política da 
História é René Remónd (1996). Para ele, as alterações presentes refe­
rem-se às próprias mudanças ocorridas no âmbito político da organi­
zação do Estado e da sociedade nas últimas décadas. Entre elas, cita, 
por exemplo, o desenvolvimento das políticas públicas e a ampliação 
dos domínios da ação política demandando, inclusive, aumento das 
atribuições do Estado. Assim afirma:
À medida que os poderes públicos eram levados a legislar, regu­
lamentar, subvencionar, controlar a produção, a construção de 
moradias, a assistência social, a saúde pública, a difusão da cultu­
ra, esses setores passaram, uns após outros, para os domínios da 
história política.26
Como poderíamos sintetizar as orientações que vêm definindo o 
campo da nova história política? Tais indicações se fazem pelo distancia­
mento do método da história política tradicional, o que já apresenta pos­
sibilidades de desdobramento em um outro método, cujas característi­
cas estão, evidentemente, bastante coladas ao movimento da nova história 
de maneira geral e, em particular, com a nova história cultural. Podemos 
portanto, apresentar as seguintes formulações:
1- Adoção de pluralidades dos tempos históricos (curta, média, longa) 
na compreensão das dinâmicas políticas presentes na sociedade. 
Segundo Remónd (1996), a história política se desenvolve simulta­
neamente em registros desiguais, articulando o contínuo e descontí­
nuo, combinando o instantâneo e o lento. Há fatos que ocorrem em 
um ritmo rápido (golpes, eleição, medidas governamentais, etc..), 
22
História Política e História da Educação
outros numa duração média (por exemplo, regimes e partidos 
políticos) e ainda há aqueles de longa duração (cultura política).
2- Abertura para o diálogo com outras áreas de conhecimento e 
seus referenciais teóricos seja do ponto de vista da utilização de 
seus conceitos, seja para o trato das fontes documentais. Em re­
lação a este último, destaca-se a utilização de procedimentos 
estatísticos e principalmente do campo da lingüística para a aná­
lise do discurso (Prost, 1996). Sobre os primeiros, diferentes 
aproximações vêm sendo feitas com a antropologia, a psicanáli­
se, a sociologia, a economia política, ocorrendo, portanto, des­
dobramentos nos campos conceituais de referência.
3- A incorporação de novos conceitos: representações, imaginário, 
simbólico, micropoderes e cultura.
4- A produção de novos objetos: poderes, saberes enquanto pode­
res, práticas discursivas, instituições, partidos, eleições, mani­
festações, opinião pública, a guerra, a mídia, associações (Re­
mónd, 1996; Falcon, 1997).
Ainda neste breve itinerário bibliográfico, destacam-se as idéias 
de Pierre Rosanvallon (1995). Sua discussão refere-se a uma história 
conceitual do político, entendendo ser esta uma estratégia para demar­
car as diferenças de uma história das idéias/mentalidades políticas, 
aproximando a história política da filosofia política. O objeto da histó­
ria conceitual do político é, na definição do autor, "a compreensão da 
formação e evolução das racionalidades políticas, ou seja, dos sistemas 
de representações que comandam a maneira pela qual uma época, um 
país ou grupo sociais conduzem sua ação, encaram seu futuro"27.
27 ROSANVALLON, 1995, p. 16.
28 ROSANVALLON, 1995, p. 12.
29 REMÓND, 1996, p. 35.
Para finalizar este item, é importante reafirmar os principais as­
pectos inovadores da história política e que são de ordem teórico-con- 
ceitual. Um primeiro diz respeito ao entendimento de que o político 
não é uma instância ou domínio, entre outros, da realidade, mas "o 
lugar onde se articulam o social e sua representação, a matriz simbólica 
onde a experiência coletiva se enraiza e se reflete ao mesmo tempo"28. 
Para Remónd (1996), o "político não constitui um setor separado: é uma 
modalidade da prática social"29.
23
História t Historiografia da EducaçAo no Brasil
Outro aspecto relaciona-se ao desenvolvimento da noção de cul­
tura política quando associado aos estudos de longa duração, e, em 
especial, às formas conceituais do político, sua representação e apro­
priação pelos diferentes setores da sociedade (Rosanvallon, 1995). Ou 
ainda nas reflexões de Burke (2002), trata-se "do conhecimento, das 
idéias e dos sentimentos políticos vigentes em determinado lugar e 
época. Engloba a socialização política, isto é, os meios pelos quais o co­
nhecimento, as idéias e os sentimentos são transmitidos de uma gera­
ção para outra"30. Ainda explorando essa noção, Pesavento (2003) en­
tende a cultura política como "conjunto de representações que nutrem 
um grupo no plano político"31.
30 BURKE, 2002, p. 111.
31 PESAVENTO, 2003, p. 76.
32 PESAVENTO, 2003, p. 75.
33 PESAVENTO, 2003, p. 75.
34 BURKE, 2002, p. 171.
Finalmente, o outro aspecto diz respeito, especificamente, aos con­
ceitos incorporados pela história política. Pesavento (2003) refere-se ao 
"endosso,pelos historiadores do político, dos pressupostos epistemo- 
lógicos que presidem a análise da História Cultural. Imaginário, repre­
sentação, a produção e recepção do discurso historiográfico reformula­
ram a compreensão do político"32. A autora compreende a história 
política como uma corrente da história cultural, denominando-a como 
uma história cultural do político, cujo objeto central reside na investi­
gação sobre os mecanismos de construção de identidades providas de 
"poder simbólico de coesão social"33. Burke (2002), ao refletir sobre os 
caminhos da história cultural, interroga sobre os problemas da utiliza­
ção do conceito de cultura, entendida de forma muito alargada como 
um sistema de significados compartilhados. Dessa maneira, enfatiza o 
cuidado de não se tomar os conceitos como premissas e indica dois 
procedimentos básicos: a importância de não se perder de vista uma 
análise dialética das relações cultura e sociedade e, principalmente, que 
a "construção cultural deve ser tratada como um problema"34.
História política: indicadores 
de conceitos e teorias de análise
O que se pretende neste item é apresentar de forma breve alguns 
conceitos importantes na problematização do político como uma das
24
História Política e História da EducaçAo
manifestações das práticas sociais, restringindo a alguns autores e con­
ceitos que estão mais consolidados nas discussões.
Pierre Bourdieu (1989) elabora o que denomina de uma teoria do 
campo político, compreendido simultaneamente como campo de for­
ças e como campo de lutas que tem em vista transformar/conservar as 
relações de forças presentes na estrutura política em um dado momen­
to. O campo político é o lugar em que se produzem, na concorrência 
entre os agentes nele envolvidos, problemas, programas, conceitos e 
acontecimentos políticos. A relação e distância entre cidadãos comuns 
e os profissionais da política se estabelecem a partir dos graus de dife­
renciação de acesso aos instrumentos da produção política. Bourdieu 
(1989) destaca ainda que o tempo livre e o capital cultural são condi­
ções essenciais para a definição dos graus de acesso à participação po­
lítica; mesmo porque a legitimidade das formas políticas de gestão do 
consenso ou da discordância depende "do estado dos instrumentos de 
percepção e de expressão disponíveis e do acesso que os diferentes gru­
pos têm a esses instrumentos"35. Atento à potencialidade multifacetá- 
ria das relações de força e, portanto, de poder, Bourdieu formulou o 
conceito de poder simbólico, pois, se o poder está em toda parte é preciso 
descobri-lo "onde ele se deixa ver menos"36 37, e por ser ignorado é reco­
nhecido. Assim, afirma: "o poder simbólico é, com efeito, esse poder 
invisível o qual só pode ser exercido com a cumplicidade daqueles que 
não querem saber que lhe estão sujeitos ou mesmo que o exercem"37.
35 BOURDIEU, 1989, p. 165.
36 BOURDIEU, 1989, p. 7
37 BOURDIEU, 1989, p. 8
Segundo Falcon (1997), a possibilidade teórica da formulação de 
poder de Bourdieu está exatamente em superar o entendimento das 
relações de poder como aquelas somente visíveis na ação do Estado. 
Lefort, citado por Capelato e Dutra (2000), afirma que o estatuto sim­
bólico do poder é conferido pela indissociabilidade entre a posição do 
poder e sua representação. É neste sentido que o conceito de represen­
tação favorece o distanciamento da racionalidade presente nas análises 
da ciência política de uma maneira geral.
A compreensão do processo de estabelecimento das relações de 
força na sociedade implica no desvendamento das formas de sua re­
presentação e sua relação com a vida social. A especificidade do políti­
co está, pois, no entendimento de ser este o campo de forças e lutas, 
25
História e Historiografia da Educação no Brasil
que articula o social e a sua representação. Capelato e Dutra (2000), 
analisando as reflexões do Louis Marin, observam que as relações entre 
o poder e sua representação se fazem numa dupla e recíproca subordina­
ção "de um lado, a instituição do poder se apropria da representação do 
poder como sua, ou seja, o poder se dá representações, produz represen­
tações de linguagem e imagens"; de outro, "a representação, o dispositi­
vo da representação, produz seu próprio poder, produz-se como poder"38.
38 CAPELATO e DUTRA, 2000, p. 229.
39 Citado por CAPELATO e DUTRA, 2000, p. 228-9.
40 CAPELATO e DUTRA, 2000, p. 229.
41 CASTORIADIS, 1992, p. 88.
42 CASTORIADIS, 1992, p. 92.
Ainda como conceito fundamental para as interrogações do polí­
tico, tem-se o conceito de imaginário, por ser o instrumento conceitual 
que exprime as representações. Como observa Marin39, os significantes 
(símbolos) afirmados por imagens, palavras, figuras de linguagem ou 
objetos e os significados (representações), figurações que dão a ver uma 
presença, se articulam em uma rede de significações que produz o ima­
ginário social. Dessa maneira, a "análise dos imaginários sociais ganha 
novos possíveis quando se começa a cotejá-los com os interesses sociais, 
com as estratégias de grupo, a autoridade do discurso, a sua eficácia 
em termos de uma dominação simbólica, enfim, com as relações entre 
poder e representação"40.
Para avançar na compreensão destes conceitos, é importante des­
tacarmos o pensamento de Castoriadis e os pressupostos de organiza­
ção do conceito de imaginário social. Sua premissa é a de que o ser 
humano possui sua especificidade na capacidade e possibilidade de 
ativamente "fazer ser formas outras de existência social e individual"41. 
Esta especificidade é a criação e corresponde a imaginação e o imaginário 
ou à capacidade de criar uma nova forma, de por em imagem. Dessa 
maneira, o imaginário social é a "capacidade criadora do anônimo co­
letivo que se põe em funcionamento cada vez que os humanos se reú­
nem e se dão, cada vez, uma figura singular instituída para existir"42. 
As instituições, os costumes, a linguagem expressam o imaginário so­
cial constituído historicamente. Para Castoriadis, o político é uma sig­
nificação imaginária que faz funcionar o político como uma relação de 
forças e não como outra coisa. Neste sentido, o autor apresenta uma 
diferenciação bastante pertinente sobre o político e a política, cuja raiz está 
nas tensões entre o sodal-histórico instituinte e as formas histórico-sociais 
26
História Política e História da Educação
instituídas (Castoriadis, 1992). Para este autor, o lugar do político é o 
lugar da instituição do poder explícito, ou seja, da necessidade de toda 
sociedade instituída controlar o seu processo de auto-instituição. Por sua 
vez, a política é o lugar de se resolver as questões do político (embora 
nem sempre aconteça dessa maneira), é a "atividade que se interroga 
sobre as instituições e, segundo o caso, as transforma. Isso significa que 
ela cria também novas significações"43. No rastro dessas reflexões de 
Castoriadis, podemos dizer que as lutas políticas, as interrogações so­
bre os mecanismos de poder e a própria estrutura de poder na socie­
dade precisam ser pensadas no âmbito das relações entre o poder e 
suas representações, sendo necessário, para isto, que o historiador res­
gate e decodifique a linguagem das representações, compreendendo- 
as como uma construção histórica.
Nestas discussões sobre o poder e o político, é preciso ainda trazer 
as contribuições de Foucault, um dos autores que mais provocaram os 
historiadores em suas "certezas". Foucault (1984) enfatiza as relações 
entre as diferentes práticas sociais e a pluralidade e onipresença dos 
poderes. A questão central do autor não é o poder/poderes, mas os 
mecanismos de poder, os seus efeitos e suas relações. Para desenvol­
ver sua questão, Foucault (1984) constrói uma crítica tanto ao deter­
minismo econômico (marxismo) como à teoria política do direito, afir­
mando a existência de outros dispositivos de poderes que se exercem 
em níveis diferentes na sociedade, em domínios e extensões variados. 
Patrícia O'Brien (1992), analisando a importânciadas questões de Fou­
cault para a história cultural, afirma que, neste autor, a cultura é in­
vestigada através das tecnologias de poder, das estratégias e táticas 
produzidas para a sua legitimação. Fica para os historiadores a tarefa 
de identificar não somente o poder como produtor de verdade, mas a 
produção da verdade como uma função do poder.
Relações de poder na escola:
Max Weber e Norbert Elias
Nos estudos afeitos aos campos de investigação da história e 
da sociologia da educação e que problematizam o campo político, desta­
cam-se os autores Vincent, Lahire e Thin (2001). Uma das proposições des­
tes autores está na elaboração do conceito de forma escolar e no entendi­
mento de sua relação com as formas sodais e formas políticas, compreendendo 
43 CASTORIADIS, 1992, p. 98.
27
História e Historiografia da Educação no Brasil
que na articulação entre tais formas se engendram formas de dominação e 
exercício de poder. Assim afirmam:
Como modo de socialização específico, isto é, como espaço onde 
se estabelecem formas específicas de relações sociais, ao mesmo 
tempo que transmite saberes e conhecimentos, a escola está fun­
damentalmente ligada a formas de exercício de poder.44
44 VINCENT, LAHIRE, THIN, 2001, p. 17.
45 VINCENT, LAHIRE, TI IIN, 2001, p. 10 - A forma escolar é definida como sendo uma configu­
ração histórica singular desenvolvida a partir dos séculos XVI e XVII, cuja particularidade 
reside na autonomização da relação pedagógica em comparação à outras relações sociais, no 
estabelecimento de um lugar específico de desenvolvimento destas relações (a escola), nos 
destinatários específicos (todas as crianças) e na produção de disciplinas/saberes escolares.
O que se quer problematizar em relação a proposições destes au­
tores não é a existência ou não de tais articulações, mas a maneira como 
elaboram o entendimento das formas de exercício de poder. Enfim, pre­
tende-se interrogar as premissas dos autores e refletir sobre os seus 
possíveis usos e apropriações para as análises que contemplam as rela­
ções entre escola e poder em sua historicidade.
De início, destaca-se a afirmação dos autores de que "das escolas 
dos Irmãos à escola mútua e à escola da República houve muitas mu­
danças que não chegaram a interferir naquilo que definimos como for­
ma escolar".45 Para estes autores, as mudanças que ocorrem nos tipos 
escolares que se desenvolvem desde o século XVI, não interferem na for­
ma escolar devido, especialmente, ao entendimento do exercício do po­
der como estabelecido a partir de regras impessoais ou suprapessoais. 
Ou melhor, o que muda essencialmente são as relações com essas regras, 
mas entretanto mantém-se "o poder impessoal".
Há uma forte identificação dos autores não somente com o pensa­
mento weberiano mas também com o que move a preocupação deste, 
ou seja, basicamente querer entender porque as pessoas se sujeitam à 
dominação, fazer uma sociologia da dominação. Para Weber (1979), o 
poder se manifesta concretamente na forma de relações de dominação 
entre os que mandam e os que obedecem. A obediência significa que os 
membros de um grupo reconhecem a necessidade da existência da do­
minação e acatam a autoridade. O poder impessoal é característica de 
uma sociedade nacional ideal (em contraposição à dominação carismá­
tica e dominação tradicional) e fundamenta a dominação legal. Assim 
afirma em relação à legitimidade desta dominação:
28
História Política e História da Educação
Ordena-se, não em nome de uma autoridade pessoal, senão em 
nome de uma norma impessoal, e inclusive a promulgação de 
uma ordem é também, por sua parte, obediência a uma norma e 
não livre arbítrio, graça ou privilegio. O f uncionário é o sujeito do 
poder de mando e nunca o exerce por direito próprio, senão que 
sempre o ostenta em representação de uma instituição impessoal, 
específica da vida coletiva, dominada normativamente mediante 
regras escritas, de homens determinados e indeterminados, po­
rém determinados por características reguladas.46
46 WEBER, 1987, p. 261.
47 VINCENT, LAHIRE, THIN, 2001, p. 14.
48 VINCENT, LAHIRE, THIN, 2001, p. 33-34.
Para Vincent, Lahire e Thin (2001), o caráter do empreendimento de 
introduzir as crianças na escola é de ordem pública; trata-se de "obter a 
submissão, a obediência ou uma nova forma de sujeição"47 48. A forma escolar 
se caracteriza por uma relação pedagógica de submissão de mestres e alu­
nos a regras e poderes impessoais, que, por sua vez, estão objetivados no 
escrito, no livro, na linguagem de sinais, enfim, em um "outro" codificado.
Entretanto, advertem que a relação com essas regras se altera com 
a "pedagogia das luzes", ou no que Weber denomina como "processo 
de racionalização ocidental", a partir das transformações nas ativida­
des econômicas, políticas, científicas. As relações de submissão e obe­
diência deveriam se fazer não mais por temor ou por imposição ex­
terior, mas como uma manifestação da razão, uma imposição interior. 
A sujeição precisa ser compreendida e aceita. A mudança em relação às 
regras impessoais a partir de fins do século XIX assim se define para 
Vincent, Lahire e Thin (2001).
a disciplina não deve ser suportada, mas compreendida e aceita. 
Trata-se sempre de agir conforme as regras impessoais, indepen­
dente da vontade dos indivíduos... mas sem as impor, passando 
por cima do consentimento dos alunos... Se a relação com regras 
impessoais parece ter mudado, estas últimas continuam onipresen­
tes na organização das práticas escolares. 48
Para além das conseqüências de se levar ao extremo as apropria­
ções weberianas de entendimento das formas de dominação, o que im­
plicaria em também acatar que as margens de liberdade dos homens 
interferirem conscientemente em sua história são bastante reduzidas, 
é preciso problematizar a própria conseqüência da apropriação desta 
29
História e Historiografia da EducaçAo no Brasil
concepção para □ estudo da história da escola. Entendo que o limite da 
abordagem de Vincent, Lahire, Thin (2001) está na apreensão, como pre­
missa, do conceito de poder impessoal que se apresenta exterior às rela­
ções entre sujeitos, na medida em que, novamente retomando Weber, 
estaria coisificado e codificado em última instância no mercado e na 
burocratização da dominação política.
A elaboração de conceitos para explicar aquilo que aparentemente 
escapa à apreensão concreta e imediata pelos sentidos humanos, sabe- 
se, vem de longuíssima data. O próprio conceito de forma, eidos, elabo­
rado por Platão (1979) nos séculos V-VI a.C, foi um esforço neste senti­
do, pretendia com este conceito dar intelegibilidade a tipos-ideais que 
transcendem o plano mutável dos objetos físicos, portanto indica para 
permanências (no sentido geométrico/pitagórico de figuras/formato). 
A utilização do conceito de forma está presente, inclusive, em vários 
autores, entretanto, a diferenciação da maneira de sua apropriação pa­
rece estar relacionada fundamentalmente ao entendimento das relações 
entre indivíduo e sociedade.
Em Weber (1971)49, o entendimento é atomizado, pois as possibili­
dades de estudo da sociedade estão no estudo das ações individuais ou 
de um número maior ou menor de indivíduos. Para Weber, o ponto de 
partida para o estudo da sociedade não é o coletivo, mas só pode ser 
dado pela ação dos indivíduos, pois o agente individual é a única enti­
dade capaz de dar sentido às ações. Dada a impossibilidade de apreen­
der as diferentes ações e os diferentes sujeitos é que Weber formula o 
conceito de tipo ideal e para a apreensão do fenômeno coletivo, o con­
ceito de relações sociais, na qual as ações dos sujeitos orientam-se por 
uma rede de significados, reciproca mente compartilhados. Em sua acep­
ção, o Estado designa uma categoria de determinada interação huma­
na e que somente é viabilizada pelo monopólio de violência física, por 
conseguinte, o Estado é a única fonte de direito legítimo à violência.
49 GERTH, Hans e WRIGT MILLS, C. Ensaios de sociologia,Rio de Janeiro, Zahar, 1971.
Dessa maneira, segundo Weber (1979), a atividade política é, princi­
palmente, atividade de exercício de dominação, e o poder é a manifesta­
ção das relações de dominação entre os quem mandam e os que obede­
cem, cujo êxito está na aceitação subjetiva de cada indivíduo e/ou grupo 
de indivíduos. Observa-se ser esta uma tarefa extremamente complexa, 
na medida em que demanda o controle social de consciências indivi­
duais e a produção e reprodução da violência simbólica. Este exercício é 
30
História Política e História da EducaçAo
possibilitado pela racionalização burocrática, através da racionalização 
jurídica e consequente especialização dos poderes legislativo e judiciá­
rio, da institucionalização da política de ordem pública, força militar, 
entre outros. Weber (1987), denomina a racionalização burocrática como 
tipo legal de dominação, enquanto condição para a manutenção do Esta­
do, perpassada pelo "poder impessoal”, ou seja, a vinculação impessoal 
dos indivíduos a um dever oficial, cuja competência está fixada nas nor­
mas (leis, decretos, regulamentos), racionalmente articuladas, de forma 
que a legitimação da dominação se concretiza na legalidade da regra 
estabelecida em caráter geral. Enfim, a dominação pode ser outorgada.
Penso que o entendimento das relações entre forma escolar e forma 
política, explicado pelo conceito de poder impessoal e tomado como pre­
missa, limita a compreensão da história das formas escolares como uma 
prática política porque não permite apreender as dinâmicas diferenciadas 
de poder presentes entre os sujeitos e os grupos sociais. No caso específico 
da constituição histórica da forma escolar, na maneira como desenvolvem 
Vincent, Lahire e Thin (2001), escapa-nos, por exemplo, a possibilidade de 
compreensão das diferentes formas de poder que se instalam entre os in­
divíduos nelas envolvidos (crianças, professores e famílias), como mem­
bros de um grupo, uma sociedade. Ou ainda, ao indicarem para a codifica­
ção das normas sociais/escolares como algo exterior aos coletivos escolares 
e sociais não nos permitem problematizar as tensões presentes no estabe­
lecimento dos procedimentos de coesão social. Para avançarmos nestes 
entendimentos, apresentamos, mesmo que de forma muito breve, alguns 
conceitos desenvolvidos por Norbert Elias.
Este autor, em suas diferentes obras, apresenta-nos instrumentos 
conceituais importantes para a história política e aqui mais especifica­
mente para a problematização de educação escolar como prática políti­
ca. Isso se deve, principalmente, à articulação que o autor realiza entre 
macro e microrrelações de poderes na sociedade, sendo sua questão 
principal a transformação das relações de poderes para o entendimen­
to do que ele denominou como processo civilizador.
O desenvolvimento de suas idéias está centrado na perspectiva de 
compreensão das relações entre indivíduo e sociedade e difere, por 
exemplo, de Karl Marx e Max Weber. Embora o autor assuma integral­
mente a grande contribuição de Weber para a produção de suas proble­
ma tizações e a relevância de seus estudos para compreensão da exis­
tência do Estado, através da monopolização de violência física, como 
condição que permite a imposição de normas e leis aos cidadãos, diverge
31
História t Historiografia da EducaçAo no Brasil
radicalmente em relação à proposição de Weber de um poder outorga­
do ou poder impessoal. Segundo Elias (1994 2001), a problemática cen 
tral do pensamento de Weber está na sua percepção de que os indiví­
duos são anteriores à sociedade (de acordo com o pensamento liberal) 
e se estabelecem nela de maneira autônoma e independente. Já sua crí­
tica ao pensamento de Marx refere-se, principalmente, ao fato deste 
autor ter tomado o monopólio dos meios de produção como fonte cen­
tral de poder, mesmo que outros poderes decorram deste monopólio. 
Para Elias (2001), os limites dessa teoria estão em não levar em conta 
todas as estruturas monopolistas da sociedade que também se apresen­
tam como instrumentos de poder, tais como os monopólios de violência 
física, da tributação e da informação, bem como pelo fato de supor que a 
supressão do monopólio privado dos meios de produção fosse suficien­
te para eliminar ou mesmo atenuar as desigualdades sociais.
O entendimento de Elias sobre as relações entre indivíduo e socie­
dade e a produção das relações de poder pretende superar tanto a visão 
autonomista de Weber como a determinação econômica das relações de 
poder em Marx. Elias (1994) parte da premissa de que a história é sempre 
história de uma sociedade, mas, sem a menor dúvida, de uma sociedade 
de indivíduos50, ou seja, não é possível pensar o indivíduo, "eu", desti­
tuído de um "nós". O estudo da sociedade não é nem o estudo de um 
acumulado de indivíduos, nem um objeto que existe exterior aos indiví­
duos; por sua vez, as distintas formações sociais também não são uma 
criação racional deliberada por pessoas individuais. As formações so­
ciais se estabeleceram historicamente pela existência de redes de depen­
dência e interdependência humanas, individuais e/ou grupais e/ou socie­
tárias. Estas redes se desenvolveram a partir da interdependência de 
funções (por exemplo: trabalho, propriedade, instintos, afetos), que não 
são exteriores aos indivíduos e nem uma soma de vontades, mas uma 
dependência funcional. Para Elias, a condição da existência humana é 
uma condição relacional, o que ele conceitua como configuração.
A complexidade do avanço das relações de interdependência refe­
re-se às diferenciações das divisões das funções entre as pessoas e gru­
pos, onde são produzidas pressões e tensões entre indivíduos e/ou gru­
pos e/ou sociedades. Os monopólios estão na origem destas relações, e, 
de acordo com a intensidade destas tensões, geram-se mudanças estru­
turais na sociedade, o que Elias denomina como força reticular que no
32
50 ELIAS. A sociedade dos indivíduos, 1994, p. 45.
História Política e História da Educação
curso da história "alterou a forma e qualidade do comportamento hu­
mano, bem como toda a regulação psíquica do comportamento, impe­
lindo os homens em direção à civilização"51. Dessa maneira, o estudo 
das relações de poder numa sociedade é problematizado a partir das 
relações de interdependência, uma vez que as coerções sociais são co- 
erções que muitos homens, conforme sua dependência recíproca, exer­
cem uns sobre os outros.
É a partir dessa premissa básica que Elias se propõe a fazer uma 
teoria do processo civilizador. Ele compreende o processo civilizador de 
maneira diferente como Weber desenvolveu o entendimento da proble­
mática das relações de poder, ou seja, como racionalização da sociedade. 
Para Elias (1993), a civilização não é produto da razão humana, se enten­
dida como um projeto deliberado e articulado; mas, também, isto não 
pressupõem uma desordenação. Ao conceito de "poder impessoal" de 
Weber, na perspectiva de um poder outorgado e codificado, Elias (1993) 
opõe o conceito de "dinâmica social" ou "mecanismos de integração" 
como identificador do processo civilizador e alterações nas relações de 
poder. Ou seja, tal processo é entendido fundamentalmente pelo desen­
volvimento e consolidação dos processos de auto-regulação/autocon- 
trole humano em função de mudanças nas configurações sociais e rela­
ções de interdependência dos indivíduos e grupos sociais.
A alteração das relações de poder são indissociadas das alterações 
nas relações de interdependência de indivíduos e/ou grupos e/ou so­
ciedades, sendo que o desenvolvimento dos processos de autocontrole, 
como habitus humano civilizado, guarda uma relação estreita com a 
monopolização de força física e estabilização aos órgãos centrais da 
sociedade - o Estado e suas instituições. Cabe perguntar, então, qual a 
dinâmica da configuração humana que determina o poder da autori­
dade central. Segundo Elias (1993), é preciso compreender as regulari- 
dades elementares presentes na dinâmica das configurações,ou me­
lhor, os dois processos constitutivos da configuração humana: o externo, 
caracterizado pelas lutas de poder entre facções e domínios territoriais 
(por exemplo: feudalismo ou guerras entre nações), e o interno, confi­
guração em que há uma autoridade central, por exemplo, o Estado, 
sendo que ambas as configurações se entrelaçam permanentemente.
No caso deste último processo constitutivo da configuração hu­
mana, a regularidade interna, Elias (1993) observa que a força do 
51 Idem.
33
História e Historiografia da Educação no Brasil
governante depende, de um lado, "da preservação de um certo equilí­
brio de tensões entre os diferentes grupos e de um certo grau de coope­
ração e coesão entre os diferentes interesses da sociedade, mas tam­
bém, por outro lado, da persistência entre eles de tensões e conflitos 
nítidos e permanentes de interesses"52. Dessa maneira, "o governante 
central e sua máquina formam na sociedade um centro de interesses 
próprios... e seus interesses exigem tanto uma certa cooperação quanto 
uma certa tensão entre as partes da sociedade"53. A estabilidade do po­
der está relacionada às condições de manutenção das relações funcio­
nais da interdependência dos indivíduos e grupos e destes com o Esta­
do e as instituições. Desse modo, as normas e os processos codificados 
das relações sociais possuem funções integradoras, mas também divi­
soras e separadoras, principalmente no momento do desenvolvimento 
dos Estados-Nações, onde a referência é a nacionalidade. Destaca-se 
ainda que, no momento de consolidação das nações e a partir do de­
senvolvimento das diferentes configurações sociais, as práticas de po­
der passaram a ser adotadas em nome de uma coletividade soberana. 
Isso demandou a produção de novos vínculos simbólicos que traduzis­
sem os vínculos emocionais dos indivíduos com a coletividade, num 
contexto em que aprofundou-se a interdependência das classes sociais 
e foi necessário o apelo às lealdades nacionais.
52 ELIAS, 1993, p. 149.
53 ELIAS, 1993, p. 149.
Segundo Elias (1997), as nações-estado formam a figuração de equi­
líbrio de poder através de um código de normas, dual e extremamente 
contraditório. São eles um código de normas morais, fundado na huma­
nidade e nos princípios igualitários, e um outro nacionalista, fundado no 
Estado e nos princípios da preservação da integridade dos indivíduos. 
Neste contexto, as pessoas passaram a ser educadas no sentido de assi­
milar ambos os códigos como parte do habitus de cada pessoa, onde a 
sua violação se apresenta como questão de consciência e/ou questão 
legal, interferindo nos processos de autocoersão e mecanismos de pres­
são social. Tais códigos podem ser ativados em diferentes situações, em 
diferentes épocas ou ao mesmo tempo, sendo que o tensionamento des­
ses códigos entre pessoas e/ou grupos e/ou nações foi produzido, a partir 
do século XIV, como um problema da política e das relações de poder. 
Portanto, é extremamente importante ater-se às características desinte- 
gradoras das formas de normalização social não somente devido ao seu 
34
História Política e História da Educação
potencial de interferência nos processos de configuração social, mas 
porque nestas relações de forças reticulares, estabelecem-se formas de 
poder, mecanismos de coerção e autocoerção.
Para finalizar estas reflexões, gostaria de destacar, a partir do campo 
conceitual de Elias (1993), a abordagem relativa à produção dos instru­
mentos de interdependência (tais como o tempo e o dinheiro) e proble­
matizar a escola como um desses instrumentos e não meramente como 
espaço de produção de sujeições. Poderiamos pensar a escola como uma 
produção cultural que se fez pela necessidade de se estabelecerem uni­
dades de referência civilizatória - ler, escrever, contar... - e não somente 
como questão de obediência, mas como algo compartilhado, não sem 
tensões, entre os diferentes sujeitos envolvidos no processo de escolari­
zação. Nesse sentido, vale interrogar-nos sobre as múltiplas tensões e 
conflitos presentes na produção de novas configurações sociais que 
demandaram a escola como fator de coesão social/nacional.
No caso do Brasil, tais tensionamentos estiveram presentes tanto 
no processo de constituição do Estado e das elites políticas e intelectu­
ais, nacionais e locais, bem como na relação entre estas e a população. 
Mas também, evidentemente, é possível capturá-los no interior da es­
cola, através das múltiplas práticas que buscaram representá-la como 
espaço legítimo de educação.
A educação escolar como prática política
No Brasil do século XIX, desenvolveram-se os debates e as ações 
relativas à monopolização da instrução elementar pelo Estado e a ex­
tensão da escola a todos os cidadãos livres das províncias. Mesmo que 
na província do Rio de Janeiro houvesse a proibição legal da freqüência 
na escola dos pretos africanos e, no Rio Grande do Sul, dos pretos, a 
intenção de disponibilizar a instrução pública para meninas, pobres e 
os negros nas outras províncias apresentou-se como uma estratégia po­
lítica de produção do ideário de coesão social/nacional.
Destaca-se que o empreendimento de organização e extensão dos 
saberes elementares às populações esteve em sintonia com as ações ocor­
ridas em diferentes países das sociedades ocidentais e possuiu especifi­
cidade ímpar nos acontecimentos históricos deste tempo. Diferentemen­
te de quaisquer outras discussões relativas aos limites de interferência 
do Estado na gestão da sociedade, a questão de necessidade de sua ação 
para o gerenciamento da difusão da escolarização elementar unificou, 
35
História t Historiografia da EducaçAo no Brasil
em maior ou menor proporção, intelectuais e elites econômicas das mais 
diferenciadas matizes políticas. Também diferentemente de outras ações 
políticas ao longo do século XIX, a extensão da escolarização se caracte­
rizou como uma ação de inclusão social ampla para as diferentes classes 
sociais, gêneros e etnias na intenção de produzir o cidadão.
É evidente que este processo não se fez sem tensões e conflitos, as­
sociados ainda aos problemas próprios das diferentes culturas, impli­
cando em diferenciações nos debates relativos aos processos de como 
estabelecer a difusão da instrução. Queremos afirmar, com isso, que se 
predominou a hegemonia de idéia de que todos deveriam ter acesso à 
escola; houve diferenças nas formas de controle da produção da hege­
monia cultural, seja pela estrutura curricular das escolas, pela definição 
dos conteúdos dos livros e as formas de sua circulação, pelos debates rela­
tivos à co-educação e diferenciação étnico-radal das escolas, à definição de 
métodos, formação de professores, entre muitas outras temáticas. Nas ob­
servações de Pierre Villar (1990), entre os vários acontecimentos que possi­
bilitaram o desenvolvimento do complexo processo de produção da cons­
ciência de pertencimento a uma nação, estiveram presentes aqueles em 
que o cidadão tomou-se um soldado e a escola um templo da pátria54.
A questão que se apresenta aqui para análise não é o entendimento 
da história da escola como um capítulo da história dos regimes políticos 
brasileiros. Pretende-se discutir a possibilidade de analisá-la sob o en­
foque macropolítico, na perspectiva de monopolização dos saberes e na 
perspectiva micro, de discutir as formas discursivas e simbólicas pelas 
quais os diferentes sujeitos representaram o lugar da escolarização e tam­
bém as formas como o poder se manifestou nas práticas políticas de or­
denamento da vida escolar.
Tratar a escola como um capítulo da história dos regimes políticos 
foi o que dominou a historiografia da educação por um bom tempo, 
numa perspectiva de entendimento da educação como reflexo ou con- 
seqüência da ação deste ou daquele governante, ou regime político, 
excluindo-se as possibilidades de entendimento da educação como prá­
tica social e cultural que se articula a outras diferentes práticas. Ou 
ainda, nas tradições das periodizações políticas,esteve presente a pro­
dução de periodização de história da educação em que se postula uma 
derivação dos acontecimentos políticos de determinado regime, toman­
do a situação política como um dado a priori.
54 VILLAR, 1990, p. 500.
36
História Política e História da EducaçAo
Embora a monopolização da instrução elementar para a maioria 
dos países tenha se concretizado ao longo do século XIX e, no Brasil, 
estivesse indissociada do regime político imperial, é preciso tomar este 
problema cuidando-se de duas premissas básicas. Em primeiro lugar, 
que o discurseo do caráter público da educação escolar não foi uma in­
venção do Império, e, em segundo, a organização escolar não é conse- 
qüência de uma forma política instituída, mas é produtora/componente 
desta forma que se instituiu.
Em relação à primeira questão, sabemos que as discussões sobre a 
implementação de uma educação "pública" no Brasil se fizeram desde 
o século XVIII55, como também em outros países europeus. Em relação 
ao Brasil, o marco tem sido as reformas pombalinas empreendidas a 
partir de 1759, mas podemos encontrar registros dessa discussão até 
anteriores a esse período, como se pode ver na Carta Régia de 1721 
para o governador D. Lourenço de Almeida, em que D. João V orienta 
para serem "obrigados em cada vila a ter um mestre que ensine a ler e 
escrever, contar, que ensine latim, e os pais mandem seus filhos a estas 
escolas..."56. É muito importante destacar que a produção de um ideário 
relativo a uma educação nacional não esteve descolada das discussões 
políticas do século XVIII, no momento em que parte da aristocracia e da 
burguesia da corte na França questionavam as práticas de civilidades 
como farsa e postulavam a necessidade de tomar toda uma sociedade 
civilizada57; ou ainda, no contexto do movimento fisiocrata, onde seus 
representantes advogaram pela necessidade do desenvolvimento da ins­
trução do povo, bem como dos acontecimentos dos movimentos popu­
lares na França e na Inglaterra (Rudé, 1991) e da difusão das ciências.
55 FACHADA, 1998.
56 Carta régia de 22/03/1721, citado por CARVALHO (1933).
57 VEIGA, 2002, p. 96.
58 FERNANDES, 1994, p. 71.
Também na sociedade portuguesa estiveram em curso as dúvidas 
com relação ao "prolongamento da ignorância", o que pode ser obser­
vado através da criação da Real Mesa Censória, em 1768. Segundo Fer­
nandes (1994), a ampliação das atribuições deste órgão paras assuntos 
da educação e, portanto, para além da censura prévia de produtos cul­
turais, esteve relacionada à "necessidade imperativa de reforçar a in­
tervenção estatal no controlo de todo o sistema educativo existente e 
também das extensões que este viesse a receber"58.
37
HISTÓria e Historiografia da EducaçAo no Brasil
Para o estudo do desenvolvimento da escolarização no Brasil, ob­
serva-se que as normas políticas de sua regulamentação também não 
foram uma fundação do Império. Se tomarmos as legislações portugue­
sas aplicadas à colônia desde o século XVIII, observamos que é neste 
contexto que desenvolveu-se uma cultura política de vigilância em rela­
ção aos modos de se estabelecer a escola. Das instruções do Alvará de 
1759 aos decretos que regulavam a educação no Brasil, antes da Consti­
tuição de 182459, estiveram presentes os indicadores de uma rotina admi­
nistrativa que irá perdurar em uma longa duração histórica e que dizem 
respeito aos métodos de ensino, à distribuição dos saberes, ao controle 
sobre os mestres, à normatização dos salários, à utilização de materiais 
escolares e à disciplina dos alunos. Apesar da longa duração histórica da 
forma escolar, é preciso problematizar as relações de poderes que se esta­
beleceram para sua legitimação, levando-se em consideração as tensões 
e conflitos desencadeados entre alunos, professores e famílias e o poder 
instituído pelo Estado. Lembrando a advertência de Burke (2002), é pre­
ciso investigar as mudanças nas permanências como estratégia de dar 
inteligibilidade às singularidades dos acontecimentos na história.
59 FACHADA, 1998 (anexos).
60 O texto refere-se a uma conferência apresentada no curso do Collège de France em 1 /02/1978.
Por outro lado, há que se destacar que a discussão relativa à extensão 
da escolarização, na maneira como se processou na Europa, não pode ser 
dissociada da organização do Estado. Através da monopolização da tribu­
tação como uma de suas funções, produziram-se as condições econômicas 
de desenvolvimento da instrução, como é o caso do estabelecimento do 
subsídio literário de 1773. Já que a monopolização da violência física criou 
as condições para o desenvolvimento da "economia das pulsões" e um 
lento e gradual caminho para a conscientização do autocontrole como for­
ma de se estabelecer na sociedade, com desdobramentos para o entendi­
mento da escolarização como portadora de uma função civilizadora.
Neste aspecto, é preciso problematizar, no caso da organização do 
Estado brasileiro, como desenvolveram-se as práticas políticas de ins­
titucionalização dos saberes elementares, no sentido de observar em 
que medida rompem ou continuam as práticas anteriores; ou ainda, de 
que maneira é possível compreender a organização escolar no período 
como componente da organização do Estado e das novas configura­
ções das relações de poder.
Um conceito fundamental desenvolvido por Foucault (1984)60, 
pode nos indicar pistas para a análise do problema, que é o conceito
38
História Política e História da Educação
de govemamentalidade. Sua questão para o desenvolvimento deste con­
ceito refere-se à relação histórica entre o problema de governar, o apare­
cimento da população como um campo de intervenção e o aparecimento 
da economia política como técnica de intervenção do governo. Ou seja, 
Foucault (1984) se refere ao contexto em que um Estado de governo é 
definido não somente pela sua territorialidade, mas pela sua população, 
ou melhor, no momento em que a população se apresenta como proble­
ma de governo. Podemos problematizar o desenvolvimento de mono- 
polização dos saberes elementares como uma entre tantas outras estraté­
gias e táticas de govemamentalidade, das formas de gerir as populações.
A garantia da instrução primária gratuita a todos os cidadãos, a 
partir da constituição de 1824, indica para desdobramentos nas formas 
de governar as populações, num contexto em que disseminaram-se as 
idéias do autogoverno como fundamentos para formação da nação. Esta 
questão no Brasil é perpassada, entre outros, pelos problemas relativos 
à produção de uma identidade nacional e pelos mecanismos e estraté­
gias de legitimação de um governo constitucional, no qual a organiza­
ção escolar, a produção de um corpo de funcionários públicos (profes­
sores, inspetores, diretores de instrução) e as táticas de convencimento 
da população quanto à eficácia da escolarização se produzem como 
parte das tensões políticas expressas nas novas configurações das rela­
ções de poder. Dessa maneira, pode-se interrogar as tensões presen­
tes entre o processo de construção das representações de uma identi­
dade nacional e a institucionalização da escola como unidade de 
referência civilizatória.
A idéia de ser cidadão de direitos e deveres e de formar uma 
nação livre e independente foi algo que, no discurso da modernidade, 
deveria ser inerente à condição de identidade de qualquer sujeito indi­
vidual, algo como uma segunda natureza. Entretanto, como observa 
Stuart Hall (1977), "as identidades nacionais não são coisas com as quais 
nós nascemos, mas são formadas e transformadas no interior da repre­
sentação".61 Enfim, somente é possível saber o que significa ser brasilei­
ro devido à forma como a brasilidade veio a ser representada "como 
um conjunto de significados" pela cultura nacional brasileira.
Segue-se que a nação não é apenas uma entidade política, mas 
algo que produz sentidos - um sistema de representação cultural. 
As pessoas não são apenas cidadãos legais de uma nação; elas 
61 HALL, 1997, p. 53
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História e

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