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13/09/21 Mayara Tomaz 1 Arruma uma coisa e estraga outra! A estudante Juliana, de 17 anos, realizou o tratamento com outro antibiótico para evitar a reação alérgica que sua mãe relatou. Porém, no final do tratamento iniciou com dor abdominal, diarreia com muco e sangue. Logo suspeitou do remédio, mas estranhou que os sintomas não melhoram com o término do tratamento. Retornou ao posto de saúde e o doutor Alan realizou o exame físico completo: a garganta havia melhorado, Juliana estava com bom estado geral, hidratada, porém referia dor a palpação abdominal, sem defesa. O médico logo suspeitou que teria relação com o antibiótico e optou por coletar exames, mas iniciar logo com o uso de Metronidazol via oral, 400mg, de 8h/8h, durante 10 dias. Dona Mercedes, a mãe de Juliana, dessa vez resolveu ir junto à consulta e perguntou ao médico: mas ela vai tratar o problema causado pelo antibiótico com outro antibiótico? Metronidazol ● Atividade alta in vitro e in vivo contra protozoários anaeróbios T.vaginalis e E.histolytica. Entretanto, o metronidazol mata apenas trofozoítos de E.histolytica, mas não cistos. ● Atividade clínica útil contra patógenos anaeróbios incluindo bactérias gram-negativas e gram-positivas como o protozoário G. lamblia. ● Fármaco de escolha para o tratamento de amebíase extraintestinal além de erradicar efetivamente as infecções teciduais intestinais e extraintestinais. ● Outros 5-nitroimidazóis clinicamente eficazes e estreitamente relacionados com o metronidazol em estrutura e atividade: tinidazol, secnidazol, ornidazol.O tinidazol apresenta um melhor perfil de toxicidade e oferece regimes de dosagem mais simples, podendo servir como substituto ao metronidazol. Espectro de ação ● Bactérias anaeróbicas gram-positivas e gram-negativas: Peptococcus, Peptostreptococcus, Clostridium, Bacteroides, Fusobacterium, Veillonella, Campylobacter fetus, Helicobacter Pylori, Gardnerella vaginalis. - Cocos anaeróbios gram-negativos e gram-positivos. - Bacilos anaeróbios gram-negativos. - Bacilos anaeróbios gram-positivos formadores de esporos. *Resistentes: bacilos anaeróbios gram-positivos não formadores de esporos, bactérias aeróbias e anaeróbias facultativas. ● Protozoarios anaeróbios: Balantidium coli, Giardia lamblia, Entamoeba histolytica e Trichomonas vaginalis. ● Na dracunculose, o metronidazol pode facilitar a extração do verme-da-guiné-adulto, apesar de não apresentar efeito direto sobre o parasito. Mecanismo de ação ● O metronidazol é um pró-fármaco e, por este motivo, requer ativação redutiva do grupo nitro pelos organismos suscetíveis. ● A transferência de um único elétron dá origem a um nitrorradical aniônico altamente reativo que destrói os organismos suscetíveis mediante a ação do radical sobre o DNA e possivelmente sobre biomoléculas vitais. ● O metronidazol sofre regeneração catalítica, ou seja, quando o metabólito ativo perde seu elétron, este recompõe o composto original. ● Níveis crescentes de O2 inibem a citotoxicidade induzida pelo metronidazol, pois o O2 compete com o metronidazol pelos elétrons gerados pelo metabolismo energético. ● Assim, o O2 diminui a ativação redutiva do metronidazol e aumenta a regeneração do fármaco ativado. Mecanismo de resistência ● Comprometimento da capacidade de remover o oxigênio, o que dá origem a concentrações locais mais altas de O2, menor ativação do metronidazol e inútil regeneração do fármaco ativado. ● Além disso, há também alterações na permeabilidade à droga ou ao metabolismo, com redução da nitrorredução. Farmacocinética Preparações: oral, intravenosa, intravaginal, retal e tópica. Absorção: o fármaco é em geral completa e prontamente absorvido após a ingesta oral. Distribuição: 13/09/21 Mayara Tomaz 2 ● Meia-vida plasmática: 8 horas. ● Menos de 20% se liga a proteínas plasmáticas. ● Penetra bem nos tecidos e líquidos corporais como secreções vaginais, líquido seminal, saliva, leite materno, saliva, suco gástrico e líquido cérebro espinhal. Exceção: placenta. ● O uso durante o primeiro trimestre de gestação não é aconselhado. Metabolismo: o fígado é o principal local de metabolismo e responde por mais de 50% da depuração sistêmica do metronidazol. Excreção: mais de 75% do fármaco é eliminado na urina, em grande parte como metabólito. Aproximadamente 10% é recuperado de forma inalterada. Possui dois principais metabólitos que são derivados da oxidação das cadeias laterais: hidroxiderivado (meia-vida de 12 horas sendo responsável por aproximadamente 50% da atividade antitricomonas exibida pelo metronidazol) e ácido. ● Em pacientes com insuficiência renal não há necessidade de ajuste da dose, pois os metabólitos são eliminados por via biliar. ● A hemodiálise remove 50% do medicamento e, portanto, é recomendada a dose suplementar igual a metade da dose habitual, ou seja, ou dose total 1,5 vezes maior. Uso clínico Tricomoníase (Trichomonas vaginalis) ● Dose adultos: 2 g uma vez ao dia ou 1 g 2 vezes/dia. ● Pacientes que não toleram dose única: 250 mg 3 vezes/dia ou 375 mg 2 vezes/dia. ● Durabilidade: 7 dias. ● Na presença de cepas resistentes ao metronidazol, o tratamento é realizado administrando-se uma segunda dose de 2 g ao paciente e ao parceiro sexual. Amebíases sintomáticas (ex.: colite amebiana, abscesso hepático amebiano) ● Dose adultos: 500-700 mg via oral 3 vezes/dia por 7 ou 10 dias. ● Dose crianças: 35-50 mg/kg/dia divididas em três doses por 7-10 dias. Colite pseudomembranosa (Clostridium difficile) ● Dose adultos: 250-500 mg via oral 3 vezes/dia por 7-14 dias. Giardíase (Giardia lamblia) ● Dose adultos: 250 mg 3 vezes/dia por 5 dias. ● Dose crianças: 15 mg/kg/dia 3 vezes/dia por 5-7 dias. Vaginose bacteriana ● Dose adultos: 2 g uma vez ao dia. Toxicidade e interações medicamentosas ● Efeitos adversos: cefaléia, náuseas, boca seca, gosto metálico na boca, vômitos, diarreia, desconforto abdominal. ● Tonturas, vertigem, encefalopatia, convulsões, falta de coordenação, ataxia, dormência e parestesia das extremidades, urticária, rubores, prurido são efeitos que indicam a interrupção do metronidazol. ● Vômitos, rubores, cefaléia e desconforto abdominal são relatados após o uso de bebidas alcoólicas durante o tratamento com metronidazol. ● Apresenta potencial de neurotoxicidade e, por isso, devem ser utilizados com cautela em pacientes com doenças do sistema nervoso central. ● Pode prolongar o tempo de protrombina em pacientes em tratamento com anticoagulantes. A fenitoína e o fenobarbital podem acelerar a eliminação do fármaco. A cimetidina pode diminuir a depuração plasmática. ● A dosagem deve ser reduzida em pacientes com doença hepática ou renal grave. Colite Pseudomembranosa O que é? ● Inflamação do cólon associada a infecção por Clostridium difficile. ● Pode cursar com a utilização de antibióticos que geram desequilíbrio da microbiota e facilitam a infecção pelo Clostridium difficile. 13/09/21 Mayara Tomaz 3 ● Grande parte dos indivíduos adquire a infecção em contexto hospitalar. Importante: o termo “colite pseudomembranosa” refere-se a colite associada a presença de pseudomembranas na colonoscopia ou retossigmoidoscopia. Entretanto, essa apresentação está presente apenas em 50% dos casos, sendo o termo “doença causada pelo Clostridium difficile” o mais abrangente. Pseudomembranas: quando infecções atingem superfícies ou mucosas há formação de exsudato (tecido não vivo) que confere aspecto laminar. Portanto, uma pseudomembrana é formada por bactérias, leucócitos mortos, tecido necrótico e outras substâncias. Membranas: formada por tecido vivo. Clostridium difficile ● Bactéria anaeróbia. ● Gram-positiva. ● Formadora de esporos. ○ Esporos: altamente resistentes e difíceis de serem eliminados. Conferem resistência no meio ambiente, o que torna mais fácil sua disseminação.● Produtora de toxinas (A e B). ● Resistente a agressões externas (calor, meio ácido, antibióticos, desinfetantes). Transmissão ● Via fecal-oral. ● Mecanismo mais comum: contato com objetos e utensílios contaminados. ● Presença de esporos são em superfícies como mesas, cadeiras, camas. ● Equipamentos médicos (estetoscópio e termômetro) também são importantes fontes de infecção no contexto hospitalar. ○ Importância da lavagem das mãos por profissionais da saúde que constantemente carregam nas mãos e nos seus acessórios esporos de bactérias (Obs.: Clostridium difficile é dificilmente eliminado com o uso de álcool em gel para as mãos). ● Fontes de infecção: doentes e infectados assintomáticos que eliminam esporos pelas fezes. Fatores de risco ● Idade avançada (> 65 anos). ○ Obs.: pode ocorrer em qualquer idade. ● Internações prolongadas. ● Uso recente de antibióticos (96% dos casos). O risco permanece aumentado por cerca de três meses. ● Asilos. ● Antibioticoterapia no geral. ● Antibioticoterapia prolongada. ● Associação antibiótica. ● Imunossupressão ou imunodeficiência. ● Uso de inibidor de bomba de prótons (IBPs). ● Uso de antagonistas dos receptores H2. ● Quimioterapia antineoplásica. ● Tratamento domiciliar. ● Ingestão de carne processada. ● Cirurgia gastrintestinal. ● Endoscopia digestiva. ● Sonda nasogástrica. ● Gastrostomia. ● Jejunostomia. ● Comorbidades em geral. ● Neoplasias sólidas. ● Neoplasias hematológicas. ● Fibrose cística. ● Diabetes mellitus. ● Cirrose hepática. 13/09/21 Mayara Tomaz 4 ● Doença renal crônica. ● Doença inflamatória intestinal. ● Desnutrição. ● Hipoalbuminemia. Fisiopatologia 1. Transmissão via fecal-oral Clostridium difficile. 2. Estômago (resistentes ao pH do suco gástrico). 3. Intestino delgado. 4. Germinação do Clostridium difficile e transformação em formas vegetativas. 5. Cólon. 6. Colonização da mucosa intestinal pelo Clostridium difficile e produção de toxinas A e B. 7. Liberação de substâncias inflamatórias pela toxina A (processo inflamatório na mucosa intestinal) e destruição epitelial (rompimento do citoesqueleto) pela toxina B ocasionando morte celular e fuga de fluidos. 8. Perda de líquido, diarréia, ulceração e formação de exsudato pseudomembranoso. ● Qualquer antibiótico pode precipitar um quadro de doença associada ao Clostridium difficile. ● Os mais frequentemente associados são as ampicilinas, quinolonas, cefalosporinas, clindamicina e penicilinas de largo espectro. ● Ao fazer o uso desses medicamentos, bactérias que colonizam o trato gastrointestinal acabam sofrendo a ação da droga sendo eliminadas ou tendo sua população destruída. ● Essas bactérias são uma espécie de “resistência” ao supercrescimento da Clostridium difficile, então sua eliminação acaba favorecendo este supercrescimento. Quadro clínico ● Doença leve: diarreia aquosa com eventual presença de muco de 3 a 5 evacuações por dia, dor abdominal em cólica especialmente na parte inferior do abdome e febre. ● Doença moderada: diarreia moderada não-sanguinolenta, dor e sensibilidade abdominal moderada, náuseas e vômitos ocasionais, desidratação. ● Doença grave: diarreia aquosa, mucosa e eventualmente sanguinolenta com mais de 10 evacuações por dia, dor abdominal intensa e difusa, diminuição do apetite, desidratação e distúrbios hidroeletrolíticos, náuseas e vômitos e febre alta (> 38,5°C). Diagnóstico Exame de fezes ou colonoscopia/retossigmoidoscopia. Exame de fezes ● Pesquisa de toxinas A e B nas fezes. ● Avaliar a presença de ambas as toxinas, pois raramente há presença isolada. ● Diagnóstico: pesquisa positiva de toxinas A e B. Colonoscopia/retossigmoidoscopia 13/09/21 Mayara Tomaz 5 ● Cólon recoberto de pseudomembranas brancas ou amareladas, salteadas a confluentes. ● Diagnóstico: presença de pseudomembranas na mucosa colônica. ● Obs.: não é recomendada a realização de rotina devido ao risco de perfurações durante o procedimento sendo reservadas em casos de dúvidas diagnósticas. Tratamento O tratamento é realizado somente em casos sintomáticos. Não há benefício no tratamento de assintomáticos. Inicialmente: retirada do antibiótico em uso. ● Se a retirada do antibiótico em uso não for possível, realiza-se a troca para um de espectro mais curto. ● Avaliar também a troca do imunossupressor, quimioterápico e inibidor da bomba de prótons. ● Ausência de resposta da retirada: tratamento com antibiótico com o objetivo de erradicar a bactéria. Casos leves ● Metronidazol 500 mg via oral de 8/8 horas por 10 a 14 dias. Casos moderados ● Considerar internação para tratamento hospitalar. ● Hidratação + metronidazol 500 mg via oral de 8/8 horas por 10 a 14 dias. ● Alternativa: vancomicina 125 mg via oral 6/6 horas por 10 a 14 dias. Casos graves ● Internação. ● Vancomicina 500 mg oral ou por sonda nasogástrica de 6/6 horas associada ou não a metronidazol 500 mg intravenoso de 8/8 horas. Casos graves complicados ● Vancomicina via oral 125 mg 6/6 horas por 10 a 14 dias + metronidazol 500 mg endovenoso de 8/8 horas por 10 a 14 dias. ● Considerar abordagem cirúrgica em caso de: ausência de resposta ao antibiótico, choque, sepse, alterações mentais, reação leucemóide, íleo paralítico, evolução fulminante, perfuração intestinal, megacólon tóxico não responsivo e enterite necrotizante.
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