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CADERNO DE ARTE E DIREITO – DANIEL NICORY – FBDG 2021.2 AULA 01 – ARTE E DIREITO: ESQUEMATIZAÇÃO DO SEMESTRE Introdução - Conceito de arte e direito – Arte é conceito polissêmico e que gera debates até os dias atuais. Uma dessas definições consiste na concepção de que a arte corresponde ao conjunto de produções humanas dotadas de expressões, de cunho identitário e de capacidade de sensibilizar os cidadãos. Já o direito consiste em uma ciência que busca pacificar as relações sociais e efetuar justiça O direito da arte – conjunto de normas jurídicas que buscam regular a arte (MFT, direitos autorais, limites da liberdade de expressão)... O direito na arte – expressões da arte que falam sobre o direito (“Antígona” de Sófocles; “O mercado de Veneza” de Shakespeare; “O processo” de Kafka...) Direito como arte – intersecção dos conceitos de direito e arte como na narrativa, comunicação, interpretação, argumentação, retórica... AULA 02 – A POÉTICA ARISTOTÉLICA 1. Introdução: 1.1 – A imitação da vida: a arte busca imitar a vida. Entretanto, essa imitação não é uma mera representação da realidade, envolvendo, principalmente, a capacidade criativa do criador; 1.2 – Análise de textos: 1.2.1 – Autopsicografia (Fernando Pessoa): O poeta é um fingidor Finge tão completamente Que chega a fingir que é dor A dor que deveras sente. E os que leem o que escreve, Na dor lida sentem bem, Não as duas que ele teve, Mas só a que eles não têm. E assim nas calhas de roda Gira, a entreter a razão, Esse comboio de corda Que se chama coração. As duas primeiras estrofes ratificam a tese aristotélica de que o poeta é um imitador da realidade. Nessa perspectiva, o poeta é caracterizado como um fingidor, valendo-se da arte de imitar com a finalidade de transmitir suas expressões e visão de mundo. Além disso, a obra escrita não corresponde à própria vida do autor, mas um fingimento, ou seja, é uma vida modificada, inclusive no que diz respeito à exposição de dores – sendo estas, na verdade, representações. A recepção por parte dos leitores é de suma importância para o alcance do objetivo da obra, tendo em vista que esses sentimentos, após a interpretação realizada por esses leitores, podem despertar outros sentimentos nesses leitores ou até a manifestação de determinadas atitudes (é a capacidade da arte de tocar o outro). Por último, é retratada a arte como um jogo, buscando, através de uma teorização, responder o seguinte questionamento: o que é arte? – abrindo espaço para a exploração de outros campos além da razão. 1.2.2 – Arte poética (Jorge Luís Borges): Fitar o rio feito de tempo e água e recordar que o tempo é outro rio, saber que nos perdemos como o rio E que os rostos passam como a água. Sentir que a vigília é outro sonho que sonha não sonhar e que a morte que teme nossa carne é essa morte de cada noite, que se chama sonho. No dia ou no ano perceber um símbolo dos dias de um homem e ainda de seus anos, transformar o ultraje desses anos em música, em rumor e em símbolo, Na morte ver o sonho, ver no ocaso um triste ouro, tal é a poesia, que é imortal e pobre. A poesia retorna como a aurora e o ocaso. Às vezes pelas tardes certo rosto contempla-nos do fundo de um espelho; a arte deve ser como esse espelho que nos revela nosso próprio rosto. Contam que Ulisses, farto de prodígios, chorou de amor ao divisar sua Ítaca verde e humilde. A arte é essa Ítaca de verde eternidade, sem prodígios. Também é como o rio interminável que passa e fica e é cristal de um mesmo Heráclito inconstante, que é o mesmo e é outro, como o rio interminável. Trad.: Josely Vianna Baptista Borges utiliza o pensamento do pré-socrático Heráclito, inicialmente, o qual defendia a tese de que os fenômenos naturais se encontram em constantes mudanças (é impossível banhar-se duas vezes em um mesmo rio pois este jamais será o mesmo) – dando ênfase à uma discussão ontológica baseada no devir (mobilismo). Nas duas primeiras estrofes, há uma discussão acerca da percepção da realidade (relembrando Aristóteles), centralizada na modificação e na perda das matérias com o decorrer do tempo. Na segunda estrofe, mais especificamente, é ampliada a discussão entre o real e o imaginário e na terceira estrofe, abordada a percepção do todo no particular – um processo de “simbolização”. Encaminhando-se para o final do poema, Borges sustenta a importância inerente à simplicidade da arte (humildade em detrimento do prodígio) como um mecanismo crucial para a resistência artística perante às transformações da realidade. Na quinta estrofe, há uma ênfase na questão da imitação – não como mera representação da realidade, mas dotada da capacidade de sensibilizar e causar impactos (catarse). A ideia central transmitida, principalmente no final da obra, consiste na concepção de que a arte se encontra inerente a essas modificações descritas por uma perspectiva heracliana, entretanto, a sua pobreza e simplicidade garantem a sua preservação e imortalidade – podendo-se falar em uma “cristalização”. 2. Poesia x História: 2.1 – História como representação do real: a história se dedica a relatar acontecimentos inerentes ao mundo dos fatos; 2.2 – Poesia como representação do possível: a poesia, aproximando-se mais da filosofia, apresenta a capacidade de transcender o mundo dos fatos bem como a sua cronologia – expressando desejos, vontades, sonhos, sofrimentos, entre outros aspectos; 2.3 – Verossimilhança: conceituada por Aristóteles como a sucessão de eventos de acordo com o necessário (determinações naturais) ou com o possível – sendo esta o principal foco da poesia. Vale ressaltar que a análise de verossimilhança envolve os pressupostos e desdobramentos contidos na própria obra; 3. Gêneros da representação: 3.1 – Tragédia: retrata fatos relevantes para a sociedade, representando personagens melhores do que as pessoas são na realidade – seja no caráter ou na capacidade de ação; 3.2 – Comédia: retrata personagens inferiores do que as pessoas são na realidade – seja no caráter ou na capacidade de ação; 4. Conceitos fundamentais da poética aristotélica: 4.1 – Mythos (organização dos fatos) – narrativa que geralmente busca explicar o natural baseado no sobrenatural. Para Aristóteles, o mito proporciona uma análise acerca do encadeamento lógico dos fatos (início, meio e fim); 4.2 – Mímesis (representação da ação) – o teatro é a fonte de todas as dramaturgias, envolvendo representações enquanto mímesis (embora não seja uma cópia da realidade); 4.3 – Katharsis (purificação espiritual) – corresponde ao efeito no público proveniente da conversa com o público, variando a depender do tipo de arte. No caso da tragédia, pode-se falar em terror e compaixão; no caso da comédia, simpatia e riso. Vale salientar que a catarse possui um vínculo mais forte com o mito (organização dos fatos) do que com a representação da ação; 4.4 – Dianoia (sentido da obra) – corresponde à mensagem transmitida, ou seja, à finalidade da obra transmitida por meio da catarse; 5. Recursos narrativos para a produção da catarse: 5.1 – Peripécia (reviravolta) – mudança da sorte para o azar, ou vice-versa; 5.2 – Descoberta (reconhecimento) – revelação de uma qualidade oculta de uma personagem para os outros personagens e/ou para o público; 5.3 – Patética (vem de padecer – sofrimento) – exposição direta da angústia da personagem; OBS: A paixão de Cristo é uma obra que contém os três elementos anteriormente citados de forma bastante evidente. A cena do beijo de Judas delimita a reviravolta unida ao reconhecido e, em seguida, há uma sucessão de fatos que demonstram o sofrimento de Cristo, culminando na cena final que se trata da crucificação. 6. Relações entre os conceitose exemplificação com Édipo Rei: 6.1 – Resumo do enredo: Na obra de Sófocles, Édipo Rei, o protagonista Édipo é condenado à morte quando ainda era um bebê. Após o seu pai – Lion - ouvir um oráculo de Delfos que profetizou que a criança iria matá-lo e ainda iria desposar sua esposa – a rainha Jocasta - o rei concordou que a melhor ação seria matar o bebê antes da profecia. Entretanto, isso acabou não acontecendo, pois um funcionário do palácio não obteve coragem para executar a ordem de homicídio e o recém-nascido cresceu distante de casa – numa família de camponeses. Quando Édipo completou dezoito anos consulta oráculo acerca do seu destino e entra em estado de choque ao se deparar com a revelação feita de que iria matar o seu pai e iria se casar com a sua mãe. Assim, resolve fugir do local em que vivia. Durante uma caminhada se desentendeu com um homem por conta da obstrução da passagem e o matou – e este era o seu pai biológico: Lion. Posteriormente veio a se apaixonar por uma mulher e a casar com a mesma em Tebas – sendo esta a sua mãe biológica: Jocasta. Entretanto, existia um clima ruim na cidade de Tebas devido à morte do rei Lion, iniciando-se investigações que culminam na descoberta de que Édipo havia assassinado Lion – revelada pelo depoimento de uma testemunha presente no dia do ato. Jocasta, percebendo que a profecia havia se cumprido por constatar ser uma pessoa mais velha que o atual marido e ter feito um raciocínio crítico, se envenena. Édipo fura seus próprios olhos (autoflagelação) – representando a ideia de que ele não havia percebido o que, de fato, estava acontecendo; 6.2 – Hubris (desmedida, soberba, arrogância): Motivo que conduziu à briga entre Édipo e Lion no trajeto – nenhum dos dois queria dar passagem ao outro. A arrogância corresponde a uma característica bastante propícia àqueles que são superiores (seja no caráter ou na capacidade de agir); 6.3 – Peripécia: Ocorre em conjunto com a descoberta do cumprimento da profecia, gerando uma desordem no ambiente familiar: envenenamento de Jocasta e autoflagelação de Édipo; 6.4 – Descoberta: Quando Édipo e Jocasta percebem o cumprimento da profecia; 6.5 – Patético: Autoflagelação de Édipo ao constatar que havia realizado a profecia; 6.6 – Dianoia: A natureza é um macrocosmo em relação aos homens, ou seja, os homens não podem fugir do destino (perspectiva mais voltada para à civilização antiga grega) e, por outro lado, a necessidade de se libertar de sentimentos degradantes como a arrogância (lição mais aceita no dia-dia, tendo em vista que a primeira se encontra vinculada a uma posição de conformismo). Em síntese, devemos buscar sermos mais humildes, pois apesar de podermos tanto, não podemos tudo e a arrogância é uma construtora de tragédias; REFERÊNCIA : A POÉTICA CLÁSSICA - ARISTÓTELES, HORÁCIO, LONGINO AULA 03 – TEORIA DOS MODOS FICCIONAIS 1. Sentido da superioridade ou inferioridade das personagens: Para Aristóteles, a distinção entre tragédia e comédia ocorre devido à superioridade ou à inferioridade dos personagens perante a realidade, respectivamente. Frye afirma que Aristóteles restringiu a sua perspectiva ao caráter dos personagens, fazendo muito mais sentido uma análise voltada para o poder, ou seja, a capacidade de ação – os personagens possuem consciência de que podem fazer muito mais seja para o bem ou para o mal. 2. Tragédia x comédia: Outro ponto que Frye se dispõe para criticar a poética aristotélica consiste na distinção entre tragédia e comédia. De acordo com Frye, a dicotomia tragédia e comédia não deveria se basear na questão de superioridade ou de inferioridade, tendo em vista que nos dois casos podem acontecer situações negligenciadas por Aristóteles (tragédias contendo personagens inferiores à realidade e comédias contendo personagens superiores à realidade). Nesse sentido, o autor propõe uma nova distinção baseada no critério de isolamento ou integração à realidade. 2.1 – Tragédia: narrativa de isolamento do herói da sociedade; 2.2 – Comédia: narrativa de integração do herói perante a sociedade; 3. Teoria dos modos ficcionais: 3.1 – Modo mítico (dionisíaco x apolíneo): nessas narrativas os personagens apresentam uma capacidade de ação superior aos outros seres e ao ambiente em espécie. O modo dionisíaco seria o modo mítico trágico e o modo apolíneo, o modo mítico cômico. A título exemplificativo pode-se citar Paixão de Cristo como modo mítico dionisíaco (enredos que retratam morte de deuses ou destruição de templos divinos) e a Ressureição de Cristo como modo mítico apolíneo (um recomeço divino). 3.2 – Modo maravilhoso (elegíaco x idílico): nessas narrativas há a presença de personagens com poderes sobrenaturais, porém não divinos. O modo elegíaco (ex: Game of Thrones) seria o modo maravilhoso trágico e o modo idílico (ex: Harry Potter), o modo maravilhoso cômico. A maior parte dos super-heróis são personagens maravilhosos, com algumas exceções como o batman, viúva negra, entre outros. 3.3 – Modo mimético elevado (destronador x recompensador): nessas narrativas não há divindades nem seres maravilhosos, mas a presença de personagens que se destoam da coletividade devido a determinadas habilidades como a capacidade intelectual (ex: Sherlock Holmes) ou física (ex: Batman). O destronador refere-se a narrativas trágicas e o recompensador, a narrativas de superação ou de inspiração. Capitu, uma das principais personagens de “Dom Casmurro” é considerada um mimético elevado devido à sua capacidade de persuasão, definida na obra como “cigana oblíqua e dissimulada”. Nesse sentido, há a sustentação da tese de que qualquer vida pode ser repleta de enredos interessantes e incomuns; 3.4 – Modo mimético baixo (patético x picaresco): nessas narrativas, assim como no modo mimético elevado, não há divindades nem seres maravilhosos, todavia, os poderes inerentes aos personagens são comuns. Como exemplo de patético pode-se citar Bentinho – protagonista de Dom Casmurro, enquanto “Se beber, não case” se encaixa como exemplo de um mimético baixo picaresco; 3.5 – Modo irônico (expiatório x lúdico): nessas narrativas, as personagens são inferiores e imponentes no que tange à capacidade de ação. O modo irônico expiatório corresponde ao trágico e o modo irônico lúdico, ao cômico. O modo irônico vincula-se à reação dos personagens diante da condição de impotência. Partindo desse pressuposto, Josef K – personagem kafkaniano – distingue-se de Solomon – de 12 anos de escravidão, tendo em vista que o segundo resiste veementemente diante das condições que lhe foram impostas, ao passo que Josef K foi declinando significativamente até culminar na sua morte encomendada por si mesmo. A título exemplificativo, “O processo” de Kafka se encaixa no irônico expiatório e “Os trapalhões” como irônico lúdico; OBS: Essas obras colocam dilemas éticos e jurídicos que não existem na vida real, mas colocam em dúvida eventos que podem vir a acontecer (por exemplo, a capacidade de destruição do mundo que antes era considerada meramente ficcional é evidente a sua aplicabilidade no contexto vigente, ilustrada no aperfeiçoamento das indústrias bélicas). Essas narrativas além de debater relações de poder, testam o medo do desconhecido e a capacidade da sociedade de reagir à intolerância. OBS: O mítico, muitas vezes, pode renascer do irônico devido à grande reviravolta inerente a determinadas narrativas. RESUMO: PODER DE AÇÃO DO HERÓI SITUAÇÃO MODO EXEMPLO Superior aos outros seres e ao ambiente em espécie Isolamento Mítico dionisíaco Paixão de Cristo, Ragnarok Superior aos outros seres e ao ambiente em espécie Integração Mítico apolíneo Ressureição de Cristo Superior aos outros seres e ao ambiente em grau Isolamento Maravilhoso elegíaco Game of Thrones Superior aos outros serese ao ambiente em grau Integração Maravilhoso idílico Harry Potter, Êxodo Superior aos outros seres em grau, mas não ao ambiente Isolamento Mimético elevado destronador O irlandês Superior aos outros seres em grau, mas não ao ambiente Integração Mimético elevado recompensador À procura da felicidade Nem superior aos outros seres nem ao ambiente Isolamento Mimético baixo patético Dom Casmurro Nem superior aos outros seres nem ao ambiente Integração Mimético baixo picaresco Se beber, não case Inferior aos outros seres Isolamento Irônico expiatório O processo Inferior aos outros seres Integração Irônico lúdico Os trapalhões AULA 04 – ESTRUTURAS NARRATIVAS 1. Introdução: Reuter e Todorov foram autores que buscaram sintetizar a concepção de que todas as narrativas, independentemente do ramo a qual pertencem, apresentam a mesma estrutura; 2. Estrutura da narrativa: 2.1 – Trama: O que? Por que? 2.2 – Narradores: Quem? 2.3 – Personagens: Quem? 2.4 – Tempo: Quando? 2.5 – Espaço: Onde? 3. Modelos narrativos: 3.1 – Ciclo Aristotélico: início > meio > fim; 3.2 – Intriga mínima completa (Todorov): equilíbrio > desequilíbrio > equilíbrio. De acordo com a lógica de Todorov, literatura é intriga, uma vez que busca a conexão entre dois polos. Partindo desse pressuposto, há um equilíbrio inicial rompido com uma situação de desequilíbrio (período de decadência e desenvolvimento das personagens) e a retomada de uma situação de equilíbrio – que, embora muitas vezes pareça, é distinta daquela situação de equilíbrio inicial. Mesmo que o desfecho seja considerado infeliz – como no caso de Romeu e Julieta – a morte é determinante de um equilíbrio e que, neste caso, é o equilíbrio supremo; 3.3 – Modelo quinário (Reuter): estado inicial > força perturbadora > dinâmica > força equilibradora > estado final. O pensamento de Reuter pode ser considerado uma ampliação do pensamento de Todorov, tendo em vista que há um detalhamento no processo de ocorrência do desequilíbrio. Nesse sentido, há uma força perturbadora que provoca um período de dinâmica (envolvendo conflitos e tentativas de resolução) e a condição de equilíbrio é retomada no estado final proveniente da atuação de uma força equilibradora. CICLO ARISTOTÉLICO INTRIGA MÍNIMA COMPLETA MODELO QUINÁRIO EXEMPLO: ÉDIPO-REI INÍCIO EQUILÍBRIO ESTADO INICIAL Lion e Jocasta vivem juntos e passam a ter consciência da profecia, ordenando a morte de Édipo MEIO DESEQUILÍBRIO FORÇA PERTURBADORA Édipo não morre e vive em um reino distante. Ao completar 18 anos passa a ter conhecimento da profecia e foge. No meio do trajeto mata um homem. Este era Lion MEIO DESEQUILÍBRIO DINÂMICA Édipo se casa com Jocasta, mas percebe que o reino estava amaldiçoado e melancólico. Investigações concluem que Édipo matou Lion MEIO DESEQUILÍBRIO FORÇA EQUILIBRADORA Jocasta se suicida e Édipo se autoflagela – furando seus próprios olhos FIM EQUILÍBRIO ESTADO FINAL A morte de Jocasta e de Édipo Mil e uma noites – Técnica de vários contos dentro de um só Primeiro nível – Shariyar e Sahrazad Segundo nível – Contos de Sahrazad Terceiro – Narrativas dentro dos contos de Sahrazad – no conto “o gênio e o mercador”, os contos relatados pelos sheiks visando a salvar o mercador da morte são contos dentro de um conto relatado por Sahzarad; AULA 05 – PERSPECTIVAS NARRATIVAS 1. Vozes narrativas (Reuter): 1.1 – Primeira pessoa (homodiegética): o narrador participa da história (narrador- personagem); 1.2 – Terceira pessoa (heterodiegética): o narrador não participa do que está sendo narrado (narrador-observador); 2. Perspectivas narrativas: 2.1 – Narrador heterodiegético: 2.1.1 – Perspectiva passando pelo narrador: narrador onisciente – possui extremo conhecimento acerca das personagens e dos fatos narrados (inclusive aqueles que acontecem simultaneamente) 2.1.2 – Perspectiva passando pela personagem: o narrador possui menos conhecimento em comparação com o narrador onisciente, aderindo, assim, a uma perspectiva narrativa baseada na psicologia das personagens; 2.1.3 – Perspectiva “neutra”: o narrador apresenta-se como uma testemunha objetiva; 2.2 - Narrador homodiegético: 2.2.1 – Perspectiva passando pelo narrador: narrador-personagem que relata os fatos de forma subjetiva. A título exemplificativo pode-se citar a obra “Dom Casmurro”, de Machado de Assis. Há, assim, uma perspectiva confessional; 2.2.2 – Perspectiva passando pela personagem: há uma nítida intimidade psicológica; 3. Níveis narrativos: 3.1 – Narrativas encaixadas: presença de narrativas dentro de uma narrativa maior. A título exemplificativo pode-se citar as narrativas relatadas pelos xeiques contidos nas histórias contadas por Shazarade em “Mil e Uma noites” e o filme “A origem”; 3.2 - Metalepse (quebra da quarta parede): a personagem “pausa” a história e interage com o público de forma muito evidente. A título exemplificativo pode-se citar Deadpool e alguns desenhos infantis como Dora Aventureira; 4. Vozes, perspectivas e níveis narrativos em “Frankenstein” (Mary Shelley): 4.1 – Resumo da trama: Victor Frankenstein é um cientista brilhante que, melancólico pela perda de sua mãe, tem dedicado sua vida e estudos a gerar vida artificialmente. Depois de tantas tentativas, o sucesso: ele dá vida a uma criatura disforme que ganha consciência e vontades e que se torna, aos olhos de Victor, uma ameaça e tormenta – resolvendo abandoná-lo. A criatura, aos poucos, vai tendo seu espírito corrompido devido ao abandono e às sucessivas rejeições que sofre pelos humanos por causa, principalmente, da sua aparência. O embate desenvolvido pela trama acontece entre esses dois - criador e criatura, retratando-se as vontades, medos e perseguições sofridas pela criatura visando a discutir acerca do real sentido de estar vivo. Nesse sentido, mais do que a criação, o abandono por parte do criador é determinante para a concretização do “monstro”; 4.2 – Vozes narrativas: Walton, Frankenstein, a criatura; 4.3 – Perspectivas narrativas: Frankenstein e a criatura sobre o mesmo fato; 4.4 – Níveis narrativos: Walton conta que Frankenstein contou que a criatura contou; 5. Análise temática de “Frankenstein” (Mary Shelley): 5.1 – Nascimento da ficção científica – alegoria da alquimia à ciência do aprendizado de Victor Frankenstein; 5.2 – Antevisão da bioética – “Brincar de Deus” (criador); 5.3 – A falha do criador não divino – Golem, Frankenstein, Eu, Robô (não há a mesma perfeição da criação divina – trazendo problemas); 5.4 – Reação violenta ao desconhecido monstruoso – dificuldade de lidar com o diferente; 5.5 – Corrupção do espírito do monstro pela rejeição humana; 5.6 – A revolta contra o criador – a criatura relata que não pediu para nascer e ser submetido àquelas condições; 5.7 – A dívida do criador – o não abandono de Victor poderia contribuir para melhorar a vida da criatura e conseguir, assim, uma inserção social. É colocada em questionamento a ideia de quem seria, de fato, o monstro da narrativa. AULA 06 – TIPOLOGIAS DA NARRATIVA POLICIAL 1. Introdução: breve exposição acerca do modo fantástico, as tipologias dos romances policiais e uma análise crítica dos romances sobre James Bond. 2. O modo fantástico – entre o estranho e o maravilhoso: 2.1 – Fantástico explicado (literatura policial): explicação naturalmente possível e pautada em aspectos racionais. A título exemplificativo pode-se citar “O caderno da Morte”. 2.2 – Fantástico hiperbólico: envolve relatos muitos exagerados sejam essas narrativas viagens ao desconhecido ou histórias de pescador.A título exemplificativo pode-se citar “Os Lusíadas”. Vale ressaltar que essas viagens também podem ser internas, apresentando, portanto, vínculo com um autoconhecimento; 2.3 – Fantástico instrumental: presença de objetos mágicos, ficção científica. A título exemplificativo pode-se citar “Harry Potter” e “Doutor estranho”; 3. Estrutura da narrativa policial (Todorov) - De acordo com Todorov, toda narrativa policial é composta por duas outras narrativas: 3.1 – História do crime: Marca o crime propriamente dito e que, em uma perspectiva racional, sempre acontecerá antes do inquérito; 3.2 – História do inquérito: Marca o julgamento do crime cometido no passado e a solução desse; 4. Tipologia do romance policial (Todorov) – A depender da forma pela qual crime e inquérito se combinam na narrativa e da prioridade desses elementos, pode-se afirmar a existência de três tipologias do romance policial: 4.1 – Romance de enigma (crime < inquérito): contendo uma grande riqueza de detalhes, os romances de enigma ilustram um evidente distanciamento do detetive e do narrador em relação ao ocorrido – sendo esses personagens, portanto, imunes. Além disso, o detetive apresenta habilidades que o diferenciam dos demais – como Sherlock Holmes – caracterizando o mimético elevado de Frye. Vale ressaltar que a literatura policial constrói a mentalidade de que aquele que está buscando proteger a sociedade apresenta uma imunidade, ou seja, detentor de uma “licença” para, inclusive, violar a lei (no caso de Sherlock Holmes há a realização de furtos, invasão de propriedades...); 4.2 – Romance negro ou sombrio (crime > inquérito): o crime se encontra em primeiro plano e há uma participação direta do detetive no caso e este, não sendo detentor de imunidade, chega a colocar a sua vida em risco. Ademais, é perceptível a presença de poucos detalhes e uma despreocupação com a psicologia das personagens. A título exemplificativo pode-se citar os contos de Rubem Fonseca sobre criminalidade; 4.3 – Romance de suspense (crime = inquérito): da fusão entre as duas tipologias anteriormente mencionadas surge o romance de suspense – evidenciando um protagonismo quase sempre de policiais que se expõem e enfrentam diretamente o crime. A título exemplificativo pode-se citar Capitão Nascimento em “Tropa de Elite” – responsável por garantir a proteção do papa. O romance de suspense se subdivide em “história do detetive vulnerável” – aquele que está integrado no universo das demais personagens e a “história do suspeito-detetive” – retratando o enredo de alguém que precisa provar a própria inocência (exerce, simultaneamente, os papéis de detetive, vítima e culpado). 5. Estrutura dos romances sobre James Bond (agente secreto britânico): 5.1 – Relações com o inimigo: os inimigos são estereotipados e provenientes de países que, à época de Guerra Fria, faziam parte de experiências socialistas; logo, Fleming – o autor responsável pela criação de Bond - passa visões particulares para a obra; 5.2 – Relações com o comando: Bond, embora dotado de grande autonomia (inclusive para matar), encontra-se subordinado a normas e, inclusive, chega a ser punido veementemente pelo não cumprimento de suas obrigações e pelo improviso; 5.3 – Relações com o par romântico: Bond trata as mulheres com desprezo e desrespeito, buscando seduzi-las, muitas vezes, para obter informações relevantes acerca de determinados casos – e, com isso, leva-as para a morte; AULA 07 – LITERATURA POLICIAL COMO UM JOGO INTELECTUAL 1. Nota biográfica e bibliográfica sobre Jorge Luís Borges: Argentino e de pensamento político conservador; 2. Borges-crítico: De acordo com Borges, a literatura policial corresponde a um jogo intelectual por envolver uma descoberta pautada em um raciocínio abstrato e não a descuido dos criminosos; Os romances policiais sombrio e de suspense – principalmente o primeiro – representariam, de acordo com Borges, uma decadência da literatura policial por se basear no excesso da violência. Nessa perspectiva, o gênero do enigma seria aquela literatura policial de essência, definindo a fragmentação nítida em início, meio e fim; CATEGORIAS TEÓRICAS DE BORGES CATEGORIAS TEÓRICAS DE TODOROV LIMITE DISCRICIONAL DAS PERSONAGENS Deve-se apresentar o menor número possível de personagens a fim de facilitar na solução do problema por parte do leitor. ROMANCE DE ENIGMA DECLARAÇÃO DE TODOS OS TERMOS DO PROBLEMA Deve-se evidenciar o máximo de informações possíveis, sem, contudo, revelar o desfecho. Entretanto, não se deve omitir tudo para não gerar um caso impossível de ser resolvido com o que fora apresentado. ROMANCE DE ENIGMA AVARA ECONOMIA DOS MÉDIOS Presença de personagens pobres e detentores de economias pouco rentáveis ROMANCE DE ENIGMA PRIMAZIA DO COMO SOBRE O QUEM O que interessa é o que foi feito e como foi feito, ao invés de quem realizou o ato – já que existem criminosos diversos. ROMANCE DE ENIGMA PUDOR DA MORTE O que se encontra é o cadáver, ou seja, o romance policial daria mais foco à perícia do crime do que o crime. ROMANCE DE ENIGMA NECESSIDADE E MARAVILHA NA SOLUÇÃO (SEM APELAR PARA O SOBRENATURAL) A solução do crime precisa impressionar o leitor, sem, contudo, apelar para o sobrenatural. FANTÁSTICO EXPLICADO DEGENERAÇÃO PELA VIOLÊNCIA EXPLÍCITA De acordo com Borges, os contos que se baseiam em uma violência explícita são desprovidos da essência da literatura policial. ROMANCE SOMBRIO 3. Borges-ficcionista 3.1 – A morte e a bússuola 3.1.1 – Cenário: Cidade inominada que reflete Buenos Aires como Gotham reflete Nova Iorque; 3.1.2 – Personagens: Investigador medíocre x investigador raciocinador; 3.1.3 – Vítimas: judias; 3.1.4 – Enredo: Influência e cobertura da mídia; LOCAL DIA VÍTIMA DETETIVE TREVIRANUS DETETIVE LONROT NORTE 03/12 Marcelo Yarmolinsky Hipótese da motivação econômica Hipótese da motivação religiosa (crime em série) OESTE 03/01 Daniel Azevedo Sem hipótese Hipótese da motivação religiosa (crime em série) LESTE 03/02 Grypihus- Ginzberg- Ginsburg? Simulacro Hipótese da motivação religiosa (crime em série) SUL 03/03 Red Scharlach ou Erik Lonrot? Sem hipótese Hipótese da motivação religiosa (crime em série) AULA 09 – A FRUSTRAÇÃO COM O DIREITO 3. Nota biográfica sobre Franz Kafka: 3.1 – Judaísmo: Kafka era judeu; 3.2 – Germanismo: nascido no Império austro-húngaro, no que hoje corresponde à Praga – capital da República Checa. Era muito mais germânico do que eslavo – tendo em vista que suas obras foram escritas em alemão e não em tcheco; 3.3 – Imperialismo; 3.4 – Relação com o pai: Kafka estabeleceu duras críticas à imposição de ordens e possuía dificuldades em lidar com relações de poder (era funcionário público e possuía conhecimento significativo nessa seara). Nesse sentido, Kafka também apresentou dificuldades com a autoridade paterna (pai opressivo e “difícil” de se conviver com); O contexto histórico de Kafka deve ser analisado unido ao conteúdo das suas obras – devido à intensa relação entre esses dois aspectos; No texto "O problema de nossas leis", Kafka adere uma perspectiva pessimista em relação ao Direito ao considerar que as leis foram criadas pela nobreza (elite dominante) em prol dos interesses da própria nobreza. Nesse sentido, o povo vive, durante séculos, em um "fio de navalha", ou seja, à margem do conhecimento das normas que regem a sociedade e esse povo, portanto, é mais inclinado a odiar a si mesmo. Apesar do exposto, Kafka considera que chegará um tempo em que a tradição e a investigação alcançarão a conclusão: tudo ficará claro, a lei pertencerá ao povo e a nobreza desaparecerá; Embora o que Kafka traga tenha veracidade (tese de que o “jogo jurídico” não começa0x0), essa veracidade é parcial, tendo em vista a possibilidade da parte mais fraca sair beneficiada em determinadas ocasiões. Essa segunda linha é a adotada por Daniel Nicory; Em “Uma mensagem imperial”, Kafka trata os operadores do direito como mensageiros (súditos) e corrobora a sua tese de que o ambiente jurídico constitui um ambiente restrito; Franz Kafka em “Diante da lei” – fragmento extraído da obra “O processo” -, retrata o dilema entre um porteiro e um camponês. O camponês dedica toda a sua vida na tentativa de convencer o porteiro a abrir a porta da lei e este não o faz, declarando no final que aquela porta já estava destinada ao camponês. Aqui se infere uma comunicação precária entre as partes e, novamente, o alcance restrito do ambiente jurídico defendido pelo autor; SÍNTESE: O PROBLEMA DAS NOSSAS LEIS UMA MENSAGEM IMPERIAL DIANTE DA LEI Ordem de grandeza temporal Séculos Milênios Uma vida Aspirantes ao Povo Súdito distante Camponês Direito Detentores da autoridade Nobreza Grandes do Reino Porteiros Agentes ineficazes Estudiosos da lei Imperador Moribundo e seu mensageiro Camponês Thiago Coelho – FBDG 2021.2 @taj_studies
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