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Conceitos Psicopedagógicos W B A 0 0 4 2 _ v2 _ 1 2/244 Conceitos Psicopedagógicos Autoria: Prof.ª Rafaela de Menezes Souza Brissac Como citar este documento: BRISSAC, Rafaela de Menezes Souza. Conceitos Psicopedagógicos. Va- linhos: 2017. Sumário Apresentação da Disciplina 03 Unidade 1: Perspectiva Histórica: A Construção da Psicopedagogia 04 34Unidade 2: Psicopedagogia no Brasil 64 98 Unidade 3: A Profissão e a Ética do Psicopedagogo 123 149 Unidade 4: Proposições e Papel da ABPp 179 211 2/244 Unidade 5: O Psicopedagogo e seu Objeto de Estudo Unidade 6: A Questão da Aprendizagem Unidade 7: Intervenção Psicopedagógica no Fracasso Escolar Unidade 8: Apoio das Neurociências 2/235 4/244 Apresentação da Disciplina A disciplina “Conceitos psicopedagógi- cos” aborda de forma clara e objetiva os conceitos que embasam a psicopedagogia como um campo de conhecimento teórico e prático. Inicialmente será apresentada uma perspectiva histórica da psicopedagogia, contextualizando a origem dela no mundo e no Brasil. O entendimento do processo histórico, que envolve a prática e o nasci- mento dessa área como uma área do conhe- cimento, permite ao leitor compreender os principais aspectos que levaram os profis- sionais da época a buscar um tipo de inter- venção voltada para crianças que apresen- tavam dificuldades de aprendizagem. Entender o papel profissional do psicopeda- gogo também é um dos objetivos que se es- tabelece com esta disciplina. Para tal, serão abordados pontos importantes previstos no código de ética, que foi elaborado pela ABPp – Associação Brasileira de Psicopeda- gogia. Este conhecimento se mostra impre- scindível para todos os profissionais que já atuam ou que pretendem atuar como psi- copedagogos. Além disso, serão explicitados o objeto de estudo da psicopedagogia, quem é o sujeito que recebe este atendimento e qual o campo de atuação para os profissionais dessa área. Os estudos mais recentes, que envolvem o impacto das neurociências frente ao fra- casso escolar, também serão apresentados nesta disciplina. De forma geral, os assun- tos que serão aqui abordados irão constituir uma base importante para o entendimento da psicopedagogia como área de conheci- mento e prática profissional. 3/235 5/244 Unidade 1 Perspectiva Histórica: A Construção da Psicopedagogia Objetivos 1. Contextualizar o período histórico em que se iniciam as preocupações com os problemas de aprendizagem; 2. Propiciar a compreensão dos aspectos que levaram ao surgimento da Psicope- dagogia enquanto área de conhecimento; 3. Contribuir para o entendimento do caráter multidisciplinar da psicopedagogia, localizando as bases teóricas que serviram de respaldo para a sua construção; 4. Elucidar os movimentos iniciais ocorridos na França, que contribuíram para o fortalecimento da psicopedagogia e sua especificidade; 5. Promover o conhecimento das etapas do desenvolvimento da psicopedagogia na Argentina. 4/235 Unidade 1 • Perspectiva Histórica: A Construção da Psicopedagogia6/244 Introdução A psicopedagogia enquanto área do conhe- cimento pode ser considerada recente em relação a outras áreas. A preocupação com os problemas de aprendizagem foi o que deu início a construção dessa área que hoje se encontra mais consolidada. Esta preocupa- ção despertou o interesse de profissionais de diversas formações, incluindo médicos, pedagogos, psicólogos, entre outros. Conhecer as origens da psicopedagogia, bem como compreender o momento his- tórico em que se deu o seu início contribui para a formação do profissional que preten- de atuar nesta área. O tema a seguir abor- dará toda a trajetória do desenvolvimento da psicopedagogia, desde o seu surgimento na França até o momento de sua chegada no Brasil. Para isso, serão apresentados os principais fatos históricos que influencia- ram o pensamento dos primeiros estudio- sos que se dedicaram a entender os chama- dos “distúrbios de aprendizagem” no século XIX. Você terá a oportunidade de conhecer a trajetória dos cursos de formação em psi- copedagogia na Argentina, país que mais influenciou o Brasil em suas práticas psico- pedagógicas. A importância deste tema “Perspectiva his- tórica: a construção da Psicopedagogia” é imprescindível, uma vez que propicia o entendimento de aspectos que sustentam hoje a prática e as intervenções realizadas por psicopedagogos. 5/235 Unidade 1 • Perspectiva Histórica: A Construção da Psicopedagogia7/244 1. O conceito de Psicopedagogia A princípio, ao ouvirmos a palavra “psico- pedagogia”, é natural pensarmos que este é um termo que combina ou tenta fazer a jun- ção entre dois campos do conhecimento, o da psicologia e o da pedagogia. A própria explicação do que vem a ser psicopedago- gia, muitas vezes, se baseia nessa combi- nação/junção destes dois campos, ou da incidência de um sobre o outro, por exem- plo: a aplicação da psicologia na prática pe- dagógica, ou a aplicação da pedagogia na prática psicológica. Não é incomum haver equívocos na explicação do que vem a ser a psicopedagogia, até mesmo por parte da- queles que estão diretas ou indiretamente envolvidos com educação. Ao buscarmos as definições de psicopeda- gogia em dicionários da língua portuguesa, temos como resultados: • Pedagogia baseada na psicologia científica, especialmente da criança.1 • Utilização pedagógica da psicologia (por meio de testes, prática de méto- dos ativos ou emprego da psicanálise2. Vários autores contribuíram na tentativa da formação da psicopedagogia como uma ci- ência com um corpo teórico próprio, a co- meçar pela tentativa em defini-la. Muitos concordam que ela surgiu na fronteira entre 1 Fonte: <https://dicionariodoaurelio.com/psicopeda- gogia>. Acesso em: 1 out. 2017. 2 Fonte: <https://www.dicio.com.br/psicopedagogia>. Acesso em: 1 out. 2017. 6/235 https://dicionariodoaurelio.com/psicopedagogia https://dicionariodoaurelio.com/psicopedagogia https://www.dicio.com.br/psicopedagogia Unidade 1 • Perspectiva Histórica: A Construção da Psicopedagogia8/244 a pedagogia e a psicologia, mas é preciso cautela nesta afirmação. Kiguel (1991 apud BOSSA, 2007) refere que a psicopedagogia tem como objetivo aten- der às crianças que não conseguiam apren- der no sistema convencional de educação, e que, portanto, eram consideradas crianças com “distúrbios de aprendizagem”. O au- tor destaca a utilização de fatores etiológi- cos para explicar índices altos do fracasso escolar, envolvendo principalmente: desnu- trição, problemas neurológicos, psicológi- cos, entre outros. Durante muito tempo foi aceita no Brasil e no mundo, a ideia de que os problemas de aprendizagem estivessem relacionados a fatores neurológicos. Isso demonstra a valorização de uma concepção organicista. Apesar de ter surgido na fronteira entre es- sas duas ciências, não é possível reduzir este campo somente a elas, principalmente por- que o ser humano é um ser pluridimensio- nal (COSTA; PINTO; ANDRADE, 2013). Para Bossa (2007) é preciso reconhecer o caráter interdisciplinar desse campo de estudo, e Para saber mais Em 1981, o National Joint Comitee for Learning Di- sabilities trouxe como definição de distúrbios de aprendizagem que “é um termo genérico que se refere a um grupo heterogêneo de alterações ma- nifestas por dificuldades significativas na aqui- sição e uso da audição, fala, leitura, escrita, ra- ciocínio ou habilidades matemáticas” (MOYSES; COLLARES, 1992). 7/235 Unidade 1 • Perspectiva Histórica: A Construção da Psicopedagogia9/244 ao mesmo tempo fortalecer a sua especifi- cidade enquanto prática profissional. Nes- te sentido, a autora resgata a ideia de que a psicopedagogia surgiu inicialmente como área de aplicação, para depois se tornar uma área de estudos. O objeto de estudo da psicopedagogia, as- sim como sua definição, passou por diversas fases, em função dos diferentes momentos históricos, contudo, é possível afirmar que, inicialmente, o principal objetode prática e estudo da psicopedagogia remetia ao cui- dar ou tratar dos problemas de aprendiza- gem (BOSSA, 2007). Com o passar do tempo, a visão do que se- ria o objeto de estudo da psicopedagogia começa a ser ampliada e discutida sob di- versos aspectos. Nesse sentido, a contri- buição de Kiguel (1991) merece destaque. Para o autor, num primeiro momento, havia um interesse da psicopedagogia em desen- volver metodologias que atendessem me- lhor àqueles que tinham dificuldades para aprender, ou seja, o foco estava na reedu- cação, ou na remediação e o objetivo era fazer com que o sintoma (dificuldade) desa- parecesse. Num segundo momento, a psi- copedagogia passa a se ocupar com a com- preensão do processo de aprendizagem, buscando entender como ocorre a relação entre o aprendiz e o processo de aprendiza- gem. Neste momento, o objeto de estudo da psicopedagogia torna-se mais abrangente, e envolve o conhecimento de como se dá o processo de aprendizagem como um todo, e não só em corrigir os problemas de apren- dizagem. 8/235 Unidade 1 • Perspectiva Histórica: A Construção da Psicopedagogia10/244 Podemos dizer então que, no início, o ob- jeto de estudo era o sujeito que não podia aprender. Foi um período em que se bus- cava estabelecer a “normalidade”, e tudo que se diferenciava disso, caracterizando a anormalidade, se tornava objeto da psico- pedagogia. Posteriormente, a psicopeda- gogia passa a ter uma visão mais ampla, ao considerar a complexidade do ser humano e compreender que o “não aprender” pode ser visto como uma forma diferente de apren- der. Abre-se espaço para a singularidade do sujeito que aprende. Leva-se em conta di- versos fatores que podem influenciar nesse processo, principalmente o contexto. A vi- são organicista passa a ter menos valor, e o conceito de anormalidade começa a cair em desuso, propiciando a compreensão por parte dos profissionais da área, de que a for- ma de aprender de cada indivíduo, pode se dar de modos diferentes, singulares (BOS- SA, 2007). Com isso, ao estabelecer como objeto de es- tudo as questões relativas à aprendizagem, este campo de conhecimento ganha espe- cificidade. Ao mesmo tempo que ganha es- pecificidade, se constitui como um campo multidisciplinar, se ancorando em ciências já estruturadas na época. Inicialmente re- cebeu a influência da medicina, psicanálise, psicologia e pedagogia, para se fortalecer enquanto uma área do conhecimento. É consenso que o objetivo da psicopedago- gia é contribuir com a diminuição do fra- casso escolar, a partir do entendimento dos problemas de aprendizagem e do processo 9/235 Unidade 1 • Perspectiva Histórica: A Construção da Psicopedagogia11/244 que leva o indivíduo a aprender, permitindo assim a elaboração de práticas que se mostrem efi- cientes, considerando a singularidade do aprendiz (BOSSA, 2007; FONTES, 2005; COSTA, PINTO; ANDRADE, 2013). Um conceito utilizado atualmente pode ser encontrado no código de ética formulado pela ABPp (Associação Brasileira de Psicopedagogia). O artigo 1° traz que: A Psicopedagogia é um campo de atuação em Educação e Saúde que se ocupa do processo de aprendizagem considerando o sujeito, a família, a escola, a sociedade e o contexto sócio-histórico, utilizando procedimentos próprios, fundamentados em diferentes referenciais teóricos (CÓDIGO DE ÉTICA E ESTATUTO DA ABPp, 2011). Ao apontarmos os aspectos acima, fica claro que entender o conceito de psicopedagogia implica muito mais do que buscar uma definição, requer uma compreensão do seu objeto de estudo, do seu objetivo enquanto prática e campo de conhecimento e também das teorias que embasam essa prática. Todos estes aspectos se tornam mais claros quando conhecemos a história da psi- copedagogia, compreendendo os fatores que contribuíram para o seu surgimento, como poderá ser visto no próximo tópico. 10/235 Unidade 1 • Perspectiva Histórica: A Construção da Psicopedagogia12/244 2. O surgimento da psicopeda- gogia: o resgate histórico De acordo com Bossa (2007), a psicopeda- gogia teve origem, ainda no século XIX na Europa, mais precisamente na França. O resgaste histórico deste período faz-se ne- cessário, na medida em que contextualiza as bases que permearam o pensamento dos teóricos da época. No século XIX consolida-se fortemente o ca- pitalismo industrial. Com isso, a maior par- te dos regimes políticos, que neste período eram conduzidos pela monarquia, passam a adotar outros tipos de regime político. A extinção dos regimes monárquicos promo- ve, de certa forma, a chegada da burguesia ao poder. Assim, a burguesia passa a deter, além do poder econômico, também o poder político (BOSSA, 2007; FONTES, 2005). Além disso, o capitalismo industrial, por conta de suas próprias características en- quanto sistema econômico, contribui para o enfraquecimento dos ideais burgueses de “igualdade e fraternidade”. Em outras pa- Link MACHADO, Fernanda. Capitalismo industrial: capitalismo e revoluções das novas tecnologias. Pedagogia e Comunicação. Especial para a página 3 - Uol Educação: 2005. Disponível em: <https:// educacao.uol.com.br/disciplinas/historia/ capitalismo-industrial-capitalismo-e-revo- lucoes-das-novas-tecnologias.htm>. Acesso em: 1 out. 2017. 11/235 https://educacao.uol.com.br/disciplinas/historia/capitalismo-industrial-capitalismo-e-revolucoes-das-novas-tecnologias.htm https://educacao.uol.com.br/disciplinas/historia/capitalismo-industrial-capitalismo-e-revolucoes-das-novas-tecnologias.htm https://educacao.uol.com.br/disciplinas/historia/capitalismo-industrial-capitalismo-e-revolucoes-das-novas-tecnologias.htm https://educacao.uol.com.br/disciplinas/historia/capitalismo-industrial-capitalismo-e-revolucoes-das-novas-tecnologias.htm Unidade 1 • Perspectiva Histórica: A Construção da Psicopedagogia13/244 lavras, este tipo de sistema não favorece a possibilidade real de uma sociedade frater- na e igualitária para todos. Como consequência, surge a necessidade de justificar as desigualdades que se apresen- tam como frutos dessa “sociedade de clas- ses”, inerente ao capitalismo. A explicação para as desigualdades presentes nesta so- ciedade emergente será fundamentada na ciência e nas formulações teóricas da épo- ca. Hobsbawn (1998, apud BOSSA, 2007) aponta que a sociedade burguesa desse pe- ríodo estava orgulhosa de seus avanços na ciência. E mais do que isso, estava prepara- da para subordinar todas as outras ativida- des intelectuais a estes avanços científicos. Havia uma crença no cientificismo, que su- geria a existência de um conhecimento se- guro e certo, quando produzido por meio da aplicação de um método científico. O conhecimento produzido por meio da aplicação de métodos e da racionalidade empírica tem início no final do século XVI, com Francis Bacon, que pode ser conside- rado o precursor da chamada ciência mo- derna e positiva. Apesar de ter surgido no século XVI, será somente a partir do século XIX que as ideias de Bacon ganham força. A influência do seu pensamento domina o pensamento científico até os dias de hoje (BOSSA, 2007). 12/235 Unidade 1 • Perspectiva Histórica: A Construção da Psicopedagogia14/244 Quando a ciência positiva ganha força, prin- cipalmente por operar com fatos objetivos e precisos, que se mostram ligados entre si, numa espécie de cadeia de causa e efeito, a forma de se produzir conhecimento muda completamente. Qualquer conhecimento que era produzido por métodos advindos do racionalismo empírico era aceito na época, como leis uniformes e invariantes. É possível considerar que este período do século XIX, com a concepção positiva de ciência, marca o fim de um estágio da humanidade em que o entendimento dos fenômenos do Univer- so era proveniente de superstição e especu- lação metafísica (HOBSBAWM, 1988). Todas as teorias que apareceram no decor- rer do século XIX possuíam a concepção po- sitivista. Como exemplo, Bossa (2007) des- taca a psicologia, que neste períodosurge como ciência independente, e que assim como outras ciências e teorias da época, se ancorou nos princípios da biologia para construir seu corpo teórico. Percebe-se um movimento de aplicar as leis que regem a natureza sendo aplicadas também para a compreensão do homem e da sociedade Para saber mais Francis Bacon (1561-1626) foi um filósofo, políti- co e ensaísta inglês, que contribuiu para uma mu- dança na forma de produzir conhecimento. Uma breve biografia que pode auxiliar na compreen- são do pensamento do filósofo pode ser vista em: <https://www.ebiografia.com/francis_ba- con/>. Acesso em: 18 out. 2017. 13/235 https://www.ebiografia.com/francis_bacon/ https://www.ebiografia.com/francis_bacon/ Unidade 1 • Perspectiva Histórica: A Construção da Psicopedagogia15/244 como um todo. No que se refere à psicolo- gia, Patto (1996, apud BOSSA, 2007) refere que o comportamento passa a ser medido e controlado no laboratório. O caráter he- reditário e genético é valorizado, e alguns testes psicológicos, principalmente os de inteligência, tentam comprovar que a capa- cidade intelectual do ser humano é resulta- do de aptidões naturais e humanas, geneti- camente herdadas. 3. O Reflexo da Ciência Moderna na Escola: O Início da Psicope- dagogia Curativa Todo o percurso histórico apresentado até o momento contribui para o entendimento do contexto em que nasceu a Psicopedago- gia e das raízes científicas por trás do pen- samento dos profissionais envolvidos com a educação na época. Os testes psicológicos, conforme citados anteriormente, passam a ser valorizados, em virtude do seu caráter científico. Na escola, os testes irão tentar explicar as diferenças de rendimento entre os alunos. Como este conhecimento (dos testes) era produzido cientificamente, era considerado, portanto, único e verdadeiro, direcionando as ações de psicólogos e pedagogos da época. Todo esse percurso histórico nos ajuda a compre- ender o enfoque orgânico, que inicialmente orientou médicos, educadores e terapeu- tas na forma de entender os problemas de aprendizagem. 14/235 Unidade 1 • Perspectiva Histórica: A Construção da Psicopedagogia16/244 Bossa (2007) aponta que estudos neuroló- gicos, neurofisiológicos e neuropsiquiátri- cos passam a ser estimulados, e passam a classificar de forma taxativa como “anor- mais” os pacientes que não alcançam os ín- dices considerados “normais” como resul- tados destes estudos. Dos centros psiquiá- tricos para a escola, o conceito de anorma- lidade passou a ser utilizado com as crian- ças que não conseguiam aprender. Por trás dessa visão, havia a interpretação de que o fator causador do fracasso escolar da crian- ça que não aprendia era alguma anomalia. Dessa forma, a criança que não conseguia aprender era vista como “anormal”. Sua di- ficuldade era vista como um distúrbio, uma anomalia anatomofisiológica. O início da Psicopedagogia estava marca- do por uma maior preocupação com as de- ficiências sensoriais e debilidades mentais do que propriamente pela desadaptação infantil. Em 1946, após a segunda guerra mundial, é fundado o primeiro Centro Médi- Para saber mais Binet (1857-1911), pesquisador de Psicologia Ex- perimental criou uma escala de inteligência, que tentava separar a inteligência natural da inteli- gência desenvolvida pela educação. Aqueles que não conseguiam atingir a “norma” eram categori- zados como anormais. Esse conceito de anorma- lidade no cotidiano escolar evidenciou problemas que os professores não se sentiam preparados para resolver. 15/235 Unidade 1 • Perspectiva Histórica: A Construção da Psicopedagogia17/244 co-Psicopedagógico em Paris, pelos psica- nalistas franceses Juliette Boutonier e Ge- orge Mauco. Este centro tinha por objetivo articular Medicina, Psicologia, Psicanálise e Pedagogia, com a finalidade de entender e resolver os problemas de aprendizagem na escola. Este primeiro enfoque estava am- parado na Biologia e Medicina, e o objeti- vo final era conseguir uma readaptação do aluno ao sistema de ensino, de modo a al- cançar o sucesso escolar (FONTES, 2005). A “psicopedagogia curativa”, termo cria- do pela autora francesa Janine Mery, tam- bém segue nessa linha, e pode ser enten- dida como um método que favorecia a re- adaptação pedagógica do aluno, buscando tratar crianças e adolescentes que tinham problemas escolares (BOSSA, 2007). Uma outra definição para “psicopedagogia cura- tiva” seria: “uma terapêutica para entender a criança e adolescentes desadaptados que, embora inteligentes, tinham maus resulta- dos escolares” (COSTA; PINTO; ANDRADE, 2013, p. 11). 4. Os Avanços da Psicopedago- gia na Argentina A psicopedagogia argentina exerce gran- de influência na psicopedagogia brasileira, portanto, é indispensável conhecer sua his- tória e seus pressupostos teóricos para en- tão, compreendermos as bases que susten- tam a prática da psicopedagogia no Brasil. Como primeiro país da América Latina a se envolver mais fortemente com as questões 16/235 Unidade 1 • Perspectiva Histórica: A Construção da Psicopedagogia18/244 de aprendizagem, e com a psicopedagogia de fato, a Argentina teve papel importante no desenvolvimento deste campo de conhe- cimento. O início da psicopedagogia no país é definido mais por suas práticas, pelas inter- venções, para depois se estruturar como um curso de formação. Bossa (2007) refere que alguns profissionais de outras áreas viram a necessidade de uma prática que pudesse re- solver os fracassos escolares e começaram fazendo reeducação, trabalhando principal- mente com as funções egoicas: memória, percepção, atenção, motricidade e pensa- mento, medindo esses déficits e propondo tratamentos para resolver as falhas presen- tes. Havia forte influência do pensamento francês nas práticas e nas formas de conce- ber a psicopedagogia na Argentina (COSTA; PINTO; ANDRADE, 2013). Foi em 1956 que a profissão de psicopeda- gogia se torna mais estruturada no país, com a abertura do primeiro curso universitário, na Universidade de Salvador em Buenos Aires (RENAULT, 2006). O curso funcionava junto à Faculdade de Psicologia, e possuía um enfoque de especialização para profes- sores (COSTA; PINTO; ANDRADE, 2013). Diversos autores apontam que é possível observar que houve três momentos distin- tos na psicopedagogia da Argentina, que Link Confira os artigos da Revista de Psicología y Psico- pedagogía – Universidad del Salvador – n. 1, 2016. Disponível em: <http://p3.usal.edu.ar/index. php/psicol/index>. Acesso em: 18 out. 2017. 17/235 http://p3.usal.edu.ar/index.php/psicol/index http://p3.usal.edu.ar/index.php/psicol/index Unidade 1 • Perspectiva Histórica: A Construção da Psicopedagogia19/244 podem ser observados principalmente em função das mudanças no curso, e conse- quentemente na formação do profissional de psicopedagogia (BOSSA, 2007; FONTES, 2005; COSTA; PINTO; ANDRADE, 2013). Es- tes mesmos autores apontam as principais características presentes em cada um des- tes momentos, observados na forma como os cursos se estruturavam, conforme ex- posto a seguir: 1° MOMENTO (referente aos planos de es- tudos dos anos de: 1956, 1958 e 1961): • Para participar do curso era necessá- rio ter o título de docente, ou seja, o diploma da escola normal. • O profissional de psicopedagogia ti- nha como principal objetivo enfrentar os graves problemas que a pedago- gia enfrentava, a saber: crise na es- cola, métodos inadequados, aumento no número de matrículas (expansão demográfica pós-guerra), evasão es- colar, repetência e dificuldades na aprendizagem sistemática. • A proposta do curso tinha uma ênfase na formação filosófica, psicológica e na nova prática, a psicopedagogia. • A duração do curso era de 3 anos. 2° MOMENTO (referente aos planos de es- tudos dos anos de 1963, 1964 e 1969): • Em função da influência da Psicologia Experimental, a formação do psico- pedagogo passou a incluir o conheci- mento de instrumentos de medição,18/235 Unidade 1 • Perspectiva Histórica: A Construção da Psicopedagogia20/244 que pudesse contribuir para a avalia- ção das funções cognitivas e afetivas do estudante. • A inclusão de disciplinas relativas a instrumentos e testes psicológicos aumenta a duração do curso que pas- sa a ter quatro anos. • Em 1969, a escola normal é extinta na Argentina e o curso começa a re- ceber alunos com título secundário de várias procedências, que não neces- sariamente possuíam conhecimentos de pedagogia ou didática. • Torna-se imprescindível uma refor- mulação do currículo. 3° MOMENTO (referente ao plano de ensino do ano de 1978): • Cria-se a licenciatura em psicopeda- gogia, tornando o curso uma carreira de graduação. • O curso passa a ter duração de cinco anos. • Inclui-se as disciplinas “Clínicas Pe- dagógicas I e II”, com o objetivo de va- lorizar o papel do profissional do psi- copedagogo enquanto terapeuta. As mudanças ocorridas em função do plano de ensino de 1978 se mantêm até hoje na Argentina, e a inclusão do olhar e da escu- ta clínica psicanalítica retrata o perfil atual do profissional de psicopedagogia do país. Valorizou-se a área clínica, incluindo diag- nóstico e tratamento (FONTES, 2005). 19/235 Unidade 1 • Perspectiva Histórica: A Construção da Psicopedagogia21/244 No processo do desenvolvimento da psico- pedagogia ocorrido na Argentina nota-se que houve uma mudança na abordagem desta prática, que foi da “reeducação” à “clí- nica”. Esta mudança é decorrente da per- cepção de alguns profissionais, que ao con- seguirem cuidar dos problemas de aprendi- zagem dos indivíduos, após algum tempo, surgiam outros problemas mais graves de natureza psicológica. Os profissionais en- tenderam que a questão da aprendizagem podia ser vista como um sintoma de alguma enfermidade mais grave, e por isso, viu-se a necessidade de incluir em seu trabalho o olhar e a escuta clínica, que traduz o perfil do profissional de psicopedagogia da Ar- gentina até os dias de hoje (BOSSA, 2007). Bossa (2007) ressalta que a atuação psi- copedagógica na Argentina está então li- gada às áreas de educação e saúde. Sendo a principal função do psicopedagogo na educação contribuir para a diminuição do fracasso escolar, e na saúde, sua função é reconhecer e atuar sobre as alterações da aprendizagem sistemática, buscando des- cobrir como o sujeito aprende, por meio de diagnósticos, testes, entrevistas com pais, entre outros recursos. Para saber mais A partir de 1984, com a Resolução nº 2473/84 do Ministério da Educação Argentina, são definidas, oficialmente, as incumbências da profissão na- quele país. Assim, a partir de então a clínica passa a ser praticada somente por licenciados. 20/235 Unidade 1 • Perspectiva Histórica: A Construção da Psicopedagogia22/244 De acordo com Fontes (2005), as autoras que mais contribuíram nesta última fase de desenvolvimento da psicopedagogia na Argentina foram Alicia Fernandez e Sarah Pain. A psicopedagogia no Brasil recebe forte influência destas autoras. Argenti e Escott (2001) referem que as autoras possuem uma visão psicopedagógica mais ampla, e que consideram a aprendizagem como uma articulação da inteligência, desejo, corpo e organismo, aproximando mais a teoria psi- canalítica da psicopedagogia. A história da psicopedagogia nos possibili- ta o entendimento de como se desenvolveu esse campo de conhecimento no Brasil, que será o assunto do próximo tema desta disci- plina: A psicopedagogia no Brasil. Link Cruzando as fronteiras da história da psicopeda- gogia: uma entrevista com Alicia Fernández. LELIS, Maria Terezinha Carrara. Cruzando as fron- teiras da história da psicopedagogia: uma entre- vista com Alicia Fernández. Rev. Psicopedagogia, São Paulo, v. 25, n. 78, p. 186-197, 2008. Dispo- nível em: <http://pepsic.bvsalud.org/pdf/psi- coped/v25n78/v25n78a02.pdf>. Acesso em: 3 out. 2017. 21/235 http://pepsic.bvsalud.org/pdf/psicoped/v25n78/v25n78a02.pdf http://pepsic.bvsalud.org/pdf/psicoped/v25n78/v25n78a02.pdf Unidade 1 • Perspectiva Histórica: A Construção da Psicopedagogia23/244 Glossário Cientificismo: é a tendência intelectual ou concepção filosófica de matriz positivista que afirma a superioridade da ciência sobre todas as outras formas de compreensão humana da realidade (religião, filosofia, metafísica etc.). Funções egoicas: são forças do ego importantes para a compreensão dinâmica do comporta- mento, e podem ser divididas em: a) funções egoicas básicas – voltada para o mundo exterior e para aspectos de si próprio: percepção atenção, memória, pensamento, previsão (programação da ação) execução, controle e coordenação de ação; b) funções defensivas – têm a finalidade de neutralizar ansiedades criadas entre condições de realidade, fantasias, impulsos e proibições: dissociação, negação e evitação e trabalham simultaneamente com as funções básicas psicoló- gicas; c) funções integradoras, sintéticas ou organizadoras – A força destas funções integrado- ras é “posta àa prova” quando diante de mudanças na situação de vida, o sujeito tem que reor- ganizar suas relações com o mundo , através de uma mobilização seletiva de novas funções de adaptação. Visão organicista: visão pautada no organicismo, que é uma teoria segundo a qual as doenças são resultadas de lesões em algum órgão. 22/235 https://pt.wikipedia.org/wiki/Filos%C3%B3fica https://pt.wikipedia.org/wiki/Positivista https://pt.wikipedia.org/wiki/Ci%C3%AAncia https://pt.wikipedia.org/wiki/Compreens%C3%A3o https://pt.wikipedia.org/wiki/Religi%C3%A3o https://pt.wikipedia.org/wiki/Filosofia https://pt.wikipedia.org/wiki/Metaf%C3%ADsica Questão reflexão ? para 24/244 A psicopedagogia possui uma história construída por muitas mãos. Psicólogos, médicos, pedagogos, filó- sofos, entre outros profissionais. Após a leitura deste tema, é possível identificar que os problemas de apren- dizagem possuem uma causa única? Vivemos uma épo- ca de intensa medicalização na escola. Em sua opinião, este ainda pode ser considerado um reflexo da “biologi- zação” dos problemas de aprendizagem? 23/235 25/244 Considerações Finais (1/2) • O conceito de psicopedagogia não pode ser reduzido à aplicação dos co- nhecimentos psicológicos à pedagogia e tampouco dos conhecimentos pe- dagógicos à psicologia. • No início, o objeto de estudo da psicopedagogia era o sujeito que não apren- dia. Foi um período em que se buscava estabelecer a “normalidade” dentro do processo de aprendizagem, e tudo que se diferenciava disso era consi- derado como “anormal” e se tornava objeto de estudo da psicopedagogia. • O capitalismo industrial contribuiu para que as desigualdades ficassem mais evidentes, em função das próprias características deste sistema econômico. • A explicação para as desigualdades presentes nesta sociedade emergen- te será fundamentada na ciência e nas formulações teóricas da época, ga- nhando força a ciência moderna e positiva. • Ocorre uma valorização da testagem, e de todo conhecimento objetivo, passível de mensuração. 24/235 26/244 Considerações Finais (2/2) • A criança que não conseguia aprender era considerada anormal, de forma que não se adaptava ao sistema educacional. • A “psicopedagogia curativa” surge com o objetivo de favorecer a readapta- ção pedagógica do aluno. • A psicopedagogia na Argentina recebeu forte influência da França e tem início na prática para depois focar nos cursos de formação. • A psicopedagogia, de forma geral, passa a ter um caráter clínico e institu- cional, tanto na Argentina quanto em outros países. 25/235 Unidade 1 • Perspectiva Histórica: A Construção da Psicopedagogia27/244 Referências ARGENTI, P. W.; ESCOTT, C. M. A formação em psicopedagogia nas abordagens clínica e insti- tucional: uma construção teórico-prática. Novo Hamburgo: Feevale, 2001. BOSSA, N. A. A psicopedagogia no Brasil: contribuições a partir da prática. 2. ed., Porto Alegre: Artmed, 2007. CÓDIGO DE ÉTICA E ESTATUTO DAABPp, 2011. Disponível em: <http://www.abpp.com.br/docu- mentos_referencias_codigo_etica.html>. Acesso em: 10 set. 2017. COSTA, A. A.; PINTO, T. M. G.; ANDRADE, M. S. Análise Histórica do surgimento da psicopedagogia no Brasil. Id On Line Revista De Psicologia, ano 7, número 20, julho/2013. FONTES, M. A. Concepções de psicopedagogia no Brasil: reflexões a partir da teoria crítica da sociedade. Dissertação (Mestrado) – Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. HOBSBAWN, E. J. A era do capital: 1848-1875. 4. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988, p. 140. KIGUEL, S. M. Reabilitação em neurologia e psiquiatria infantil: aspectos psicopedagógicos. Con- gresso brasileiro de neurologia e psiquiatria infantil: a criança e o adolescente na década de 80. Porto Alegre: Abenepe, 1991. v. 3. 26/235 http://www.abpp.com.br/documentos_referencias_codigo_etica.html http://www.abpp.com.br/documentos_referencias_codigo_etica.html Unidade 1 • Perspectiva Histórica: A Construção da Psicopedagogia28/244 MOYSÉS, M. A. A.; COLLARES, C. A. L. A história não contada dos distúrbios de aprendizagem. Caderno Cedes, n. 28, 1992, p. 31-47. PATO, M. H. S. A produção do fracasso escolar: histórias de submissão e rebeldia. São Paulo: T. A. QUEIROZ, 1996. v. 6. RENAULT, G. La Universidad Del Salvador, cumple sus primeros 50 anõs. La carrera de Psicopeda- gogia, se encuentra cumpliéndolos también. Aprendizaje Hoy: Revista de Actualidad Psicopeda- gogica, Buenos Aires, julho de 2006. Ano 26, n. 64, p. 7-10. RUBINSTEIN, E. R. O estilo de aprendizagem e a queixa escolar: entre o saber e o conhecer. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003. 27/235 30/244 1. O primeiro centro médico psicopedagógico, fundado por Boutonier e Mauco, teve como sede: a) Alemanha. b) França. c) Brasil. d) Argentina. e) Estados Unidos. Questão 1 28/235 31/244 2. Desde o seu surgimento, o objetivo da psicopedagogia passou por algu- mas modificações em função do seu próprio desenvolvimento enquanto campo de conhecimento, e também, em função da influência dos diversos teóricos que contribuíram para o fortalecimento da prática psicopedagó- gica. No entanto, é correto afirmar, que no início o principal objetivo da psicopedagogia era o de: a) Promover a escuta psicanalítica das crianças que apresentavam distúrbios de aprendizagem. b) Colaborar para a melhoria no relacionamento entre professor X aluno. c) Impedir que crianças com dificuldades de aprendizagem interferisse negativamente na edu- cação de crianças normais. d) Aplicar testes que buscavam mensurar a inteligência de cada criança. e) Desenvolver metodologias que atendessem melhor aqueles que tinham dificuldades para aprender, promovendo a reeducação ou remediação, fazendo com que o sintoma (dificulda- de) desaparecesse. Questão 2 29/235 32/244 3. É possível observar que no decorrer do desenvolvimento da psicopeda- gogia enquanto campo do conhecimento, algumas ciências contribuíram mais fortemente para trazer especificidade para a área. São elas: a) Medicina, psicologia, psicanálise e pedagogia. b) Medicina, psicologia, fonoaudiologia e pedagogia. c) Filosofia, psicologia, psicanálise e sociologia. d) Astrologia, psicologia, psicanálise e pedagogia. e) Medicina, física, psicanálise e pedagogia. Questão 3 30/235 33/244 4. A psicopedagogia curativa, termo criado pela psicopedagoga francesa Janine Mery, pode ser entendida como: a) Uma pedagogia que buscava uma associação de terapias com medicações. b) Um método que favorecia a readaptação pedagógica de crianças e adolescentes desadap- tados que, embora inteligentes, tinham maus resultados escolares. c) Uma intervenção que tinha por objetivo criar salas especiais que visavam à cura dos proble- mas de aprendizagem. d) Um método que só poderia ser utilizado com crianças com retardo mental. e) A psicopedagogia aplicada aos professores. Questão 4 31/235 34/244 5. A psicopedagogia na Argentina pode ser dividida em três momentos, que dizem respeito às reformulações ocorridas em seus planos de en- sino no curso de psicopedagogia. Sobre o terceiro momento, é correto afirmar que: a) O curso tem duração de quatro anos. b) Só são aceitos no curso alunos que tenham a titulação de docente. c) Todos os professores do curso precisam ser psicólogos. d) O curso passa a ter as disciplinas “Clínicas pedagógicas I e II, valorizando o papel do profis- sional do psicopedagogo enquanto terapeuta. e) A psicopedagogia começa a ser aplicada exclusivamente em clínicas. Questão 5 32/235 35/244 Gabarito 1. Resposta: B. Foi na França que surgiu o primeiro centro médico psicopedagógico. 2. Resposta: E. O foco era na reeducação, buscando corri- gir aquilo que não ia bem com o aluno. Ao identificar as suas dificuldades, o profissio- nal tentava auxiliá-lo naquele aspecto, bus- cando a correção. 3. Resposta: A. A medicina, psicanálise, psicologia e peda- gogia são as bases para a prática da psico- pedagogia até os dias de hoje. 4. Resposta: B. A psicopedagogia curativa também busca a readaptação do aluno ao sistema de ensino, buscando intervir em aspectos que estejam contribuindo para o seu fracasso escolar. 5. Resposta: D. A influência da psicanálise traz para a psi- copedagogia argentina a necessidade de o profissional desenvolver a escuta psicanalí- tica, visto que os problemas de aprendiza- gem podem ser apenas o sintoma de outras questões de natureza emocional. 33/235 36/244 Unidade 2 Psicopedagogia no Brasil Objetivos 1. Conhecer os principais fatos ocorri- dos na construção da psicopedago- gia brasileira; 2. Elucidar a tendência contemporânea da psicopedagogia no Brasil e sua forma de caracterizar o objeto de es- tudo desta área do conhecimento; 3. Identificar os principais desafios pre- sentes no Brasil em relação à psico- pedagogia. 34/235 Unidade 2 • Psicopedagogia no Brasil37/244 Introdução A psicopedagogia no Brasil, assim como em outros países, possui uma história que se construiu a partir de diversas práticas e influências teóricas vindas de outros países e adaptadas, na medida do possível, para a nossa realidade. As passagens históricas que auxiliam na compreensão desse pro- cesso de construção da identidade da psi- copedagogia brasileira serão expostas nes- te tema. Ao conhecer os fatos históricos e remon- tar o percurso da psicopedagogia, é possí- vel compreender o momento atual da área e pontuar com clareza suas características enquanto área do conhecimento em expan- são. Neste sentido, você conseguirá visua- lizar o momento inicial da psicopedagogia no Brasil, o momento presente e também vislumbrar os rumos futuros dessa área. A formação do psicopedagogo precisa estar pautada também neste percurso histórico, uma vez que ele também está construindo essa história, por isso a importância deste tema em nosso curso. 1. A Psicopedagogia no Brasil: Uma Identidade em Construção O momento atual da psicopedagogia no Brasil é vivido por uma diversidade de práti- cas e enfoques teóricos, que têm contribuí- do significativamente para o fortalecimen- to da área em nosso país. É um campo que, apesar de já ter avançado em alguns aspec- tos, ainda podemos dizer que está em cons- trução. Como um campo em construção, 35/235 Unidade 2 • Psicopedagogia no Brasil38/244 pressupõe-se que ainda existem muitos ca- minhos a serem percorridos, mas também é possível fazermos algumas considerações do que já foi alcançado até este momento. De acordo com Rubinstein, Castanho e Nof- fs (2004), a psicopedagogia, enquanto área de atuação, no Brasil: • É fundamentada em referenciais teó- ricos, sendo assim, é uma práxis psi- copedagógica; • É reconhecida academicamente, em função das diversas produções cien- tíficas (teses, publicações) e de reuni- ões científicas organizadas pela Asso- ciação Brasileira de Psicopedagogia (ABPp); • A formação em psicopedagogia no Brasil se dá por meio de cursos de es- pecialização em instituições deensi- no superior1; • Contribui para a integração de crian- ças, adolescentes e adultos que se encontram desarticulados de institui- ções de ensino; • É um campo interdisciplinar, que pos- sui como bases principais a psicologia, pedagogia e psicanálise; • Surgiu para atender a crianças e ado- lescentes com problemas na aprendi- zagem, mas está voltada para a apren- dizagem de modo geral. 1 Estas informações são referentes ao ano de 2004, sendo que no Brasil já é possível encontrar a formação em psicopedago- gia também em cursos de graduação. A maior parte dos cur- sos ainda é em nível de pós-graduação. 36/235 Unidade 2 • Psicopedagogia no Brasil39/244 Rubinstein, Castanho e Noffs (2004) nos lembram que a Psicopedagogia, principal- mente no início do século XXI, tinha como verdade que as razões do insucesso escolar das crianças na escola estavam localizadas apenas nos alunos, e nas suas caracterís- ticas individuais. Este aspecto foi visto no tema anterior, quando falamos da visão or- ganicista da psicopedagogia, que atribuía ao organismo as causas do fracasso esco- lar. De acordo com Bossa (1994) nas déca- das de 1960 e 1970, houve um forte movi- mento que difundia a teoria da “carência cultural”, sendo que as explicações sobre o fracasso escolar começaram a ser atribu- ídas ao meio cultural deficitário que os alu- nos viviam. Nesta perspectiva, o insucesso escolar passou a ser visto como um sintoma social, e não mais como uma patologia do aluno. A tendência contemporânea da Psi- copedagogia no Brasil corrobora com esta Para saber mais “A Associação Brasileira de Psicopedagogia – ABPp – é uma associação de direito privado, de âmbito nacional, sem fins lucrativos e econômi- cos, de caráter técnico, científico e social, com atividade preponderante no exercício da psicope- dagogia. Fundada em 12 de novembro de 1980, a ABPp agrega psicopedagogos brasileiros com a finalidade de propiciar-lhes o desenvolvimento, a divulgação e o aprimoramento desta área do conhecimento”. Disponível em: <http://www. abpp.com.br/psicopedagogo_quem_so- mos.html>. Acesso em: 5 out. 2017. 37/235 http://www.abpp.com.br/psicopedagogo_quem_somos.html http://www.abpp.com.br/psicopedagogo_quem_somos.html http://www.abpp.com.br/psicopedagogo_quem_somos.html Unidade 2 • Psicopedagogia no Brasil40/244 percepção, de que as questões de contexto também precisam ser avaliadas quando se buscam as causas do fracasso escolar. Rubinstein, Castanho e Noffs (2004) apon- tam que nenhuma análise parcial pode contribuir para a compreensão do fracas- so escolar. É preciso entender o fenômeno em sua complexidade, pois qualquer análi- se parcial, seja ou atribuindo tudo ao orga- nismo ou tudo ao contexto, pode conduzir a erros no entendimento do mesmo. A tendência contemporânea na psicopeda- gogia busca compreender o insucesso esco- lar a partir dos seguintes aspectos: – relação do sujeito com o objeto de conhecimento; – relação professor/aluno; – condução ina- dequada das instituições de ensino; – vi- são integral do aluno; e – conhecimento do contexto em que o aluno vive. Essa tendên- cia ressalta o caráter mais dinâmico do pro- cesso de aprendizagem, e considera o sujei- to da aprendizagem como um todo. O ob- jetivo da psicopedagogia contemporânea é a aprendizagem e a relação do sujeito com a aprendizagem, e o modo de fazer o diag- nóstico psicopedagógico envolve observar o potencial de aprendizagem do aluno e Link “A culpa do fracasso escolar gera discursos con- flitantes”. Confira o artigo da Agência USP de no- tícias. Disponível em: <http://www.usp.br/ agen/?p=5934>. Acesso em: 5 out. 2017. 38/235 http://www.usp.br/agen/?p=5934 http://www.usp.br/agen/?p=5934 Unidade 2 • Psicopedagogia no Brasil41/244 identificar quais são as melhores condições que podem contribuir para uma aprendiza- gem de sucesso neste aluno (RUBINSTEIN; CASTANHO; NOFFS, 2004). Até o momento foi contextualizado de uma forma geral como a psicopedagogia se en- contra atualmente no Brasil, e em que sen- tido avançamos na forma de perceber o fenômeno da aprendizagem, porém para atendermos ao objetivo do nosso tema, passaremos agora a conhecer os principais marcos presentes na construção da história deste campo de conhecimento no Brasil. 2. Principais fatos na História da Psicopedagogia Brasileira Durante muito tempo, no Brasil, os fatores orgânicos foram considerados responsá- veis pelo fracasso escolar desde o início da história da psicopedagogia (BOSSA, 2004). Talvez por esse motivo, assim como ocorreu em outros países do mundo, os problemas de aprendizagem muitas vezes eram asso- ciados a problemas de saúde. Em 1906 foi criado um Laboratório de Psico- logia Pedagógica no Rio de Janeiro. A preo- cupação de psicólogos e educadores, neste período, era com a saúde mental, indicando uma abordagem médica para as questões associadas ao insucesso na escola (RUBINS- TEIN; CASTANHO; NOFFS, 2004). As auto- 39/235 Unidade 2 • Psicopedagogia no Brasil42/244 ras apontam que, ainda no Rio de Janeiro, na década de 1940, a Secretaria de Saúde promoveu o atendimento a estudantes com dificuldades diversas. Os anos 1950 no Rio de Janeiro foram mar- cados pela criação de classes especiais para alunos que eram considerados deficientes mentais. Na década de 1950 havia um ou- tro movimento ocorrendo no Rio Grande do Sul, que também pode ser visto como uma prática que retrata as preocupações com as questões de aprendizagem no Brasil: o iní- cio de pesquisas voltadas para a educação e linguagem. Na década de 1960 surge a psicopedagogia clínica, com a finalidade de compreender as questões de insucesso escolar em nível in- dividual, buscando intervir sobre a pessoa que apresenta dificuldades de aprendiza- gem, seja por motivos individuais ou fami- liares (FONTES, 2005). Nestes casos, o pro- blema de aprendizagem é diagnosticado como sintoma (quando o não aprender pos- sui um significado inconsciente) ou inibição (quando ocorre uma retração intelectual do ego, diminuindo assim as funções cogniti- vas do sujeito). De acordo com Fernandez (1991, apud Fontes, 2005, p. 85; grifo da autora), “o sintoma ou inibição causam um aprisionamento da inteligência do indivíduo que não aprende, a partir da estrutura sim- bólica inconsciente”. Esse caráter clínico da psicopedagogia surge ao mesmo tempo na Argentina e no Brasil. 40/235 Unidade 2 • Psicopedagogia no Brasil43/244 De acordo com Rubinstein, Castanho e No- ffs (2004), no final dos anos 1960, o esta- do do Rio Grande do Sul, preocupado com o aumento no número de alunos que apre- sentavam dificuldades com a aprendizagem da leitura e da escrita, cria a Clínica de lei- tura. Dados apontam que nos anos 1970, já havia em torno de 300 Clínicas de leitura em funcionamento no estado. As autoras apontam que “nesta ocasião, a abordagem era reeducativa, havia uma parceria entre a medicina e a educação. A tendência era por uma concepção adaptacionista para alcan- çar a integração das crianças” (RUBINSTEIN; CASTANHO; NOFFS, 2004, p. 229). Link Confira esta entrevista com a autora Alicia Fer- nández, que completou 40 anos contribuindo para a área de psicopedagogia. OLIVA, Luiza. Entrevista com Alicia Fernández. Matéria publicada na Revista Direcional Educador – edição 43, agosto/2008. Disponível em: <http:// vivainfancia.org.br/Entrevista_Alicia%20Fer- nandez.pdf>. Acesso em: 5 out. 2017. 41/235 http://vivainfancia.org.br/Entrevista_Alicia%20Fernandez.pdf http://vivainfancia.org.br/Entrevista_Alicia%20Fernandez.pdf http://vivainfancia.org.br/Entrevista_Alicia%20Fernandez.pdf Unidade 2 • Psicopedagogia no Brasil44/244 Em São Paulo, na década de 1970, a PUC- -SP oferecia cursos voltados para as difi- culdades escolares. Estes cursos buscavam capacitar profissionais para o atendimento de crianças, em caráter preventivo, tanto na escola quanto na clínica. Sobre a década de 1970, é importante relembrar que havia aindauma prevalência da visão organicista para explicar o fracasso escolar. Foi a dé- cada da DCM – Disfunção Cerebral Míni- ma, que era entendida como as disfunções neuromotoras, que causavam as dificulda- des nos alunos. Implícito a esta visão, havia um discurso que tornava o fracasso esco- lar patológico, e localizado exclusivamente no aluno (RUBINSTEIN; CASTANHO; NOFFS, 2004). Para saber mais As clínicas de leitura foram implantadas por meio do Decreto nº 18415/67, no estado do Rio Gran- de do Sul, e tinham por finalidade diminuir os pro- blemas de desadaptação escolar. As professoras especializadas trabalhavam com os alunos da rede que apresentassem os distúrbios de leitura e escrita. Era oferecido um curso de preparação para os professores, denominado como “Curso de atendentes de clínica de leitura”, com duração de 766 horas/aula. A demanda de trabalho sempre foi bem maior do que a capacidade de atendi- mento das especialistas (PORTELLA, 2005). 42/235 Unidade 2 • Psicopedagogia no Brasil45/244 O primeiro curso regular de psicopedagogia no Brasil foi criado em São Paulo, no ano de 1979, no Instituto Sedes Sapientae. Havia no curso a proposta de uma visão mais in- tegrada do sujeito da aprendizagem. Rubinstein, Castanho e Noffs (2204) refe- rem que a década de 1980 foi marcada por uma mudança na forma de compreender o fracasso escolar, principalmente, a partir de dois movimentos que se destacaram: 1) Compreensão do fracasso escolar: foco na investigação de aspectos es- truturais, funcionais e da dinâmica in- terna da instituição escolar. 2) Clínica: foco na compreensão da rela- ção que o aluno estabelecia com o co- nhecimento, que implicava uma visão mais dinâmica da queixa escolar. Um dos fatos mais importantes ocorridos na década de 1980, mais precisamente no ano de 1980, foi a criação da Associação Brasileira de Psicopedagogia – ABPp, que pode ser considerada um marco inicial na direção da institucionalização da profissão de psicopedagogo (COSTA; PINTO; ANDRA- DE, 2013). Link Confira neste artigo as principais características da Disfunção cerebral mínima. BAZ, Erika Infante. Integração sensorial e distúr- bios escolares. Disponível em: <http://www.sb- neurociencia.com.br/erikainfante/artigo3. htm>. Acesso em: 5 out. 2017. 43/235 http://www.sbneurociencia.com.br/erikainfante/artigo3.htm http://www.sbneurociencia.com.br/erikainfante/artigo3.htm http://www.sbneurociencia.com.br/erikainfante/artigo3.htm Unidade 2 • Psicopedagogia no Brasil46/244 Costa, Pinto e Andrade (2013) ressaltam que a década de 1990 foi marcada pelas contribuições principalmente de psicope- dagogas argentinas, como as autoras Sara Paín e Alicia Fernandez. Ambas ampliaram a visão teórica da psicopedagogia no Bra- sil, enfatizando o sujeito psicológico que aprende e introduzindo a abordagem da dinâmica familiar no entendimento dos problemas de aprendizagem. Além dessas autoras, observa-se a presença da influência de outros autores argentinos, a saber: Ana Maria Rodriguez Muñiz, Ana Te- berowsky, Bernardo Quirós, Emília Ferrero, Jorge Visca, Jacob Feldman e Mabel Conde- marin. Direta ou indiretamente, por meio de seminários, cursos, palestras, textos, estes autores influenciaram a construção de um novo modelo de intervenção clínica. Tal modelo envolvia uma nova compreensão do sujeito que aprende, que levava em con- ta os conhecimentos advindos da Psicologia Genética, Antropologia, Sociologia, Psica- nálise, Psicologia Social Operativa, Psico- linguística, Educação e Neurologia. A partir de então, a visão organicista não tem mais a primazia no que se refere aos problemas de aprendizagem, que passam a ser vistos em sua complexidade, envolvendo muitos as- pectos, e de forma mais dinâmica (RUBINS- TEIN, CASTANHO; NOFFS, 2004). Em 1997, o Projeto de Lei Federal nº 3124, do deputado federal Barbosa Neto sugere a criação dos Conselhos Regionais de Psico- 44/235 Unidade 2 • Psicopedagogia no Brasil47/244 pedagogia. Ainda no trajeto da legalização da profissão de psicopedagogo, o Projeto de Lei nº 128/2000, do deputado Claury Santos Alves da Silva, foi aprovado em 2001 e estabeleceu que a assistência psicopedagógica estivesse presente em todas as instituições de Ensino Básico da rede pública do Estado de São Paulo (COSTA; PINTO; ANDRADE, 2013). Em termos de formação profissional, em 2013 era possível identificar no Brasil: quatro cursos de graduação, sendo um localizado no estado de São Paulo e os outros três localizados no estado do Rio Grande do Sul e diversos cursos de pós-graduação lato sensu espalhados pelos estados brasileiros (COSTA; PINTO; ANDRADE, 2013). Para saber mais A psicopedagogia no Brasil é considerada uma ocupação. A tentativa de criar os conselhos é um reflexo da busca pela legalização da psicopedagogia como profissão. Existem muitos equívocos neste sentido. A ABPp – Associação Brasileira de Psicopedagogia se difere de um Conselho. Os conselhos federais são autarquias criadas pelo governo federal que exercem o papel de emissão de números de registro profis- sional, fiscaliza e representa uma categoria profissional. 45/235 Unidade 2 • Psicopedagogia no Brasil48/244 4. A Psicopedagogia no Brasil Hoje Para falarmos de psicopedagogia hoje no Brasil, é necessário fazer um recorte em função dos aspectos relativos: ao exercício da profissão de psicopedagogo; à concep- ção atual de psicopedagogia no Brasil, e aos desafios futuros presentes em nossa reali- dade. 4.1 O exercício da profissão de psicopedagogo Noffs (2016) contribui trazendo uma visão atualizada que se ampara nos aconteci- mentos mais recentes. Em termos da Clas- sificação Brasileira de Ocupações, a psico- pedagogia, desde 2002, está inserida na família 2394-5, que diz respeito aos “pro- gramadores, avaliadores e orientadores de ensino da grande área Educação” (NOFFS, 2016 p. 111). Em junho de 2008, o Projeto de Lei sob o nº 3512 é reapresentado pela Deputada Fede- ral Raquel Teixeira (GO), quando argumenta a necessidade de se regulamentar a profis- são de psicopedagogo, de modo a melhorar a qualidade do que se ensina nas escolas, do como se ensina, e também do que se apren- de e como se aprende. Ao argumentar dessa forma, refere a necessidade de um profis- sional da área de psicopedagogia, especia- lizado, que contribua para aumentar as po- tencialidades de aprendizagem dos alunos. Ainda sobre este projeto: 46/235 Unidade 2 • Psicopedagogia no Brasil49/244 Em 2009, o projeto ao ser analisado pela comissão de trabalho, de admi- nistração e serviço público entende que o projeto ao preservar as atribui- ções dos profissionais em Psicopedagogia não propõe reserva de mercado, garantindo assim o exercício da Psicopedagogia por profissionais com for- mação em Psicologia, Pedagogia e Licenciatura, desde que tenham o certi- ficado de conclusão de curso em Psicopedagogia a nível de especialização ou graduação (NOFFS, 2016, p. 114). Em 2010, este mesmo projeto sofre mudanças e se amplia a prática da psicopedagogia para profissionais que sejam portadores de diplomas em Psicologia, Pedagogia, Licenciaturas ou Fo- noaudiologia. O projeto ainda aguarda aprovação no Senado Federal. Estes são os aspectos que foram apresentados em artigo mais recente que contribui para o en- tendimento de quem pode exercer a psicopedagogia hoje no Brasil. Em relação aos rumos que devem ser tomados, a autora sugere “regulamentar o bem formado e legalizar o que a sociedade já legitimou” (NOFFS, 2016). 47/235 Unidade 2 • Psicopedagogia no Brasil50/244 4.2 A concepção atual de psicopedagogia no Brasil Para definirmos a concepção atual da psicopedagogia, buscou-se no código de ética, elaborado pela ABPp – Associação Brasileira de Psicopedagogia, e reformulado em 2011, como ele estabe- lece o conceito de psicopedagogia: A Psicopedagogia é um campo de atuação em Educação e Saúde que se ocu- pa do processo de aprendizagem considerando o sujeito,a família, a escola, a sociedade e o contexto sócio-histórico, utilizando procedimentos próprios, fundamentados em diferentes referenciais teóricos (ABPp, 2011, p. 1). Essa concepção retrata a diversidade das práticas atuais no Brasil e estabelece como objeto não o aluno que não aprende, mas sim o processo de aprendizagem com toda a sua complexidade, envolvendo o sujeito, família, escola, sociedade e contexto sócio-histórico. 48/235 Unidade 2 • Psicopedagogia no Brasil51/244 4.3 Desafios futuros da psicope- dagogia no Brasil No último simpósio realizado pela ABPp, em 20162, coloca-se como tema de reflexão para o congresso, as diversas transforma- ções vividas na atualidade de uma socie- dade nomeada de aprendente, em que se observa que o conhecimento se torna um valor para estabelecer a convivência entre as pessoas. Também foram citados os dife- rentes modos de conhecimento e as novas formas de ensinar e de aprender. Entende-se como um dos desafios implíci- tos a necessidade do profissional de psico- pedagogia de acompanhar e entender essas mudanças no cenário da aprendizagem. 2 Fonte: <http://www.abppeventos.com.br/>. Acesso em: 5 out. 2017. Em outro texto não tão recente, porém atu- al, Peres (1998) destaca como desafios na- quele momento alguns que, ao nosso ver, ainda se fazem presentes: • o aumento de cursos de formação em psicopedagogia com qualidade; • delimitação do campo de atuação do psicopedagogo; • a incorporação de ações psicopeda- gógicas aos projetos pedagógicos nas unidades educacionais; • a popularização da psicopedagogia, ampliando sua intervenção para além das clínicas e escolas particulares. 49/235 http://www.abppeventos.com.br/ Unidade 2 • Psicopedagogia no Brasil52/244 Certamente, o tema é vasto e conclui-se que o profissional de psicopedagogia preci- sa estar presente nas discussões que ainda se fazem necessárias para o avanço da área em nosso país. 50/235 Unidade 2 • Psicopedagogia no Brasil53/244 Glossário Concepção adaptacionista: concepção que, na área de psicopedagogia, visa à adaptação do aluno a um modo sistematizado de aprender, instituído pelas escolas. Diagnóstico psicopedagógico: o objetivo do diagnóstico é identificar os desvios e os obstáculos básicos no modelo de aprendizagem do sujeito. Sintoma social: refere-se às alternativas que uma determinada cultura oferece aos sujeitos que nela se inserem para resolução de seus conflitos. O sintoma social só é social porque faz sentido em relação ao momento histórico de certa cultura; social ou particular, no entanto, o sintoma sempre fará sentido em relação à experiência do sujeito. De alguma forma, o sintoma sempre é relativo, em psicanálise, a uma história única, seja de uma sociedade ou de um sujeito. 51/235 Questão reflexão ? para 54/244 O artigo a seguir é de uma das principais autoras sobre a psicope- dagogia no Brasil, Nádia Bossa. Ao ler o texto, identifique sua con- cepção de psicopedagogia e como ela se relaciona com a história da psicopedagogia no Brasil. O TRATAMENTO PSICOPEDAGÓGICO A especificidade do tratamento psicopedagógico consiste no fato de que existe um objetivo a ser alcançado: a eliminação do sin- toma – os obstáculos na aprendizagem, diferentemente do que ocorre no tratamento psicoanalítico. Assim, a relação do psicope- dagogo-paciente é mediada por atividades bem-definidas, cujo objetivo é solucionar rapidamente as consequências do sintoma, para logo depois mobilizar e desenvolver os recursos cognitivos. 52/235 Questão reflexão ? para 55/244 Esta é a maior complexidade na atuação do psicopedagogo, pois está relacionado com a operacionalização do trabalho e consequente- mente com o êxito. Tal afirmação decorre da minha atuação como Supervisora. Frequentemente me deparado com situações em que, não podendo suportar as pressões (internas ou externas), o psico- pedagogo opta por uma abordagem mais emergente, introduzindo o conteúdo escolar atual como tarefa nas seções, ou seja, buscando eliminar de pronto o sintoma. A pressão é interna e externa, porque muitas vezes o profissional, devido à sua ansiedade, tenta apressar o processo, pois, assim como a criança, a sua autoestima depende de avaliação externa, de modo que chega a experimentar a mesma frus- tração que a criança vive na Escola. 53/235 Questão reflexão ? para 56/244 BOSSA, N. A. O tratamento psicopedagógico. Disponível em: <http://www.nadiabossa.com.br/index.php/o-tratamento-psico- pedagogicohtml>. Acesso em: 10 out. 2017. 54/235 57/244 Considerações Finais • Em relação às dificuldades de aprendizagem, o aspecto orgânico do aluno não deixa de ser considerado, mas passa a ser visto em conjunto com ou- tros aspectos, que envolvem, por exemplo, o cenário cultural. • A psicopedagogia pode ser vista no Brasil como um campo ainda em cons- trução. • Ao longo da história, os fatores orgânicos perdem a primazia e ganha força a visão integrada do estudante que passa por um processo de aprendiza- gem, considerando a multiplicidade de fatores que estão envolvidos neste processo, para além do sujeito que aprende. • A década de 1980 merece destaque no desenvolvimento da Psicopedago- gia no Brasil com a criação da ABPp – Associação Brasileira de Psicopeda- gogia. • Nos dias atuais ainda existem desafios acerca da identidade do profissional de psicopedagogia e de delimitação de sua área de atuação. 55/235 Unidade 2 • Psicopedagogia no Brasil58/244 Referências BOSSA, N. A. A psicopedagogia no Brasil: construção a partir da prática. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000. BOSSA, N. A. O tratamento psicopedagógico. (2004). Disponível em: <http://www.nadiabossa. com.br/index.php/o-tratamento-psicopedagogico.html>. Acesso em: 10 out. 2017. ABPp. Código de ética. 2011. Disponível em: <http://www.abpp.com.br/documentos_referen- cias_codigo_etica.html>. Acesso em: set. 2017. COSTA, A. A.; PINTO, T. M. G.; ANDRADE, M. S. Análise Histórica do surgimento da psicopedagogia no Brasil. Id On Line Revista De Psicologia, ano 7, n. 20, jul./2013. FONTES, M. A. Concepções de psicopedagogia no Brasil: reflexões a partir da teoria crítica da sociedade. Dissertação (Mestrado) – Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. NOFFS N. A. A formação e regulamentação das atividades em psicopedagogia. Rev. Psicopeda- gogia, 2016; 33(100):110-120. PERES, M. R. Psicopedagogia: aspectos históricos e desafios atuais. Revista de Educação PUC – Campinas, 1998; v. 3 n. 5: 41-45. 56/235 http://www.nadiabossa.com.br/index.php/o-tratamento-psicopedagogico.html http://www.nadiabossa.com.br/index.php/o-tratamento-psicopedagogico.html http://www.abpp.com.br/documentos_referencias_codigo_etica.html http://www.abpp.com.br/documentos_referencias_codigo_etica.html Unidade 2 • Psicopedagogia no Brasil59/244 PORTELLA, F. O. Percursos históricos da psicopedagogia no Rio Grande do Sul. Rev. Psicopeda- gogia, 2005; 22(67):41-50. RUBINSTEIN, Edith; CASTANHO, Marisa; NOFFS, Neide. Rumos da psicopedagogia brasileira. Rev. Psicopedagogia, v. 21, n. 66, p. 225-238, 2004. 57/235 61/244 1. Um dos países que mais influenciou a história da psicopedagogia no Brasil foi: a) Chile. b) Argentina. c) Colômbia. d) México. e) Uruguai. Questão 1 58/235 62/244 2. A Teoria da carência cultural teve um impacto sobre os problemas de aprendizagem. Sendo que muitos teóricos, apoiados nas bases desta visão, consideravam que: Questão 2 a) Os problemas de aprendizagem eram originados da falta de professores bem formados. b) Os problemas de aprendizagem eram reflexos de uma cultura empobrecida, que oferecia poucos recursos as suas crianças. c) Os problemas de aprendizagem tinham relação com a deficiência de algumas vitaminas no organismo. d) Os problemas de aprendizagem eram oriundos de escolas que não utilizavam livros didáti- cos. e) Os problemas de aprendizagem tinham como causa principal o difícil relacionamento entre professor e aluno. 59/235 63/2443. Assinale a alternativa que se refere ao que a tendência contemporânea na psicopedagogia acredita que possa contribuir para a compreensão do insu- cesso escolar: Questão 3 a) A relação do sujeito com o objeto de conhecimento. b) O número de horas que o sujeito passa na escola. c) O grau de instrução dos pais do estudante. d) A idade em que o estudante começou a falar. e) A quantidade de vezes que o estudante reprovou. 60/235 64/244 4. Um dos fatos mais importantes ocorridos no ano de 1980 para a psicopeda- gogia no Brasil foi: Questão 4 a) A criação das clínicas de leitura. b) A aprovação de um projeto de lei que regulamenta a profissão do psicopedagogo. c) O surgimento de um grande autor brasileiro na área de psicopedagogia. d) A criação da Associação Brasileira de Psicopedagogia. e) O fechamento das classes especiais nas escolas. 61/235 65/244 5. Em relação aos desafios futuros da psicopedagogia, para o seu avanço no Brasil, é INCORRETO afirmar como um dos desafios: Questão 5 a) O aumento dos cursos de psicopedagogia com qualidade. b) A popularização da psicopedagogia. c) A delimitação do campo de atuação do psicopedagogo. d) A incorporação de ações psicopedagógicas aos projetos pedagógicos nas unidades educa- cionais. e) A reabertura das classes especiais para alunos com dificuldades de aprendizagem. 62/235 66/244 Gabarito 1. Resposta: B. A Argentina foi o primeiro país da América Latina a produzir conhecimentos na área de psicopedagogia, sendo, portanto, o que mais influenciou o Brasil em suas práticas e cursos de formação. 2. Resposta: B. A teoria da “carência cultural” explicava que o fracasso escolar poderia ser atribuído ao meio cultural deficitário que os alunos viviam. 3. Resposta: A. Um dos aspectos que a Tendência Contem- porânea acredita que deve ser avaliado no processo de entendimento do que leva o su- jeito a não conseguir obter sucesso na es- cola é justamente verificar como se dá a sua relação com o conhecimento. 4. Resposta: D. A criação da ABPp foi um marco para a pro- dução do conhecimento em Psicopedago- gia e também para a expansão da área de uma forma geral. 5. Resposta: E. Cada vez mais, o que se busca em relação a psicopedagogia, é compreender as for- mas de aprendizagem do sujeito. As classes especiais vão contra essa direção e não se constituem de forma alguma como um de- safio a ser superado. 63/235 67/244 Unidade 3 A Profissão e a Ética do Psicopedagogo Objetivos 1. Compreender os aspectos que diferen- ciam uma ocupação de uma profissão; 2. Esclarecer sobre os processos de for- mação em psicopedagogia existentes no Brasil; 3. Apresentar a trajetória dos profissio- nais em busca da legalização da pro- fissão de psicopedagogo; 4. Conhecer os artigos que compõem o Código de Ética elaborado pela Asso- ciação Brasileira de Psicopedagogia. 64/235 Unidade 3 • A Profissão e a Ética do Psicopedagogo68/244 Introdução A psicopedagogia, apesar de ser um traba- lho exercido por inúmeros profissionais no Brasil, ainda não foi legalizada como uma profissão, ou seja, ainda não é reconheci- da e, portanto, não possui Conselho que possa supervisionar suas atividades. Neste percurso ocorreram algumas iniciativas na tentativa de tornar a psicopedagogia reco- nhecida como profissão, e que serão apre- sentadas no decorrer da leitura. Os cursos de formação oferecidos em nos- so país possuem papel fundamental no processo de fortalecimento da profissão de psicopedagogo. Neste tema iremos explo- rar também a formação do psicopedagogo. O Código de Ética, elaborado pela Associa- ção Brasileira de Psicopedagogia, será apre- sentado com o objetivo de contribuir para a compreensão do papel do psicopedagogo na prática profissional. 1. A Psicopedagogia é Uma Pro- fissão? A Constituição Brasileira de 1988 garan- te o livre exercício de qualquer trabalho ou profissão. A psicopedagogia está inserida na CBO (Classificação Brasileira de Ocu- pações) na família 2304-2, desde o ano de 2002. A CBO é um documento elaborado pelo Ministério do Trabalho que reconhe- ce, nomeia e codifica os títulos e descreve quais são as características das ocupações do mercado de trabalho no Brasil. A última versão da CBO contém as ocupações orga- nizadas e descritas por famílias. Cada fa- 65/235 Unidade 3 • A Profissão e a Ética do Psicopedagogo69/244 mília constitui um conjunto de ocupações similares. No que se refere à psicopedago- gia, ela está inserida na família 2304-2, que inclui programadores, avaliadores e orien- tadores de ensino da grande área da educa- ção (NOFFS, 2016). Conforme ressalta Noffs (2016), nem todo o trabalho pode ser caracterizado como pro- fissão. É possível identificar muitas práticas profissionais que são legitimadas pela so- ciedade, como é o caso da psicopedagogia, sem ser legalmente reconhecida enquanto profissão. Culturalmente, no Brasil, esse re- conhecimento ocorre quando um órgão re- gulatório emite um certificado de conclusão de curso. A autora refere sobre o equívoco com o qual nos deparamos na psicopeda- gogia, pois o governo brasileiro credencia cursos de formação e especialização na área, “e que profissionalmente têm validade como conhecimento, mas que não se trans- formam em reconhecimento profissional” (NOFFS, 2016, p. 113). Além disso, o reconhecimento legal assegu- ra às pessoas formadas o direito de exercer as atividades para as quais foram formadas, sendo regulamentados pelos conselhos fe- derais os direitos e deveres para este exer- cício profissional. Link Entenda melhor o que é a CBO (Classificação Bra- sileira de Ocupações), elaborada pelo Ministé- rio do Trabalho e Emprego (MTE). Disponível em: <http://www.mtecbo.gov.br/cbosite/pages/ saibaMais.jsf>. Acesso em: 8 out. 2017. 66/235 http://www.mtecbo.gov.br/cbosite/pages/saibaMais.jsf http://www.mtecbo.gov.br/cbosite/pages/saibaMais.jsf Unidade 3 • A Profissão e a Ética do Psicopedagogo70/244 A partir do exposto, podemos considerar a psicopedagogia como uma prática profis- sional, que se origina de uma necessidade localizada na compreensão dos processos de aprendizagem, a princípio na compreen- são dos motivos que levam ao fracasso es- colar. Argenti e Escott (2001) afirmam que o trabalho do psicopedagogo tem por objeti- vo que as pessoas consigam obter qualida- de em suas relações com o conhecimento. O caminho para se tornar uma profissão re- gulamentada já conta com alguns anos de história, porém ainda sem sucesso. Veremos agora os principais movimentos ocorridos na busca pela regulamentação da psicope- dagogia. 1.1 O percurso para a legaliza- ção da profissão de psicopeda- gogo no Brasil: principais ini- ciativas A busca pela legalização da profissão do psicopedagogo pode ser observada a partir Para saber mais Os conselhos federais são autarquias criadas pelo governo federal que exercem o papel de emissão de números de registro profissional, fiscalizam e representam uma categoria profissional. A fun- ção primária dos conselhos profissionais é defen- der a sociedade dos maus profissionais. Também cabe ao conselho, por exemplo, redigir e fiscalizar a utilização do código de ética profissional e o ju- ramento profissional. 67/235 Unidade 3 • A Profissão e a Ética do Psicopedagogo71/244 de alguns movimentos ocorridos principalmente nos últimos 20 anos (FONTES, 2005; NOFFS, 2016; GONÇALVES, 2007; BOSSA, 2007). Alguns movimentos são observados na esfera jurídica, e envolvem a apresentação de projetos de lei, entre os quais se destacam os seguintes: Projeto de Lei nº 3124/97: o deputado federal Barbosa Neto (GO), apresenta o projeto em 1997, indicando a necessidade da inserção de um profissio- nal nas escolas, que tivesse como principal função a redução do fracasso escolar. Este profissional deveria ser o psicopedagogo. Este projeto passou por aprovação na Comissão de Trabalho e educação, mas em 2007 foi ar- quivado e se encontra assim até o momento1. Projetode Lei nº 128/2000: em 2001 foi aprovado no estado de São Paulo este projeto, de autoria do deputado Claury Santos Alves da Silva, que au- toriza o Poder Executivo a implantar Assistência Psicológica e Psicopeda- gógica em todos os estabelecimentos de ensino público. O principal obje- tivo deste serviço era diagnosticar e prevenir problemas de aprendizagem. 1 1 Fonte: <http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=19139>. Acesso em: 9 dez. 2017. 68/235 http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=19139 Unidade 3 • A Profissão e a Ética do Psicopedagogo72/244 Projeto de Lei nº 3512/2008: apresentado pela deputada federal Raquel Teixeira, trata-se do mesmo projeto nº 3124/97, do deputado Barbosa Neto. A deputada apresenta novamente este projeto sob o nº 3512/2008 e argumenta sobre a ne- cessidade de uma revisão do projeto educacional brasileiro, que precisa investir na melhoria dos processos de aprendizagem, e que para isso, faz-se necessário um serviço desempenhado por um profissional especializado, o psicopedagogo. A deputada ressalta o papel deste profissional como aquele que pode aumentar as potencialidades de aprendizagem dos estudantes. Atualmente, este projeto está aguardando apreciação pelo senado federal2. 2 2 Fonte: <http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=398499>. Acesso em: 9 dez. 2017. Para saber mais Após a aprovação do Projeto de Lei nº 128/2000, o município de Ourinhos/SP incorporou o profissional psicopedagogo em seu Quadro de Magistério, através da Lei nº 387/2002, que dispõe sobre o Estatuto e Plano de Carreira do Magistério Público Municipal de Ourinhos. Este estatuto prevê o cargo de psicope- dagogo como efetivo das instituições auxiliares da educação. 69/235 http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=398499 Unidade 3 • A Profissão e a Ética do Psicopedagogo73/244 Além dos movimentos citados acima, a cria- ção da Associação Brasileira de Psicope- dagogia ABPp também pode ser considera- da como mais uma ação que visa à constru- ção da identidade deste campo do conhe- cimento, buscando uma maior estruturação dos seus saberes e criando uma comissão responsável pelo processo de legalização. A ABPp foi fundada em 1980 (FONTES, 2005). De acordo com Bossa (2007), a questão da formação do psicopedagogo assume um papel de grande importância no Brasil, pois ela pode ser vista como um ponto de par- tida para a formação da identidade deste profissional. Ao mesmo tempo, se existe um conjunto de conhecimentos que subsi- dia um curso de formação para uma deter- minada prática profissional, é possível que este espaço, sendo bem delimitado, seja mais uma iniciativa rumo à regulamenta- ção da profissão. Link Conheça o site da Associação Brasileira de Psico- pedagogia e veja como ela se estrutura. Disponí- vel em: <http://www.abpp.com.br/>. Acesso em: 8 out. 2017. 70/235 Unidade 3 • A Profissão e a Ética do Psicopedagogo74/244 2. A Formação em Psicopeda- gogia Um dos grandes embates presentes nas dis- cussões sobre a prática da psicopedagogia, e consequentemente em sua legalização como profissão é a questão da formação do psicopedagogo. Rubinstein, Castanho e Noffs (2004) referem que os cursos de especialização em Psico- pedagogia já eram oferecidos por institutos particulares e associações de classe mesmo antes de haver cursos formais de especiali- zação dentro das instituições de Ensino Su- perior. A psicopedagogia nasceu da “falta” de um conhecimento e de uma prática que pudesse atender às questões relativas às di- ficuldades de aprendizagem nos estudan- tes. Muitos profissionais que começaram a atender a estes alunos, principalmente das áreas de pedagogia, psicologia e fonoau- diologia, perceberam que a formação es- pecífica em seus cursos de origem não era suficiente para atender a estas demandas. Era necessária uma formação interdisci- plinar, que auxiliasse no entendimento do Para saber mais Nadia Bossa é doutora em psicologia pela Univer- sidade de São Paulo (USP), possui graduação em Psicologia, especialização em Neuropsicologia e em Psicopedagogia e Mestrado em Psicologia e Educação. É conhecida por seus livros, artigos, vídeos, cursos e palestras e tem contribuído sig- nificativamente para a formação dos psicopeda- gogos no Brasil. 71/235 Unidade 3 • A Profissão e a Ética do Psicopedagogo75/244 aluno e do seu processo de aprendizagem, considerando a complexidade dos fatores envolvidos. Para Noffs (2016) o conceito de formação está vinculado ao conceito de desenvolvi- mento pessoal, envolvendo um trabalho de autoconhecimento por parte do profissio- nal, para que possa assumir o seu papel de facilitador da aprendizagem para as pesso- as de forma geral. A autora comenta sobre o fato da formação se constituir como um processo de aprendizagem contínua, em to- das as fases da vida do sujeito. No artigo em que propõe uma reflexão so- bre a formação do psicopedagogo, a autora Neide Noffs (2016) faz um paralelo com os princípios apontados por Garcia (1995) em relação à formação de professores. A pro- posta foi a de buscar uma referência para pautar alguns princípios que pudessem ser- vir de base para os cursos de formação de psicopedagogos. Uma síntese dessa refle- xão pode ser observada no Quadro 1. 72/235 Unidade 3 • A Profissão e a Ética do Psicopedagogo76/244 Quadro 1 | Princípios norteadores para a formação em psicopedagogia Princípios da formação de professores (Garcia, 1995) Considerações em relação à psicopedagogia (Noffs, 2016) 1. Conceber formação como um processo contínuo, mantendo os princípios éticos, didáticos, pedagógicos onde a formação inicial e a permanente se articulam para o desenvolvimento profissional. Geralmente, a formação em Psicopedagogia se inicia na gra- duação (independente de qual seja o curso) e se especializa em cursos posteriores de psicopedagogia, se aprofundando na área de interesse do profissional. Desta forma, também se constitui como um processo permanente onde o profissional opta por ações de formação que o mantenham em constante desenvol- vimento. 2. A formação deve se integrar a proces- sos de mudança, inovação e desenvolvi- mento curricular. A psicopedagogia está concebida como uma proposta de mu- dança, de estimular a aprendizagem e também de descoberta de novos processos de ensino-aprendizagem. 3. A formação deve estar ligada ao de- senvolvimento organizacional da escola. A psicopedagogia também está comprometida com o ambiente de aprendizagem na instituição, podendo ser a escola ou qual- quer outra instituição em que se encontre espaços de aprendi- zagem, como hospitais, empresas, entre outros. 73/235 Unidade 3 • A Profissão e a Ética do Psicopedagogo77/244 Princípios da formação de professores (Garcia, 1995) Considerações em relação à psicopedagogia (Noffs, 2016) 4. A formação deve integrar conteúdos acadêmicos e disciplinares e a formação pedagógica do professor. O psicopedagogo tem que possuir um conhecimento específico que possa colaborar com o processo do desenvolvimento dos aprendentes. Tais conhecimentos podem ser advindos da lin- guagem, da Pedagogia e da Psicologia. 5. A formação integra a teoria e a prática. Neste caso, a formação em psicopedagogia valoriza a prática como fonte de conhecimento, não como mais uma disciplina que compõe o currículo, mas sim como um espaço curricular que constrói o pensamento prático do profissional. 6. A formação deve procurar o isomorfis- mo entre a formação recebida e o tipo de educação que posteriormente será pedi- do que se desenvolva. Os cursos de psicopedagogia deveriam deixar claro para qual ambiente de trabalho estão focados, pois a generalização muitas vezes dificulta a inserção do profissional no mercado de trabalho. 7. A formação destaca o princípio da in- dividualização como elemento integran- te
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