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95 Unidade 4 Análise de Situações Reais de Grupo por Meio das Pesquisas, Jogos, Técnicas Gru- pais e Vivências Apresentação O fenômeno grupal está presente em todas as áreas da vida de um ser. Estes encontros humanos, que ocorrem nos grupos, podem ser salutares ou não. Os diferentes grupos podem ser analisados e cui- dados para que todos os integrantes possam se benefi- ciar de tal vivência. Para tanto, existem métodos e estra- tégias para este auxílio grupal através de intervenções. Na atualidade, cuidar dos grupos amplia a área de cuidado de forma eficaz e pela própria estrutura grupal atinge maior número de pessoas, as quais vão poder se beneficiar. Muitas vezes, uma simples dinâ- mica de grupo pode auxiliar uma pessoa a se conhe- cer melhor e, com isso, perceber melhor os outros e desenvolver a empatia. A empatia é um aspecto que para ser desenvol- vido e treinado depende da presença de outro ser. Outros aspectos também importantes são de- senvolvidos com o auxílio da presença de outro ser humano, inclusive, aspectos que podem auxiliar não só na convivência grupal, mas na vida do indivíduo como um todo. 96 Hoje se vive em uma sociedade em que muitas feridas na alma e no corpo são abertas. O que se tem de solução, embora o processo seja complexo, encontra-se na própria capacidade de um ser humano se oferecer a outro como um tutor de resiliência. Um líder na atualidade precisa ter em mente que vai se deparar com pessoas as quais, naturalmen- te, vão necessitar de um líder que possa se relacionar com o grupo, exercitando sua inteligência emocio- nal, mas também que possa se oferecer como tutor em seu processo de resiliência e de seus liderados. Ao pensar nos profissionais de saúde, os quais se deparam com o trágico todos os dias, torna-se impossível não imaginar que, de algum modo, tais vivências não irão afetá-los. Nesse sentido, o papel do líder é extremamente importante para o processo de superação de tais vivências. As atividades coletivas auxiliam o desenvolvi- mento do ser humano em aspectos muito importan- tes, como será abordado nesta unidade. 97 4. Análise de Situações Reais de Grupo Por Meio de Pesquisas, Técnicas Grupais e Vivências. Este capítulo pretende fazer um recorte sobre algumas pesquisas e técnicas grupais que permi- tem observar, analisar, compreender e intervir em situações reais, nos contextos grupais. Para tanto, torna-se importante recordar que o ser humano é um ser social em sua essência, naturalmente, bus- ca grupos dos quais possa fazer parte, pois nesses grupos outras pessoas estarão presentes, com seus aspectos subjetivos. Por aspectos subjetivos compreende-se, segun- do Cabral e Nick (1989 p.370): “SUBJETIVO - O que somente existe em virtude de uma experiência psíquica ou mental da pessoa ou su- jeito. O que é intrinsicamente inacessível à observação de mais de uma pessoa e caracteriza, portanto, a expe- riência exclusiva de uma pessoa. Subjetivo e sujeito são antônimos de objetivo e objeto”. As primeiras experiências subjetivas de um ser acontecem dentro do primeiro grupo que o ser faz parte, ou seja, a família. Desde as primeiras experi- ências grupais até as adquiridas na idade adulta, o 98 ser está em constante processo de construções vin- culares e aprendizagem, portanto, é através destes encontros intersubjetivos entre os seres que estes fenômenos acontecem (RIVIÈRE, 2012). Muitas vezes, estes encontros intersubjetivos, que ocorrem nos grupos, podem ser salutares, ou- tras vezes nem tanto, e apontam para uma impres- cindível intervenção, neste caso, os estudos e pesqui- sas sobre grupos tornam-se uma necessidade, assim como as estratégias e técnicas para melhor análise e intervenções em situações reais e humanas que acontecem nos grupos. Os grupos que podem ser auxiliados com tais técnicas são, por exemplo, a família, os grupos de trabalho dentro de uma instituição ou organiza- ção, grupos de usuários dos serviços de saúde, os grupos dentro de uma determinada comunidade e outros. As técnicas vão variar de acordo com o ob- jetivo a que se propõe. Os seres humanos estão em constante proces- so mudança, apesar das dificuldades que apresen- tam frente ao novo. Estas mudanças que aconte- cem através do processo de aprendizagem sofrem interferência dos medos básicos, que se referem ao medo da morte e do ataque, presentes desde a Pré- -História, ora manifestados de forma consciente, ora inconsciente. Ao se pensar em análise de situa- ções reais de grupos, não se podem esquecer esses 99 padrões de funcionamento psíquico, tão bem des- critos por Rivière (1998). Com relação à análise de situações reais de grupo por meio de pesquisa, o campo é bem vas- to nas áreas da Política e do Marketing, que vêm usufruindo do método de pesquisa qualitativo para atingir seus eleitores e consumidores respectiva- mente. Felizmente, as pesquisas sobre análise de situações reais de um grupo não se limitam às áreas citadas, mas aparecem no campo das pesquisas na saúde coletiva, saúde do trabalhador, saúde mental, epidemiologia e outros. Dentre as pesquisas que analisam as situações reais de um grupo, está a da pesquisadora Menezes (2012), que constatou, por meio de um estudo de caso realizado com um grupo de trabalhadores em uma fábrica de manequim, a estreita relação entre a dinâmica psíquica dos trabalhadores e a precarização do trabalho. Aponta a precarização do trabalho que se manifesta através de um contexto relacional de servidão, como fonte de sofrimento psíquico, pro- dução de sentimentos de desamparo e consequente adoecimento do trabalhador. Outra importante área de pesquisa a ser con- siderada para analisar situações reais de grupos encontra-se no campo da saúde mental, através de levantamentos sobre as doenças que mais incapa- citam no mundo, os estudos apontam que, das dez 100 mais incapacitantes, cinco se referem a problemas da saúde mental, a depressão é responsável por 13%, o alcoolismo por 7,1%, a esquizofrenia por 4%, o transtorno bipolar por 3,3% e o transtorno obses- sivo-compulsivo por 2,8%. Os transtornos mentais são responsáveis por 12% das incapacitações por doença, em geral, nos países desenvolvidos, este nú- mero sobe para 23% (MURRAY, LOPEZ, 1996). Como é possível observar, os transtornos men- tais atingem uma boa parcela da população, isto não é coincidência, e sim um reflexo de uma série de eventos ligados a problemas individuais e coletivos. As doenças têm uma história e cada época tem suas doenças. São vivenciadas de modos diferentes em função da época em que ocorrem. Existem diferenças entre os flagelos do passado (flagelos coletivos) e as doenças (individuais) de hoje. Existe uma ligação muito forte entre o grau de desenvolvimento de uma sociedade e o estado geral de sua saúde. Os estudos sobre saúde mental, em nosso mo- mento contemporâneo, têm muito que contar sobre os grupos humanos e as possibilidades de interven- ções, pois apesar de todo o avanço da medicina e o uso desenfreado de medicamentos para curar a alma, ela continua insistentemente a apresentar sua rebeldia, através de seu sofrimento, o qual, muitas vezes, os remédios apresentam apenas uma eficácia 101 simbólica e em um movimento refratário a alma é que insiste em não se render à medicalização da vida. As medicações com certeza têm sua eficácia e são necessárias para algumas situações, mas a ques- tão aqui levantada diz respeito a seu uso exclusivo em detrimento das relações humanas, sendo que es- tas últimas apresentam alta potência curativa através do próprio encontro humano, como será levantado na próxima sessão desta unidade. Ao pensar em grupos humanos e análise de si- tuações reais através de técnicas grupais e vivenciais, após a explanação sobre os transtornos mentais, al- gumas perguntas podem surgir. Quais os tipos de técnicas grupais e vivenciais que contemplam a análise e intervenção em situa- ções reais de grupos?Sabe-se que as técnicas de grupo, neste momento da humanidade, são extremamente eficazes, não so- mente por atender um número maior de pessoas, mas pela eficácia que a própria vivência em grupo propicia, por meio do exercício da solidariedade e afetividade que, de um modo geral, os grupos também podem ofe- recer para um sistema humano que tem adoecido por flagelos individuais, como as doenças psíquicas. As técnicas grupais e vivenciais são utilizadas em uma gama de situações que vão desde institui- ções públicas até as privadas na área da saúde, mas também na educacional e empresarial. 102 Para iniciar o assunto é necessário fazer alguns apontamentos, toda técnica grupal propicia uma vi- vência, então, neste texto, as técnicas grupais serão compreendidas como vivências grupais. Podem-se dividir as técnicas grupais da seguin- te forma: a dinâmica de grupo, os grupos operativos e os grupos terapêuticos. A dinâmica de grupo é um conjunto técnicas que dispõem de recursos, que podem ser utilizados em diferentes áreas e com finalidades diversas. Po- dem ser utilizadas na área organizacional com a fi- nalidade de desenvolvimento pessoal, recrutamento e seleção, integração do grupo de trabalho, desliga- mento de funcionário, e outros. Na educação, pode ser utilizada como integração entre alunos e profes- sores, como grupos de prevenção a situações de risco e outros. Na área terapêutica pode ser utilizada como instrumento de tratamento em abordagens diferen- tes, mas, particularmente na abordagem psicodra- mática, é um recurso fundamental através dos jogos psicodramáticos (FIGLIE; MELO; PAYA 2004). Este conjunto de técnicas, que dizem respeito às intervenções em dinâmica de grupo, é utilizado em diversos setores e sua flexibilidade no uso, se deve em parte a sua estratégia de criar situações fo- cadas, por exemplo, brincadeiras, jogos, exercícios, dramatizações e outros com objetivos bem delinea- dos a serem atingidos. 103 As dinâmicas de grupo, embora tenham obje- tivos bem definidos, e estratégias focadas para a re- alização dos mesmos, são recursos que apresentam uma forma indireta de lidar com assuntos diversos e que, normalmente, dizem respeito a situações que envolvem relações interpessoais, intrapessoais, afeti- vas e outras (FIGLIE; MELO; PAYA, 2004). Por exemplo, um profissional da psicologia que supervisionava uma determinada equipe de saúde do Programa de Saúde da Família organizou alguns exercícios de dinâmica de grupo que tinham como objetivo melhorar as relações interpessoais dentro da equipe de profissionais do Programa de Saúde da Família, isto foi feito por meio de dinâ- micas que despertavam a solidariedade e o afeto entre os mesmos. Naturalmente, o assunto não fora tratado anteriormente de forma direta, mas, através do exercício de dinâmica de grupo, tais sentimen- tos puderam se manifestar e ser trabalhados para maior integração do grupo. Neste exemplo, as técnicas de dinâmica de grupo foram utilizadas por um profissional da psicologia, mas são técnicas que, por terem seus objetivos bem defi- nidos e estratégias bem focadas, podem ser utilizadas por profissionais de outras áreas. O mais importante a ser destacado a respeito dos exercícios de dinâmica de grupo não é quem vai aplicá-los, mas o seu significado e sua finalidade, segundo Fritzen (1989). 104 Portanto, existem exercícios que despertam a solidariedade, outros têm como objetivo despertar o potencial humano adormecido, outros ainda se pro- põem a auxiliar as pessoas a perceberem os movi- mentos do seu inconsciente, enfim, existe uma varie- dade grande de técnicas para contemplar as relações humanas interpessoais e intrapessoais. A seguir, dois quadros com exemplos adapta- dos para este texto de dinâmicas de grupo retiradas do livro de Fritzen (1989), que, segundo o autor, têm como objetivo propiciar um maior conhecimento de si e dos outros, assim como, melhorar as relações interpessoais, despertar os sentimentos de solidarie- dade de confiança e descobrimento entre as pessoas integrantes de um grupo. Figura 17: modelo de dinâmicas de grupo: Novos Nomes Obejtivo: diminuir o problema de esteriótipos que sofrem as pessoas de um grupo e os pre- conceitos que por vezes estão associados a eles. Tamanho do grupo: Qualquer tamanho de grupo. Material utilizado: Uma lista com nomes mas- culinos e femininos, se o grupo for misto. Ambiente fisico: Uma sala que possa acomo- dar o grupo. 105 Conhecimento Pessoal: Gráfico da vida. Objetivos:Oferecer a oportunidade aos inte- grantes da dinâmica de fazer um feedback da sua vida. Propiciar a expreessão de vivências e sentimentos ao grupo. Tamanho do grupo: Oito a dez pessoas. Tem- po: 35 minutos. Material: Folhas de papel em branco, caneta ou lápiz. Ambiente: sala com carteira. Prcesso: A pessoa que vai aplicar a dinâmica esclarece, que para haver maior esponteneidade num grupo formado por pessoas que ainda não se conhecem existe uma oportunidade valiosa para se livrarem das expectativas resultantes de suas identidades passadas, adotando novos nomes, concordando em não falar inicialmen- te, sobre seus antecedentes, ocupação, cidade onde nasceram, etc. Em alguns momentos, certas profissões evocam certos comportamen- tos esteriotipados, os quais despertam no gru- po reações tambem esteriotipadas. Ex: médico, enfermeiras, psicologo e outros. Processo: Os integrantes do grupo antes de se conhecerem recebem novos nomes, e vão ser conhecidos apenas por este nome durante a dinâmica.A distribuição dos nomes pode ser ao acaso, por escolha dos integrantes do grupo em concordancia com a pessoa que vai assumir o nome, ou ainda, cada integrante escolhe o nome que for mais significativo para ele. Pode acontecer de alguns participantes deseja- rem trocar os nomes durante a dinâmica, assim como alguns desejarem retornar aos seus pró- prios nomes revelando sua identidade e queren- do conhecer a de outro membro do grupo. Fonte: adaptção por fonseca, 2013. Modelo de dinâmica de grupo de frittzen, 1989. Figura 18: modelo de dinâmica de grupo? 106 Processo: A pessoa que vai aplicar a dinâmica incia com a explicação dos objetivos da dinâmi- ca, seguindo com a distribuição do material. É solicitado para cada participante traçar um linha com ângulos e curvas, os quais representem fatos de sua vida, nos ultimos meses ou ano. O gráfico poderá expressar sentimentos e vivências. Após esta atividade cada membro do grupo irá fazer uma exposição do seu gráfico para o grupo ressaltando os aspéctos importantes. Ao terminar esta troca, caminha-se para os de- poimentos e comentários entre os membros do grupo. Fonte: modelo de dinâmica de grupo de frittzen, 1989. Adaptação por fonseca, 2013. As dinâmicas de grupo podem também ser compreendidas como grupos operativos como será apresentado a seguir. Os Grupos operativos têm uma aplicação bem extensa, pode-se pensar que eles são uma espécie de recipiente dos outros tipos de grupos que se pro- põem a intervenções em situações reais. Os grupos operativos foram descritos e criados por Pichon Rivière (1998), e tem como finalidade e objetivo a mobilização de estruturas estereotipadas, nas dificuldades de aprendizagem e comunicação, dificuldades ligadas às ansiedades básicas que são naturalmente despertadas frente às possibilidades de mudança, expressas pelo medo da perda e do ataque, que, em uma linguagem psicanalítica, dizem respeito às ansiedade depressiva e paranoide, respectivamen- 107 te. Estas ansiedades emergem juntas e se alimentam entre si, segundo o autor em um processo natural do ser humano, como reação ao novo, mas são su- peradas através do processo aprendizagem que se faz pelo exercício da comunicação humana. Toda esta movimentação surge frente a uma tarefa pro- posta pelo grupo, que pode ser desde um grupo de aprendizagem até um grupo terapêutico, ambos se formam em torno de uma tarefa. No primeiro, a ta- refa seria a aprendizagemem si, no segundo, a tarefa proposta estaria ligada ao bem-estar dos integrantes, ou sua cura. Os papéis, inicialmente, são fixos, mas mu- dam naturalmente quando as lideranças funcionais surgem. Por lideranças funcionais o autor entende como operativas, que são altamente eficazes e se constroem no aqui e agora, de acordo com a neces- sidade do grupo, ou seja, qualquer integrante do gru- po pode assumir o papel de liderança. Os grupos podem ser homogêneos, ou he- terogêneos, verticais ou horizontais, primários ou secundários, mas à medida que aumenta a homo- geneidade de tarefa, o grupo pode apresentar sua heterogeneidade adquirida através de uma diferen- ciação progressiva e acolhida dentro do contexto grupal (RIVIÈRI, 1998). Esta teoria sobre grupos operativos apresenta alguns conceitos interessantes já expressos: O con- 108 ceito de vínculo que aponta para os personagens parentais, que podem surgir de forma inconsciente dentro de um contexto grupal, os integrantes po- dem repetir padrões de relacionamento adquiridos em suas relações familiares sem perceber que estão diante de relações novas, que demandam um novo modo de se relacionarem; o conceito de formação de papéis, que diz respeito aos lugares ocupados pelos integrantes, por exemplo, o do bode expia- tório, o porta-voz, o sabotador, o líder, que pode variar em sua expressão; o conceito de modelo do cone invertido, que diz respeito aos movimentos grupais, por exemplo, aos processos de afiliação grupal, pertinência, comunicação, cooperação, aprendizagem e o contexto emocional do grupo; os conceitos de verticalidade, que diz respeito à história de cada integrante do grupo contemplada, a ideia de horizontalidade que se expressa através do aqui e agora do grupo; o conceito de pré-tarefa, que diz dos movimentos grupais que surgem antes da realização da tarefa, e que podem impedir uma ação realmente nova, expressa na própria realiza- ção da tarefa; os conceitos de depositário, deposi- tante e depositado das ansiedades básica, ou medos básicos (ZIMERMAN, 2000). Estes conceitos podem ser observados em movimentos de diferentes grupos, inclusive nas grupoterapias. 109 O coordenador de grupos operativos tem como objetivo centrar na tarefa proposta, seja ela de apren- dizagem ou terapêutica. Outro modelo de intervenção em situações re- ais de grupo são os grupos terapêuticos, que podem ser divididos em dois tipos, como identifica Zimer- man (2000), os de autoajuda e os de psicoterapia. Os grupos de autoajuda comumente são gru- pos que se formam por pessoas que tem em comum algum tipo de sofrimento que é reconhecido por quem integra o grupo, ou melhor, por quem sofre pela mesma razão. Tem seu início marcado em 1935, com a formação dos alcoólicos anônimos, e é con- siderado uma das formas de intervenções grupais mais antigas para quem sofre de dependência de ál- cool (FIGLIE; MELO; PAYA, 2004). Nesses grupos alguns fatores parecem con- tribuir para seu sucesso evidente, os integrantes se reconhecem como alguém que sofre, recorrem sem- pre ao amparo grupal e iniciam através do grupo um processo interno de autocura. Eles surgem, inicialmente, através dos alcoóli- cos anônimos, mas seu modelo de funcionamento vem sendo estendido para outros campos, por exem- plo, grupos de diabéticos, grupos dos que amam de- mais e outros. E, por fim, os grupos psicoterápicos, estes podem se diferenciar, de acordo com suas abordagens teóricas. 110 As abordagens podem ser de orientação psica- nalítica, psicodramática, sistêmica, cognitivo-com- portamental e outras. De um modo geral, elas têm como objetivo, através de seus construtos teóricos e práticos, se aproximarem da cura dos problemas apresentados, sendo que a definição de cura também pode variar de acordo com a abordagem teórica O que todas estas abordagens apresentam em comum é a possibilidades de analisar e intervir em situações reais de grupos, no auxílio dos que sofrem. Essa possibilidade é o que anima e mantém viva a chama da esperança que a solução para o sofrimen- to humano está no próprio encontro humano, e, um dos lugares privilegiados para que isto possa ocorrer são os contextos grupais. 4.1. Desenvolvimento da Consciência Crítica E Das Habilidades Interpessoais Através das Atividades Coletivas Ao iniciar esta unidade sobre o tema do desen- volvimento da consciência crítica humana e das ha- bilidades interpessoais através das atividades coleti- vas, naturalmente, se remete a temática das relações do ser com ele mesmo e com outros seres humanos ou com mundo ao seu redor. O próprio desenvolvimento da consciência crí- tica é condicionado na dialética que se dá entre a 111 reflexão do ser sobre ele mesmo, que propicia uma consciência de si, e a reflexão e atenção ao mundo externo e consciência do outro. Portanto, esta cons- ciência se desenvolve dentro de um contexto de re- lação intrapessoal e interpessoal situados no mundo. As atividades coletivas são espaços privilegiados, para esta bonita valsa do encontro entre o ser e o ou- tro, possibilitando conhecimento de si e do outro. Para maior compreensão sobre o conceito de consciência crítica se faz necessário compreender primeiramente o que é consciência. Normalmente, este termo está associado à capacidade do ser huma- no de apreender a realidade através da capacidade intelectual, mas o ser humano é capaz de apreender a realidade através de outras capacidades, por exem- plo, dos sentidos, percepções conscientes e incons- cientes, assim como através das emoções. A consciência crítica, então, se desenvolve jun- to com o desenvolvimento do ser em um constante processo de aprendizagem que acontece por meio de sua vivência interna e com outros seres. Essa atividade psíquica permite aos seres que estejam no mundo com algum conhecimento. Per- mite também a análise de si mesmo e dos outros, considerando as possíveis diferenças e semelhanças, os limites e os valores de uma pessoa ou sociedade, através de uma postura reflexiva, que pode facilitar a diferenciação do que é moral ou ético. 112 Esta consciência crítica se desenvolve acompa- nhando o desenvolvimento individual do ser e da hu- manidade, pois acompanha os constantes movimen- tos evolutivos do ser e do mundo. À medida que o ser evolui, ela também e se altera. É um processo intima- mente ligado ao desenvolvimento do ser e do mundo. A consciência de si desenvolve-se através de um processo de atenção, concentração e reflexão dos estados internos e de suas manifestações, sejam elas intencionais ou não. A consciência do outro se desenvolve através do processo da concentração da consciência e atenção no exterior, no mundo exter- no e no outro (COTRIM, pág. 42 a 45,2008). Ambas as consciências desenvolvem-se tam- bém através das manifestações humanas, como no primeiro caso, o ato de falar, posicionar-se frente a algo, criar, afirmar, sofrer, inovar, ser feliz etc. No segundo, o processo se dá através do encontro hu- mano, do escutar o outro, assimilar o que vem de fora, renovar, ou abrir para o novo. A consciência de si, também ocorre frente ao encontro humano, um exemplo claro disso é o pro- cesso de psicoterapia, no qual o ser, através de suas manifestações verbais ou não, acolhidas pelo analis- ta, pode fazer uma interlocução entre questões pes- soais e ele mesmo. Ainda no que diz respeito à consciência do ou- tro, é importante ressaltar a dimensão da alteridade, 113 que, enquanto processo, trata-se desta percepção do que é o outro, e surge através do contato com o outro. Na psicologia, o conceito de alteridade diz respeito à concepção que o ser tem sobre a diferença entre ele e o outro, entre o ego e o outro (Dicionário de psicologia, 1973). O mesmo conceito, oferecido pelo dicionário de filosofia (ABBAGNANO, 1998 p. 34-35), apresenta- -se como a eminência do ser em ser o outro, colocar- -se no lugar do outro, constituir-se como o outro. Para finalizar, alteridade trata daassimilação e compreensão do outro em toda sua dimensão hu- mana incluindo suas diferenças. Quanto maior for a consideração a respeito da alteridade, menor a pos- sibilidade de conflitos entre os seres e os grupos, e este exercício humano é possível frente a atividades coletivas, que vão desde as profissionais até as de lazer, entre outras. Para finalizar a temática sobre consciência críti- ca, é importante ressaltar a necessidade de um equilí- brio entre a consciência de si e a do outro, pois o in- divíduo que se centra somente na consciência alheia pode agir sem reflexão sobre a autoconsciência e desenvolver comportamentos grupais contrários às suas concepções, assim como o ser que fica preso somente à consciência de si pode desenvolver com- portamentos narcisistas, submetendo outras pessoas a seus desejos sem respeito às diferenças. 114 Outro conceito importante para ser descrito nesta unidade diz respeito ao conceito de inteligên- cia emocional, o qual desembocará no conceito de inteligência relacional. 4.2 Inteligência Emocional Ao falar sobre relações humanas e liderança ocorre uma aproximação do conceito de inteligên- cia emocional, pois os seres humanos, antes de tudo, são seres emocionais. No passado, o conceito de in- teligência foi muito estudado e a inteligência, nestes estudos, era considerada como uma função mental, intimamente ligada a outras funções, tais como a percepção, o pensamento, a memória e o raciocínio lógico (OSÓRIO, 2003). No dicionário de psicologia, encontra-se a definição da seguinte forma (CABRAL; NICK, 1989 pg. 193): INTELIGÊNCIA- Segundo o ponto de vista básico adotado pelos vários autores que o definiram, em termos psicológicos, o conceito de inteligência pode abranger di- ferentes significados. (1) Binet: “Tendência para adotar e manter uma direção definida; capacidade de fazer adap- tações com o intuito de alcançar uma determinada meta; poder e auto-crítica.” (2) Craparèd: “Nível mental, consi- derado globalmente.” (3) Burt: “Fator inato da atividades 115 cognitivas” (4) J. Chaplin: “Capacidade de resolver proble- mas frente a novas situações. Capacidade de utilizar efeti- vamente conceitos abstratos.” Estas definições não devem ser consideradas independentemente umas das outras; elas apenas enfatizam diferentes aspectos do processo. Como se pôde observar trata-se de um proces- so global, que inclui várias funções psíquicas e não é somente uma questão de cognição ou memória ou rapidez, mas algo que auxilia o ser frente a situações novas, nem todas as pessoas que são rápidas em ra- ciocínio, por exemplo, lidam bem frente a situações emocionais novas. Por um longo tempo, os aspectos que eram res- saltados nas avaliações de inteligência, basicamente diziam respeito às funções mentais de precisão e ra- pidez na realização de cálculos numéricos, de fluên- cia e compreensão verbal, de velocidade da percep- ção ou da habilidade em rememorar e da capacidade de raciocínio (OSÓRIO, 2003). Aparentemente, estes aspectos identificavam o grau de inteligência disponível na mente do ser. A partir deste ponto, nesta pequena introdução sobre o conceito de inteligência, se torna importante o início da ampliação do mesmo. Todas essas funções mentais descritas sempre estiveram intimamente relacionadas com as emo- 116 ções, basta retomar as unidades anteriores desta obra, as quais apontam para o ser humano enquanto um ser essencialmente emocional e relacional. É fácil observar, por exemplo, que quando as pessoas estão deprimidas, uma das primeiras fun- ções psíquicas a serem afetadas é a memória, assim como as pessoas que estão vivendo em ambientes com muitos conflitos interpessoais, muitas vezes, não conseguem ter agilidade perceptiva sobre o que está acontecendo, sendo necessário alguém de fora intervir, pois este último avalia a situação melhor por não estar envolvido emocionalmente na mesma. Os fatores emocionais estão relacionados com os cognitivos desde sempre, na área da psicologia tem um ditado de autor desconhecido, que diz que, “criança feliz naturalmente vai bem na escola”. Nessa relação de interdependência entre os afetos e a cognição, existe mais um ingrediente im- portante, que diz respeito à consideração a ser feita sobre o ser humano, por ser ele um ser biopsicos- social se torna necessário ressaltar outros aspectos envolvidos no desenvolvimento da inteligência, não mais somente a capacidade cognitiva, mas também a emocional e relacional (OSÓRIO, 2003). O autor Goleman (1995), em seu livro sobre inteligência emocional, ressalta vários aspectos des- ta função psíquica a serem considerados em sua di- mensão. Listou cinco principais domínios a serem 117 observados no que diz respeito as capacidades da inteligência emocional, sendo que, três delas estão ligadas a relação do indivíduo com ele mesmo, ou seja, o seu relacionamento intrapessoal. Elas são o autoconhecimento emocional, o controle emocional e a automotivação. Essas habilidades dizem respeito à identificação das próprias emoções no momento em que surgem, o manejo adequado das mesmas e o uso das mesmas para situações determinadas, ou frente a objetivos ou ainda realizações pessoais. As outras duas dimensões também tratam de aspectos importantes ligados à relação com os ou- tros ou relações interpessoais. Estes outros domínios são o reconhecimento de emoções em outras pesso- as e as habilidades em relacionamento interpessoal. O reconhecimento das emoções no outro se trata do exercício da empatia, da capacidade de reconhecer e compreender os sentimentos dos outros. As habili- dades em relacionamento interpessoal dizem respei- to à interação com outros seres humanos, através do uso de competências interpessoais, que nascem de uma disponibilidade para o encontro humano, mas também de um esforço prático e teórico realizado a partir das vivências grupais. Figura 19: inteligência emocional – luz quântica nos tempos atuais 118 Por que pensar em um esforço, prático e teóri- co para desenvolver a competência interpessoal? Pelo simples fato de que não se desenvolve tal inteligência através do isolamento social, há estudos que podem ajudar a compreender melhor o ser hu- mano e que podem ser levados para a prática através do exercício da vida em grupos. Os grandes teóricos da psicologia, da psicanáli- se e da fi losofi a iniciaram esta incrível jornada sobre o conhecimento do ser humano há muito tempo, e Emotional Intelligence Man agin g Emo tions Identifying Emotions Eval uatin g Emo tions UsingEmotions FONTE: THUMBS.DREAMSTIME, 2013. Disponível em: http://thumbs. dreamstime.com/z/intelig%C3%AAncia-emocional-27770224.jpg 119 seus trabalhos estão disponíveis para todos que se interessarem em, também, iniciar esta jornada de en- contro com o outro e consigo mesmo. Através de pesquisas realizadas sobre as inte- rações precoces, muito se descobriu a respeito das disposições inatas do recém-nascido. Sabe-se que o bebê nasce com um equipamento de base, ou me- lhor, certa organização neurológica e fisiológica so- fisticada e com uma gama de funções perceptivas, dentre elas a percepção visual, a auditiva e a olfativa, que o tornam um parceiro singular em ação de ini- ciativa e pronto para interagir com a mãe em um contexto interpessoal. Esta organização sofisticada trata-se de um modo individual e particular de ritmos estabelecidos através do sono e de descargas motoras em intera- ção com o ambiente. Estes ritmos e descargas são diferentes para cada bebê, apontam para a originalidade de cada um, por exemplo, a figura da mãe para um determina- do bebê pode funcionar como estímulo pacificador frente às descargas motoras provenientes do pró- prio organismo. Em outro bebê, o estado de alerta pode ser alterado quando se vê diante de estímulos nocivos, ele pode adormecer aos poucos, revelando deste modo a capacidade de subtrair-se do estímulo nocivo, ocorrendo uma atividadedinâmica de para- -excitação (BRAZELTON, 1987). 120 Este exemplo de uso do estado de vigília de- monstra uma complexa capacidade de o bebê orga- nizar-se diante de um estímulo, uma capacidade de se tranquilizar. Pode ocorrer também uma reação diferente desta citada, dependendo da originalidade do mesmo, ele pode se expor ainda mais ao estí- mulo, permanecendo acordado, como no caso das insônias precoces. Com relação às funções perceptivas, sabe-se que o bebê nasce preparado para receber os estímulos vindos do adulto, discriminá-los e a respondê-los de modo que a comunicação entre ambos se estabeleça. Deste modo, o bebê não é somente um reflexo do ambiente, ele vai, também, através da interação com sua mãe, provocá-la de modo ativo para o iní- cio de um processo de comunicação e aprendizagem entre ambos. Este recorte teórico feito sobre o funcionamen- to psíquico dos bebês aponta para uma potenciali- dade praticamente inata da inteligência emocional e relacional, neurologicamente, o ser nasce pronto para manifestar-se de modo espontâneo e habilitado para o encontro humano, tais potencialidades em- brionárias ficam aguardando para serem despertadas em um primeiro momento, através do outro, mas, em um segundo momento, este mesmo bebê já cres- cido e adulto pode vir a ser um agente do desper- tar humano, para pessoas que em decorrência dos 121 traumas da vida se veem encapsuladas em sua dor e impedidos de reabilitar sua competência emocional e relacional. A próxima sessão desta unidade vai tratar sobre o conceito de resiliência, já introduzido levemente no parágrafo anterior. 4.3 Resiliência O termo Resiliência tem sua origem na discipli- na da física, trata-se de uma capacidade de um de- terminado material que, após sofrer tensão, retorna a seu estado original, exemplos destas matérias são os utilizados pelos dentistas na fabricação de apare- lhos ortodônticos. Estes materiais acumulam energia quando submetidos ao estresse sem se romperem, após o período de exposição à tensão. Esta terminologia, embora originalmente surgi- da na área de física, vem sendo utilizado e adaptado para outras áreas do conhecimento, como na psico- logia, tornando-se um conceito psicológico aplica- do aos indivíduos, às famílias, às organizações e nas áreas sociais. Por resiliência pode-se entender que são pro- cessos de superação que os indivíduos vivenciam após se depararem com crises e adversidades (YU- NES, 2001). O conceito de resiliência compreendi- do desta forma aproxima-se da compreensão que é 122 dada pelos pesquisados brasileiros e de língua latina, portanto, um pouco diferente dos pesquisadores in- gleses e americanos, como será apontado a seguir. Embora o termo resiliência fosse familiar nas disciplinas da física e engenharia, o seu uso pelas ci- ências humanas é relativamente novo e adquire, com relação ao construto teórico sobre resiliência, sig- nificados diferentes em diferentes países nos quais vem sendo pesquisado, variando de acordo com a familiaridade com o termo e o tempo. Tal distinção torna-se importante na introdução desse tema para melhor compreensão. Os estudos norte-americanos e ingleses sobre resiliência, ligados à área da psicologia, surgiram, ini- cialmente, no final da década de setenta e no início dos anos oitenta, quando, neste período, ocorreram mudanças de enfoque nas pesquisas em psicologia, em consequência de demandas que surgiram ligadas às mudanças socioculturais. Até então, tais estudos eram ancorados na psicopatologia e se debruçavam nas questões referentes ao adoecimento do ser, havia pouco ou quase nada de material sobre aspectos di- tos saudáveis. O enfoque era o de avaliação de riscos, centrado na doença e em fatores que poderiam levar o ser humano a um prejuízo social ou biológico. Nos estudos iniciais sobre resiliência, acredi- tava-se que certos indivíduos eram invulneráveis às situações traumáticas ou de risco. 123 Através de pesquisas com crianças foi obser- vado que algumas delas, apesar de expostas a situa- ções de risco para o desenvolvimento normal, não adoeciam, eram praticamente invulneráveis aos ris- cos (BRANDÃO; MAHFOUD; GIANORDOLI- -NASCIMENTO, 2011). Estes estudos levaram à observação de que cer- tas crianças possuíam algum grau de vulnerabilidade ou predisposição individual para não obterem suces- so no enfrentamento das situações de risco, assim como uma disposição para o desenvolvimento de doenças psíquicas ou físicas frente aos traumas, en- quanto outras apresentavam algumas características que as auxiliavam na superação de situações de risco. Tais estudos passaram a levantar quais seriam estas características. Embora esses estudos iniciais praticamente descrevam inicialmente crianças invencíveis, poucos pesquisadores fixaram somente nesta ideia, pois a ideia de invencibilidade limitava as pesquisas. No que diz respeito a um dos conceitos de resiliência atuais utilizado na área da psicologia, a American Psychological Association (APA, 2010) aponta a resiliência como um processo no qual o ser consegue se adaptar a experiências muito complexas e difíceis com eficácia, através do exercício de seus recursos, como flexibilidade mental e emocional e manejo de demandas externas e psíquicas internas. 124 Neste conceito sobre resiliência, observa-se que ocorre uma mudança, o ser não é exatamente invencível, mas é capaz de processualmente acio- nar recursos ou potências para superar uma situ- ação traumática. A mudança de enfoque que surge a partir destas décadas de pesquisas em resiliência, trata-se de uma mudança de paradigma que levou os pesquisadores a mudarem do enfoque de riscos para o enfoque de resiliência. O enfoque na resiliência aponta que os fatores de risco irão encontrar pessoas que não esta- rão simplesmente paradas ou determinadas a danos permanentes, mas vão reagir, superar e voltar a viver, apesar do sofrer. Outro pesquisador sobre resiliência, Sabbag (2012) aponta que tal fenômeno humano diz respei- to a certa competência dos seres ou de instituições que auxilia no enfrentamento das adversidades, pos- sibilitando inclusive, uma aprendizagem nova. Neste sentido, trata-se de um fenômeno humano que pode ser desenvolvido e melhorado, pois tal fenômeno se apresenta como um processo de tomada de consci- ência das atitudes e habilidades ativadas no enfren- tamento do sofrimento e uma postura ativa frente à dor de resolutividade. Ainda nesta linha de pensamento de Job (2003), através de seus estudos sobre resiliência em institui- ções, conclui que tal competência denota também, 125 uma postura ativa frente à situação geradora de ten- são ou sofrimento em uma tentativa e desejo de re- solver o problema. Até este momento, as definições sobre o conceito de resiliência baseiam-se nos estudos americanos e ingleses e dizem respeito a com- petências que um indivíduo ou uma organização para lidar com a adversidade. Estes estudos, embora alguns sejam atuais, se- guem a linha de raciocínio cujo conceito de resili- ência diz respeito a uma capacidade de resistir aos problemas sem ser afetado, são pessoas que resistem ao estresse sem adoecerem e são auxiliados neste processo através de características individuais, tais como: personalidades flexíveis, sociabilidade, criati- vidade na resolução dos problemas e senso de auto- nomia (YUNES, 2003). As pesquisas quantitativas nesta abordagem do fenômeno naturalizam a resiliência como uma capaci- dade humana e como um indicativo de vida saudável. Em seu artigo sobre resiliência, Yunes (2003) aponta algumas características de famílias resi- lientes, como as famílias que conseguem atribuir sentido às adversidades, olhando-as positivamen- te, com certa transcendência e espiritualidade. Apresentam também flexibilidade, coesão, recur- sos sociais e econômicos com relação aos padrões de organização. No que diz respeito à comunica- 126 ção nestas famílias resilientes, ela é exercida comclareza, e as emoções são expressas abertamente, apresentam também comportamento colaborati- vo entre si frente às adversidades. Os pesquisadores brasileiros e de língua latina vão compreender o conceito de resiliência de for- ma ampliada, para eles, resiliência trata-se de uma possibilidade de recuperação, mas esta recuperação vai além de simplesmente recuperar-se de um dano, significa uma superação do que se era. As pesqui- sas que são realizadas a partir desta concepção do conceito se interessam por indivíduos fragilizados frente às adversidades, tem como meta recuperá-los, fortalecê-los para que ocorra a superação do trau- ma (BRANDÃO; MAHFOUD; GIANORDOLI- -NASCIMENTO, 2011). Esses pesquisadores não abandonaram com- pletamente o conceito de resiliência relacionado aos fenômenos de resistência ao estresse, mas eles acrescentaram a este conceito a ideia de resiliência como um processo de superação e recuperação após situações traumáticas. Assim como muitas pesquisas americanas e inglesas, atualmente, se apoiam no con- ceito de resiliência tal como descrito. Pode-se pensar então que resiliência são pro- cessos a serem cuidadosamente avaliados que dizem respeito tanto a características individuais que uma pessoa possa ter e que a auxiliem a resistir as adver- 127 sidades, ou ao estresse, quanto à condição ou possi- bilidade de superação e recuperação de pessoas que não resistiram às adversidades e adoeceram. Desta forma, o conceito torna-se mais realista e aplicável tanto em indivíduos como em organiza- ções, e a partir desta visão pode-se pensar que todos, de alguma forma, podem auxiliar no processo de resiliência de pessoas que se encontram em adversi- dades através do simples exercício da solidariedade. Pois, com a ampliação do conceito e das pesquisas neste campo, outro termo importante surge que diz respeito aos tutores de resiliência. O psicanalista Cyrulnik (2004) trata do con- ceito como um processo, um conjunto de fenôme- nos sincronizados que dizem respeito à capacidade do ser de lutar frente à adversidade, mas também de uma abertura para receber uma mão estendida quando já se sucumbiu a dor, e esta pode vir do social através de uma professora, ou um técnico de enfermagem em um hospital, ou ainda através de um processo de psicoterapia, neste sentido todos podem ser tutores da resiliência, da recuperação de alguém que está em sofrimento. O processo de resiliência para este pesquisador inclui a fala, mas é necessária a espera do ser para que ele consiga falar, pois, ao falar sobre o trauma, ele o revive e a ferida é sentida, mas, desta vez, para que ela seja cicatrizada. 128 O resiliente tem guardado dentro de si vivên- cias infantis seguras que o auxiliam a receber a mão estendida, mas Cyrulnik (2004) afirma que mesmos os seres que foram privados de tais vivências po- dem obtê-las mais tarde, porém, lentamente, es- tas serão assimiladas. Esta construção é possível, contanto que o meio ofereça para os feridos alguns tutores de resiliência. Pessoas dispostas a escutar e acolher o sofrimento do outro em um simples movimento de solidariedade. Antes de finalizar esta obra, vale ressaltar que os feridos estão em toda parte, nas famílias, nos gru- pos de trabalho, nas ruas e até mesmo nos grupos de lazer, assim como os tutores de resiliência em poten- cial, e, às vezes, como aponta Cyrulnik (2004), uma simples palavra ou expressão de um sorriso serve de instrumento de resiliência para quem foi ferido. Vale ressaltar também que pensar em relações humanas e liderança também é lembrar que a solução para o ser humano está no próprio humano e nesta incrível jornada que é este encontro. Figura 20: resiliência 129 FONTE: http://reginagiannetti.files.wordpress.com/2013/04/resiliencia- blog.png 130 Exercícios 1) O que são aspectos subjetivos? 2) Quais são os grupos que podem se beneficiar com estratégias grupais? 3) Como as técnicas grupais podem ser divididas? 4) O que é consciência crítica? 5) Quais são as capacidades da inteligência emocional? 133 Referências ABBRAGNANO, N. Dicionário de filosofia. 3ª edição. 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