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Resenha crítica

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BORGES, A., S.; LISBÔA, J., A., N.; BRAGA, P., R., C.; LEITE, R., O.; QUEIROZ, G., R. 
Doenças neurológicas dos ruminantes no Brasil: exame e diagnóstico diferencial. Revista 
Brasileira de Buiatria. Vol. 1, nº 3, pág. 82-96, 2021. 
Ana Júlia Vieira da Silva Platilha¹ 
Os estudos de casuística das enfermidades neurológicas dos ruminantes contribuem para a 
atualização das informações epidemiológicas, principalmente em relação aos bovinos, onde a 
ocorrência de doenças neurológicas precisa ser constantemente monitorada, pois existem 
doenças como a Encefalopatia Espongiforme Bovina (EEB) que em caso de detecção, podem 
se tornar um impedimento no momento de exportação da carne. Com esse contexto em vista, 
os autores Alexandre Secorun Borges, Júlio Augusto Naylor Lisbôa, Pollyana Rennó Campos 
Braga, Raissa Oliveira Leite e Gustavo Rodrigues Queiroz publicaram o artigo “Doenças 
neurológicas dos ruminantes no Brasil: exame e diagnóstico diferencial”, buscando trazer 
levantamentos a respeito da epidemiologia das enfermidades neurológicas dos ruminantes 
junto à uma abordagem sobre as principais manifestações clínicas dessas doenças e as formas 
de diagnóstico diferencial disponíveis. 
Em relação aos bovinos, o artigo aponta como causas de enfermidades prevalentes do Sistema 
Nervoso Central (SNC) as doenças inflamatórias (50% de todos os casos, sendo composta por 
encefalites e em casos raros mielites), sendo as virais (44,5%) e as causadas por toxinas (36%) 
a primeira e segunda causas mais frequentes, respectivamente. Em seguida, aparecem em 
ordem decrescente: causas degenerativas (7%), doenças inflamatórias bacterianas (5,5%), 
causas circulatórias (3,5%), causas físicas (2,6%) e causas congênitas/hereditárias (1%). 
Sobre os bovinos, as principais enfermidades neurológicas constatadas foram (em ordem 
decrescente de prevalecimento): raiva, botulismo, encefalopatia hepática por plantas 
hepatotóxicas, meningoencefalite por BoHV-5, polioencefalomalacia (PEM), intoxicação com 
plantas de ação direta no SNC, meningoencefalite não supurativa, babesiose cerebral, 
abscessos no SNC ou no canal vertebral, traumatismos cranianos ou na coluna vertebral, febre 
catarral maligna (FCM), tétano, meningoencefalite bacteriana não organizada em abcesso, 
intoxicação por compostos químicos, doenças congênitas e/ou hereditárias do SNC, 
histofilose e listeriose. 
No levantamento de casuísticas em ovinos, destacou-se como principal causa de doença no 
SNC as enfermidades inflamatórias bacterianas (40% dos casos totais), divergindo dos dados 
casuísticos dos bovinos ao mostrar as enfermidades inflamatórias virais como pouco 
importantes epidemiologicamente (7%). Em ordem decrescente de frequência, as outras 
causas foram: intoxicação (26%), causas parasitárias (21%), causas degenerativas (5%) e 
causas físicas (1%). As enfermidades neurológicas em ovinos mais frequentes são: abscessos 
no SNC ou no canal vertebral, cenurose, listeriose, tétano, intoxicação por plantas 
hepatotóxicas ou de ação direta no SNC, raiva, polioencefalomalacia, mielite bactéria 
ascendente pós-caudectomia, meningoencefalite bacteriana não organizada em abscesso, 
traumatismo craniano ou na coluna vertebral e necrose simétrica focal. 
O artigo também discorre sobre o diagnóstico diferencial preliminar aplicado, no qual afirma 
que o tétano é a única enfermidade neurológica que é certamente passível de diagnóstico 
clínico, devido a presença de sinais clínicos característicos (rigidez muscular generalizada, 
hiperestesia e exposição da terceira pálpebra em alguns casos). Outro quadro com sinais 
clínicos mais específicos é o traumatismo craniano, o qual costuma ser acompanhado de 
síndrome cerebral aguda devido ao edema cerebral difuso, sendo necessária sua diferenciação 
de outras enfermidades semelhantes, ação que pode ser feita através do relato de ocorrência da 
pessoa que assistiu o paciente e/ou se existir lesões aparentes no crânio. Os traumatismos da 
coluna vertebral apresentam síndromes medulares que geram incoordenação motora, podendo 
ser ataxia e/ou paresia (devido à compressão da medula espinhal), e seu diagnóstico pode ser 
confirmado pelo relato da ocorrência junto ao curso agudo da enfermidade e a presença de 
alterações ósseas (desvios, desalinhamentos e/ou mobilidade anormal e crepitação das 
vértebras). 
Os casos de intoxicação por organofosforados, carbamatos e ureia (amônia) manifestam-se 
em súbita excitação, tremores musculares generalizados, sialorreia, incoordenação motora 
(ataxia) e convulsão, sendo possível observar em intoxicações por organofosforados em 
específico sinais como diarreia, miose e bradicardia. O diagnóstico pode ser fechado se 
houver o conhecimento seguro de que ocorreu ingestão ou exposição prévia recente a esses 
compostos. 
Na avaliação clínica de um animal apresentando disfunções neurológicas, as enfermidades se 
confundem entre si em suas manifestações clínicas, surgindo a obrigatoriedade do diagnóstico 
diferencial. Os autores recomendam iniciar a avaliação neurológica diferenciando 
encefalopatia de mielopatia, sendo a primeira composta por sinais de síndrome cerebral, 
cerebelar, mesencefálica ou pontinobulbar, associados ou não entre si, enquanto que a 
mielopatia manifesta-se por incoordenação motora (ataxia e/ou paresia) em graus variados e 
de modo exclusivo, havendo ausência de alterações comportamentais ou da consciência do 
animal. Ademais, os casos de encefalopatia são numerosos e podem acontecer em forma de 
surtos, enquanto as mielopatias são menos frequentes e acometem de modo 
isolado/individual. 
A síndrome cerebral aguda, associada ou não às outras síndromes encefálicas, é definida 
como padrão sintomático das seguintes enfermidades: meningoencefalite por BoHV-5, PEM, 
babesiose cerebral, FCM, trauma cranioencefálico, intoxicação por chumbo ou por NaCl, 
histofilose, encefalopatia hepática (por plantas hepatotóxicas) e em alguns casos de 
meningoencefalite bacteriana não organizada. A síndrome citada é um conjunto de 
manifestações clínicas que inclui sinais de excitação, convulsão e depressão, apresentando no 
caso dessas enfermidades seus sinais de modo mais evidente/acentuado desde o início do 
curso da doença, devido ao edema cerebral difuso que ocorre nessas doenças. 
Lesões nas estruturas do cerebelo e tronco encefálico irão resultar em síndrome cerebelar e 
síndrome mesencefálica e pontinobulbar, que também podem ser ocasionadas pela 
compressão causada pelo aumento da pressão intracraniana. Nessa última situação, os sinais 
clínicos são amenizados ou resolvidos pela redução do edema cerebral. 
Na babesiose cerebral ou na encefalopatia hepática por plantas que determinam necrose aguda 
no fígado, expressam-se sinais de excitação (atividade neuronal exagerada), podendo ocorrer 
convulsão, que é capaz de evoluir para óbito em um curto período de tempo (12 a 36 horas). 
Em quadros de meningoencefalite por BoHV-5, febre catarral maligna ou histofilose, notam-
se sinais de depressão onde a atividade neuronal encontra-se diminuída. Nos casos de PEM, 
trauma cranioencefálico, intoxicação pelo chumbo e intoxicação por NaCl evidencia-se sinais 
de excitação predominantes no começo da doença, que evolui a óbito entre 2 a 6 dias. 
Nos quadros de abscessos no encéfalo e cenurose, o curso de evolução da doença é maior, 
possuindo sinais de disfunção neurológica que são discretos de início e que vão se agravando 
com o passar do tempo. 
A listeriose manifesta-se em lesões consideradas clássicas, que se apresentam como 
microabscessos ou granulomas, os quais ficam localizados no troncoencefálico, resultando 
nos sinais de síndrome pontinobulbar e/ou mesencefálica, que pode gerar disfunções 
assimétricas dos nervos cranianos, além de poder formar uma síndrome cerebral aguda devido 
à presença de lesões multifocais no encéfalo (raro). 
Em encefalopatia hepática por intoxicaçãocom plantas hepatotóxicas, observa-se cirrose 
hepática, junto a sinais súbitos e discretos de síndrome cerebral, levando um tempo maior de 
evolução até o óbito. Evidenciam-se alterações comportamentais, depressão, emagrecimento 
progressivo, dilatação do abdômen (devido à ascite) e diarreia crônica. A intoxicação por 
plantas com ação direto no SNC apresenta síndrome cerebelar, onde observa-se tremores 
musculares localizados ou generalizados com ou sem incoordenação motora (ataxia). 
É comum confundir a raiva com outras doenças neurológicas. Desse modo, deve-se saber que 
os primeiros sinais da enfermidade costumam ser de síndrome medular, com paraparesia que 
evoluirá para tetraparesia, fazendo com que o animal fique em decúbito esternal permanente. 
Posteriormente, serão observados sinais de síndrome encefálica precedentes ao óbito. Seu 
rápido período de evolução permite que a doença seja diferenciada de mielopatias. Porém, 
esse mesmo período assemelha-se com o do botulismo, que diferencia-se nos sinais 
apresentados, pois nesse último não se evidenciam sinais de encefalopatia além de depressão 
e flacidez da língua. 
Para efetivar o diagnóstico diferencial, são realizados exames laboratoriais, sendo possível 
constatar alterações no líquido cefalorraquidiano (LCR), como processos inflamatórios no 
encéfalo ou na medula (a partir da presença de pleiocitose, hiperproteinorraquia e de elevação 
da concentração de lactato), podendo identificar se o agente causador é vírus ou bactéria, além 
da existência de hemorragia prévia ou intoxicação por NaCl. Além disso, os exames também 
permitem identificar atividades enzimáticas (como as da GGT e AST) e concentração de 
bilirrubinas no soro sanguíneo. A elevação da atividade de creatinoquinase é observada em 
casos de enfermidades musculares e em casos de animais que encontram-se em decúbito 
prolongado (sinal apresentado em doenças neurológicas). O diagnóstico da PEM é realizado 
através da administração de tiamina (vitamina B1), sendo observada uma resposta efetiva e 
rápida do organismo, além de análise de H²S ruminal (nos casos em que a PEM é provocada 
por excesso de enxofre). Junto a esses métodos discutidos, também é mostrado o papel do 
patologista, que diagnostica por meio de dados vindos da necrópsia os animais que vieram a 
óbito, podendo indicar medidas terapêuticas e/ou profiláticas. 
O artigo publicado possui uma leitura completa e enriquecida pelos dados de levantamentos, 
gráficos e referências de outros estudos. Apesar de não serem dados que representam 100% 
do cenário nacional e que não abrangem as regiões Sudeste e Norte, ele traz uma noção geral 
a partir das informações encontradas no período do estudo, além de pontuar que algumas 
prevalências de enfermidades são influenciadas por particularidades regionais, estaduais e/ou 
locais. Os autores trouxeram um texto detalhado e explicativo, abordando epidemiologia, 
clínica e diagnósticos diferenciais das doenças neurológicas dos ruminantes no Brasil1. 
 
1 Discente cursando o 7º semestre do curso de Medicina Veterinária da Universidade Federal Rural da 
Amazônia (UFRA)

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